<strong>OS</strong> <strong>PENSADORES</strong>pressão mais refinada, 'a hermenêutica natural do mundosocial' como sacrossanto? Caso contrário, em que consiste aparticularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> seu método? Em que medida nela 'a coisa'tem 'mais valor' quanto a 'seu próprio peso' do que nosmétodos usuais das ciências da realida<strong>de</strong>?" 1 Entretanto, <strong>de</strong>maneira alguma a teoria dialética suspen<strong>de</strong>, tal como outroraHegel, <strong>de</strong> modo artificial e dogmático, a crítica à assim <strong>de</strong>nominadaconsciência pré-científica. No congresso <strong>de</strong> sociologia<strong>de</strong> Frankfurt em 1968, Dahrendorf apostrofou ironicamenteos dialéticos: Eles sabem muito mais do que eu. Duvidaele do conhecimento <strong>de</strong> uma objetivida<strong>de</strong> social preexistente,uma vez que o social é em si mediatizado por categoriassubjetivas do entendimento. O predomínio do método,atacado pelos dialéticos, nada mais é do que reflexãoprogressiva da intentio recta, pela qual se realiza o progressoda ciência. Contudo, os dialéticos criticam justamente a criticadateoria do conhecimento, a intentio oblíqua, em sua própriaconseqüência. Nisto cobram todas as proibições em que0 cientificismo se aguçava até o recente <strong>de</strong>senvolvimento da"filosofia analítica", porque se realizam à custa do conhecimento.O conceito <strong>de</strong> coisa mesma não reanima, como preten<strong>de</strong>Albert, "<strong>de</strong>terminados preconceitos" ou mesmo a precedênciada "origem" espiritual em face do "rendimento", noque aliás o positivismo não é tão imponente na marcha dasociologia. A concepção popperiana citada por Albert, emconseqüência <strong>de</strong> que teoremas "po<strong>de</strong>m ser entendidos comotentativas <strong>de</strong> aclarar os traços estruturais da realida<strong>de</strong>", 2 nãodista tanto assim do conceito daquela coisa mesma. Poppernão renega, como a seu tempo fez Reichenbach, a tradiçãofilosófica. Critérios tais como o da "relevância" 3 ou da "forçaexplicativa", 4 que não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> interpretar posteriormente1 Albert, "O mito da razão total", ibid., p. 204.2 Albert "Pelas costas do positivismo?", ibid., p. 285, nota 41: Vi<strong>de</strong> também Popper, "Oestabelecimento <strong>de</strong> objetivos pata a ciência experimental", em Ratio, ano 1,1957; reimpressoem "Theorie und Realitaet", editado por Hans Albert, Tübingen, 1964.3 Popper, "A lógica das ciências sociais", em A Disputa do Positivismo..., p. 114.4 id.— 146 —
ADORNOnum sentido aproximativo <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ciências naturais,diriam pouco se por trás não figurasse implicitamenteum conceito <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> que muitos positivistas, como Kõnige Schelsky na Alemanha, prefeririam eliminar. A mentalida<strong>de</strong>fechada a toda estrutura objetiva da socieda<strong>de</strong> estremeceem face do objeto que transformou em tabu. Aomesmo tempo que os cientificistas caricaturizam seus opositorescomo metafísicos sonhadores, eles próprios <strong>de</strong>ixam<strong>de</strong> ser realistas. Técnicas operacionalmente i<strong>de</strong>ais distanciamseforçosamente das situações em que se situa o que <strong>de</strong>veser investigado; isto po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong>monstrado sobretudo naexperiência sócio-psicológica, mas também na suposta melhorados índices. A objetivida<strong>de</strong> a que propriamente <strong>de</strong>veriaservir a afinação metodológica, o evitar fontes <strong>de</strong> erro, torna-sealgo secundário, que o i<strong>de</strong>al operacional piedosamentearrasta consigo; o que era central transforma-se em periférico.Dominando a vonta<strong>de</strong> metodológica, <strong>de</strong>sprovida <strong>de</strong> maiorreflexão, <strong>de</strong> tornar problemas "falseáveis" univocamente <strong>de</strong>cidíveis,a ciência se atrofia em alternativas que emergemsomente graças à supressão <strong>de</strong> variables, abstraindo portantodo objeto, e assim transformando-o. De acordo com este esquema,o empirismo metodológico opera em direção opostaà experiência.Que sem referência à totalida<strong>de</strong>, ao sistema global realporém intraduzível em imediatez tangível, nada <strong>de</strong> socialpo<strong>de</strong> ser pensado, que no entanto só po<strong>de</strong> ser conhecidoenquanto apreendido no singular fático, constitui o que nasociologia confere peso à interpretação. Ela constitui a fisionomiasocial do que se manifesta. Interpretar significa, emprimeiro lugar, perceber a totalida<strong>de</strong> nos traços dos dadossociais. A idéia da "aproximação antecipada" à totalida<strong>de</strong>,que eventualmente um positivismo muito liberal aprovaria,não é suficiente: à lembrança <strong>de</strong> Kant, ela visa a totalida<strong>de</strong>como algo infinitamente abandonado e adiado, porém a serpreenchido <strong>de</strong> princípio por dados, sem consi<strong>de</strong>rar salto qualitativoentre essência e fenômeno na socieda<strong>de</strong>. A análise— 147 —
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