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da necessidade de permanecerem no poder, não estava em desarmar uma guerrilha. A posiçãoinstitucional vinha com a promessa de construir um novo país. As Forças Armadas ficariam no poderporque iam refundar o Chile, e construir o que chamavam de uma “grande nação”. As frentes em quelutariam esta guerra, que eu tenho denominado como uma guerra social, eram as frentes econômicas,sociais, culturais e psicológicas. A guerra militar era importante, mas não era o mais importante. Ofundamental era mudar a mente das pessoas.Mas por que foi importante uma guerra social no caso do Chile? Pelo conceito de subversão. Osmilitares chilenos, por sua trajetória histórica, associavam a ideia de subversão à pobreza. Para eles,por que o Partido Comunista e Socialista tinham tanta tradição? Como era possível que o marxismotivesse chegado ao poder por via democrática? Porque o Chile era um país pobre e subdesenvolvido, eportanto a pobreza era o que atraia o marxismo. E de que forma se poderia superar essa ideologiamaligna? Superando a pobreza! Nesse sentido, as Forças Armadas se propuseram desde o princípio asuperar os níveis de estancamento econômico que havia no Chile. Deveriam construir um novo projetomodernizador para transformar o país e trazer crescimento econômico; esse crescimento deveriaeliminar o que se chamava de “extremamente pobres”, os marginais, os das favelas; e em terceiro lugar,este projeto modernizador deveria terminar com a influência dos partidos. Deveria despolitizar,entendendo por despolitizar, eliminar a influência dos partidos. Assim, deveria ser um projeto global querespondesse aos problemas econômicos, sociais e políticos. Esse projeto ficou pronto apenas em 1978,provindo dos civis, mas também de elementos das Forças Armadas.Desde o ponto de vista econômico, o projeto apontou para o neoliberalismo, ou o que hojecompreendemos como o neoliberalismo, já que ele não existia enquanto projeto na década de 1970. Oque havia, a partir de teóricos como Milton Friedman, e tudo o que eles defendiam, as políticas demercado da década de 1970, eram receitas de estabilização econômica, receitas monetaristas parabaixar a inflação, mas não existia o neoliberalismo como projeto. Mas nesse projeto o neoliberalismoexcede o marco econômico, e passa ao marco social, político e cultural. Esse processo se completa noChile em 1978, advindo de um grupo de economista que haviam estudado na Universidade de Chicago eque, junto com outro setor denominado “gremialistas” – nome que advém de um grupo de estudantes dedireita que se autodesignou “Movimento Gremial de la Pontificia Universidad Catolica”, porque diziamque os grêmios estudantis e sindicais deveriam estar separados dos partidos, e dedicar-se a seus finsespecíficos, ocupando espaços organizados de forma separada dos partidos – articularam um projetotecnocrático que cumpria com todas as condições para “vencer os desafios do Chile”, produzido a partirde uma mescla entre os neoliberais e os gremialistas.O que propunham os neoliberais? Desarmar o aparato estatal, completamente, e introduzir naeconomia chilena as lógicas de mercado. Portanto, o Estado se desfez de suas empresas públicas,reprivatizou todo o sistema financeiro que havia sido estatizado, privatizou o sistema comercial, tornandotudo privado. O mais importante de 1978 é que, uma vez desestatizando o sistema econômico, osneoliberais plantaram uma utopia: a utopia de uma sociedade autorregulada pelo mercado, que nãonecessitasse das interferências do Estado, mas que sozinha pudesse se autorregular pelo mercado. Issosignificou transpassar às lógicas neoliberais para o sistema social: privatizar a previdência, a saúde, aeducação, e todos os sistemas sociais. E isso que dizer que temos que pagar por tudo no Chile. Atémesmo a cultura, as entradas nos museus, é tudo pago.E então, do que se ocupa o Estado? Apenas dos extremamente pobres, dos habitantes dasfavelas, que segundo a ditadura não eram mais de vinte e um por cento dos habitantes do Chile, eportanto toda a guerra psicológica e social esteve voltada a esta porcentagem dos “pobres”, para queesses pudessem internalizar as lógicas de mercado.Nesse sentido, no país não havia nenhuma possibilidade de reestatizar a saúde, ou aprevidência em 1990, porque tudo já pertencia a grandes consórcios econômicos transnacionalizados. Apossibilidade de que a saúde ou o trabalho voltasse às mãos da regulação do Estado não existia.Precisariam pagar indenizações gigantescas aos grandes conglomerados, e isso não era possível. Alémdisso, o que a ditadura fez foi colocar a lógica neoliberal em todos os âmbitos da vida privada, porquetudo se transformou em problema privado: a educação, que era pública, agora era um problema privado,e as famílias, que discutiam onde estudariam seus filhos, não resolviam na esfera pública. Tudo setransformou em um problema privado, o que gerou uma atomização geral da sociedade. Tudo é umproblema individual, e não social. Não é um problema político. Isso significou uma legislação trabalhistaque desarticulou por completo os poucos sindicatos que existiam. Se dizia que estava mantida anegociação coletiva, mas na prática não tinham nenhuma capacidade de enfrentar os patrões, e omundo sindical praticamente sucumbiu. Subsistiram os sindicatos, mas sob a lógica neoliberal.O Chile do começo dos anos 1980 é um Chile que já não tem mais um Estado que considereque deva estar a cargo do social, salvo para estes grupos extremamente pobres, sobre os quais seexercerá a ressocialização mais profunda. Nós, o restante, vivemos a guerra psicológica através dosmeios de comunicação e de nossa própria experiência. Tivemos que perder a educação que tínhamos,perder o sistema de saúde que tínhamos, e aprender com essa experiência. Mas sobre os pobres se22

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