07-02-09 livro_A_Retorica_da_Perda_Jose_Reginaldo - Nomads.usp
07-02-09 livro_A_Retorica_da_Perda_Jose_Reginaldo - Nomads.usp
07-02-09 livro_A_Retorica_da_Perda_Jose_Reginaldo - Nomads.usp
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Fichamento do <strong>livro</strong> GONÇALVES, José <strong>Reginaldo</strong> Santos. A Retórica <strong>da</strong> Per<strong>da</strong>: osdiscursos do patrimônio cultural no Brasil. Rio de Janeiro: Editora UFRJ; IPHAN, 1996.O <strong>livro</strong> traz uma leitura crítica às estruturas narrativas que concebem os patrimônios nacionais,em especial o caso Brasileiro. Utilizando-se <strong>da</strong> ideologia <strong>da</strong> per<strong>da</strong>, os historiadores “criam” opatrimônios nacionais, num processo que também pode ser entendido como contraditório,porque a per<strong>da</strong> também ocorre através de seus discursos (através <strong>da</strong> homogeneização <strong>da</strong>sculturas e do passado). Terminologias como alegoria, objetificação, apropriação eautentici<strong>da</strong>de, extraí<strong>da</strong>s de discursos extra-nacionais são aplica<strong>da</strong>s no contexto brasileiro, emespecial na atuação de dois historiadores do SPHAN, Rodrigo Melo Franco de Andrade eAloísio Magalhães, a fim de entender o processo de “brasili<strong>da</strong>de”.Obs: grifos (verde): grifo sobre minhas observaçõesGrifos (cinza): grifo sobre observações relevantes do autor1. Patrimônio Cultural e Narrativas Nacionais1.1. Narrativas Nacionais1.2. Objetivação Cultural“A partir de Whorf, Handler entende a “objetivação” como “...uma tendência <strong>da</strong> lógicacultural ocidental a imaginar fenômenos não-materiais (como o tempo) como se fossemcorporalizados, objetos físicos existentes” (1984:55). A “objetivação” é determina<strong>da</strong> por uma“lógica” embuti<strong>da</strong> nas línguas e culturas ocidentais. Por esse viés, ela tenderia a ser vista comoum processo que ocorreria independentemente de ações humanas contingentes e dota<strong>da</strong>s depropósito.” (p. 13)“Em ver<strong>da</strong>de, estou tomando como ponto de parti<strong>da</strong> o pressuposto antropológicosegundo o qual os indivíduos, assim como seus propósitos, ações e contextos, sãoculturalmente mol<strong>da</strong>dos.” (p. 14)1.3. História, cultura e nação como narrativas
História como enredo:“O enredo torna possível a apresentação dos eventos históricos como um todo coerenteinterconectado, sendo que habilita o historiador a apresentar o que White chama deacontecimentos caóticos e arbitrários como uma totali<strong>da</strong>de significativa. Os historiadoresimpões sobre tais acontecimentos uma estrutura ficcional que os re-(a)presenta como sepossuíssem em si mesmos atributos de coerência e objetivi<strong>da</strong>de.” (p. 16)“A moderna crença segundo a qual os historiadores descrevem ou deveriam descreveros fatos ‘como eles realmente ocorrem’ é produzi<strong>da</strong> por meio de uma estratégia onde ohistoriador define a autori<strong>da</strong>de <strong>da</strong> narrativa como “a autori<strong>da</strong>de <strong>da</strong> própria reali<strong>da</strong>de” (White1980:19).” (p. 19)“Segundo Clifford, na medi<strong>da</strong> em que essa autori<strong>da</strong>de narrativa, partilha<strong>da</strong> por autores eleitores de etnografias, não é questiona<strong>da</strong>, as ‘culturas’ ou ‘socie<strong>da</strong>des’ estu<strong>da</strong><strong>da</strong>s pelosantropólogos são apresenta<strong>da</strong>s nos textos etnográficos como se fossem enti<strong>da</strong>des préexistentes,concretas e coerentes, esperando para serem representa<strong>da</strong>s pelos etnógrafos. Opapel dos antropólogos no processo de “invenção” <strong>da</strong>s culturas (...) tende a ser desvalorizado.Do mesmo modo que o historiador, o antropólogo apareceria como um narrador não situado,cujo papel serio o de descrever e analisar fatos etnográficos independentes de qualquerinterpretação.” (p. 119)Historiadores e antropólogos fazem prosa:“(...) evidentemente, não significa afirmar queo que historiadores e antropólogos têm produzido e continuam a produzir seja inválido, mas queseus textos podem ser avaliados também a partir de um outro padrão complementar.Historiadores e antropólogos recebem o convite para que percebam o que sempre fizeram:prosa, ou um certo gênero de prosa.”Nação como objeto de desejo: “Enquanto um objeto de desejo, a nação é experimenta<strong>da</strong>por meio de sua ausência. No entanto, essa distância ou ausência na<strong>da</strong> mais é que o efeito dodesvio diferencial entre coerência e incoerência, desejo e objeto desejado, ambos existindocomo parte integrante dos discursos nacionais. (...)Essa “estrutura do desejo”, para Stewart, “é paralela à formulação lacaniana segundo aqual o símbolo manifesta-se, fun<strong>da</strong>mentalmente através do assassinato do objeto que édesejado e que essa morte constitui no sujeito a eternização do seu desejo” (1984:143)” (p. 21-25)“É o distanciamento mesmo desses bens culturais no tempo e no espaço, através <strong>da</strong>retórica <strong>da</strong> per<strong>da</strong>, que os transforma em “objetos de desejo”, “objetos autênticos” (...).”(p.111)
1.4. O patrimônio cultural como apropriação e per<strong>da</strong>A idéia <strong>da</strong> per<strong>da</strong>: “A História aparece como “um processo inexorável de destruição, em quevalores, instituições e objetos associados a uma “cultura”, “tradição”, “identi<strong>da</strong>de” ou “memória”nacional tendem a se perder.(...)O efeito dessa visão é desenhar um enquadramento míticopara o processo histórico, que é equacionado, de modo absoluto, à destruição ehomogeneização do passado e <strong>da</strong>s culturas.”(p. 22)O discurso também provoca destruição !!!:“No entanto, este discurso, que se opõevigorosamente àquele processo de destruição, é o mesmo que, paradoxalmente, o produz. (...)No mesmo movimento produzem-se, transformados em colações e patrimônio culturais, osobjetos que estão sendo destruídos e dispersados. Esses objetos são concebidos nos termosde uma imaginária e originária uni<strong>da</strong>de, onde estariam presentes atributos tais como coerência,continui<strong>da</strong>de, totali<strong>da</strong>de e autentici<strong>da</strong>de.(...)Embora haja um lamento constante em relação a esse processo de fragmentação e per<strong>da</strong>, ele,na ver<strong>da</strong>de não é apenas um fato exterior ao discurso, mas algo que coexiste com o esforço depreservação tal como aparece nos discursos sobre patrimônio cultural.” (p. 25)Desejo de autentici<strong>da</strong>de = per<strong>da</strong>: “(...) Susan Stewart (1984) afirma que é odistanciamento dos objetos no tempo e no espaço que os transforma em “objetos de desejo”:objetos “autênticos”, que merecem ser buscados resgatados como parte representativa de umpatrimônio cultural ou de uma tradição.(...) As práticas de apropriação, restauração epreservação desses objetos são estruturalmente articula<strong>da</strong>s por um “desejo permanente einsaciável” pela autentici<strong>da</strong>de, uma autentici<strong>da</strong>de que é o efeito de sua própria per<strong>da</strong>.(...)A “estrutura de desejo” descrita por Stewart está presente nas narrativas nacionais sobrepatrimônios culturais. É por intermédio dessa estrutura que a nação é retira<strong>da</strong> <strong>da</strong> história e <strong>da</strong>contingência e transforma<strong>da</strong> num objeto de desejo, numa enti<strong>da</strong>de estável e permanente,dota<strong>da</strong> de coerência e continui<strong>da</strong>de.” (p. 25-26)1.5. Redenção: o patrimônio como alegoriaDefinição de alegoria: “De acordo com os especialistas em teoria literária, a alegoria é umgênero literário que pode ser entendido como uma estória narra<strong>da</strong> sobre uma situação históricapresente, na qual existe um forte sentimento de per<strong>da</strong>, transitorie<strong>da</strong>de, ao mesmo tempo emque existe um desejo permanente e insaciável pelo resgate de um passado histórico ou mítico,
além de uma permanente esperança de um futuro redimido (Benjamin 1977; De Man 1979;1981; Greenblatt 1981; Jameson 1981; Lavie 1989).(...) elas [as alegorias] não somenteexpressam um desejo por um passado glorioso e autêntico; elas, simultaneamente, expõem oseu desaparecimento.”Patrimônio como alegoria: “Desse modo, pode ser analiticamente produtivo pensar ospatrimônios culturais como alegorias por meio <strong>da</strong>s quais idéias e valores classificados como“nacionais” vêm a ser visualmente ilustrados na forma de objetos, coleções, monumentos,ci<strong>da</strong>des históricas e estruturas similares.” (p. 28)Processo de objetificação:”(...) o que Barthes vai chamar de “ilusão referencial” ou “efeitode real”. (...) o “detalhe concreto” na narrativa realista, assim como nas narrativas nacionaissobre patrimônio culturais, desempenha estruturalmente a função de realizar uma mediaçãosimbólica entre linguagem e experiência, entre o passado e ou a identi<strong>da</strong>de nacional e osindivíduos que compõem a nação. E o fazem enquanto se configuram como a própria categoriado real. No entanto, para que ca<strong>da</strong> um desses pormenores desempenhe essa funçãomediadora eles devem estar, de certo modo, marcados pela ambigüi<strong>da</strong>de: estão, ao mesmotempo, na narrativa e fora dela; representam a reali<strong>da</strong>de e, ao mesmo tempo, são a reali<strong>da</strong>de;são parte <strong>da</strong>s narrativas e, ao mesmo tempo, são supérfluos, uma vez que elas poderiamcontinuar sem eles (...).”(p. 29)1.6. As narrativas sobre patrimônio cultural como alegorias <strong>da</strong> formação nacionalJustificativa para a defesa do patrimônio nacional: “A história, de certo modo, é vistacomo um processo destrutivo.(...)Nesse sentido, a nação, ou seu patrimônio cultural, éconstruí<strong>da</strong> por oposição a seu próprio processo de destruição.” (p. 32)Mas, “Quem tem autori<strong>da</strong>de para dizer o que é e o que não é o patrimônio culturalbrasileiro? Quem tem autori<strong>da</strong>de para preservá-lo? Como essa autori<strong>da</strong>de é culturalmenteconstituí<strong>da</strong>?” (p. 33)Para isso, explora as visões de Rodrigo Melo Franco de Andrade e Aloísio Magalhães:“No discurso de ca<strong>da</strong> um deles o Brasil é objetificado de certo modo e segundo determinadospropósitos. Exploro contrasticamente as estratégias através <strong>da</strong>s quais esses intelectuais, pormeio de narrativas diversas, inventam o patrimônio cultural, a nação brasileira e a eles próprios,enquanto guardiões desse patrimônio.” (p. 33)
2. A identificação do Brasil2.1. A busca <strong>da</strong> “identi<strong>da</strong>de nacional”1937- 1970: Rodrigo Melo Franco de Andrade e o antigo SPHAN (Secretaria dePatrimônio Histórico e Artístico Nacional) – política hegemônica. “Período heróico”.1979-1982: “Aloísio Magalhães e o processo de renovação do ideológica e institucional<strong>da</strong> política oficial de patrimônio cultural (...).”(p. 37)2.2. Narrando a cultura Brasileira2.3. Rodrigo, os anos trinta e o SPHAN: o Brasil como civilização e tradição-Contexto histórico:“Esse projeto era implementado por uma nova elite de bases urbanas – em oposição àsvelhas elites agrárias – que veio a dirigir o país sob orientação de uma ideologia nacionalista,autoritária e modernizadora, após a revolução de trinta.” (p. 39)Ideologia: “(...) uma nova nação, através <strong>da</strong> modernização <strong>da</strong>s estruturas econômicas,político-administrativas e culturais.”1937: golpe de Estado, regime político autoritário.1937: o SPHAN foi criado por decreto presidencial, subordina<strong>da</strong> ao Ministério <strong>da</strong> Cultura eSaúde, dirigido por Gustavo Capanema. Este convidou Rodrigo Melo Franco de Andrade,intelectual mineiro, para dirigir o SPHAN.Identi<strong>da</strong>de Nacional: “Desde os últimos anos do império e desde a instauração do regimerepublicano, em 1889, as discussões sobre esse tema centraram-se na idéia de “raça”(Skidmore 1974; Schwartz 1993). Ao longo <strong>da</strong> segun<strong>da</strong> e terceira déca<strong>da</strong> do século XX, oproblema veio a ser discutido, não mais em termos raciais, mas culturais, como uma busca <strong>da</strong>“brasili<strong>da</strong>de”, de uma “essência”, “alma” ou simplesmente “identi<strong>da</strong>de” <strong>da</strong> nação brasileira.” (p.41)Discurso de Rodrigo:Além de 1500: “(...) o patrimônio brasileiro é pensado como parte de um patrimôniouniversal.Ao mesmo tempo, ele situa as origens <strong>da</strong> cultura brasileira na “tradição” singularproduzi<strong>da</strong> pelas contribuições <strong>da</strong> populações indígenas, africanas e européias no Brasil.(...)uma síntese de valores “primitivos” e “exóticos”.” (p. 44-45)
prosseguir sem que isso represente uma per<strong>da</strong> de autonomia cultural frente aos países doprimeiro mundo.” (p. 53)“Bens Culturais”: “Eles são pensados não como objetos fixos, exemplares, mas noprocesso mesmo de criação e recriação que lhes dá reali<strong>da</strong>de (Magalhães 1984; 1985).” (p. 55)Discurso de Aloísio:-Aproximação com as idéias do projeto original de Mário de Andrade, de 1936, que segundoAloísio não foram segui<strong>da</strong>s pela instituição até então. O Projeto de Mário de Andrade é bastanteabrangente.-“Diferentes formas de ‘cultura popular’”;-“autêntica” identi<strong>da</strong>de nacional (cultura popular);-“visão pluralista e, de certo modo, “antropológica” do Brasil”;-patrimônio também pensado como uma “causa” (p. 56)2.5. Cultura nacional como estratégia de autenticaçãoRodrigo: “Rodrigo autentica sua posição opondo-a a um discurso não científico, não profissionalsobre a cultura brasileira.”(p.61)Aloísio: “por sua vez, autentica sua própria posição desafiando a de Rodrigo. Sua estratégia é ade narrar a cultura nacional brasileira, não necessariamente de um ponto de vista distante eimpessoal, mas, aproxima<strong>da</strong>mente, valorizando o que (...) chamamos de “ponto de vistanarrativo”.” (p.62)Aproximações: “Em ambas as narrativas a nação é objetifica<strong>da</strong> como uma “busca” pelaidenti<strong>da</strong>de. (p.62)3. A apropriação <strong>da</strong> cultura nacional“Uma nação é concebi<strong>da</strong> como legítima proprietária de sua cultura.(...)Nesse processo, o que é apropriado, quem se apropria e com quais propósitos são questõesque trazem diferentes respostas.” (p.63-64)Apropriações diversas:Rodrigo: seu propósito de apropriação era o de “defender uma “tradição” para “civilizar”.”
Aloísio: para ele era necessário “preservar a “heterogenei<strong>da</strong>de cultural” para garantir o“desenvolvimento”.”3.1. Em busca do tempo perdido: a política do SPHAN de 1937 a 1979-Apropriação do passado-Defesa dos monumentos “como signos visuais de uma condição civiliza<strong>da</strong>” (p.65)-Tombamento (o correspondente ao termo registration, em inglês, e ao termo classement, emfrancês):1) proposta de um bem cultural pelo dono ou outra pessoa2) o bem é identificado e avaliado por especialistas, que elaboram um relatório técnico3)se é recomen<strong>da</strong>do o tombamento, as conclusões são leva<strong>da</strong>s ao Conselho Consultivo doSPHAN (este conselho é tido como cargo de prestígio para a elite intelectual e política, sendoque seus integrantes são indicados pelo Presidente <strong>da</strong> República e exercem função vitalícia;eles não são pagos a fim de justificar a idéia de “causa” do patrimônio)4)Se aprovado pelo conselho, o bem é inscrito em um dos Livros do Tombo5)várias restrições então são impostas ao proprietário, como necessi<strong>da</strong>de de autorização oficialpara realizar qualquer alteração ou ven<strong>da</strong> do imóvel, assim como para levar objetos de valorhistórico para fora do país. Além disso, na maioria dos casos o proprietário do imóvel nãorecebe aju<strong>da</strong> financeira para manter esse bem.-Tombamento de Ouro Preto e defesa <strong>da</strong> arquitetura colonial. Justificativa: “Rodrigo justificouessa concentração argumentando que, no século XVIII, mais que em qualquer outra região dopaís, um número superior de monumentos e obras de arte “com feição mais expressiva” foiproduzido em Minas Gerais ([1969] 1987:73).” (p.71)-“Ponto de Vista estético”-“Associações de natureza cívica”-“A religião, especificamente o catolicismo, desempenha um papel crucial na narrativa deRodrigo”3.2. Referência Cultural e Produção CulturalAproximação de Aloísio com Mário de Andrade: “Para Aloísio, a noção de “patrimônio cultural”concebi<strong>da</strong> por Mário (de Andrade) estava muito próxima de uma concepção democrática epluralista do que a veio a inspirar a política implementa<strong>da</strong> por Rodrigo.” (p.73)
Foco no passado, mas “um passado concebido como um instrumento, uma referência a serusa<strong>da</strong> no processo de desenvolvimento econômico e cultural.”Ênfase nos “bens culturais”: uma categoria mais ampla que bens patrimoniais: “Em seudiscurso, a ênfase está naquela categoria de “bens culturais” considerados como parteintegrante <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> cotidiana de distintos seguimentos <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de brasileira.(...)Eles são produzidos pelo povo e, nessa condição, são considerados como uma fonte deautentici<strong>da</strong>de.”(p.76)Criação do CNRC (Centro Nacional de Referência Cultural) com o objetivo de “ estu<strong>da</strong>r e proporuma política alternativa de patrimônio cultural”, a fim de “traçar um sistema referencial básicopara a descrição e análise <strong>da</strong> dinâmica cultural brasileira, tal como é caracteriza<strong>da</strong> na prática<strong>da</strong>s diversas artes, ciências e tecnologias (Magalhães [1979] 1985:130).”(p.77)Apropriação: “A estratégia de apropriação <strong>da</strong> cultura nacional pressuposta no discurso deAloísio trazia como conseqüência uma representação <strong>da</strong> nação brasileira como uma totali<strong>da</strong>decultural diversifica<strong>da</strong> e em permanente processo de transformação.” (p.81)3.3. Apropriação e o papel <strong>da</strong>s metáforas visuaisDefinição de Patrimônio relacionado à proprie<strong>da</strong>de: “Etimologicamente, “patrimônio” vem dolatim patrimonium e está associado à idéia de uma proprie<strong>da</strong>de her<strong>da</strong>de do pai ou de outroancestral. No contexto <strong>da</strong>s narrativas nacionalistas de preservação histórica do Brasil,a palavraé usa<strong>da</strong> para significar uma determina<strong>da</strong> espécie de “proprie<strong>da</strong>de nacional”. Na ver<strong>da</strong>de, essenão é um procedimento específico do Brasil. Em um estudo sobre o nacionalismo e políticacultural em Québec, Handler (1988), baseando-se em MacPherson (1962), sugere uma relaçãoentre as metáforas de proprie<strong>da</strong>de e o “individualismo possessivo” do século XVII. De acordodom essa ideologia, a “proprie<strong>da</strong>de” é o que define a pessoa. Em outras palavras, sou umindivíduo, no sentido moderno do termo, na medi<strong>da</strong> em que sou proprietário de algum bem.Assim, as nações modernas, que são “indivíduos coletivos” ou “coleções de indivíduos”(Dumont 1970; 1985; 1992) individualizam-se ao assumirem suas proprie<strong>da</strong>des,particularmente, suas proprie<strong>da</strong>des culturais, seus “patrimônios”.(...)Em termos histórico-sociológicos, essa estratégia narrativa é coerente com o que Nobert Eliaschamou de “processo civilizador” (1990; 1993) e, particularmente, com o processo deintegração territorial, social e simbólica que caracteriza a formação <strong>da</strong>s modernas socie<strong>da</strong>desnacionais (1972).” (p.81-82)
“(...)o patrimônio é uma vasta coleção de fragmentos, na medi<strong>da</strong> em que seus componentessão descontextualizados, retirados dos seus contextos originais, no passado ou no presente, ereclassificados nas categorias <strong>da</strong>s ideologias culturais que informam as políticas oficiais depatrimônio. Sua integri<strong>da</strong>de não é presente e positiva, mas uma integri<strong>da</strong>de necessariamenteperdi<strong>da</strong>, situa<strong>da</strong> numa dimensão distante no tempo ou no espaço. Os fragmentos que ocompõem são metonímias de uma totali<strong>da</strong>de temporal ou especialmente longínqua (...).”(p.112)Definição de Patrimônio Cultural e objetificação: “A expressão “patrimônio cultural” é usa<strong>da</strong> paradesignar objetos no sentido mais geral desse termo: prédios, obras de arte, monumentos,lugares históricos, relíquias, documentos; e diferentes mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong>des de práticas sociaisobjetifica<strong>da</strong>s enquanto bens culturais: artesanato, rituais, festas populares, religiões populares,esportes, etc. Enquanto objetos ou práticas sociais objetifica<strong>da</strong>s, são todos apropriados com opropósito de serem exibidos e contemplados. É nesse sentido que a metáfora <strong>da</strong> apropriaçãoimplica o uso de metáforas visuais. Em termos gerais, o efeito <strong>da</strong> apropriação é a cultura “comouma coisa” (Handler 1988) ou “como exibição” (Mitchell 1989), implicando o uso de metáforasoculares. É por meio <strong>da</strong> exibição desses objetos e práticas sociais objetifica<strong>da</strong>s que é produzidoo “efeito de reali<strong>da</strong>de” (Barthes 1988: 141-148) no contexto <strong>da</strong>s narrativas do patrimôniocultural. Esses objetos e práticas objetifica<strong>da</strong>s autenticam o ‘real’ produzido por essasnarrativas. O que dizem é: ‘Nós somos reais, tanto quanto a reali<strong>da</strong>de que apresentamos’. Seupropósito é persuadir os expectadores <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>quilo que apresentam: a nação, em suainegável concretude.” (p.83)Patrimônio como alegoria: “O patrimônio cultural pode ser entendido como uma alegoria visualem dois sentidos: pelo uso de meios visuais; mas, também porque, enquanto alegoria, eleilustra e reproduz o princípio epistemológico do conhecimento como um produto do olho.” (p.84)Tradições: “Na ver<strong>da</strong>de to<strong>da</strong>s as tradições são inventa<strong>da</strong>s: não no sentido de que sejam‘artificiais’ ou ‘inautênticas’, mas no sentido de que não existe qualquer significado semmediações, qualquer significado primordial que delas possa ser resgatado.” (p.86)