www.nead.unama.brE assentou-se à mesa, que tia Zefa cobria nesse instante com uma toalhade linho grosso, enquanto a Rosinha corria a buscar á dentro a tigela de sopa. A avóchegou-se também para vê-lo comer, como fazia todos os dias. Uma velhinhaengraçada, a vovó Custódia! — seca, pequenita, a pele enrugada que nem umjenipapo maduro; a cabeça que era um algodão; a boca fechando e abrindo sempre,e toda cheia de pregas, tal qual a boca de um saco fechado. Mas toda ela aindaesperta, agarrando-se à vida com as unhas, que os dentes já á se tinham ido.Sentia-se ali um cheiro especial de roupa engomada e de roupa lavada.Justificando esse cheiro, viam-se acumulada por toda a parte, sobre as mesas,sobre as cadeiras, pilhas de camisas dobradas, montões de peças de roupa branca,e, dependuradas de uma corda, pelo cós, muitas anáguas, e muitas saias,penteadores bordados e vestidos de linho com guarnições de renda. Um candieirode querosene iluminava a pobre sala de duas braças de largura e três decomprimento, toda caiada de cima a baixo, e com uma pequena barra de roxo-terra.Havia um armário de pinho sem pintura, onde se guardava a louça, aquela grossalouça de doze vinténs o prato, e aquelas canecas de pó de pedra, onde elestomavam café antes de levantar o dia. Na parede — uma gaiola de pindoba com umgaturamo. A casa constava ainda d duas alcovas e outra salinha; ao fundo umpequeno quintal que dava para o cortiço. Era propriedade da mãe do Luiz; deixoulhao marido, um ferreiro, que morreu de desastre.O rapaz, enquanto jantava, falou a respeito das esquisitices da filha doConselheiro, causou grande impressão na sua gente. Quiseram pormenores;crivaram-no de perguntas: "Se Magda tinha cara de doida; se era bonita; se dava aorespeito". Luiz respondia a tudo, devorando colheradas de feijão amassado comfarinha.— Pois mana Justina diz que ela é muito boa, observou Rosinha. — E ocaso é que lhe tem dado muita coisa! Ainda há dias mostrou-me um anel, que...— Um anel? De ouro?— Sim, senhora, de ouro! Juro por esta luz! Eu vi! Lindo! Com umaspedrinhas em ciam!A notícia do anel abriu um silêncio comovido.A tia Zefa observou afinal:— Aquela chorou na barriga da mãe! Tem muita sorte o diabo da rapariga!Hão de ver que ainda encontra marido, apesar dos filhos...— Ora se encontra! respondeu Luiz. — Isso é tão certo como me achar euaqui! Pois não se vê como está o Manoel das Iscas por ela?... Não fala noutra coisa!"Porque a S’óra Justina p’ra cá! A S’óra Justina p’ra lá!" Até já fede!— Que me estás tu a dizer, rapaz?— Ora! Caidinho! E, se ela o souber levar, apanha-o mesmo!— Uma sorte grande! O Iscas já tem alguma coisa de seu!— Olá! Só aquele correr de casas, que ele fez agora, dá-lhe com que passarmais duas vidas!...Depois do Iscas, a filha do Conselheiro tornou a entrar para assunto daconversa, e discutiram-se com assombro os presentes dados por ela à Justina. Porfim o cavouqueiro ergueu-se da mesa, tomou a sua viola e foi esperar pela hora dedormir, assentado à porta da estalagem, repinicando o seu fado favorito. Rosinha48
www.nead.unama.bracompanhou-lhe logo e instalou-se ao lado dele como costumava fazer; ao passoque as duas velhas, tomando cada qual a sua cadeira, ficaram defronte uma daoutra, a falar; entre bocejos e cochilos, no que tinham trabalhado esse dia e no queiam trabalhar no dia seguinte. Daí a pouco já não diziam palavra, e a própriaRosinha dava marradas no noivo, cabeceando de sono. Só a viola do cavouqueirocontinuava bem acordada, quebrando o denso recolhimento das nove e meia com oseu "tir-lim-tim-tim" monótono e embebido de saudade.Luiz cantava:"O sol prometeu à luaUma faixa de mil cores;Quando o sol promete à lua,Que dirá quem tem amores!..."Tir-lim-tim-tim! Tir-lim-tim-tim!"Tia a amar-me, e eu a amar-te,Não sei qual será mais firme!Eu como sol a buscar-te,Tu como sombra a fugir-me!"Essa cantilena chegava até a casa do Conselheiro reduzida a uma toadaerrante e tão lânguida que entristecia. Magda escutava-o da sua alcova, deitada nocolo de Justina, à espera do sono.E quando, lá pela meia-noite, conseguiu adormecer, continuou logo a sonharcom o moço da pedreira.CAPÍTULO XIO sonho ligava-se ao da véspera. Tornou a ver-se no colo do rapaz,abandonando a casa paterna e dirigindo-se vagarosamente para a montanha; esta,porém, surgia-lhe adora defronte dos olhos, não como pedreira esbrugada, mas emplena efervescência de verdura e toda coberta de flores.Começaram a subir. Uma floresta virgem abria-se diante deles, para lhes darpassagem, e logo se fechava sobre os seus passos, como cortinas de um leito defolhas. O moço parecia não cansar com o peso que levava, e Magda por sua vezsentia-se leve, muito vaporosa; e, à proporção que se afastava de casa e ia-seentranhando na mata, fazia-se melhor, mais satisfeita e feliz.Afinal, deram com uma planície. Haviam chegado ao cimo da montanha; aí ocírculo de verdura que os guardava abriu em clareira, destoldando o azul, onde o solresplandecia, transbordante de ouro por entre espumas de prata. Reinava na luz ummeio tom suave e comunicativo; tudo era doce, temperado e calmo; as vozes danatureza chegavam aos seus ouvidos apenas balbuciadas; as folhas e asascochichavam, como se temessem acordar alguém; perto corria um regatosussurrando.O moço pousou Magda sobre a relva e assentou-lhe ao lado dela, tomandolheas mãos entre as suas.— Como te sentes agora, minha flor! Segredou-lhe, aproximando o rosto.— Muito, muito melhor... Respondeu a filha do Conselheiro com um suspiro.— Sinto-me ainda um pouco fraca, mas conto que estes ares me restituam asforças...49
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