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A ICTIOFAUNA DO RIO SANTO ANTÔNIO, BACIA DO ... - ICB - UFMG

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AGRADECIMENTOSCertamente em um trabalho desenvolvido ao longo de um tempo extenso demaispara os padrões atuais, muitos tiveram participação direta ou indireta para que chegassea termo. Dessa forma, certamente será impossível agradecer a todos, razão pela qualpeço desculpas antecipadas por eventuais omissões.A Fundação O Boticário de Proteção a Natureza pelo financiamento e apoio quepermitiram o início e conclusão desse trabalho.Ao Programa Espécies Ameaçadas, subsidiado pelo Fundo de Parceria paraEcossistemas Críticos (CEPF) e coordenado pela Fundação Biodiversitas e pelo Centrode Pesquisas Ambientais do Nordeste (CEPAM), pelo financiamento dos estudos comespécies de peixes ameaçados na bacia do rio Doce, parte dos quais ainda se continuamnesse momento.Aos Projetos NEODAT (The Inter-Institutional Database of Fish Biodiversity inthe Neotropics), Catalog of Fishes (California Academy of Sciences), Centro deReferência em Informação Ambiental (CRIA) e FishBase pela possibilidade de acessoirrestrito aos bancos de dados sobre espécies de peixes e exemplares depositados emmuseus. A Agência Nacional de Águas (ANA), pelo acesso ao banco de dadosdisponibilizado via Hidroweb: Sistema de Informações Hidrológicas, fonte da sérietemporal de dados pluviométricos, de vazão e físicos e químicos da água na bacia do rioSanto Antônio.Aos amigos incondicionais de sempre, referindo-me aos primórdios dessetrabalho Carlos B. M. Alves (Cacá), Luiz A. Rocha (Muminha) e Gilmar B. Santos(Ilgão).Ao Paulo Pompeu, que além da grande amizade auxiliou nas coletas em campo efez a leitura crítica e sugestões em várias partes do trabalho aqui apresentado.Ao Flávio C. T. Lima, José L. Birindelli e Edson L. Pereira pela ajuda emsolucionar algumas identificações, notadamente exemplares depositados no Museu deZoologia da USP (MZUSP) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul- PUCRS.A Volney Vono, Márcia e Renê Hojo que confirmaram informações preciosassobre a ocorrência de espécies a jusante da UHE Salto Grande.Alexandre L. Godinho (Sam) pelo espaço franqueado e uso incondicional dolaboratório e equipamentos.5


SumárioRESUMO ..................................................................................................................................... 8ABSTRACT................................................................................................................................. 9INTRODUÇÃO GERAL.......................................................................................................... 10A <strong>BACIA</strong> <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO.................................................................................. 12REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 20CAPÍTULO 1.............................................................................................................................. 23COMUNIDADES DE PEIXES NA DRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO, <strong>BACIA</strong><strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MG.................................................................................................................24RESUMO ................................................................................................................................... 24INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 24METO<strong>DO</strong>LOGIA .....................................................................................................................26ÁREA DE ESTU<strong>DO</strong> ................................................................................................................. 26AMOSTRAGEM DA <strong>ICTIOFAUNA</strong> ..................................................................................... 28QUALIDADE DA ÁGUA......................................................................................................... 29ANÁLISE <strong>DO</strong>S DA<strong>DO</strong>S........................................................................................................... 30RESULTA<strong>DO</strong>S.......................................................................................................................... 32DISCUSSÃO.............................................................................................................................. 45REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 51CAPÍTULO 2.............................................................................................................................. 59DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E ASPECTOS DA ECOLOGIA DE PEIXESAMEAÇA<strong>DO</strong>S DE EXTINÇÃO NA DRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO, <strong>BACIA</strong><strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MG.................................................................................................................60RESUMO ................................................................................................................................... 60INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 60METO<strong>DO</strong>LOGIA .....................................................................................................................62RESULTA<strong>DO</strong>S.......................................................................................................................... 65DISCUSSÃO.............................................................................................................................. 72REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 80CAPÍTULO 3.............................................................................................................................. 88ÁREAS P<strong>RIO</strong>RITÁRIAS PARA A CONSERVAÇÃO DA FAUNA DE PEIXES NADRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO, <strong>BACIA</strong> <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MG....................... 89RESUMO ................................................................................................................................... 89INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 89CARACTERÍSTICAS DA DRENAGEM E DA <strong>ICTIOFAUNA</strong> PARA DELINEAMENTODE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO................................................................................... 91AS ÁREAS SELECIONADAS PARA CONSERVAÇÃO .................................................... 95REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 997


RESUMOAnalisamos a riqueza, distribuição e aspectos biológicos das assembléias de peixes queocorrem na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG. Essa drenagem éreconhecida como prioritária para conservação da diversidade de peixes em MinasGerais e no bioma da Mata Atlântica. Além da ampliação do conhecimento sobre aictiofauna, o objetivo do estudo foi selecionar áreas que possam manter a diversidade depeixes nessa drenagem, atualmente ameaçada com a construção de barragens e outrosimpactos antrópicos. Os dados foram obtidos em estudos de campo e complementadoscom os registros de exemplares depositados em museus, cobrindo uma série temporalentre os anos de 1989 e 2005. No total foram feitos registros da ictiofauna em 61pontos, sendo 27 localizados em córregos e 34 na calha central do Santo Antônio e deseus maiores afluentes. Nossos resultados indicaram que a bacia do rio Santo Antônioabriga mais espécies de peixes nativas (57 sp.) que qualquer área de tamanhocomparável na bacia do rio Doce. Desse total, pelo menos dez são novas para a ciência.A ictiofauna também inclui todas as espécies ameaçadas de extinção na bacia do rioDoce, e para as quais são necessárias ações destinadas à conservação (andirá –Henochilus wheatlandii; timburé – Leporinus thayeri; pirapitinga – Brycon opalinus;piabanha – B. devillei e surubim-do-Doce – Steindachneridion doceanum). A maioriadas espécies exóticas apresentou distribuição restrita ao baixo rio Santo Antônio, ajusante da UHE Salto Grande. Principais impactos antrópicos são a construção debarragens, introdução de peixes exóticos, retirada da vegetação ciliar e assoreamento.Atualmente, pelo menos duas subdrenagens (rios Guanhães e Tanque) e a parte baixa dorio Santo Antônio não mantêm mais características apropriadas para o desenvolvimentode programas de conservação. Com base nos resultados obtidos foram identificadas trêsáreas distribuídas ao longo do canal principal e tributários, as quais em conjuntodeverão manter a maior parte da ictiofauna registrada na bacia. A estratégia deconservação indicada para essas áreas foi a transformação em Áreas de ProteçãoAmbiental (APA). Essa nova condição regional inviabiliza a implantação de quatropequenas centrais hidrelétricas, que em seu conjunto representam 16,4% do potencialenergético inventariado para a bacia. Entretanto, mesmo com implicações econômicasnegativas, essas obras devem ser consideradas fora de um planejamento regional onde oobjetivo seja a manutenção desse importante componente da ictiofauna neotropical.8


ABSTRACTSpecies richness, distribution, and biological features of freshwater fish assemblageswere analyzed within the Santo Antônio River drainage, Doce River basin, MinasGerais state. Santo Antônio’s drainage is recognized as one of the conservation priorityareas for fish diversity in Minas Gerais state and Atlantic rain forest biome. In additionto the increasing knowledge of its ichthyofauna, the aim of this study was to identifysignificant areas that could support fish diversity in the drainage, which is threatened bydam’s construction and other anthropogenic impacts. Data were obtained during fieldsurveys and complemented with those registered in museum, embodying a temporalseries from 1989 to 2005. Fishes were caught in 61 sampling sites, 27 of which instreams and 34 in the main channel of Santo Antônio River and its tributaries. Ourresults suggested that Santo Antônio River supports more native fishes (57 species) thanany other area of comparable size in the Doce River basin. We found at least ten newspecies among the collected species, including also all threatened species from DoceRiver, for which conservation measures are needed (andirá - Henochilus wheatlandii;timburé - Leporinus thayeri; pirapitinga - Brycon opalinus; piabanha - B. devillei andsurubim-do-Doce - Steindachneridion doceanum). Most of exotic species were restrictto low stretches of Santo Antônio River, below the Salto Grande Hydropower Plant.The major impacts in the Santo Antônio River Basin are dam construction, introductionof exotic species, clearing of the riparian vegetation and silting. Guanhães and TanqueRivers and the low stretch of Santo Antônio River were not considered for conservationprograms as they showed a relative high degree of degradation. Our results support theselection of three areas in the main channel and tributaries that together can maintainmost of the ichthyofauna recorded in the drainage. As a conservation strategy wesuggest their establishment as Environmental Protection Areas (EPA). This newregional scenario would not permit the implementation of four small hydropowerprojects which together represents 16.4 % of the energy powerful in the Santo AntônioRiver Basin.9


Figura 2 – Áreas prioritárias para conservação da fauna de peixes na Mata Atlântica enos Campos Sulinos, sendo que a drenagem do rio Santo Antônio está indicada pelaseta. Fonte: Conservation International (2000b).Também deve ser considerado que na prática da conservação, informações comoriqueza de taxa indicadores, endemismos e riqueza total de espécies têm sido utilizadaspara identificar possíveis áreas de conservação (Landres, 1988; Curnutt et al., 1994; vanJaarsveld et al., 1998). Adicionalmente, as características regionais das assembléias deespécies e a probabilidade de ocorrência de uma dada espécie em reservas potenciaistambém são consideradas em conservação da biodiversidade (Pressey et al., 1993;Wahlberg et al., 1996; Margules & Pressey, 2000).11


Entretanto, se por um lado definições de diretrizes gerais para a conservação dabiodiversidade têm sido ampliadas, os esforços concretos para transformá-las em açõesefetivas para conservação ainda permanecem como um objetivo a ser alcançado. Essefato ficou muito evidente no estado de Minas Gerais, em que perdas significativas deáreas consideradas prioritárias para conservação da fauna de peixes ocorreram no curtoespaço de sete anos (Drummond et al., 2005).No que se refere a ictiofauna, a bacia do rio Santo Antônio atende a algunsrequisitos que justificam sua indicação como área prioritária para conservação,destacando-se a ocorrência de diversas espécies endêmicas, ameaçadas de extinção(Vieira et al., 2000; Vieira & Alves, 2001; Castro et al. 2005, Rosa & Lima, 2005) e porapresentar elevada diversidade de espécies.Neste contexto, definir as áreas que mantêm alta diversidade de espécies constituio elemento primário para a proteção da biodiversidade (Allan & Flecker, 1993), emboradeterminar como essas áreas se originaram e são mantidas representa um consideráveldesafio científico. Assim, após essas áreas serem identificadas serão necessários estudosadicionais, que associados a ações legais, representarão uma forma efetiva deproporcionar a sua manutenção em longo prazo.Embora exista reconhecimento formal que a bacia do rio Santo Antônio seja umaárea de grande importância para peixes no bioma Mata Atlântica, faltam diretrizesbásicas para a definição de estratégias de conservação. Este estudo teve como objetivos:i) inventariar e mapear a distribuição das espécies de peixes que ocorrem nessadrenagem e ii) definir as áreas e estratégias de conservação que poderão mantê-las nofuturo.A bacia do rio Santo AntônioA bacia do rio Doce possui área total de aproximadamente 82.000 km 2 , dos quais86% no estado de Minas Gerais. Suas nascentes estão em um dos contrafortes da Serrado Espinhaço, no município de Ressaquinha, a 1220 m de altitude. Em Minas Geraisseus principais afluentes pela margem direita são os rios Chopotó, Casca, Matipó,Cuieté e Manhuaçu, enquanto pela margem esquerda são os rios Piracicaba, SantoAntônio, Corrente Grande e Suaçuí Grande (CETEC, 1983).O rio Santo Antônio nasce nas proximidades da Serra Tromba D’Anta, nomunicípio de Conceição do Mato Dentro. Tem como principais formadores os rios do12


Peixe, Preto do Itambé, Guanhães e Tanque e uma área total de drenagem de 10.390km 2 . A totalidade da drenagem do rio Doce encontra-se inserida no bioma MataAtlântica, atualmente reduzido a menos de 8% de sua área original (ConservationInternational, 2000b). Segundo Espindola (2005), a cobertura vegetal da bacia do rioDoce conservou-se de forma significativa até o início da década de 1930, concentrandosenas três décadas seguintes a fase de devastação generalizada. Esse processo resultouem intensa fragmentação florestal, como pode ser observado na drenagem do rio SantoAntônio, onde atualmente a maior densidade de remanescentes encontra-se nascabeceiras, principalmente em áreas elevadas na vertente da cadeia do Espinhaço(Figura 3).Figura 3 – Remanescentes florestais da mata atlântica na bacia do rio Santo Antônio. Alinha pontilhada indica a área principal de inserção da bacia. Fonte:http://www.sosmatatlantica.org.br/?secao=atlas (outubro/2005)DrenagensÁrea UrbanaRemanescente florestalNessa bacia existem três usinas hidrelétricas (UHE’s) de médio e grande porteem funcionamento: Salto Grande e Porto Estrela (calha do Santo Antônio) e Dona Rita(rio do Tanque). Além dessas, pelo menos mais doze foram incluídas no inventário daEletrobrás (Eletrobrás, 1999) (Figura 4). Parte desses aproveitamentos já foi estudada e13


os processos de licenciamento encontram-se em tramitação na Fundação Estadual deMeio Ambiente de Minas Gerais (FEAM-MG).44 o 00’42 o 00’v v v18 o 30’v v vEspinhaçov vv v vGuanhãesrioCadeia de montanhasCidadesCursos d’águaUHE’s implantadasUHE’s em estudov vriorioCorrenteGrandev v vPara uninhaConceição doMato Dentrodov vvrioSantoItambério do PeixeS. Sebastião doRio PretoFerrosGuanhãesAntônioBeloOrienterioDoceSenhora daPenhav vParque Nacional daSerra do CipóCadeiav vvvvrioPretoItambé doMato DentroriododoItabiraTanqueAntônio DiasrioPiracicabaIpatingaoDoce0 20km19 o 30’vrioFigura 4 – Mapa de localização da bacia do rio Santo Antônio indicando os prováveiseixos de usinas hidrelétricas conforme apresentado em Eletrobrás (1999As UHE’s de Salto Grande e Porto Estrela foram construídas na calha do SantoAntônio, em um trecho que pode ser considerado como um divisor do rio em porçõesdistintas com relação às suas características fisiográficas. O seu baixo curso, desde aUHE Porto Estrela até a foz no rio Doce, com cerca de 47 km, apresenta menorprofundidade e leito recoberto predominantemente por areia. Essa condição fica aindamais evidente com a operação diária dessas usinas, quando parte do leito fica exposta14


pelo rebaixamento da lâmina d’água. No restante da drenagem, localizado acima dobarramento da UHE Salto Grande, o leito é predominantemente rochoso, apresentandoextensas áreas de corredeiras intercaladas com poções mais profundos. Nesse trecho,existem afluentes que drenam diretamente da cadeia do Espinhaço e possuemcaracterísticas únicas dentro da bacia, apresentando águas de cor escura e pHligeiramente ácido (Galdean et al., 2000) (Figura 5). A coloração da água foi elementopreponderante na toponímia local, tanto no que se refere a nomes de rios como demunicípios. Na bacia do rio Doce, excetuando-se a drenagem do rio Santo Antônio, essacaracterística (águas pretas) somente é observada em um pequeno afluente do rio SantaBárbara, drenagem do rio Piracicaba, e cujas nascentes estão na Serra do Caraça,também na cadeia do Espinhaço.Figura 5 – Visão geral de um trecho do rio Preto do Itambé, que possui águas decoloração escura e leito rochoso.A bacia do rio Santo Antônio ocupa uma área com precipitações totais entre 900e 1500 mm anuais (Figura 6). O período de chuvas se estende de novembro a março,com precipitação total mensal que pode superar 500 mm, enquanto o período secocaracterístico vai de maio a setembro, com meses sem qualquer chuva (Figura 7). Osmeses de abril e outubro podem ser caracterizados como de transição entre esses15


períodos. Conforme pode ser observado, os valores de precipitação total mensal sãosemelhantes, seja na parte baixa, média ou alta da bacia.üFigura 6 – Precipitação total anual em milímetros para as séries históricas entre 1931 e1990. A bacia do rio Santo Antônio está indicada pela seta. Fonte: INMET – InstitutoNacional de Meteorologia, consultado em 2005http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html16


600500Naque4003002001000600500400Precipitação (mm)FerrosConceição do Mato dentro30020010006005004003002001000Jan-1992 Jan-1994 Jan-1996 Jan-1998 Jan-2000 Jan-2002 Jan-2004Jan-1993 Jan-1995 Jan-1997 Jan-1999 Jan-2001 Jan-2003 Jan-2005Mês/AnoFigura 7 – Precipitação total mensal (mm) no período de jan/1992 a out/2005 em trêspostos fluviométricos localizados nos trechos baixo (Naque), médio (Ferros) e alto(Conceição do Mato Dentro) da bacia do rio Santo Antônio. Fonte:http://hidroweb.ana.gov.br/O regime pluviométrico resulta em vazões diárias que podem chegar até 2.658m 3 /s próximo à foz, medidos na estação fluviométrica de Naque Velho. O padrão decheia no rio é similar, tanto nas cabeceiras como junto à foz (Figura 8). As duas UHE’sexistentes na calha do Santo Antônio não exercem regulação de fluxo sazonal, operandocom vazões que alteram somente as descargas diárias.17


454035AMedianaPercentis 25%-75%Mín-Máx30Vazões (m 3 /s)2520151050Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov DezMeses1000800BMedianaPercentis 25%-75%Mín-MáxVazão (m 3 /s)6004002000Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov DezMesesFigura 8 - Vazões médias mensais obtidas para as séries históricas em dois postosfluviométricos localizados na bacia do rio Santo Antônio: (A) Conceição do MatoDentro, cabeceira - jan/1947 a dez/2001 (B) Naque Velho, foz - jan/1975 a dez/2001.Fonte: http://hidroweb.ana.gov.br/A temperatura média anual está entre 21 e 24 ºC, enquanto as máximas chegama 30ºC e as mínimas a 15ºC (Figura 9).18


üüüFigura 9 – Climatogramas referentes às temperaturas, máxima, mínima e média anual.A localização da bacia do rio Santo Antônio está indicada por uma seta. Fonte: INMET– Instituto Nacional de Meteorologia, acesso em 2005http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html19


O rio Santo Antônio, na região da sua foz, apresentou índice de qualidade daságuas (IQA) no nível médio em 2002, 2003 e 2004 (IGAM, 2005). Fatores que maiscontribuíram para estes resultados foram coliformes fecais e a turbidez. Como pode serobservado na Figura 10, existe correlação negativa significativa entre o aumento davazão no período chuvoso e o IQA, condição verificada ao longo dos anos e que estáassociada ao arraste de material para a calha do rio. Contaminação por tóxicos no rioSanto Antônio foi detectada para fenóis, cujos valores estiveram acima do limite legalnas duas campanhas realizadas em 2004 (IGAM, 2005).8580r = - 0,77 p < 0,001Índice de Qualidade de Água (IQA)75706560555045400 50 100 150 200 250 300Vazão (m 3 /s)Figura 10 – Relação entre IQA e as vazões do rio Santo Antônio (estação RD 039) noperíodo de março/1998 a outubro/2004. Fonte: IGAM (2005) com modificações.Referências bibliográficasAllan, J. D. & Flecker, A. S. 1993. Biodiversity conservation in running waters:identifying the major factors that threaten destruction of riverine species andecosystems. BioScience, 43(1): 32-43Castro, R. M. C.; Vari, R. P.; Vieira, F. & Oliveira, C. 2004. Phylogenetic analysis andredescription of the genus Henochilus (Characiformes: Characidae). Copeia, 2004(3): 496–506Cetec, 1983. Diagnóstico Ambiental do Estado de Minas Gerais. Série PublicaçõesTécnicas, 10. 158p.20


Conservation International, 2000a. Planejando paisagens sustentáveis: a MataAtlântica Brasileira. Conservation International & Instituto de Estudos Sócio-Ambientais do Sul da Bahia. 28 p.Conservation International, 2000b. Avaliação de ações prioritárias para a conservaçãoda biodiversidade da Mata Atlântica e Campos Sulinos. Ministério do MeioAmbiente, Brasília, 40 p.Costa, M. R. C.; Hermann, G.; Martins, C. M.; Lins, L. V. & Lamas, I. R. 1998.Biodiversidade em Minas Gerais: um atlas para sua conservação. BeloHorizonte: Fundação Biodiversitas, 94 pg.Curnutt, J.; Lockwood, J.; Luh, H. K.; Nott, P. & Russel, G. 1994. Hotspots and speciesdiversity. Nature, 367: 326-327Drummond, G. M.; Martins, C. S.; Machado, A. B. M.; Sebaio, F. A. & Antonini, Y.2005. Biodiversidade em Minas Gerais: um Atlas para sua conservação. 2ª. Ed.,Belo Horizonte, Fundação Biodiversitas. 222p.Eletrobrás, 1999. Mapa do potencial hidrelétrico brasileiro: usinas acima de 10 MW.Espindola, H. S. 2005. Sertão do rio Doce. EDUSC, Bauru, SP, 485 p.Galdean, N.; Callisto, M. & Barbosa, F. A. R. 2000. Lotic ecosystems of Serra do Cipó,southeast Brazil: water quality and a tentative classification based on the benthicmacroinvertebrate community. Aquatic Ecosystem Health and Management, 3 (4):545-552IGAM, 2005. Relatório de monitoramento das águas superficiais na Bacia do Rio Doceem 2004. Instituto Mineiro de Gestão das Águas, Belo Horizonte, IGAM, 233p.IUCN, 1994. A guide to the convention on biological diversity. Gland, IUCNLandres, P. B.; Verner, J. & Thomas, J. W. 1988. Ecological uses of vertebrate indicatorspecies: a critique. Conservation Biology, 2: 316-328Margules, C. R. & Pressey, R.L. 2000. Systematic conservation planning. Nature, 405:243-253Myers, N. R. 1988. Threatened biotas: hotspots in tropical forests. TheEnvironmentalist, 8: 178-208Myers, N. R. 1990. The biodiversity challenge: expanded hotspots analysis. TheEnvironmentalist, 10: 243-256Myers, N.; Mittermeier, R. A.; Mittermeier, C. G.; Fonseca, G. A. B. & Kent, J. 2000.Biodiversity hotspots for conservation priorities. Science 403: 853-858.21


Pressey, R. L.; Humpries, C. J.; Margules, C. R, Vane-Wright, R. I & Williams, P. H.1993. Beyond opportunisms: key principles for systematic reserve selection.Trends in Ecology & Evolution 8: 124-128Rosa, R. S. & Lima, F. C. T. 2005. Peixes. pp . 65-81 in. Machado, A. B. M.; Martins,C. S. & Drummond, G. M. (eds.) Lista da Fauna brasileira ameaçada deextinção: incluindo as espécies quase ameaçadas e deficientes em dados.Fundação Biodiversitas, Belo Horizonte, 160p.van Jaarsveld, A. S.; Freitag, S.; Chown, S. L.; Muller, C.; Koch, S.; Hull, H.; Bellamy,C.; Krüger, M.; Younga, S. E.; Mansell, M. W. & Scholtz, C. H. 1998.Biodiversity Assessment and Conservation Strategies. Science, 279: 2106-2108Vieira, F. & Alves, C. B. M. 2001. Threatened fishes of the world: Henochiluswheatlandii Garman, 1890 (Characidae). Environmental Biology of Fishes 62 (4):414Vieira, F.; Alves, C. B. M. & Santos, G. B. 2000. Rediscovery and first record ofHenochilus wheatlandii (Teleostei: Characidae) a rare Neotropical fish, in Doceriver basin, southeastern Brazil. Ichthyological Exploration of Freshwaters 11(3):201-206Wahlberg, N.; Moilanen, A. & Hanski, I. 1996. Predicting the occurrence of species infragmented landscapes. Science, 273: 1536-1538Willink, P. W.; Chernoff, B.; Alonso, L. E.; Montambault, R. & Lourival, R. (eds.)2000. A biological assessment of the aquatic ecosystems of the Pantanal, MatoGrosso do Sul, Brasil. RAP Bulletin of Biological Assessment 18. ConservationInternational, Washington, DC22


CAPÍTULO 123


COMUNIDADES DE PEIXES NA DRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO,<strong>BACIA</strong> <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MGRESUMOFoi realizado um inventário sistematizado da ictiofauna na drenagem do rio SantoAntônio, segundo maior afluente do rio Doce, desde suas cabeceiras até a foz, com oobjetivo de determinar suas características de distribuição longitudinal, altitudinal eentre ambientes. Os dados foram obtidos em trabalhos de campo e registros em museus,cobrindo uma série temporal entre os anos de 1989 e 2005. Foram confirmados registrosde 71 espécies, das quais 14 são exóticas. Parcela considerável das espécies apresentoualgum grau de endemismo ou estão ameaçadas de extinção. Predominaram espéciesnativas de pequeno porte (< 20 cm), enquanto as exóticas atingem em sua maioriatamanhos superiores a 30 cm. A diversidade de espécies apresentou diferençassignificativas entre seções da drenagem, com maiores valores a montante da UHE SaltoGrande, área que também mantém a maior riqueza de espécies nativas e menor númerode exóticas. A altitude, a área da drenagem e o tipo de curso d’água influenciaramdiretamente a riqueza e distribuição das espécies. Entretanto, o isolamento pelabarragem da UHE Salto Grande do trecho médio-alto do rio Santo Antônio, parece tersido o elemento fundamental para os resultados obtidos. A qualidade da água indicoumudanças sazonais e entre áreas, podendo em algumas drenagens influenciar aocorrência de espécies. A bacia do rio Santo Antônio é a que abriga a maior riqueza deespécies nativas por unidade de área dentro da bacia do rio Doce, confirmando suaindicação como de extrema importância para conservação da diversidade de peixes doleste brasileiro. Projetos de aproveitamento hidrelétricos propostos para a bacianecessitam serem avaliados em um contexto mais amplo que a realidade local, poisimplicam na perda de qualidade ambiental e impossibilidade de manter a ictiofaunaregistrada atualmente.INTRODUÇÃOInformações sobre a distribuição e requerimentos de hábitats das espécies oucomunidades de peixes são necessárias para conservação, determinação do potencialpara restauração da biodiversidade e previsão dos efeitos do manejo de ambientesaquáticos e terrestres em determinada drenagem (Jowett & Richardson, 2003).24


afluente do rio Doce e que abriga diversas espécies endêmicas, ameaçadas de extinção(Vieira et al., 2000; Vieira & Alves, 2001; Castro et al., 2004, Rosa & Lima, 2005),além de possuir elevada riqueza ictiofaunística. Embora essa bacia atenda a diferentesrequisitos para ser indicada como uma área prioritária para conservação, diversosaspectos da sua ictiofauna ainda carecem de avaliação. Entre esses, está o conhecimentoainda incompleto da distribuição das espécies na drenagem e a taxonomia em nívelespecífico, que segundo discussão apresentada em Vari & Weitzman (1990) e Vari &Malabarba (1998), representam limitações importantes para os estudos de biogeografiahistórica com peixes neotropicais.O objetivo desse estudo foi realizar um inventário sistematizado dascomunidades de peixes que ocorrem na drenagem do rio Santo Antônio, desde suascabeceiras até a foz, para determinar suas características de distribuição longitudinal,altitudinal e entre ambientes. Adicionalmente, os resultados obtidos permitirãoestabelecer uma base de dados que no futuro poderá ser usada para avaliar mudançasnas comunidades de peixes induzidas por ações antrópicas dentro da drenagem,notadamente aquelas relacionadas aos barramentos.METO<strong>DO</strong>LOGIAÁrea de estudoO rio Santo Antônio nasce nas proximidades da Serra Tromba D’Anta, nomunicípio de Conceição do Mato Dentro. Tem como principais formadores os rios doPeixe, Preto do Itambé, Guanhães e Tanque e uma área total de drenagem de 10.390km 2 (Figura 1) (Cetec, 1983). Representa 12,6% da drenagem do rio Doce, sendo seusegundo maior afluente (HIDROTEC – http://www.ufv.br/dea/hidrotec - outubro 2005).Toda a bacia encontra-se inserida no bioma Mata Atlântica, formação florestalque se encontra reduzida para menos de 8% de sua área original (ConservationInternational, 2000a). Atualmente, os maiores remanescentes florestais existentes nadrenagem encontram-se nas cabeceiras, principalmente em áreas elevadas na vertente dacadeia do Espinhaço (SOS Mata Atlântica -http://www.sosmatatlantica.org.br/?secao=atlas - outubro/2005). Afluentes que drenamessa região possuem características únicas dentro da bacia, com águas de cor escura epH ligeiramente ácido (Galdean et al., 2000). Na bacia do rio Doce, ambiente similarocorre somente na drenagem do rio Piracicaba, em um pequeno afluente do rio SantaBárbara, cujas nascentes também se encontram na cadeia do Espinhaço.26


42 o 00’v v vPontos de coleta18 o 30’Espinhaçov vv v vGuanhãesriov v vCadeia de montanhasCidadesCursos d’águaUHE’s implantadasv vCorrentev v vrioPara uninhaConceição doMato DentrorioGrandedov vvriorio do PeixeSantoItambéS. Sebastião doRio PretoFerrosGuanhãesAntônioBeloOrienterioDoceSenhora daPenhav v44 o 00’Parque Nacional daSerra do CipóCadeiav vvvvrioPretoItambé doMato DentroriododoTanqueItabiraAntônio DiasrioPiracicabaIpatingaDoce0 20km19 o 30’vrioFigura 1 – Parte dos pontos de amostragem da ictiofauna na drenagem do rio SantoAntônio, bacia do rio Doce, MG.O rio Santo Antônio pode ser dividido em duas seções com característicasfisiográficas distintas: o baixo curso, da foz até cerca de 47 km acima, apresenta menorprofundidade e declividade, além de leito recoberto predominantemente por areia. Norestante da drenagem o leito é principalmente rochoso, com extensas áreas decorredeiras intercaladas com poções mais profundos. Dividindo essas seções do rioencontram-se as duas maiores usinas hidrelétricas da bacia, Salto Grande e PortoEstrela, cujo funcionamento foi iniciado em 1956 e 2001, respectivamente.As precipitações totais variam entre 900 e 1500 mm anuais (INMET – InstitutoNacional de Meteorologia, ( INMET -http://www.inmet.gov.br/climatologia/combo_climatologia_C.html consultado em2005). O período de chuvas se estende de novembro a março, com precipitação totalmensal que pode superar 500 mm, enquanto o período seco característico vai de maio asetembro. Os meses de abril e outubro podem ser caracterizados como de transição entreesses períodos (Hidroweb, http://hidroweb.ana.gov.br/ consultado em 2005)27


Segundo a classificação de Köppen e de acordo com a distribuição regional declimas em Minas Gerais (Antunes, 1986), na maior parte da bacia do rio Santo Antôniopredomina o clima Cwa, definido como temperado chuvoso (mesotérmico), cominverno seco e verão chuvoso.Segundo IGAM (2005), o rio Santo Antônio a montante da confluência com orio Doce (estação RD 039), apresentou índice de qualidade das águas (IQA) no nívelmédio nos anos de 2002 a 2004. Coliformes fecais e a turbidez foram os fatores quemais contribuíram para o decréscimo dos valores de IQA, o qual apresenta correlaçãonegativa com o aumento da vazão. Deve-se destacar que esses resultados se referemsomente uma estação de amostragem localizada próximo à foz, sendo que o restante dadrenagem pode apresentar condição diferenciada.Amostragem da ictiofaunaA área de estudo compreendeu toda a drenagem do rio Santo Antônio, desde suafoz até os afluentes localizados nas áreas mais elevadas próximo às nascentes (Figura1). No total foram feitos registros da ictiofauna em 61 pontos, sendo 27 localizados emcórregos e 34 na calha tanto do Santo Antônio e de seus maiores afluentes. Os dadosforam obtidos em amostragens distribuídas em períodos distintos ao longo dos anos de1991-1996, 1999 e 2000-2005, sendo que a intensificação dos estudos foi conduzidaentre 2002 e 2005.Adicionalmente às amostragens em campo conduzidas especificamente para esseestudo, foram levantados todos os registros disponíveis de peixes coletados na bacia dorio Santo Antônio e que possuem exemplares testemunhos depositados em museus quemantêm suas coleções disponíveis para consulta através da rede mundial decomputadores (Internet): Museu Nacional (MNRJ), Museu de Zoologia da Universidadede São Paulo (MZUSP) e Museu de Ciências e Tecnologia da Pontifícia UniversidadeCatólica do Rio Grande do Sul (MCP). Os dados foram obtidos através de consultas aoProjeto NEODAT III (http://www.mnrj.ufrj.br/search1c.htm) e ao Centro de Referênciaem Informação Ambiental, CRIA(http://splink.cria.org.br/simple_search?criaLANG=pt).Coletas quantitativas na calha dos rios foram realizadas com redes de emalharcom tamanhos de malha de 24, 30, 40, 50, 60, 70, 80, 100 e 120 mm (medidos entre nósopostos). As redes sempre foram armadas à tarde e retiradas na manhã do dia seguinte,permanecendo na água por aproximadamente 12 horas. Nos córregos e ribeirões as28


Tabela I – Características das estações onde foram realizadas amostragens paraparâmetros físicos, químicos e biológicos na bacia do rio Santo Antônio.Nome original da estação Dom Joaquim Fazenda Barraca Senhora doPortoConceição doMato DentroFerrosNaque VelhoCódigo adotado nesseestudoPeixe Tanque Guanhães Sto. Antônio 1 Sto. Antônio 2 Sto. Antônio 3Rio do Peixe do Tanque Guanhães Santo Antônio Santo Antônio Santo AntônioMunicípio Dom Joaquim Ferros Senhora doPortoConceição doMato DentroFerrosAçucenaResponsável/Operadora ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRM ANA/CPRMAltitude (m) 648 482 581 501 477 240Área de Drenagem (km 2 ) 972 1280 1521 301 4058 10170Fonte: Sistema de Informações Hidrológicas (Hidroweb) em http://hidroweb.ana.gov.br/Para efeito comparativo com os dados referentes a ictiofauna, também foramregistradas as características de cada ponto de amostragem no que se refere a tipo decurso d’água (córrego/ribeirão ou rio 1 ), altitude (m) obtida através de GPS e confirmadaem cartas topográficas do IBGE na escala 1:50.000 e coloração da água.Análise dos dadosComo indicador de riqueza foi utilizado o número total de espécies registradoem cada ponto de amostragem.O comprimento total máximo das espécies foi obtido em Reis et al. (2003) eFroese & Pauly (2005), e quando não disponível foi utilizado dos exemplaresregistrados durante os trabalhos. Dados foram expressos com base na distribuição defreqüência de espécies por classes de tamanho considerando-se exóticas e nativasseparadamente.Para cálculo da diversidade de espécies foi utilizado o índice de Shannon,SH' =− ∑ ( pi)*(log n pi), onde: S = número total de espécies na amostra; i = espécie 1,i=12 ... na amostra; pi = proporção de indivíduos da espécie i na amostra (Magurram,1988). Para essa análise, foram utilizados somente os dados de capturas com redes deemalhar, padronizados através das capturas por unidade de esforço (CPUE), utilizando aequaçãoCPUEi =12∑m=2,4( Ni / EPm) *100 , onde: CPUE = captura em número por unidade1 As denominações para córrego/ribeirão e rio foram tomadas nas cartas topográficas editadas pelo IBGE.No primeiro caso se referem de forma geral a cursos d’água que não ultrapassam 5 metros de largura epequena profundidade, enquanto ambientes maiores são reconhecidos como rios.30


de esforço para a espécie i; N = número total de exemplares da espécie i capturados namalha m; Epm = esforço de pesca, que representa a área em m 2 das redes de malha m;m = tamanho da malha (2,4 a 12 cm). Esse procedimento foi necessário parapadronização dos dados, visto que o esforço de pesca foi diferente entre pontos decoleta.As diferenças nos valores de H’ entre áreas foram verificadas através de testesnão paramétricos (Kruskall-Wallis e Mann–Whitney), visto que os dados não atendiamaos requisitos de distribuição normal e homogeneidade das variâncias(homocedasticidade) para emprego de análises paramétricas (Zar, 1999).A contaminação da drenagem por espécies exóticas foi determinada conformeproposto em Alves et al. (no prelo), cujos resultados variam de 0 em comunidades semespécies exóticas até 1, onde somente existem espécies exóticas. A razão é expressa porIC = E/N+E onde: IC = índice de contaminação, E = número de espécies exóticas, N =número de espécies nativas.Esse mesmo procedimento foi utilizado com modificações (nesse casosubstituindo espécies exóticas por endêmicas/raras/ameaçadas) para determinar a razãoentre espécies endêmicas/raras/ameaçadas e a riqueza total de espécies nativas em cadaum dos pontos de amostragem.Para verificação da similaridade na composição em espécies entre áreas foiutilizada a análise de agrupamento (cluster) pelo método de ligação completa(Anderberg, 1973), com base em uma matriz de presença/ausência das espécies em cadauma das drenagens consideradas. Como coeficiente de similaridade (medida dedistância), foi utilizado a Distância Euclidiana. Deve-se destacar que esse procedimentoanalisa somente a composição de espécies entre as áreas, pois é dado peso igual paratodas as espécies, independente da abundância de cada uma.O coeficiente de correlação de Pearson foi usado para expressar as relações entreos dados das comunidades de peixes, altitudes e área da bacia, as quais demonstram emparte a distribuição das espécies no eixo longitudinal e altitudinal dentro das drenagens.Todas análises foram conduzidas utilizando o pacote STATISTICA versão 6adotando o nível de significância estatística de 0,05.31


RESULTA<strong>DO</strong>SAo longo do período de estudos foram obtidos registros de 9.912 exemplares,sendo 7.355 oriundos das capturas realizadas e 2.557 referentes a registros em museus.Esses exemplares se distribuíram por 71 espécies, 19 famílias e cinco ordens (TabelaII). Dessas espécies, pouco mais de 50% são comuns a outras drenagens do lestebrasileiro e 20% são exóticas, enquanto um percentual que varia entre 1,5 e 8,5%apresentou algum grau de endemismo ou estão ameaçadas de extinção (Tabela II eFigura 2). Pouco mais de 18% das espécies permaneceram com determinação em nívelde gênero ou categoria superior e não puderam ser incluídas nas categorias definidas.Figura 2 – Percentual de espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônioentre 1989 e 2005, distribuídas por diferentes categorias.As curvas cumulativas de espécies demonstram que houve um incrementoconstante no número de espécies registradas ao longo dos anos de amostragem e que onúmero total de espécies que ocorre na drenagem pode ainda não ter sido estabelecido(Figura 3). Entretanto, o processo de adição de espécies nos últimos anos é maisevidente para as exóticas, cujo aumento é marcante após 2002, quando as amostragensforam intensificadas e passaram a cobrir a parte baixa da bacia, principalmente a jusanteda barragem da UHE de Salto Grande.32


Figura 3 – Curvas cumulativas de espécies (nativas, exóticas e o total) registradas nabacia do rio Santo Antônio entre 1989-2005.Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1)comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somenteno Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmicado Santo Antônio e (7) sem dadosOrdem Família Espécie Autor / ano CategoriasCharaciformes Anostomidae Leporinus conirostris Steindachner 1875 1Leporinus copelandii Steindachner 1875 1Leporinus macrocephalus Garavello & Britski 1988 2Leporinus mormyrops Steindachner 1875 1Leporinus thayeri Borodin 1929 1, 3, 4Characidae Astyanax bimaculatus (Linnaeus 1758) 1Astyanax fasciatus (Cuvier 1819) 1Astyanax scabripinnis (Jenyns 1842) 1Astyanax sp. - 7Astyanax taeniatus (Jenyns 1842) 1Brycon devillei (Castelnau 1855) 1, 4Brycon opalinus (Cuvier 1819) 1, 4Deuterodon pedri Eigenmann 1908 5Hasemania sp. - 7Henochilus wheatlandii Garman, 1890 4, 6Knodus sp. - 7Moenkhausia doceanus (Steindachner 1877) 1Oligosarcus argenteus Guenter 1864 1Continua...33


Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1)comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somenteno Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmicado Santo Antônio e (7) sem dados.continuação....Ordem Família Espécie Autor / ano CategoriasCharacidae Piaractus mesopotamicus (Holmberg 1887) 2Pygocentrus nattereri Kner 1858 2Salminus brasiliensis (Cuvier 1816) 2Serrapinnus cf. heterodon (Eigenmann 1915) 1Characidae gen e sp. nova - 3Crenuchidae Characidium cf. timbuiensis Travassos 1946 1Curimatidae Cyphocharax gilbert (Quoy & Gaimard 1824) 1Erythrinidae Hoplias lacerdae Ribeiro 1908 1Hoplias malabaricus (Bloch 1794) 1Prochilodontidae Prochilodus costatus (Cuvier & Valenciennes 1849) 2Prochilodus vimboides Kner 1859 1Cyprinodontiformes Poeciliidae Poecilia reticulata Peters 1859 2Poecilia vivipara Bloch & Schneider 1801 1Phalloceros caudimaculatus (Hensel 1868). 1Gymnotiformes Gymnotidae Gymnotus carapo Linnaeus 1758 1Sternopygidae Sternopygus cf. macrurus (Bloch & Schneider 1801) 1, 3Perciformes Cichlidae Cichlasoma facetum (Jenyns 1842) 1Geophagus brasiliensis (Quoy & Gaimard 1824) 1Oreochromis niloticus (Linnaeus 1758) 2Tilapia rendalli (Boulenger 1897) 2Sciaenidae Pachyurus adspersus (Steindachner 1878) 1Siluriformes Auchenipteridae Glanidium cf. melanopterum Miranda-Ribeiro 1918 1Pseudauchenipterus affinis (Steindachner 1877) 1Trachelyopterus striatulus (Steindachner 1876) 1Callichthyidae Callichthys callichthys Linnaeus 1758) 1Hoplosternum littoralle (Hancock 1828) 2Clariidae Clarias gariepinnus (Burchell 1822) 2Heptapteridae Imparfinis sp. - 7Pimelodella sp. - 7Rhamdia quelen (Quoy & Gaimard 1824) 1Loricariidae Delturus carinotus (LaMonte 1933) 5Harttia sp. - 7Hemipsillichthys sp. A - 7Hemipsillichthys sp. B - 7Hemipsillichthys sp. C - 3Hypostominae gên. e sp. novos - 7Hypostomus affinis (Steindachner 1875) 1Continua...34


Tabela II - Espécies de peixes registradas na bacia do rio Santo Antônio no período de1989-2005, com suas respectivas categorias relacionadas à distribuição geográfica: (1)comuns a outras bacias do leste brasileiro; (2) exóticas; (3) no rio Doce ocorre somenteno Santo Antônio; (4) ameaçadas de extinção; (5) endêmica do rio Doce; (6) endêmicado Santo Antônio e (7) sem dados.continuação....Ordem Família Espécie Autor / ano CategoriasLoricariidae Hypostomus luetkeni (Steindachner 1877) 1Loricariichthys castaneus (Castelnau 1855) 1Neoplecostomus sp. - 7Parotocinclus sp. - 7Pogonopoma wertheimeri (Steindachner 1867) 2Rineloricaria sp. - 7Pimelodidae Lophiosilurus alexandri (Steindachner 1876) 2Pimelodus maculatus Lacepède 1803 2Pseudoplatystoma sp. - 2Steindachneridion doceanum (Eigenmann & Eigenmann 1889) 4,5Pseudopimelodidae Microglanis sp. - 3Trichomycteridae Trichomycterus cf. alternatus (Eigenmann 1917) 1Trichomycterus cf. brasiliensis Lütken 1874 1Trichomycterus cf. immaculatus (Eigenmann & Eigenmann 1889) 1Trichomycterus sp. A - 3Trichomycterus sp. B - 7A ordenação das espécies mais abundantes é diferenciada entre as áreas dejusante e montante da barragem de Salto Grande (Figura 4). Entretanto, nessas duasregiões predominaram characiformes de pequeno porte (


Figura 4 - Curva espécie-abundância em relação ao número total de indivíduos (%)registrados na drenagem do rio Santo Antônio a montante (A) e jusante (B) da UHESalto Grande.Os valores de diversidade de espécies, representados pelo índice de Shannon,demonstraram diferença significativa entre as subdrenagens amostradas (Kruskal-Wallis- Diversidade - H': (5,31) = 17,7, p < 0,05) (Figura 5). O rio do Peixe e a calha do rioSanto Antônio a montante da barragem de Salto Grande se destacaram como os pontoscom maiores valores médios, enquanto os rios Guanhães e do Tanque registraram osmenores valores de diversidade. No rio Preto do Itambé e Santo Antônio jusante osvalores foram intermediários.36


3,02,8Média± Desvio padrãoMín-Máxa2,62,4b, ca, bDiversidade (H')2,22,01,81,6ccb, c1,41,21,00,8Preto do ItambéPeixeGuanhãesRiosSto. Antônio (montante)Tanque Sto. Antônio (jusante)Figura 5 – Índice de diversidade de Shannon (H’) nos afluentes e na calha do rio SantoAntônio, sendo que este último foi individualizado nos trechos de montante e jusante dabarragem da UHE Salto Grande. Letras diferentes indicam diferenças significativas(p < 0,05) entre os pares.Na bacia estão representadas espécies nativas com comprimentos totais quandoadultas que variam de 5 cm (ex.: Poecilia vivipara e Phalloceros caudimaculatus) a 1metro (Steindachneridion doceanum), com maiores freqüências nas classes até 20 cm(Figura 6). Para as espécies exóticas esse padrão é diferente, pois praticamente todas asespécies quando adultas possuem comprimentos superiores a 25 cm. A única exceção érepresentada pelo barrigudinho (Poecilia reticulata), que se encontra disseminado portoda a drenagem, tanto nos rios como nos córregos.37


2016n = 57Anativas128Número de espéciesexóticas402016128n = 14B40< 10 20 30 40 50 > 50Classes de comprimento total máximo (cm)Figura 6 – Distribuição de freqüência por classes de comprimento total máximoalcançado pelas espécies nativas (A) e exóticas (B) registradas na bacia do rio SantoAntônio.Observa-se que o trecho localizado a montante da barragem da UHE SaltoGrande, que representa aproximadamente 83% da bacia do rio Santo Antônio, abrigamais de 80% das espécies nativas e ameaçadas/endêmicas. Para as espécies exóticasesse padrão é inverso, com somente cerca de 28% delas ocorrendo nesse trecho do rio(Figura 7).As espécies endêmicas/ameaçadas registradas exclusivamente a jusante dabarragem são a piabanha (Brycon devillei) e um pequeno bagre (Microglanis sp.), queestão restritos a calha do Santo Antônio e ao ribeirão Pitangas, respectivamente. Aocorrência do andirá (Henochilus wheatlandii) nesse trecho do rio foi consideradaacidental e relacionada às cheias, quando alguns exemplares passam para jusante dobarramento através do vertedouro, área onde não existem populações estabelecidas.A jusante da UHE Salto Grande foram registradas todas as 14 espécies exóticasconfirmadas para a bacia, entre as quais estão o dourado (Salminus brasiliensis), opacumã (Lophiosilurus alexandri), a piranha (Pygocentrus nattereri), o bagre-africano38


(Clarias gariepinus) e o surubim-ponto-e-vírgula ou cachara (Pseudoplatystomacorruscan X P. fasciatum), que são piscívoros de médio a grande porte. Entre asespécies exóticas registradas a montante, somente o bagre-africano e o cacharaencontram-se na categoria de grandes piscívoros.Ameaçadas/Endêmicas100806040200n = 12% de espéciesExóticasNativas100n = 14806040200100n = 578060402000 20 40 60 80 100.montantejusanteÁrea da drenagem (%)Figura 7 – Percentual de espécies nativas, exóticas e ameaçadas/endêmicas em funçãoda área total de drenagem do rio Santo Antônio e em relação ao trecho de jusante emontante da UHE Salto Grande.A riqueza de espécies nativas foi fortemente influenciada pela altitude, uma vezque apresentou correlação negativa significativa tanto nos ambientes amostrados nascalhas dos rios (r = - 0,59; p = 0,0003; n = 33) (Figura 8A), como nos córregos(r = - 0,53; p = 0,0056; n = 26) (Figura 8B).39


3530Ar = - 0,5901 p < 0,00125Riqueza de espécies20151050100 200 300 400 500 600 700Altitude (m)181614Br = - 0,527 p < 0,01Riqueza de espécies121086420200 300 400 500 600 700 800Altitude (m)Figura 8 – Relação entre altitude e riqueza de espécies para os ambientes amostrados nabacia do rio Santo Antônio: rios (A) e córregos (B)A distribuição de espécies exóticas foi expressa pelo índice de contaminação(IC), que mostrou correlação negativa significativa em relação à altitude para a calhados rios (r = -0,69, p < 0,001; n = 27). (Figura 9A). Porém essa condição não foiregistrada nos córregos (r = 0,09, p = 0,64; n = 27) (Figura 9B), onde foram registradassomente duas espécies (Poecilia reticulata e Tilapia rendalli).40


0,30AÍndice de contaminação por exóticos (IC)0,250,200,150,100,050,00r = -,695 p < 0,001-0,05100 200 300 400 500 600 700Altitude (m)Índice de contaminação por exóticos (IC)0,350,300,250,200,150,100,050,00Br = ,093 p > 0,05-0,05200 300 400 500 600 700 800Altitude (m)Figura 9 – Relação entre altitude e o índice de contaminação por espécies exóticas (IC)para rios (A) e córregos (B) na bacia do rio Santo Antônio.A razão entre espécies endêmicas/ameaçadas em relação à riqueza total denativas não mostrou correlação significativa com a altitude (r = 0,15; p = 0,42; n = 28)(Figura 10). Entretanto, proporções de espécies endêmicas/ameaçadas superiores a 15%da comunidade foram encontradas somente em pontos localizados em altitudessuperiores a 450 m, como o curso médio do rio Santo Antônio e o baixo de grandesafluentes, como o rio do Peixe e Preto do Itambé. Estas regiões estão todas localizadasacima do barramento da UHE Salto Grande.41


0,300,25r = ,148 p > 0,050,20Razão0,150,100,050,00-0,05100 200 300 400 500 600 700Altitude (m)Figura 10 – Relação entre a razão de espécies endêmicas-ameaçadas/nativas e a altitudeem ambientes localizados na calha dos rios amostrados na bacia do rio Santo Antônio.A análise de similaridade indicou que a bacia do rio Santo Antônio abrigaassembléias de peixes distintas, as quais se distribuem de forma diferenciada nosambientes (córregos – rios – reservatórios) e ao longo do eixo longitudinal da calhaprincipal (Figura 11). Quatro agrupamentos foram evidenciados: 1) todos os córregoslocalizados a montante da barragem da UHE Salto Grande mais os rios Guanhães eTanque; 2) O rio Santo Antônio a jusante desse barramento; 3) O reservatório de SaltoGrande, no braço alagado do rio Guanhães e 4) Os rios Santo Antônio, Preto do Itambée Peixe, mais os córregos que drenam diretamente para o Santo Antônio na parte baixada bacia.42


Sto. Antônio-cór-jus .Peixe-rio-mont .Preto Itambé-rio-mont .Sto. Antônio-rio-mont .Guanhães-reservatório-mont .Guanhães-cór-mont .Sto. Antônio-cór-mont .Peixe-cór-mont .Preto Itambé-cór-mont .Tanque-cór-mont .Tanque-rio-mont .Guanhães-rio-mont .Sto. Antônio-rio-jus .2 3 4 5 6 7 8Distância EuclidianaFigura 11 – Dendrograma obtido através da análise de cluster baseada nos dados depresença-ausência das espécies entre ambientes (rios – córregos - reservatório) nosafluentes e na calha do rio Santo Antônio, sendo que este último foi individualizado nostrechos de montante e jusante da barragem da UHE Salto Grande.Dados físicos, químicos e biológicos referentes à qualidade da água na baciaindicaram alterações marcantes entre os períodos de chuva e seca nos rios analisados(Figura 12). Assim, temperatura da água, sólidos totais em suspensão, turbidez,coliformes totais e fecais aumentaram com as chuvas, enquanto o pH e teores deoxigênio dissolvido diminuiram. Dados de condutividade atingiram valores máximosem todos os pontos sempre no período de seca, fato também registrado quando seconsideram os percentis 75%, exceto para os rios Guanhães e Peixe.Em relação aos rios, são marcantes as diferenças na calha do rio SantoAntônio, representado por três pontos de amostragem no sentido longitudinal, ondetodos os parâmetros avaliados tiveram seus valores aumentados no sentido da nascentepara a foz, padrão que se repete independente do período do ano. Nas demais drenagens,rios do Peixe, Tanque e Guanhães, as alterações mais importantes foram para coliformestotais e fecais, que apresentaram valores mais elevados nos dois últimos e semprerelacionados ao período de chuvas (Figura 12).43


3210,530A10,0B289,5269,0o C2422201816mg/l8,58,07,57,0146,5126,0GuanhãesTanqueSto. Antônio 2GuanhãesTanqueSto. Antônio 2PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3Estações de coleta de dados (rios)Estações de coleta de dados (rios)8,07,87,6C400350D7,43007,27,0250pH6,8mg/l2006,66,41506,21006,05,8505,60GuanhãesPeixeTanqueSto. Antônio 2Sto. Antônio 1Sto. Antônio 3GuanhãesPeixeTanqueSto. Antônio 2Sto. Antônio 1Sto. Antônio 3Estações de coleta de dados (rios)Estações de coleta de dados (rios)120100105E90F8090707560NTU60µS/cm504540303020151000GuanhãesTanqueSto. Antônio 2GuanhãesTanqueSto. Antônio 2PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3Estações de coleta de dados (rios)Estações de coleta de dados (rios)900003500080000G30000H700002500060000NMP/100 ml5000040000NMP/100 ml200001500030000100002000010000500000GuanhãesTanqueSto. Antônio 2GuanhãesTanqueSto. Antônio 2PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3PeixeSto. Antônio 1Sto. Antônio 3Estações de coleta de dados (rios)Estações de coleta de dados (rios)Figura 12 - Parâmetros físicos, químicos e biológicos referentes à qualidade de água na baciado rio Santo Antônio (1993-2005). (A) temperatura da água, (B) oxigênio dissolvido, (C) pH,(D) sólidos totais em suspensão, (E) turbidez, (F) condutividade, (G) coliformes totais e (H)coliformes fecais. Barras transparentes (período chuvoso) e hachuradas (período seco)44


DISCUSSÃOA drenagem do rio Santo Antônio, embora represente menos de 13% de todaa área da bacia do rio Doce, abriga parte expressiva da fauna de peixes nativos, vistoque mais de 89% (57 sp.) das espécies registradas para o rio Doce em Minas Gerais(Drummond et al., 2005) estão aí representadas. Essa situação contrasta com outros riosafluentes do rio Doce que possuem inventários sistematizados da ictiofauna. Um desses,o rio Piracicaba (6,7% da bacia do rio Doce), que drena áreas altamente populosas eindustrializadas abriga somente 25 espécies de peixes entre nativas e exóticas (Barbosaet al., 1997, Vieira et al., 2000; obs. pes.). Mesmo sistemas localizados nas áreas maispreservadas da bacia do rio Doce e estudados ao longo de vários anos, como os lagosexistentes dentro do Parque Estadual do Rio Doce e entorno (Sunaga & Verani, 1991;Vieira, 1994; Godinho, 1996; Vono & Barbosa, 2001; Latini & Petrere-Jr., 2004;Espíndola et al., 2005), não abrigam em seu conjunto mais que 38% da ictiofauna nativaregistrada na bacia dentro do estado de Minas Gerais.Apesar do número de espécies não depender exclusivamente da área de umabacia, relações do tipo espécie/área foram demonstradas para diversos grupos (Ricklefs,1996), representando um parâmetro útil para estabelecer indicativo inicial do número deespécies passíveis de ocorrer em uma determinada área e para se identificar regiõesonde o esforço de coleta empregado não tenha sido adequado. Embora baseado em umbanco de dados hoje desatualizado, é possível avaliar quão expressiva é a riqueza deespécies de peixes nativos na drenagem do rio Santo Antônio através da fórmulaproposta por Welcomme (1985), para rios sul-americanos {N = 0.169 x A 0,552 , onde: N= número de espécies esperado para a bacia; A = área da bacia em km 2 }. O resultadoobtido com o emprego dessa equação indica um total esperado de 28 espécies de peixespara o rio Santo Antônio (10.390 km 2 ), enquanto os dados demonstraram valor maiorque o dobro (57 sp.).Embora em uma bacia com este tamanho o inventário não possa ser dado porencerrado com esse estudo, os dados expressos através da curva do coletordemonstraram tendência à estabilização para o número de espécies nativas a partir doano de 2003, confirmando um esforço amostral compatível para a drenagem. Oincremento observado nos últimos três anos de amostragem se refere quase queexclusivamente aos registros de espécies exóticas, em sua maioria ocorrendo à jusantedo barramento da UHE Salto Grande.45


Outro fato que deve ser considerado é que em toda a bacia do rio Doce, somenteno rio Santo Antônio existem registros atuais do timburé (Leporinus thayeri), do sarapó(Sternopygus cf. macrurus), de um pequeno bagre (Microglanis sp.) e de um lambari,cujo gênero e espécie ainda não foram descritos. Adicionalmente, abriga a maiorpopulação conhecida da pirapitinga (Brycon opalinus) e do andirá (Henochiluswheatlandii), ambos ameaçados de extinção (Rosa & Lima, 2005), sendo o últimoendêmico dessa bacia e ocorrendo exclusivamente no trecho localizado a montante dabarragem da UHE Salto Grande (Vieira et al., 2000, Vieira & Alves, 2001; Castro et al.,2004). Assim, independente dos novos registros de espécies que possam ocorrer, osresultados obtidos corroboram a indicação de que parte dessa drenagem apresentaelevada importância para conservação da diversidade de peixes do leste brasileiro(Conservation International, 2000b; Drummond et al., 2005).Não foi encontrada uma explicação a priori para o número relativamenteelevado de espécies endêmicas ou com registros exclusivos no rio Santo Antônio (H.wheatlandii, L. thayeri, S. cf. macrurus, Microglanis sp. entre outras), condição que atéo presente não é aplicável a outras áreas estudadas na bacia do rio Doce e que pode seruma característica intrínseca da drenagem. Entretanto, a presença de parcelasignificativa dessas espécies somente a montante da UHE Salto Grande foi um doselementos determinantes para os resultados obtidos, apesar de novos estudos seremnecessários em outras drenagens do rio Doce para corroborar os resultados aquiencontrados.A ictiofauna nativa do rio Santo Antônio foi representada predominantementepor espécies de porte pequeno, ou seja, mais de 60% não alcançam tamanhos superioresa 20 cm quando adultas. Entre essas, se destacam vários lambaris do gênero Astyanax,que estão entre as espécies numericamente mais abundantes nas comunidadesamostradas ao longo da drenagem. O predomínio da ictiofauna de pequeno porte é umacaracterística que pode ser estendida para a bacia do rio Doce e também é compartilhadacom outros rios do leste brasileiro, como o Mucuri (Pompeu, 2005), Paraíba do Sul(Bizerril, 1994; Bizerril & Primo, 2001), Jequitinhonha (Godinho et al., 1999; Bizerril& Lima, 2005) e Ribeira do Iguape (Oyakawa et al., 2006). Esse padrão só é alteradoem trechos dessas bacias mais próximos ao mar devido à ocorrência de peixesdiádromos de maior porte, como os robalos (Centropomus spp.), o tarpão (Megalopsatlanticus), os xaréus (Caranx spp.), entre outros.46


Nas bacias do leste brasileiro, a predominância marcante de espécies demenor porte pode ter contribuído para inúmeras introduções de peixes exóticos ao longodos anos. Essa condição possui relação com os órgãos responsáveis pelo fomento dapesca (e.g., antiga SUDEPE – Superintendência de Desenvolvimento da Pesca), queadotaram a premissa básica do aumento da produtividade pesqueira, obtida geralmentecom liberação de espécies que alcançam grande porte e proporcionam maioresrendimentos com as capturas (Welcomme, 1988; Alves et al., no prelo).Adicionalmente, a degradação ambiental dessas drenagens associada ao declínio dasespécies nativas exploradas na pesca artesanal também foram fatores que culminarampara a situação presente (Alves et al., no prelo; obs. pes.). Como resultado, naatualidade as espécies exóticas registradas no rio Santo Antônio são todas de tamanhossuperiores a 20 cm, exceção feita ao barrigudinho (Poecilia reticulata). Entre asespécies de grande porte estão o bagre-africano (Clarias gariepinnus) e o cachara(Pseudoplatystoma sp.), que atingem tamanhos máximos superiores à maior espécienativa do rio Doce, o surubim (Stendachneridion doceanum).A substituição gradual e contínua da biota nativa por espécies cosmopolitas eexóticas é um processo global, usualmente como um resultado de introduções porhumanos, que diminui a distinção da fauna e flora entre regiões e apresentaconseqüências genéticas, taxonômicas e funcionais nos sistemas onde se processa(Olden et al., 2004). Na literatura é tratado como homogeneização biótica (McKinney &Lockwood, 1999; Rahel, 2002; Olden et al., 2005), constituindo um processo emexpansão e ligado diretamente ao domínio humano sobre praticamente todos osecossistemas (Vitousek et al., 1997). Segundo Angermeier (1994), a diversidade podeser ampliada artificialmente em qualquer nível organizacional, incluindo o genoma(pela transferência de genes), comunidades (por espécies exóticas) e paisagens (porfragmentação). Entretanto, mesmo quando se verifica que a biodiversidade foi ampliadapor introduções de espécies, esse aumento freqüentemente inclui taxa que já sãoamplamente difundidos, tolerantes a hábitats degradados e em alguns casosrepresentando pragas (Angermeier, 1994, Pimentel et al., 2000; Scott & Helfman,2001).Na bacia do rio Doce, o longo processo de introdução de espécies exóticasculminou com alterações substanciais nas comunidades de peixes ao longo de váriasdrenagens formadoras, resultando em poucas oportunidades de selecionar áreas paraconservação e manutenção da ictiofauna nativa (Marques & Barbosa, 2002; Drummond47


et al., 2005). No rio Santo Antônio, isso ficou evidente no trecho localizado a jusante daUHE Salto Grande, cujas características fisiográficas e ligação direta com a calha do rioDoce permitiram a colonização por um elenco variado de peixes exóticos. Nessa áreanão foram estabelecidas até o presente relações de causa-efeito em que essas espéciesalterassem as comunidades de peixes nativos, ou mesmo induzissem extinções locais.Entretanto, essa constatação parece estar relacionada mais à ausência de estudosespecíficos que uma realidade local, pois em áreas em que esses foram desenvolvidosverificaram-se relações negativas advindas da substituição da fauna nativa por peixesexóticos (Godinho & Formagio, 1992; Godinho et al., 1994; Alves et al., no prelo).Desse modo, não é possível prever sob quais condições futuras serão mantidas ascomunidades de peixes nesse trecho da drenagem, principalmente após a disseminaçãomais recente de grandes piscívoros como Clarias gariepinnus (Alves et al., 1999) ePseudoplatystoma sp. (Vieira & Pompeu, 2001).A ictiofauna do rio Santo Antônio apresentou padrão de riqueza de espéciesnativas relacionado a altitude, independente do ambiente considerado, rios ou córregos.Assim, constatou-se que o número de espécies nativas decresce à medida que sedireciona para as cabeceiras, padrão esse que tem sido descrito para diferentes sistemasde rios (Balon & Stewart, 1983; Ibarra & Stewart, 1989; Fu et al., 2004; Braga &Andrade, 2005). Entretanto, para as espécies exóticas foi registrada correlação negativado índice de contaminação (IC) e altitude somente nos ambientes de rios. Para essasespécies, a dispersão ao longo da calha do rio Santo Antônio foi influenciada pelapresença da barragem da UHE Salto Grande, que representa o limite para osdeslocamentos de qualquer espécie que se distribua no baixo curso dessa drenagem e norio Doce, e em última análise determinou o grande número de peixes exóticosregistrados a jusante da mesma.Nos ambientes de córregos, embora se tenham registrado valores de ICmaiores que os observados na calha dos rios, foram encontradas somente duas espéciesexóticas, a tilápia (Tilapia rendalli) e o barrigudinho (Poecilia reticulata). Dessa forma,maiores valores de IC foram obtidos em função do menor número de espécies nativaspresentes nestes ambientes, e não pelo número elevado de espécies exóticas que oscolonizam. Esses resultados demonstraram que os córregos são restritivos para amaioria dos peixes exóticos existentes na bacia, sendo essa restrição atribuida àpreponderância de espécies de porte grande que ocorrem na drenagem, as quais nãoencontram condições adequadas para manterem populações em cursos de água menores.48


Apesar de se ter constatado que os córregos foram colonizados por poucasespécies exóticas, em algumas situações os impactos negativos proporcionados poressas espécies nesses ambientes podem ser mais acentuados para a fauna nativa queaqueles registrados em rios. De modo geral, córregos possuem microhábitats específicose com espécies endêmicas, sendo muitas vezes de distribuição restrita a pequenostrechos (Buckup, 1996), fato verificado na drenagem em estudo. Dessa forma,alterações nas características ambientais originais desses ambientes podem favorecer aexpansão das populações de exóticos generalistas em detrimento das espécies nativascom requerimentos específicos, condição que pode culminar com eventos de extinçãolocal, como relatado para outros sistemas (Bayley & Li, 1992; Scott & Helfman, 2001).Para as espécies endêmicas/ameaçadas de extinção, a maior riqueza relativafoi registrada em altitudes intermediárias (acima de 450 m), condição também relatadaem sistema distinto do estudado (Fu et al., 2004). No rio Santo Antônio esse resultadoguarda relações com os seguintes fatores: i) número relativamente elevado de espéciescom registros exclusivos em segmentos específicos da drenagem; ii) maiorcomplexidade estrutural em altitudes intermediárias; iii) qualidade ambiental e iv)conectividade longitudinal da drenagem.Ecossistemas lóticos são caracterizados por gradientes ambientaismultidimensionais (Ward, 1989), sendo que na dimensão longitudinal, a altitude e asdiferentes unidades fisiográficas conferem heterogeneidade espacial à bacia (Ward &Tockner, 2001). Adicionalmente, a qualidade física e química das águas representaoutro fator responsável pela manutenção da biodiversidade dentro de uma drenagem(Marques & Barbosa, 2002). O trecho a montante da UHE Salto Grande inclui rios dediferentes dimensões e com um mosaico de ambientes (corredeiras, cachoeiras, poções,reservatórios), que em conjunto conferem estrutura altamente heterogênea à paisagem.Nessa região, a qualidade física e química da água mostrou diferenças mais acentuadasno que se refere ao aspecto sazonal de seca e chuva que na zonação longitudinal,embora essa tenha sido evidenciada nas três estações localizadas ao longo da calha dorio Santo Antônio. As alterações longitudinais e temporais nos parâmetos físicos equímicos estão de acordo com o previsto pelas teorias do “continuum fluvial” e do“pulso de inundação”, as quais também incluem mudanças nas comunidades bióticas(Vannote et al., 1980; Junk et al., 1989; Allan, 1995). Embora tenham sido verificadasdiferenças sazonais e na dimensão longitudinal, os valores obtidos para todos os49


parâmetros físicos e químicos não indicaram condições que possam ser caracterizadascomo limitantes para as espécies de peixes que ocorrem na bacia.De uma forma geral, a melhor qualidade física e química da água pode seratribuída à baixa densidade populacional em grande parte da bacia, predominância deatividades agro-pastoris e alta capacidade de depuração apresentada pelos extensostrechos de corredeiras a montante da UHE Salto Grande. Entretanto, somente aqualidade física e química da água adequada para peixes não representounecessariamente maior representatividade da ictiofauna em uma determinada área. Essefato foi observado nos rios do Tanque e Guanhães, onde se constatou as maioresdiferenças para os coliformes totais e fecais e onde foram registrados os menoresvalores de diversidade de espécies. Nessas duas drenagens, excetuando o trecho do rioGuanhães alagado pelo reservatório da UHE Salto Grande, não foram registradasespécies ameaçadas como H. wheatlandii, L. tahyeri e B. opalinus, relativamentecomuns nas outras seções de rio.O último fator se refere à conectividade longitudinal, condição consideradaessencial para manutenção da biodiversidade em rios e cuja perda pode alterar aviabilidade de populações de espécies nativas (Allan & Flecker, 1993; Abell et al.,2002; Wiens, 2002). A construção de barragens representa um dos principais elementosresponsáveis pela perda de conectividade em ambientes de rios e está associada aodeclínio da biodiversidade em ecossistemas aquáticos continentais brasileiros(Agostinho et al., 2005). Entretanto, no rio Santo Antônio, a descontinuidadelongitudinal proporcionada pela barragem da UHE Salto Grande, que entrou emoperação em 1956 e manteve o trecho médio-alto da bacia isolado, parece ter sido oelemento de importância primária na manutenção de uma ictiofauna bastantediversificada e com baixo grau de contaminação por espécies exóticas. Esse fato aindaguarda estreita relação com a extensão do trecho de rio que ficou isolado, o qualrepresenta cerca de 80% da bacia e ao que tudo indica foi suficiente para que as espéciesnativas se mantivessem.A importância desse barramento no processo de isolamento pode ser ilustradapela distribuição do dourado (Salminus brasiliensis = S. maxillosus), espécieintroduzida no rio Doce pelo Instituto de Caça e Pesca após sua aclimatação na estaçãode piscicultura de Aimorés, MG (Ruschi, 1965). Sua dispersão se deu por praticamentetoda a bacia do rio Doce, excetuando-se algumas áreas de cabeceiras, cujo acesso foiimpedido por obstáculos naturais ou por barragens, caso do rio Santo Antônio. Dessa50


forma, até o presente a barragem da UHE Salto Grande representou um impedimentoefetivo na dispersão natural de qualquer espécie introduzida na partes baixas dadrenagem. Sob esse aspecto, o cumprimento literal da lei estadual sobre transposição depeixes (Minas Gerais, 1997) representaria um fator decisivo na dispersão das espéciesexóticas para o trecho de montante do barramento, razão pela qual foi recomendado queesse processo não fosse efetivado (obs. pes.).Entretanto, a integridade da ictiofauna no alto-médio rio Santo Antônio,proporcionada pelo isolamento foi alterada em anos mais recentes com a introdução degrandes piscívoros como o cachara (Pseudoplatystoma corruscans X P. fasciatum) e obagre-africano (Clarias gariepinnus). A primeira é mantida em uma pisciculturacomercial na drenagem do rio do Tanque (Coelho & Cyrino, 2006), de onde sedisseminou para a drenagem após escapes dos tanques-redes, enquanto a segunda éoriunda de fugas de tanques de criação e de estabelecimentos do tipo pesque e pague. Oimpacto dessas espécies para a ictiofauna nativa nesse trecho do rio Santo Antônioainda é desconhecido e necessita de análises futuras.Os resultados obtidos evidenciaram que o rio Santo Antônio emborarepresentando 12,6% da bacia do rio Doce, mantêm número de espécies de peixes maisexpressivo que qualquer outro afluente estudado até o presente. Entre essas espéciesvárias, são endêmicas ou de ocorrência restrita à drenagem, fato que demonstra aimportância da mesma como área mantenedora de biodiversidade nas bacias do lestebrasileiro. Essa condição deixou claro que alterações como a construção de novas usinashidrelétricas, principalmente em algumas seções das drenagens a montante da UHESalto Grande, podem ter conseqüências que extrapolam análises de impactos ambientaisdesenvolvidas em nível local e deverão representar o empobrecimento da ictiofauna oumesmo extinção de espécies. Adicionalmente, as estratégias atuais disponíveis eadotadas para a mitigação dos impactos negativos de barragens (transposição de peixes,repovoamentos e outros), não deverão ser suficientes para garantir a diversidade depeixes atual. Essa constatação está relacionada às alterações estruturais na drenagem,principalmente a fragmentação e supressão de áreas lóticas que, conforme demonstrado,são requisitos essenciais para a maior parte da ictiofauna.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASAbell, R.; Thieme, M.; Dinerstein, E. & Olson, D. 2002. A sourcebook for conductingbiological assessments and developing biodiversity visions for ecoregion51


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CAPÍTULO 259


DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E ASPECTOS DA ECOLOGIA DE PEIXESAMEAÇA<strong>DO</strong>S DE EXTINÇÃO NA DRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO,<strong>BACIA</strong> <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MGRESUMOForam analisadas cinco espécies de peixes ameaçados de extinção que possuemdistribuição na drenagem do rio Santo Antônio. Os dados foram obtidos em trabalhos decampo e registros em museus, cobrindo uma série temporal entre os anos de 1989 e2005. Todas as espécies apresentaram distribuição restrita a ambientes lóticos, em rioscom larguras superiores a 10 m e em altitudes de até 670 metros. Brycon devillei eSteindachneridion doceanum não foram avaliados quanto a aspectos da biologia porserem muito raras e terem baixa representividade nas amostragens. Henochiluswheatlandii é uma espécie de grande porte que possui crescimento isométrico e cujadieta muda de invertebrados bentônicos para frutos e podostemáceas ao longo dodesenvolvimento ontogenético. Brycon opalinus também apresenta crescimentoisométrico e apresentou dieta onívora incluindo principalmente recursos alóctones,notadamente frutos e insetos que caem na água. Leporinus thayeri apresentoucrescimento alométrico negativo e hábito alimentar invertívoro, predando formasadultas e larvais de insetos aquáticos bentônicos. As três espécies apresentaram cicloreprodutivo relacionado ao período de chuvas. Programas de conservação são viáveispara as três últimas espécies, enquanto para as demais as perspectivas são menospromissoras, pois as populações parecem estar em acentuado declínio, tanto no SantoAntônio como no restante do rio Doce.INTRODUÇÃOPara uma parcela considerável das espécies, o risco de extinção está ligado aonúmero total de indivíduos remanescentes, enquanto que para outras esse processo estárelacionado com a distribuição espacial e, por conseguinte, com a quantidade de hábitatocupado (Gaston 1994; Kunin & Gaston, 1997). Causas primárias do declínio da faunade peixes são atribuídas a cinco categorias principais: demanda pelo uso da água,alteração de hábitats, poluição, introdução de espécies exóticas e exploração comercial(Moyle & Leidy, 1992). Embora uma ou duas causas principais possam ser identificadas60


para cada espécie isoladamente, o declínio resulta quase sempre de efeitos múltiplos,cumulativos e de longo prazo.Apesar dos problemas metodológicos inerentes à elaboração de listas de espéciesameaçadas de extinção (Regan et al., 2005), essas constituem uma das principaisferramentas utilizadas atualmente para estabelecer prioridades para conservação (Mace& Lande, 1991), representando uma informação imprescindível no estabelecimento decritérios para uso dos recursos financeiros, que em sua maioria são bastante limitados(Darwall & Vié, 2005; Grammont & Cuarón, 2006).A primeira lista de animais ameaçados de extinção no Brasil foi formuladasomente ao final da década de 1960 (Coimbra-Filho & Magnanini, 1968), e não incluíapeixes. Esse resultado estava relacionado primariamente à falta de análise para o grupoe não a uma realidade sobre melhores condições de conservação. Essa situação perdurounas demais listas de abrangência nacional publicadas posteriormente (IBDF, 1973;IBAMA, 1989; MMA, 2003), cuja mudança ocorreu somente em 2004 (MMA, 2004;Rosa & Lima, 2005). Nesse espaço de tempo, alguns estados com legislação maisvanguardista listaram suas espécies de peixes ameaçadas (Machado et al., 1998; SãoPaulo, 1998; Mazzoni et al., 2000; Marques et al., 2002; Abilhoa & Duboc, 2004),permitindo a adoção de mecanismos para proteção efetiva, ainda que somente em nívelestadual.Em Minas Gerais, a primeira lista incluia somente três espécies ameaçadas depeixes (Machado et al., 1998): Zungaro jahu = Paulicea luetkeni (Lundberg &Littmann, 2003), Brycon orbignyanus e Characidium lagosantensis, nenhuma das quaiscom ocorrência na bacia do rio Doce. Com a publicação da lista nacional (MMA, 2004),esse número foi significativamente alterado e passou a incluir 34 espécies para MinasGerais, das quais cinco distribuídas no rio Doce. Essas espécies foram relacionadascomo ameaçadas por serem raras ou possuírem populações extremamente reduzidas –e.g., Steindachneridion doceanum e Brycon devillei (obs. pes.), ou apresentaremdistribuição restrita a uma determinada drenagem sob forte ameaça de alteraçãoambiental – e.g., Henochilus wheatlandii, Brycon opalinus e Leporinus thayeri (Vieiraet al., 2000; Vieira & Alves, 2001; obs. pes.). As três primeiras espécies são endêmicasdo rio Doce, enquanto as demais apresentam distribuições mais amplas nas drenagensdo leste brasileiro.No rio Doce, H. wheatlandii foi a única dessas espécies abordada em estudos maisamplos nos últimos anos, primariamente em função de problemas de distribuição61


geográfica (Vieira et al., 2000) e interessse filogenético (Castro et al., 2004). Apirapitinga (B. opalinus) teve populações da bacia do rio Paraíba do Sul, onde tambémestá distribuída (Lima, 2003), submetidas a estudos utilizando marcadores molecularesdo DNA mitocondrial, cujas informações foram utilizadas para planejar a formação e omanejo dos estoques de reprodutores mantidos em cativeiro, indicar áreas paraconservação de populações isoladas geneticamente e orientar programas derepovoamento (Hilsdorf et al., 2002; Hilsdorf & Petrere-Jr., 2002).De uma forma geral, o desconhecimento sobre aspectos básicos da biologia depeixes ameaçados de extinção constitui um dos grandes entraves para adoção de açõesde conservação, fato normalmente relacionado à baixa representatividade dos mesmosem ambientes naturais. Dessa forma, oportunidades de estudos com essas espéciesdevem ser aproveitadas em sua totalidade, fator preponderante para que as mesmaspossam ser melhor conhecidas e mantidas a longo prazo. Nesse contexto, foramavaliadas características biológicas e de distribuição das cinco espécies ameaçadas queocorrem no rio Doce, algumas com ocorrência restrita a subdrenagem do rio SantoAntônio.METO<strong>DO</strong>LOGIAÁ área amostrada cobriu a drenagem do rio Santo Antônio, desde sua foz até osafluentes localizados nas áreas mais elevadas próximo às nascentes totalizando 61pontos de coleta, sendo 27 localizados em córregos e 34 nas calhas dos rios maiores(Figura 1).As amostragens foram aperiódicas e distribuídas ao longo dos anos de 1991-1996 e 1999-2005, sendo que a intensificação dos estudos foi conduzida entre 2002 e2005. Registros adicionais, referentes as cinco espécies ameaçadas, foram obtidos naliteratura e nos bancos de dados do Museu Nacional (MNRJ), Museu de Zoologia daUniversidade de São Paulo (MZUSP) e Museu de Ciências e Tecnologia da PontifíciaUniversidade Católica do Rio Grande do Sul (MCP), através de consultas ao ProjetoNEODAT III (http://www.mnrj.ufrj.br/search1c.htm) e ao Centro de Referência emInformação Ambiental, CRIA (http://splink.cria.org.br/simple_search?criaLANG=pt).62


42 o 00’Espinhaçov vv v vv v vGuanhãesriov v vPontos de coletaCadeia de montanhasCidadesCursos d’águaUHE’s implantadas18 o 30’v vCorrentev v vrioPara uninhaConceição doMato DentrorioGrandedov vvriorio do PeixeSantoItambéS. Sebastião doRio PretoFerrosGuanhãesAntônioBeloOrienterioDoceSenhora daPenhav v44 o 00’Parque Nacional daSerra do CipóCadeiav v vvvvvvvrioPretoItambé doMato DentroriododoTanqueItabiraAntônio DiasrioPiracicabaIpatingaDoce0 20km19 o 30’v vrioFigura 1 – Pontos de amostragem da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio,bacia do rio Doce, MG. Parte dos pontos não é apresentada em função da escala em quese encontra o mapa, a qual não permite reproduzir cursos d’água de pequeno porte.Em cada ponto foram registradas as características referentes ao tipo de cursod’água (córrego ou rio), coloração da água (preta ou clara) e altitude (m) obtida atravésde GPS e conferida em cartas topográficas do IBGE na escala 1:50.000.Capturas foram realizadas com redes de emalhar com tamanhos de malha de 24a 120 mm (medidos entre nós opostos). Nos córregos foram utilizadas peneiras (malha 2mm) e tarrafas (malha 3 e 5 cm), artefatos que também foram empregados em riosmaiores. Os exemplares foram separados por local de captura e fixados em formalina a10%. Em laboratório os exemplares foram medidos {comprimento padão (CP) e total(CT) em mm}, pesados (precisão 1 g) e dissecados para separação dos estômagos eposterior análise da dieta. O coeficiente intestinal foi determinado para cada exemplaratravés da razão entre o tamanho do peixe (CP) e do intestino, medido em milímetros. Ocoeficiente de correlação de Pearson foi usado para expressar as relações entre osvalores do coeficiente intestinal e o comprimento padrão para cada espécieisoladamente.A análise do conteúdo estomacal foi realizada sob estereomicroscópio e os itensencontrados identificados até a menor categoria taxonômica possível. Foram utilizados,63


os métodos de freqüência de ocorrência e gravimétrico (peso úmido), segundo Hyslop(1980). Freqüência de ocorrência é definida como a percentagem de estômagoscontendo determinado item, em relação ao total de estômagos com alimento. O pesoúmido foi obtido através da pesagem de cada item alimentar em balança Mettler P1210com precisão de 0,01g, após o mesmo ter sido mantido sob papel de filtro para eliminaro excesso de água.Os dados das porcentagens do peso úmido e freqüência foram correlacionadosatravés do índice alimentar proposto por Kawakami & Vazzoler (1980), descrito pelaequação:IA i = ( Fi * Pi )n, onde:( Fi * Pi)∑i=1IA i = índice alimentar;i = 1, 2,... n = determinado item alimentar;Fi = frequência de ocorrência (%) de determinado item;Pi = peso úmido (%) de determinado item.Na apresentação dos resultados, alguns organismos foram agrupados emcategorias mais amplas, como por exemplo invertebrados aquáticos, que englobamdiversas ordens de insetos. Quando este procedimento foi adotado, os itens identificadosforam discriminados na apresentação dos resultados.A relação peso-comprimento para cada espécie (machos e fêmeas agrupados) foiestimada através do ajuste de uma curva exponencial, PC = a CP b (Ricker, 1975). Osparâmetros a e b da curva exponencial foram estimados por regressão linear utilizandoos dados de comprimento e peso logaritimizados (ex.: ln PC = ln a + b . ln CP), ondePC = peso corporal (g), CP = comprimento padrão (mm), a o intercepto e b ainclinação, usando o método dos mínimos quadrados (Zar, 1999). O grau de associaçãoentre as variáveis ln PC e ln CP, foi avaliado pelo coeficiente de determinação (r 2 ).A hipótese nula de crescimento isométrico (Ho: b = 3) foi testada através doteste t usando a equação t s = (b-3) / S b , onde S b é o erro padrão do coeficiente deregressão, adotando o nível de significância estatística de 0,001 (Sokal & Rohlf, 1995).As análises estatísticas foram conduzidas através do programa Statistica 6.0(Statsoft, 2001).64


RESULTA<strong>DO</strong>SForam capturados 131 exemplares distribuídos entre quatro das espéciesameaçadas (Tabela I). O surubim-do-Doce (S. doceanum) foi a única espécie registradasomente através de dados secundários, nesse caso uma cabeça mantida sêca por umpescador local, cujo exemplar foi pescado na calha do rio Santo Antônio abaixo daconfluência do rio do Tanque, no município de Ferros (Figura 2D). A piabanha (Brycondevillei) foi outra espécie muito rara, com somente dois exemplares capturados a jusanteda UHE Salto Grande (Figura 2D). Embora restritas ao trecho de montante da UHESalto Grande, as demais espécies (andirá – Henochilus wheatlandii; pirapitinga –Brycon opalinus e o timburé – Leporinus tahyeri) foram registradas em maiorabundância e em áreas mais amplas da drenagem (Figuras 2A, 2B e 2C).Todas as espécies ocorreram exclusivamente em ambientes de rios (largurassuperiores a 15 metros e em altitudes de até 670 metros – Tabela I e Figura 3), queincluem a calha do Santo Antônio e o baixo curso de afluentes maiores: Guanhães,Parauninha, Peixe e Preto do Itambé. No rio Guanhães, a única espécie registrada foi B.opalinus, representada por dois exemplares no reservatório da UHE de Salto Grande.Steindachneridion doceanum e B. devillei tiveram os registros limitados à calha do rioSanto Antônio. O rio do Tanque foi o único afluente de maior porte onde não foiregistrada nenhuma das espécies.Henochilus wheatlandii, B. opalinus e o L. thayeri ocorreram tanto em rios deáguas pretas (Preto do Itambé e parte alta do rio Santo Antônio) como de águas claras(Peixe e médio Santo Antônio), enquanto S. doceanum e a B. devillei estiveram restritosa ambientes de águas claras.Tabela I – Distribuição altitudinal, comprimentos totais e pesos máximos e mínimospara as espécies de peixes ameaçadas de extinção na drenagem do rio Santo Antônio,bacia do rio Doce, MG.ComprimentoEspécieAltitude (m) total (mm) Peso (g)n mín. máx. mín. máx. mín. máx.Leporinus thayeri 50 520 670 117 257 18 157Brycon opalinus 45 382 670 89 296 8 364Henochilus wheatlandii 34 449 591 102 320 10 376Brycon devillei 2 194 220 227 330 247 410Steindachneridion doceanum 1 - 440 - - - -65


v vv vvvv vv vv vv vvvv vv vv v vv v vv v vv vrioEspinhaçoCorrenteGranderioDocedorioParque Nacional daSerra do CipóConceição doMato DentroItambé doMato DentroGuanhãesriov v vGuanhãesrioFerrosS. Sebastião doRio PretoIpatingao0 20PiraciDocerioItabiraAntônio DiasSenhora daPenhaBeloOrienteAntônioSantoPeixerio dovv vItambév vdoPretoTanqueriodovvriocabav v v vkm42 o 00’18 o 30’v v vv v vv v19 o 30’Cadeia44 o 00’Cadeia de montanhasCidadesCursos d’águarioEspinhaçoUHE’s implantadasCorrenteÁrea de ocorrênciaBrycon opalinus44 o 00’GranderioPara uninhaDocedorioParque Nacional daSerra do CipóConceição doMato DentroGuanhãesriov v vGuanhãesrioFerrosvvItambé doMato DentroS. Sebastião doRio PretoIpatingao0 20PiraciDocerioItabiraAntônio DiasÁrea de ocorrênciaLeporinus thayeriSenhora daPenhaBeloOrienteAntônioSantoPeixerio dovv vItambév vdoPretoTanqueriodovvriocabav v v vkm42 o 00’18 o 30’Para uninhavv19 o 30’CadeiariorioABv v vv v v44 o 00’v v vv vrioEspinhaçoCorrenteGranderioDocedorioParque Nacional daSerra do CipóConceição doMato DentroItambé doMato DentroGuanhãesriov v vGuanhãesrioFerrosS. Sebastião doRio PretoIpatingao0 20PiraciDocerioItabiraAntônio DiasÁrea de ocorrênciaHenochilus wheatlandiiSenhora daPenhaBeloOrienteAntônioSantoPeixerio dovv vItambév vdoPretoTanqueriodovvriocabav v v vkm42 o 00’18 o 30’v v vv vrioEspinhaçoCorrenteGranderioPara uninhaDocedoriovv19 o 30’44 o 00’Parque Nacional daSerra do CipóConceição doMato DentroItambé doMato DentroGuanhãesriov v vGuanhãesrioFerrosS. Sebastião doRio PretoIpatingao0 20PiraciDocerioItabiraAntônio DiasSenhora daPenhaBeloOrienteAntônioSantoPeixerio dovv vItambév vdoPretoTanqueriodovvriocabav v v vCadeiariorioCDRegistrosSteindachneridium doceanumBrycon devilleikm42 o 00’18 o 30’Para uninhavv19 o 30’CadeiaFigura 2 – Área de ocorrência das espécies de peixes ameaçadas de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.


ABCDEFFigura 3 – Ambientes de calha amostrados na drenagem do rio Santo Antônio, bacia dorio Doce, MG: A – Rio Santo Antônio a montante da UHE Salto Grande; B – Rio doPeixe; C – Rio Preto do Itambé; D – Rio Guanhães no final do reservatório da UHESalto Grande; E – Rio Santo Antônio a jusante da UHE Salto Grande; F – Rio doTanque.


Os valores do IA i para os itens alimentares, utilizados pelas três espécies comexemplares disponíveis para análises demonstraram dietas e estratégias de obtenção doalimento diferenciadas (Tabela II).Para Henochilus wheatlandii, foi verificada forte ontogenia trófica, comexemplares menores que 15 cm de comprimento padrão se alimentaram basicamente deinvertebrados bentônicos (efemerópteros, hemípteros – Gerridae e larvas de dípteros), eos exemplares acima desse tamanho passando a utilizar frutos (Moraceae – Ficus sp.) etalos de Podostemaceae (Figura 4A). A categoria invertebrados terrestres incluiuhimenópteros (formas aladas de Formicidae), coleópteros e lepdópteros, todos combaixa representatividade tanto nos exemplares de pequeno como de grande porte. Amudança de hábito alimentar se refletiu no coeficiente intestinal, cujos valoresaumentaram significativamente com o crescimento dos exemplares (Figura 5).Exemplares de maior porte e com hábito alimentar herbívoro apresentaram forteinfestação por nematóides, que em alguns preenchiam grande parte do intestino (Figura4B).A dieta de L. tahyeri foi composta quase que exclusivamente por invertebradosbentônicos, sendo estes representados por Trichoptera, Odonata, Hemiptera –Naucoridae e larvas de Diptera (Tabela II). Invertebrados terrestres foram ocasionais erepresentados somente por coleópteros. Para essa espécie, não foi encontrada variaçãosignificativa do coeficiente intestinal ao longo do crescimento (Figura 5).Brycon opalinus apresentou hábito alimentar mais diversificado, embora compredominância de invertebrados terrestres (Tabela II). Para essa espécie, também foiverificado aumento significativo no coeficiente intestinal com o crescimento (r = 0,74; p< 0,01; n = 15), embora bem menos pronunciado que aquele registrado para H.wheatlandii (Figura 5). Frutos de Moraceae (Ficus sp.) foram registrados somente emexemplares acima de 20 cm, enquanto que partes de sementes e outros frutos nãoidentificados estiveram presentes nos estômagos de exemplares desde 7,5 cm.Invertebrados terrestres foram representados por coleópteros e himenópteros (formasaladas ou não de Formicidae), enquanto que os aquáticos pertenciam às ordens Diptera,Hemiptera e Odonata, esses ocorrendo em baixa freqüência e peso.As três espécies utilizam diferentes táticas para obterem o alimento. Assim, L.thayeri e exemplares de H. wheatlandii com tamanhos até 15 cm são predadoresbentônicos que exploram o substrato para captura de invertebrados aquáticos,primariamente formas juvenis pertencentes a várias ordens de insetos; B. opalinus é um68


onívoro que utiliza itens alóctones de origem vegetal e animal e que são capturados nasuperfície e coluna d’água; por último os exemplares maiores de H. wheatlandii (> 15cm), aqui considerados como primariamente herbívoros e que exploram tanto vegetaisque caem na água (frutos e sementes) como partes de plantas aquáticas(Podostemaceae). Invertebrados terrestres foram considerados como itens acessórios nadieta.Tabela II – Índice alimentar (IAi) para as espécies de peixes ameaçadas de extinção nadrenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.Item alimentar / Índice de Importância Alimentar (IA i )EspécieAmplitudeCP (mm)nInvertebradosaquáticosInvertebradosterrestresMoraceae(Ficus sp.)Sementes efrutosPodostemaceaeH. wheatlandii 80 – 145 8 0,975 0,024 - - 0,002160 – 262 9 - 0,015 0,954 - 0,031L. thayeri 94 – 209 30 0,999 0,001 - - -B. opalinus 72-211 21 0,002 0,563 0,074 0,361 -BAFiguras 4 – A) Estômago de Henochilus wheatlandii preenchido com frutos deMoraceae (Ficus sp.) e partes de Podostemaceae B) Seção do intestino de um exemplarde H. wheatlandii cujo lúmem encontra-se totalmente preenchido por nematóides.69


3,02,82,6Henochilus wheatlandii r = 0,96 p < 0,001Brycon opalinus r = 0,74 p < 0,01Leporinus thayeri r = 0,23 p > 0,052,4Coeficiente intestinal2,22,01,81,61,41,21,00,80,60,460 80 100 120 140 160 180 200 220 240 260 280Comprimento padrão (mm)Figura 5 – Relação entre o comprimento padrão e o coeficiente intestinal para trêsespécies de peixes ameaçados de extinção na drenagem do rio Santo Antônio, bacia dorio Doce, MG.As relações peso-comprimento, as equações correspondentes e os valores doscoeficientes de determinação (r 2 ) encontram-se na Figura 6. O teste t para o tipo decrescimento das três espécies indicou crescimento do tipo alométrico negativo para L.tahyeri e isométrico para H. weatlandii e B. opalinus (p < 0,001). O coeficiente dedeterminação ficou acima de 98% para todas as espécies.70


200175150125Leporinus tahyeriY = 0,00006 * X 2,792r 2 = 0,98Peso (g)10075502500 25 50 75 100 125 150 175 200 225Comprimento padrão (mm)400350300Henochilus wheatlandiiY = 0,00001 * X 3,0895r 2 = 0,99250Peso (g)2001501005000 40 80 120 160 200 240 280Comprimento padrão (mm)400350300Brycon opalinusY = 0,00002 * X 3,0869r 2 = 0,99250Peso (g)2001501005000 25 50 75 100 125 150 175 200 225 250Comprimento padrão (mm)Figura 6 - Relação peso comprimento para espécies de peixes ameaçados de extinçãona drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.71


DISCUSSÃOAs cinco espécies ameaçadas aqui analisadas representaram menos de 1,5% dototal de exemplares capturados na drenagem do rio Santo Antônio, incluindo todos osdados das amostragens em campo e aqueles referentes ao material testemunho que seencontra depositado em museus. Devido à raridade ou ausência nas amostragens, duasespécies (B. devillei e S. doceanum) não puderam ser avaliadas quanto aos aspectos desua biologia na drenagem do rio Santo Antônio, embora os registros obtidos tenhamsido utilizados como um indicativo das áreas e hábitats que as mesmas utilizam.O nome B. devillei tem sido utilizado para designar as piabanhas que ocorrem nacalha e nos lagos do médio rio Doce (Sunaga & Verani, 1991; Godinho, 1996), razãopela qual foi utilizado na lista de espécies ameaçadas do Brasil (MMA, 2004; Rosa &Lima, 2005). Entretanto, segundo revisão taxonômica do gênero, trata-se de umaespécie nova ainda não descrita (Lima, 2001). Os poucos estudos com informaçõesbiológicas indicam que alcança tamanho de até 60 cm e possui dieta que inclui frutos,sementes, larvas de Odonata, camarões, insetos terrestres e peixes (Godinho, 1996;Lima, 2001). Esses dados demonstram o hábito alimentar onívoro, condição tambémrelatada para outros Brycon de maior porte, tanto em rios amazônicos como no sudestebrasileiro (Goulding, 1980; Lowe-McConnell, 1987; Lima & Castro, 2000).Os dois registros obtidos no baixo rio Santo Antônio foram congruentes com osdadso sobre a ocorrência da espécie somente em altitudes inferiores a 300 metros e nosrios de maior porte da bacia do Doce (dados inéditos). Assim, a ausência de B. devilleiacima da UHE de Salto Grande parece estar relacionada à sua distribuição original enão ao impedimento do deslocamento para montante proporcionado pelo barramento.Embora não existam dados sobre abundância, trabalhos desenvolvidos no baixo rioDoce na região de Aimorés (MG) demonstraram que a espécie já fez parte da pescaartesanal local, desaparecendo da mesma durante a década de 1970 (Alves et. al., noprelo). Atualmente, além dos exemplares obtidos no baixo Santo Antônio, os únicosregistros adicionais foram feitos em localidades específicas no rio Suaçui Grande e naregião da foz do Manhuaçu em Aimorés (obs. pes.), além dos lagos Dom Helvécio,Carioca e Palmeiras (Sunaga & Verani, 1991; Godinho et al., 1994).As causas do declínio populacional ao longo de toda a bacia são desconhecidas,embora a expressiva supressão da vegetação com conseqüente redução dadisponibilidade de recursos alimentares alóctones e perda de hábitats por assoreamento,pode ter sido a causa principal. Hipótese similar foi proposta para B. vermelha do rio72


Mucuri (Lima & Castro, 2000), e para outras espécies congêneres de grande porte(Pádua & Audi, 1984; Agostinho et al., 2003). No rio Santo Antônio, o intensoassoreamento do baixo curso pode ser a principal causa da baixa representatividade daespécie ao longo dos estudos desenvolvidos.No gênero Steindachneridion, estão incluídas seis espécies que possuemdistribuições restritas às drenagens costeiras do leste do Brasil, Alto Paraná e rioUruguai (Garavello, 2005), sendo que quatro encontram-se listadas como ameaçadas deextinção (MMA, 2004). A não inclusão de S. melanodermatum e S. punctatum comoameaçadas está relacionada a aspectos taxonômicos, visto que a primeira foi descritaposteriormente à elaboração da lista de espécies ameaçadas, enquanto a segunda foirevalidada no mesmo estudo de revisão do gênero (Garavello, 2005). Entre as espéciesoficialmente reconhecidas como ameaçadas, aquelas endêmicas do rio Doce (S.doceanum), Jequitinhonha/Pardo (S. amblyurum) e Paraíba do Sul (S. parahybae) são asque se encontram em situação mais crítica de conservação (MMA, 2004; Rosa & Lima,2005).Steindachneridion doceanum é a maior espécie de água doce nativa na bacia dorio Doce, com relatos de peixes pesando até 17 kg (obs. pes.). De forma similar aorelatado para a piabanha (B. devillei), já fez parte da pesca artesanal na região deAimorés, onde não é mais capturado desde o final da década de 1970 (Alves at al., noprelo). Segundo relato de pescadores e observações em campo, é uma espécie quepossui como hábitats específicos os locais mais profundos na calha do rio Doce e deseus maiores afluentes, primariamente em poções com fundos rochosos e localizadosabaixo de corredeiras e cachoeiras. O uso exclusivo desse tipo de ambiente também foidescrito para as demais espécies do gênero (Garavello, 2005). Nenhuma informaçãoestá disponível sobre aspectos da biologia da espécie, fato relacionado ao reduzidonúmero de exemplares disponíveis.Os dados mais recentes sobre a distribuiçãode S. doceanum na bacia do rio Docese resumem a três exemplares capturados no rio Piranga e imediatamente abaixo daconfluência desse com o rio do Carmo, quando passa a ser denominado rio Doce(Garavello, 2005), além do baixo rio Manhuaçu e médio Santo Antônio (obs. pes.). Nomédio Santo Antônio o registro foi feito com base em material observado com pescadore se refere somente a cabeça de um exemplar.A raridade dessa espécie na bacia do rio Doce parece estar relacionadaprimariamente à retirada da cobertura vegetal, com conseqüente assoreamento que73


eliminou grande parte de seus hábitats. Em anos recentes, a introdução do híbridoresultante do cruzamento do surubim com o cachara (Pseudoplatystoma corruscans x P.fasciatum), ocorreu por todo o rio Doce e representa uma ameaça potencial, mas semqualquer avaliação até o presente (Vieira & Pompeu, 2001; Alves et al., no prelo). Asformas de introdução do híbrido na bacia do rio Doce não estão registradas na literatura,embora no rio Santo Antônio esteja relacionada aos escapes de tanques-rede usados paracriação. Essa constatação está embasada no fato de ser mantido dentro do rio doTanque, no município de Santa Maria do Itabira, o maior cultivo comercial da espéciena bacia do rio Doce (Coelho & Cyrino, 2006).O híbrido, conhecido popularmente como surubim-ponto-e-vírgula ou cachara, éum piscívoro de grande porte (exemplares de até 25 kg já foram capturados no rio Doce- obs. pes.) e nada se conhece sobre a suas relações com S. doceanum, apesar deregistros em ambientes similares àqueles originalmente ocupados pela espécie nativa.Dados de campo indicam que o híbrido possui menores restrições ambientais que S.doceanum, colonizando até mesmo rios de menor porte como o Matipó e áreas bastantealteradas (obs. pes.).As espécies com exemplares disponíveis para análises biológicas (H. wheatlandii,B. opalinus e L. thayeri) apresentaram distribuições similares, as quais se resumem aotrecho localizado a montante da UHE Salto Grande e incluiu exclusivamente a calha dorio Santo Antônio e o médio-baixo curso de alguns afluentes maiores. Henochilusweatlandii foi a única que teve exemplares registrados a jusante desse barramento(Volney Vono & Renê Hojo, com. pes.). Entretanto, considero que esses eventos foramocasionais e estiveram relacionados a períodos de fortes chuvas, quando é possível apassagem de alguns peixes através das comportas dos vertedores. Dessa forma, emfunção de H. weatlandii não manter populações nessa região, os registros foramconsiderados acidentais e não foram considerados como área de distribuição da espécie.As três espécies ocorreram primariamente em ambientes lóticos de rios maiores,sempre com larguras superiores a 10 metros, utilizando áreas com leito rochoso eextensas áreas encachoeiradas, essas intercaladas por regiões de deposição de areia ondesão formados poções e remansos. A maioria das áreas mantinha vegetação ciliarexpressiva, entretanto, também ocorreram em trechos onde houve supressão esubstituição parcial por pastagens. A única exceção a esse padrão foram os doisexemplares de B. opalinus coletados no braço do reservatório da UHE Salto Grande,dentro do rio Guanhães. Esse reservatório recebe água do rio Santo Antônio através de74


um aqueduto, o qual pode funcionar como uma rota para chegada desses peixes a esseambiente. Entretanto, a baixa representatividade quando comparada as demais áreas dedistribuição é um indicativo de que a espécie talvez não estabeleça populações comciclo de vida completo nesse ambiente. Vieira et al. (2005) utilizaram a presença dejuvenis como indicativo para inferir que a reprodução deve ocorrer em áreas lóticas emtrechos mais elevados da drenagem.As três espécies ocorreram indistintamente em ambientes de águas claras enaqueles que possuem águas de coloração escura e pH ligeiramente ácido, como no rioPreto do Itambé (Galdean et al., 2000) e trecho superior do rio Santo Antônio. Ao quetudo indica, são as características fisiográficas da drenagem que determinam o padrãode distribuição registrado para as três espécies.O andirá (H. wheatlandii) foi descrito em 1890 com base em um exemplar obtidona localidade de Santa Clara, bacia do rio Mucuri (Garman, 1890). Decorrido mais deum século após a descrição e amplos esforços de coleta no rio Mucuri, nenhum outroexemplar foi obtido. Esse fato culminou com a sua inclusão na lista de espéciesameaçadas (Rosa & Menezes, 1996), sendo posteriormente considerado extinto no lestedo Brasil (Swerdlow, 1998). Em setembro de 1996, Vieira et al., (2000) registraramdois exemplares no rio Preto do Itambé, bacia do rio Santo Antônio e propuseram duashipóteses para explicar a ausência da espécie no rio Mucuri: erro na designação dalocalidade tipo ou extinção local. Essas hipóteses ainda permanecem sob debate (Castroet al., 2004), embora o holótipo continue a ser o único exemplar conhecido provenientedo rio Mucuri e o rio Santo Antônio a única área com registros atuais.É uma espécie de porte grande (sensu Agostinho et al., 1995), que chega a maisde 40 cm de comprimento total (holótipo) e cujo crescimento isométrico indicaproporcionalidade entre o aumento de tamanho e o ganho de peso. A primeira indicaçãode hábito alimentar herbívoro foi feita por Garman (1890), posteriormente corroboradacom a análise de outros cinco exemplares (Vieira & Alves, 2001, Castro et al., 2004).Entretanto, segundo Castro et al. (2004) a espécie passa por mudanças acentuadas nadieta, tamanho do trato digestivo e dentição ao longo do desenvolvimento ontogenético,mas devido ao pequeno número de exemplares analisados (3), indicaram que havianecessidade de ampliar as observações.A análise da dieta demonstrou a ontogênese trófica, permitindo inferir que amudança de hábito alimentar se processa em exemplares com cerca de 15 cm decomprimento padrão. A partir desse tamanho ocorre um incremento acentuado no75


tamanho do intestino, o qual chega a atingir quase 3 vezes o comprimento padrão emexemplares com 26 cm. Dessa forma, exemplares pequenos são predadores deinvertebrados bentônicos enquanto os maiores passam a utilizar quase queexclusivamente vegetais superiores, incluindo plantas terrestres (Moraceae) e aquáticas(Podostemaceae), além de insetos terrestres em pequena proporção.Segundo Gerking (1994), nenhum peixe herbívoro adulto utiliza somente vegetaisna alimentação, fato demonstrado em diversos estudos de dieta. Entretanto, na maioriados casos, itens de origem animal foram interpretados como ingeridos acidentalmentedurante o forrageamento, o que parece não se aplicar a H. weatlandii. O registroexclusivo de insetos alóctones e também grandes quantidades de frutos de Ficus sp., queflutuam e são arrastados pela corrente, indica que é feita captura ativa, tática deforrageamento que pode ser classificada como cata na superfície (“surface picking”sensu Sazima, 1986) e alimentação de itens a deriva (“drift-feeding” sensu Grant &Noakes, 1987). Dessa forma, os insetos terrestres utilizados pelos exemplares de maiorporte são intrerpretados como um complemento da dieta, cujo hábito alimentar é aquiconsiderado como primariamente herbívoro.No leste brasileiro, os relatos sobre o uso de podostemáceas como alimento porpeixes são muito raros (Vilella et al., 2002), contrastando com o uso de vegetaisterrestres, principalmente frutos e sementes (Araújo-Lima et al., 1995; Barrella et. al,2000; Gomiero & Braga, 2003; Alvim & Peret, 2004; Bennemann et al., 2005). Na áreaestudada, Ficus sp. representou o principal item alimentar dos exemplares de H.wheatlandii com tamanhos superiores a 15 cm. Brycon opalinus também fez uso desserecurso, embora os itens principais tenham sido invertebrados terrestres seguidos deoutros frutos e sementes diversas. Embora o uso de itens alimentares pelos peixes possamudar em função da disponibilidade local e temporal (Gerking, 1994), nossasobservações reforçam a importância da vegetação ripária como fonte importante derecursos para as duas espécies.Segundo Philbrick & Novelo (1995), a família Podostemaceae possui distribuiçãoprincipalmente tropical e ocupa ambiente único para as angiospermas, que são as rochasem áreas de rios com corredeiras e cachoeiras. Em função de formarem extensosestandes, essas plantas têm sido descritas como importantes hábitats para váriosorganismos (Vadas & Orth, 2000; Hutchens et al., 2004), além de servirem diretamentecomo alimento para diversas espécies de peixes, principalmente em rios amazônicos(Santos et al., 1997; Horeau et al., 1998; Santos & Rosa, 1998; Zanata & Lima, 2005;76


Jégu & Keith, 2005). Nas drenagens do leste brasileiro, além do uso por H. wheatlandii,o único relato adicional de podostemáceas como alimento de peixes foi feito paraespécies do gênero Astyanax (Vilella et al., 2002). Podostemáceas abrigam uma grandediversidade de invertebrados aquáticos, alguns ocorrendo em altas densidades e que sãoutilizados como fonte de alimento pelos peixes (Hutchens et al., 2004). No rio SantoAntônio, esse recurso parece ser explorado pelos exemplares pequenos de H.wheatlandii (< 15 cm de CP), que se alimentam primariamente de invertebradosaquáticos e foram capturados principalmente junto às corredeiras onde essas plantascrescem em abundância.Segundo Winemiller (1992), a forma dos dentes dos Characiformes é um bomindicativo sobre as diferenças no comportamento e no uso de recursos alimentares. EmH. wheatlandii, além do aumento no tamanho do intestino, ocorrem mudanças noformato dos dentes com o crescimento e estas também foram associadas à mudança nohábito alimentar de invertívoros para herbívoros (Castro et al., 2004). Característicassemelhantes (adultos com intestino longo e dentes com cúspides arredondadas) foramdescritas para Mylesinus paraschomburgkii e Tometes lebaili em rios amazônicos,embora nessas espécies a alimentação dos adultos seja mais especializada incluindoquase exclusivamente podostemáceas (Jégu & Santos, 1988; Jégu et al., 1989; Santos etal., 1997; Jégu & Keith, 2005). Nas outras espécies, cuja dieta incluiu podostemáceas(Vilella et al., 2002; Zanata & Lima, 2005), não estão descritas mudanças ontogenéticasna dentição e trato digestivo, fato que pode estar associado as mesmas não seremherbívoras quando adultas.Entre os exemplares analisados de H. wheatlandii, os que estavam em estádioavançado de maturação das gônadas ou desovados/espermiados, foram capturados emmarço de 2005, com o menor peixe medindo 20 cm de comprimento padrão. Esse é umindicativo que a repodução ocorre durante o período chuvoso, padrão descrito paragrande parte dos Characiformes da América do Sul (Vazzoler & Menezes, 1992). Amaturação sexual parece ser alcançada após as mudanças ontogenéticas descritas para adieta, embora não pareça ocorrer concomitantemente. Apesar desse indicativo, estudoscom maior número de exemplares são necessários para validar essas observações.Da mesma forma que para M. paraschomburgkii (Thatcher & Jégu, 1996; Santoset al., 1997), também em H. wheatlandii foi registrado que partes do intestino de todosos exemplares grandes e com hábito alimentar herbívoro encontravam-se tomadas pornematóides. Santos et al. (1997) colocaram em dúvida ser esse um caso de parasitismo,77


visto que todos os exemplares analisados estavam em excelentes condições nutricionaise sem qualquer sinal de patologias. A mesma observação se aplica a H. wheatlandii,restando estudos mais detalhados para definir a verdadeira relação entre o hospedeiro eos nematóides encontrados em seu trato digestivo.Tanto B. opalinus como L. thayeri foram descritos a partir de exemplares do rioParaíba do Sul (Garavello & Britski, 2003; Lima, 2003), sendo que mais recentementetiveram populações localizadas em outras drenagens do leste brasileiro (Vieira, 2005; J.Birindelli, com. pes.; obs. pes.). Assim, a distribuição confirmada das duas espéciesabrange a área entre as drenagens que vão do rio Doce ao Paraíba do Sul, não sendoválida a indicação de ocorrência de L. thayeri feita para o rio Jequitinhonha porGaravello & Britski (2003). Na bacia do rio Doce, as únicas populações representativasdas duas espécies são as existentes no médio e alto rio Santo Antônio. Os únicosregistros adicionais estão restritos ao rio Piranga (B. opalinus – MZUSP 59287) ecórrego Taquaraçu (L. thayeri – MZUSP 41727), ambos os lotes representados por umexemplar cada e que foram coletados há mais de uma década.Brycon opalinus é uma espécie reofílica, necessitando indução hormonal paradesovar quando mantido em cativeiro (Narahara et al., 2002). No rio Santo Antônio,foram registrados exemplares de até 30 cm e que no seu conjunto apresentaramcrescimento isométrico. O menor exemplar em atividade reprodutiva mediu 21centímetros de comprimento padrão e foi registrado em março de 2005, semelhante aoencontrado para H. wheatlandii.A dieta foi composta quase exclusivamente por recursos alóctones (insetos, frutose sementes), caracterizando o hábito alimentar onívoro, padrão reconhecido para amaioria das espécies desse gênero (Menezes, 1969; Goulding, 1980; Horn, 1997; Sabino& Sazima, 1999; Lima & Castro, 2000). Embora o coeficiente intestinal tenhaapresentado correlação significativa em relação ao crescimento, o valor máximo de 1,2foi inferior àquele relatado para B. guatemalensis, cujos exemplares adultos possuemintestino maior que o dobro do tamanho e apresentam dieta composta quaseinteiramente por frutos e folhas (Drewe et al., 2004). Entretanto, esses autoresargumentaram que o aumento ontogenético no comprimento do intestino pode ser umacaracterística comum para Brycon sem conexão com troca de dieta, sendo nesse caso aquantidade de material vegetal ingerido o elemento crítico para a compreensão dessarelação. Nossos dados corroboram essa premissa, uma vez que exemplares grandes de78


B. opalinus possuem dieta mais diversificada e relação intestino/comprimento menorque B. guatemalensis.Espécies de Brycon têm sido relacionadas a processos de dispersão de sementes,principalmente em áreas de florestas alagáveis (Horn, 1997; Goulding, 1980; Banack et.al., 2002; Drewe et al., 2004). Embora a possibilidade de dispersão de sementes por B.opalinus não tenha sido avaliada, é possível que essa relação não seja tão efetiva naregião de estudo, visto que a maioria das sementes encontradas nos estômagos estavaquebrada. Entretanto, deve-se considerar que os estudos que comprovam a relação deespécies do gênero Brycon como dispersoras foram feitos tendo como modelo Ficusspp., que possui sementes muito pequenas e que não são trituradas para a ingestão(Horn, 1997; Banack et. al., 2002; Drewe et al., 2004). Sob esse aspecto, tanto B.opalinus como H. wheatlandii utilizaram Ficus sp. e podem ser dispersores efetivos,uma relação que necessita maiores investigações. Como relatado para B. guatemalensis(Horn, 1997), a dispersão seria particularmente importante para sítios a montante dolocal onde se encontram as plantas em frutificação, condição provável de ocorrer pelomenos com B. opalinus, para o qual existem indícios de deslocamentos para trechosmais elevados da drenagem durante o período reprodutivo (Vieira et al., 2005).Leporinus thayeri é um anostomídeo relativamente raro e com distribuiçãodisjunta em rios de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo (Vieira, 2005). Nofinal da década de 1970 foi considerado sinônimo de L. mormyrops (Garavello, 1979),condição que perdurou até recente revalidação da espécie (Garavello & Britski, 2003). Éuma espécie de médio porte (maior exemplar com 26 cm) e apresentou crescimentoalométrico negativo, condição que se traduz em animais com corpo baixo e alongado.Adicionalmente, esse formato de corpo é característico de peixes que vivem em trechosencachoeirados e com forte velocidade da corrente, áreas onde a maioria dosexemplares foi capturada.Dados da dieta demostraram que é um ínvertivoro bentônico que utilizou quaseque exclusivamente formas imaturas e adultas de insetos aquáticos, notadamenteTrichoptera e larvas de Diptera. O uso intensivo de larvas de Diptera também foirelatado para L. amblyrhynchus, outro anostomídeo com tamanho e característicasmorfológicas similares a L. thayeri, mas com distribuição geográfica distinta (Callisto etal., 2002; Mendonça et al., 2004). Segundo Winemiller (1992), predadores bentônicostendem a possuir perfil ventral reto e dorsal convexo, boca orientada para baixo enadadeiras peitorais pequenas, todas essas características observadas em L. thayeri.79


Diferente de B. opalinus e H. wheatlandii, L. thayeri não apresentou variaçãoontogenética nos valores do coeficiente intestinal, que esteve entre 0,73 e 1,11 paraexemplares de 9,4 a 20,9 cm de comprimento padrão. Exemplares em atividadereprodutiva foram registrados em diferentes anos de amostragem sempre entre os mesesde novembro e março, coincidindo com o período de chuvas, uma característica comumpara Characiformes do leste brasileiro (Vazzoler & Menezes, 1992).Todas as espécies aqui analisadas são reofílicas e demonstraram que asparticularidades na distribuição espacial, uso de hábitats e de recursos alimentares estãointimamente relacionadas aos ambientes lóticos da drenagem do rio Santo Antônio. Pelomenos três espécies mantêm populações significativas no trecho médio-alto dadrenagem, fato aqui atribuído a ser esse um sistema ainda pouco alterado em termos desua fisiografia. Esse fato indica que programas de conservação são viáveis e podemgarantir a permanência das mesmas a longo prazo. Para B. devillei e S. doceanum, asperspectivas de conservação são menos promissoras, pois as populações parecem estarem acentuado declínio, tanto no Santo Antônio como no restante do rio Doce.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASAbilhoa, V. & Duboc, L. F. 2004. Livro vermelho da fauna ameaçada do Paraná.Curitiba, Instituto Ambiental do Paraná – IAP (Versão eletrônica em:http://celepar7.pr.gov.br/livrovermelho/index.asp?idmenu=intr&idgrupo=0Agostinho, A. A.; Gomes, L. C.; Suzuki, H. I & Júlio Jr., H. F. 2003. Migratory fishesof the Upper Paraná River Basin, Brazil, p. 19-98. In: Carolsfeld, J., Harvey, B.,Ross, C. & Baer, A. (eds.). Migratory fishes of South America: Biology, Fisheriesand Conservation Status. IDRC and World Bank. 372 p.Agostinho, A. A.; Vazzoler, A. E .A. M. & Thomaz, S. M. 1995. The high river Paranábasin: limnological and ichthyological aspects. pp. 59-103 In: Tundisi, J. G.,Bicudo, C. E. M. & Tundisi, T. M. Limnology in Brazil, ABC/SBL, Rio de JaneiroAlves, C. B. M.; Vieira, F.; Magalhães, A. L. B. & Brito, M. F. G (no prelo). Impacts ofnon-native fish species in Minas Gerais, Brazil: present situation and prospects. In:Bert, T. M. (ed.), Ecological and Genetic Implications of Aquaculture Activities,Kluwer Academic Publishers, The NetherlandsAlvim, M. C. C. & Peret, A. C. 2004. Food resources sustaining the fish fauna in asection of the upper São Francisco river in Três Marias, MG, Brazil. BrazilianJournal of Biology, 64(2): 195-20280


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CAPÍTULO 388


ÁREAS P<strong>RIO</strong>RITÁRIAS PARA A CONSERVAÇÃO DA FAUNA DE PEIXESNA DRENAGEM <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>SANTO</strong> ANTÔNIO, <strong>BACIA</strong> <strong>DO</strong> <strong>RIO</strong> <strong>DO</strong>CE, MGRESUMOPoucas áreas têm sido criadas primariamente para a conservação dos ambientes de águadoce, embora se reconheça que essas mantêm biodiversidade expressiva e grande partese encontre ameaçada por impactos ambientais diversos. Nesse estudo utilizamos afauna de peixes como modelo para definir áreas de preservação dentro da bacia do rioSanto Antônio, segundo maior afluente do rio Doce e considerado de importânciaespecial para conservação de peixes em Minas Gerais. Os resultados obtidos indicaramque a bacia constitui um mosaico com diferentes graus de modificação antrópica. Duassubdrenagens (rios do Tanque e Guanhães) e o baixo rio Santo Antônio foram excluídosda estratégia de conservação e para as mesmas são indicadas ações de recuperaçãoambiental. Três áreas foram identificadas e delimitadas, estando distribuídas ao longodo canal principal e nos tributários. No seu conjunto deverão manter a maior parte daictiofauna registrada na bacia, inclusive quatro espécies ameaçadas de extinção. Aestratégia de conservação indicada para os trechos de rios selecionados foi transformálosem Áreas de Proteção Ambiental (APA). Essa nova condição regional teráimplicações econômicas, pois inviabiliza a implantação de quatro usinas hidrelétricas,que no seu conjunto representam 16,3% do potencial hidrelétrico inventariado para todaa bacia. Entretanto, consiste na única forma para que a ictiofauna encontrada atualmentepossa ser mantida em longo prazo.INTRODUÇÃOEm um grande número de revisões recentes há o consenso de que abiodiversidade existente em sistemas de água doce encontra-se altamente ameaçada,sendo que para alguns autores, mais que em qualquer outro ecossistema (ex.: Allan &Flecker 1993; Leidy & Moyle, 1998; McAllister et al., 1997; Ricciardi & Rasmussen,1999; Malmqvist & Rundle, 2002; Saunders et al., 2002). As principais causas sãoamplamente conhecidas e estão relacionadas a perda e degradação de habitats,superexplotação das espécies, poluição, introdução de organismos exóticos e usosdiversos da água - abastecimento, geração de energia, irrigação, etc...(e.g., McAllisteret al., 1997; Revenga & Kura, 2003; Agostinho et al., 2005).89


Segundo Ravenga & Kura (2003), em relação aos vertebrados, avaliaçõesglobais e regionais de biodiversidade em ambientes de água doce incluem maisinformações sobre os peixes que qualquer outro grupo, fato também constatado noBrasil (Agostinho et al., 2005). Essa condição está relacionada a serem essesorganismos os componentes mais conspícuos da biota aquática, apresentarem grandediversidade de espécies, além de serem utilizados como recurso econômico. Entretanto,o maior conhecimento relativo ao grupo não significa que o mesmo esteja em melhorsituação de conservação. No Brasil, das 159 espécies de peixes relacionadas em algumacategoria de ameaça de extinção, 135 (85%) são de água doce (Rosa & Lima, 2005).Desse total, 119 espécies ocorrem no sul e sudeste, região com o maior índice dedesenvolvimento no país e, portanto, com maior pressão sobre os ambientes aquáticosinteriores. É importante destacar que esse número reflete uma análise ainda incompleta,visto que nem todas as espécies existentes nessa porção do território brasileiro foramavaliadas simplesmente pelo desconhecimento de aspectos básicos da biologia,incluindo a distribuição geográfica.Áreas protegidas representam uma solução parcial para a degradação ambiental,entretanto, poucas têm sido criadas especificamente para ambientes de água doce e suabiota (Saunders et al., 2002; Agostinho et al., 2005). No Brasil, essa é uma situaçãomarcante, visto que, apesar dos peixes constituirem o segundo grupo de vertebradoscom maior número absoluto de espécies ameaçadas de extinção (Machado et al., 2005),nenhuma área protegida foi criada prioritariamente para manutenção desses organismos,embora não faltem indicativos para tal (Agostinho, 1997; Marques & Barbosa, 2002;Drummond et al., 2005).. Esse fato certamente guarda relação com a maiorcomplexidade em se preservar sistemas de rios, que se extendem por grandes áreassujeitas aos mais diferentes usos, tornando as ações de conservação mais difíceis edispendiosas (Moss, 2002).O estado de Minas Gerais sempre se destacou em políticas conservacionistas, nãosendo diferente na definição de áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade(Costa et al., 1998; Drummond et al., 2005). Entretanto, apesar de contar com esseinstrumento de planejamento, a falta de ações concretas baseadas nos indicativosapresentados tem levado a perda de importantes áreas para a manutenção dabiodiversidade de peixes no Estado. Adicionalmente, todas as áreas indicadasnecessitam avaliações subseqüentes detalhadas, o que permite traçar seus reais limites e90


definir a ações a serem tomadas, uma condição que não tem sido efetivada para osambientes aquáticos.Em vista do exposto, são apresentados neste capítulo os critérios e odelineamento das áreas para manutenção de peixes na drenagem do rio Santo Antônio,bacia do rio Doce, uma área considerada de importância biológica especial para peixesem Minas Gerais (Drummond et al., 2005).CARACTERÍSTICAS DA DRENAGEM E DA <strong>ICTIOFAUNA</strong> PARADELINEAMENTO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃOOs dados obtidos acerca da distribuição da ictiofauna (capítulos 1 e 2)mostraram padrões diferenciados para as espécies, além de indicarem que nem toda abacia do rio Santo Antônio apresenta o mesmo potencial para conservação. Essaconstatação está relacionada às condições e impactos a que estão submetidasdeterminadas subdrenagens, especificamente os rios Guanhães e Tanque e o trecho dorio Santo Antônio a jusante da UHE Salto Grande.O rio Guanhães é o maior afluente do rio Santo Antônio e, cuja bacia possui asegunda maior densidade populacional (Figura 1). Embora seja a maior subdrenagem,encontra-se bastante alterado em termos estruturais e possui baixa riqueza de espécies,não reunindo nesse momento características desejáveis para um programa deconservação. Como as alterações estruturais estão relacionadas primariamente àeliminação de vegetação ripária e assoreamento, agravado pelo lançamento de esgotos,o mais indicado para essa drenagem será implementar um programa de recuperação,incluindo a eliminação/contenção das fontes de assoreamento, tratamento de esgotos erecomposição da vegetação ciliar.91


Figura 1 – Área percentual das subdrenagens do rio Santo Antônio e respectivasdensidades populacionais estimadas para 2005. Fontes de dados conforme especificadasabaixo (consulta em fevereiro/2006).http://www.alemg.gov.br/index.asp?grupo=estado&diretorio=munmg&arquivo=municipios (população)http://www.ufv.br/dea//hidrotec (área das drenagens)O rio do Tanque representa pouco mais de 10% do total da drenagem e baixadensidade populacional (Figura 1). Entretanto, foram registrados impactos quecontribuem para a perda continuada da qualidade ambiental, refletida na baixadiversidade e ausência de todas as espécies ameaçadas de extinção.O primeiro destes impactos se refere ao complexo de exploração de minério deferro existente no município de Itabira. Apesar de uma série de programas ambientaisem curso nessa região (obs. pes.), uma parcela da drenagem superior foi afetadanegativamente pela construção de barragens de contenção de rejeitos e assoreamento.Deve-se destacar que embora Itabira seja o município mais populoso da bacia (106.016hab. estimados em 2005), seu núcleo urbano que agrega cerca de 90% da população estálocalizado na bacia do rio Piracicaba. Dessa forma, os problemas originados com olançamento de esgotos nos cursos d’água são refletidos em outra drenagem e não no riodo Tanque.O segundo é aqui considerado o mais importante e se refere à pisciculturacomercial do surubim-ponto-e-vírgula (Pseudoplatystoma corruscans X P. fasciatum),implantada no município de Santa Maria do Itabira (Coelho & Cyrino, 2006). Após oinício desse cultivo e devido aos escapes dos tanques-rede, esse peixe alcançou a92


drenagem e se disseminou amplamente pela bacia. Segundo diversos autores (ex.:Moyle & Light, 1996; Lozon & MacIsaac, 1997), o sucesso da invasão por organismosexóticos tem maiores probabilidades de ocorrer em ambientes alterados. Entretanto, ahabilidade e o potencial dos peixes exóticos prosperarem em ambientes alterados eimpactarem a estrutura e função dos ecossistemas aquáticos, sugere que possamrepresentar tanto um sintoma como uma causa de declínio das comunidades nativas(Kennard et al., 2005).Nesse caso em específico, há necessidade de medidas efetivas para evitar queos escapes continuem e o desenvolvimento de um programa de monitoramento daespécie e seu estabelecimento na drenagem. Por se tratar de um híbrido (Coelho &Cyrino, 2006), existe a possibilidade do mesmo não se reproduzir naturalmente noambiente, entretanto, essa hipótese necessita verificação. Desde que essa hipótese sejaverdadeira e havendo o controle rígido dos locais de criação e supressão de qualquernova introdução, a possibilidade de manejo e sua consequente eliminação da baciaestaria assegurada.Por fim, ainda existe marcante atividade relacionada ao desmate das áreas maisíngremes da bacia, o que em última análise contribui para o assoreamento excessivo docurso d’água e perda de qualidade ambiental.A terceira área é representada pelo rio Santo Antônio a jusante da UHE SaltoGrande, região mais densamente povoada da bacia (Figura 1). Embora nessa áreatenham ocorrido espécies nativas exclusivas dessa porção da bacia (Imparfinis sp.,Loricariichthys castaneus, Moenkhausia doceana, Pimelodella sp., Poecilia vivipara,Rineloricaria sp., Trachelyopterus striatulus e Trichomycterus sp.), todas sãorelativamente comuns e possuem distribuição ampla na bacia do rio Doce. As únicasexceções são Microglanis sp. e a piabanha (Brycon devillei), a primeira representando oúnico registro conhecido na bacia do rio Doce e a segunda ameaçada de extinção.Apesar da ocorrência dessas espécies, essa área foi a que apresentou maiornúmero de peixes exóticos, praticamente todos conhecidos para a bacia do rio Doce(Alves et al., no prelo). Adicionalmente, a implantação das duas maiores usinashidrelétricas (Salto Grande e Porto Estrela) nesse trecho da bacia, modificousubstancialmente o padrão diário de vazão do rio Santo Antônio. Em função dessascaracterísticas ocorreu uma perda considerável da qualidade ambiental, traduzida deforma mais evidente no excessivo assoreamento que eliminou as características doshábitats originais.93


Para as cinco espécies ameaçadas de extinção os dados de campo foramcomplementados com as informações da literatura e composta uma avaliação qualitativaem relação ao risco de extinção ao qual estão submetidas na bacia do rio Santo Antônio,cuja síntese é apresentada na Figura 2. A integração dos dados indicou que existe riscode extinção decrescente entre as espécies, sendo S. doceanum e B. devillei as que seencontram em condições mais críticas. As demais espécies, embora tenham sidoregistradas com maiores abundâncias, possuem particularidades próprias que definem assuas possibilidades de permanência na drenagem em longo prazo, em particular o uso dehábitats mais específicos e área de ocorrência menor.Hábitats utilizadosespecíficosvariadosSteindachneridion doceanummaiorrestritaBrycon devilleiHenochilus wheatlandiiLeporinus thayeriBrycon opalinusDistribuição na drenagemmenoramplaFigura 2 – Modelo indicando a probabilidade de extinção, que aumenta no sentido dalinha tracejada, ao qual estão submetidas espécies de peixes ameaçados de extinção comocorrência na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MGmaior menorRaridadeDe especial importância para manutenção da fauna de peixes do rio SantoAntônio será o seu uso futuro para geração de energia, possivelmente a maior ameaçaambiental no curto e médio prazos. Na Tabela I são especificados todos osempreendimentos para a bacia, incluindo os já construídos e em operação e aquelesoutorgados.94


Tabela I – Usinas hidrelétricas implantadas e em estudo para implantação na drenagemdo rio Santo Antônio, bacia do rio Doce, MG.UsinashidrelétricasSituaçãoPotênciainstalada(MW)MunicípioRioPorto Estrela Em operação 112 Açucena, Braúnas e Joanésia Santo AntônioSalto Grande Em operação 102 Braúnas Santo Antônioe GuanhãesDona Rita Em operação 2,4 Santa Maria do Itabira TanqueDores do Guanhães Estudos 12 Dores de Guanhães GuanhãesFunil Construção 22,5 Dores de Guanhães GuanhãesJacaré Estudos 10,5 Dores de Guanhães GuanhãesSenhora do Porto Estudos 9 Dores de Guanhães GuanhãesBrejaúba Estudos 11 Conceição do Mato DentroSanto Antônio do Rio AbaixoMonjolo Estudos 15 Conceição do Mato DentroSanto Antônio do Rio AbaixoQuinquim Estudos 14 Conceição do Mato DentroSanto Antônio do Rio AbaixoPeixePeixeSanto AntônioSumidouro Estudos 13 Conceição do Mato DentroSanto Antônio do Rio AbaixoSanto AntônioFonte: Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Banco de Informações deGeração – BIG. 2003. Disponível em: www.aneel.gov.br/15.htm (consulta emfevereiro/2006).Do potencial total de geração na bacia (323,4 MW), observa-se que 67% já seencontram explorados, restando 33% (107 MW), parte dos quais já licenciados e parteem análise nos órgãos ambientais do Estado. O nosso estudo indicou que desses 107MW restantes é possível explorar 54 MW, distribuídos em quatro usinas, todaslocalizadas no rio Guanhães, considerado aqui como menos importante paraconservação. As demais, localizadas na calha do rio Santo Antônio e baixo rio do Peixe,são consideradas incompatíveis com a manutenção das áreas aqui identificadas paraconservação da ictiofauna, notadamente as espécies ameaçadas de extinção.AS ÁREAS SELECIONADAS PARA CONSERVAÇÃOCom base na exclusão de parte das drenagens e demais características discutidasanteriormente, o restante da bacia foi analisado para definir duas questões fundamentais:maior número de espécies de peixes mantidas em longo prazo X menor áreanecesssária para proteção efetiva. Atendendo a essas premissas foram selecionadas trêsregiões que em seu conjunto deverão garantir a manutenção de populações95


significativas da maioria das espécies de peixes conhecidas na bacia, cujo mapa sínteseé mostrado na Figura 3.A primeira área é representada pela drenagem do rio Preto do Itambé. Aliado asboas características ambientais e estruturais, essa drenagem abriga ictiofauna muitodiversa e com populações do andirá (H. wheatlandii), da pirapitinga (B. opalinus) e dotimburé (L. thayeri), embora somente as duas últimas sejam abundantes. Outrascondições positivas para a seleção dessa drenagem são: Ausência de grandes fontes de impacto, excetuando-se aquelas representadas pelolançamento de esgotos. Continuidade com a área do Parque Nacional da Serra do Cipó, onde está a nascentedo seu principal afluente, o rio do Peixe. Não existirem aproveitamentos hidrelétricos previstos ao longo de toda a drenagem. Ser a maior drenagem com águas de coloração escura, que embora não tenharepresentado um ambiente específico para peixes, necessita de estudos detalhadospara os demais organismos aquáticos, parte dos quais podem ser exclusivos dessetipo de ambiente. Um bom exemplo são as podostemáceas, plantas aquáticasimportantes para os peixes do rio Santo Antônio, para as quais recentemente foramdescritos gêneros e espécies endêmicas de rios de águas escuras na cadeia doEspinhaço em Minas Gerais (Philbrick et al., 2004a; 2004b).A segunda área em importância é o canal central do rio Santo Antônio e baixocurso do rio do Peixe. Essa área compreende a região que se inicia a jusante da foz dorio do Tanque e se estendende para montante até a foz do ribeirão Mata-Cavalos. No riodo Peixe seu limite superior foi posicionado junto à foz do ribeirão Folheta, localizadoabaixo do núcleo urbano de Dom Joaquim. Essa área foi selecionada por ser a únicaonde existem registros do surubim-do-Doce (S. doceanum), por manter as maiorespopulações das espécies ameaçadas de extinção e pela maior riqueza de espécies.Fator potencial de mudança ambiental está relacionado à existência de quatrobarramentos projetados e já em estudos (Tabela I). Apesar desse problema, essa área éprimordial no contexto de manutenção da ictiofauna da bacia.A terceira área compreende a drenagem do rio Parauninha, que apresentacomunidade de peixes bastante representativa. Adicionalmente, essa região encontra-sepouco alterada e com baixa densidade populacional, condições desejáveis para uma áreaa ser protegida. Essa drenagem também é utilizada como área para reprodução de L.96


thayeri, além de várias espécies de pequeno porte e que vivem associadas a trechos decorredeiras.Após a seleção das áreas procurei enquadrá-las dentro das categorias definidaspelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação Nacional (SNUC) (Costa, 2006)Segundo as proposições apresentadas em Boon (1992), concluímos que a bacia do rioSanto Antônio constitui um caso para conservação onde a estratégia a ser adotada será alimitação de usos. Com base nessa premissa concluímos que as três áreas possuemcaracterísticas adequadas para enquadramento como APA (Áreas de ProteçãoAmbiental), cuja definição é apresentada a seguir.“As APAs são áreas submetidas ao planejamento e à gestão ambiental e se destinam a compatibilizaçãode atividades humanas com a preservação da vida silvestre, a proteção dos recursos naturais e a melhoriada qualidade de vida da população local. Elas podem compreender uma ampla gama de paisagensnaturais, semi-naturais ou alteradas, com características bióticas, abióticas, estéticas ou culturaisnotáveis que exijam proteção para assegurar as condições ecológicas locais. Podem conter ecossistemasurbanos ou outras Unidades de Conservação mais restritivas em termos de utilização, e permitem aexperimentação de novas técnicas e atitudes que possibilitem conciliar o uso da terra e o desenvolvimentoregional com a manutenção dos processos ecológicos essenciais” (Costa, 2006).Além de disciplinar o uso adequado da drenagem, a efetivação dessas áreascomo APA’s deverá ser capaz de conciliar as atividades econômicas com a conservaçãoda maior parte da ictiofauna encontrada na bacia. Por outro lado, evitará a necessidadede exaustivos processos de desapropriação e uso de amplos recursos financeiros, em suamaioria bastante limitados (Darwall & Vié, 2005; Grammont & Cuarón, 2006), quetornam a implementação de UC’s no Brasil um processo muito lento.Adicionalmente, ainda falta uma definição de atividades que poderão sercompatíveis com os objetivos de uma APA, fato que demanda uma análise maiscriteriosa e particular em cada uma das áreas selecionadas, o que se traduz naelaboração de seus respectivos planos de manejo. Apesar dessa informação não estardisponível em sua totalidade, constitui um fato que as usinas hidrelétricas previstas nasáreas selecionadas não são compatíveis com os propósitos de conservação aquiapresentados. Dessa forma, embora com implicações econômicas negativas, essasusinas hidrelétricas devem ser consideradas inviáveis dentro do planejamento regionalonde o objetivo seja a manutenção desse importante componente da ictiofaunaneotropical.97


42 o 00’v v v18 o 30’Espinhaçov vv v vGuanhãesriov v vÁreas selecionadasCadeia de montanhasCidadesCursos d’águaUHE’s implantadas3v v vv vrioPara uninhaConceição doMato DentrorioCorrenteGrande44 o 00’1dov vParque Nacional daSerra do CipóCadeiavv vv vvvvriorioPretoItambé doMato DentroriodoPeixerioSantoItambédodoItabiraFerrosS. Sebastião doRio PretoTanqueAntônio DiasGuanhãesAntôniorioPiracicabaBeloOrienteIpatingaoDoce2rioDoce0 20kmSenhora daPenha19 o 30’vrioFigura 3 – Áreas prioritárias para a conservação da ictiofauna na drenagem do rio Santo Antônio, bacia do rio Doce,MG. 1 = Rio Preto do Itambé; 2 = Rio Santo Antônio e 3 = Rio Parauninha.98


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