Originais â Originals outubro | dezembro ⢠2011 - IPUB - UFRJ
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ISSN 0047-2085<br />
CODEN JBPSAX<br />
4<br />
<strong>outubro</strong> | <strong>dezembro</strong> • <strong>2011</strong><br />
Volume 60, Número 4, <strong>2011</strong><br />
<strong>Originais</strong> – <strong>Originals</strong><br />
Validação psicométrica do Cocaine Craving Questionnaire-Brief – Versão Brasileira Adaptada<br />
para o Crack para dependentes hospitalizados<br />
Eating habits and psychopathology: translation, adaptation, reliability of the Nutrition Behavior<br />
Inventory to Portuguese and relation to psychopathology<br />
Simulator Sickness Questionnaire: tradução e adaptação transcultural<br />
Validade discriminante do Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey: comparação entre<br />
idosos normais e idosos na fase inicial da doença de Alzheimer<br />
Associação entre polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR e a resposta ao tratamento da<br />
dependência de nicotina<br />
Alterações cognitivas em indivíduos brasileiros com esclerose múltipla surto-remissão<br />
Comorbidades clínicas e psiquiátricas em pacientes com transtorno bipolar do tipo I<br />
Sintomas depressivos em crianças e adolescentes com anemia falciforme<br />
Satisfação de familiares de pacientes psiquiátricos com os serviços de saúde mental<br />
e seus fatores associados<br />
Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio em um município no interior da Bahia<br />
Cardio-respiratory symptoms in panic disorder: a contribution from cognitive-behaviour therapy<br />
Insatisfação corporal de adolescentes atletas e não atletas<br />
Body image dissatisfaction and its relationship with physical activity and<br />
body mass index in Brazilian adolescents
Órgão Oficial do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro<br />
Official Journal of the Institute of Psychiatry - Federal University of Rio de Janeiro<br />
Editores<br />
Antônio Egidio Nardi<br />
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J82<br />
Jornal Brasileiro de Psiquiatria/Universidade Federal do Rio de Janeiro.<br />
Instituto de Psiquiatria. – Rio de Janeiro, 1948 -.<br />
v.60, n.4 <strong>2011</strong><br />
Trimestral ISSN 0047-205801965 – a responsabilidade passa a ser da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Psiquiatria<br />
1982 – publicado pela ECN ed. Científica Nacional<br />
Editado pela Segmento Farma Editores a partir do v.56, n.1-4, 2007<br />
Continuação de: Anais do Instituto de Psiquiatria 1942-1947<br />
1. Psiquiatria - Periódicos brasileiros. I. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Psiquiatria<br />
CDD 616.89<br />
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sumário<br />
Artigos originais – Original articles<br />
Validação psicométrica do Cocaine Craving Questionnaire-Brief – Versão<br />
Brasileira Adaptada para o Crack para dependentes hospitalizados<br />
Psychometric validation of Cocaine Craving Questionnaire-Brief –<br />
Brazilian Crack Adapted Version inpatients dependents<br />
Renata Brasil Araujo, Maria da Graça Tanori de Castro, Rosemeri Siqueira Pedroso, Paola Lucena dos Santos,<br />
Letícia Leite, Marcelo Rossoni da Rocha, Ana Cecília Petta Roselli Marques..............................................................................233<br />
Eating habits and psychopathology: translation,<br />
adaptation, reliability of the Nutrition Behavior Inventory<br />
to Portuguese and relation to psychopathology<br />
Hábitos alimentares e psicopatologia: tradução, adaptação, confiabilidade do Nutrition<br />
Behavior Inventory para o português e correlação com a psicopatologia<br />
Cássia Roberta Benko, Antonio Carlos de Farias, Mara L. Cordeiro.............................................................................................240<br />
Simulator Sickness Questionnaire: tradução e adaptação transcultural<br />
Simulator Sickness Questionnaire: translation and cross-cultural adaptation<br />
Marcele Regine de Carvalho, Rafael Thomaz da Costa, Antonio Egidio Nardi............................................................................247<br />
Validade discriminante do Teste de Aprendizagem<br />
Auditivo-Verbal de Rey: comparação entre idosos normais<br />
e idosos na fase inicial da doença de Alzheimer<br />
Discriminant validity of the Rey Auditory Verbal Learning Test: comparison between<br />
normal elderly and elderly patients in early stages of Alzheimer’s disease<br />
Mariana Fonseca Cotta, Leandro Fernandes Malloy-Diniz, Fábio Lopes Rocha, Maria Aparecida Camargos Bicalho,<br />
Rodrigo Nicolato, Edgar Nunes de Moraes, Jonas Jardim de Paula ...........................................................................................253<br />
Associação entre polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR e a<br />
resposta ao tratamento da dependência de nicotina<br />
Association between polymorphism SLC6A3 3’UTR VNTR and<br />
response to treatment of nicotine dependence<br />
Guilherme Rubino de Azevedo Focchi, Ismael Dale Cotrim Guerreiro da Silva, Sandra Scivoletto.............................................259<br />
Alterações cognitivas em indivíduos brasileiros<br />
com esclerose múltipla surto-remissão<br />
Cognitive profile of Brazilian individuals with relapsing-remitting multiple sclerosis<br />
Marco Aurélio Negreiros, Jesus Landeira-Fernandez, Cíntia Villela Kirchmeyer, Renata Alves Paes, Regina Alvarenga,<br />
Paulo Mattos...............................................................................................................................................................................266<br />
Comorbidades clínicas e psiquiátricas em pacientes<br />
com transtorno bipolar do tipo I<br />
Psychiatric and medical comorbidities in type 1 bipolar disorder patients<br />
Izabela Guimarães Barbosa, Rodrigo de Almeida Ferreira, Rodrigo Barreto Huguet, Fábio Lopes Rocha,<br />
João Vinícius Salgado, Antônio Lúcio Teixeira............................................................................................................................271<br />
Sintomas depressivos em crianças e adolescentes com anemia falciforme<br />
Depressive symptoms in children and adolescents with sickle cell anemia<br />
Felipe José Nascimento Barreto, Rosana Cipolotti......................................................................................................................277<br />
Satisfação de familiares de pacientes psiquiátricos com os<br />
serviços de saúde mental e seus fatores associados<br />
Family satisfaction in mental health services and associated factors<br />
Marina Bandeira, Mônia Aparecida da Silva, Cleucimara Aparecida Camilo, Cynthia Mara Felício............................................284
sumário<br />
Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio<br />
em um município no interior da Bahia<br />
Suicide attempts and suicide mortality in a countryside Bahia city<br />
Viviane dos Santos Souza, Murilo da Silva Alves, Lívia Angeli Silva, Débora Cristiane Silva Flores Lino,<br />
Adriana Alves Nery, Cezar Augusto Casotti.................................................................................................................................294<br />
Cardio-respiratory symptoms in panic disorder: a<br />
contribution from cognitive-behaviour therapy<br />
Sintomas cardiorrespiratórios no transtorno de pânico: uma contribuição da terapia cognitivo-comportamental<br />
Anna Lucia Spear King, Adriana Cardoso de Oliveira e Silva, Alexandre Martins Valencça, Antonio Egidio Nardi.....................301<br />
Insatisfação corporal de adolescentes atletas e não atletas<br />
Body dissatisfaction of teen athletes and non-athletes<br />
Leonardo de Sousa Fortes, Valter Paulo Neves Miranda, Ana Carolina Soares Amaral, Maria Elisa Caputo Ferreira.................309<br />
Body image dissatisfaction and its relationship with physical<br />
activity and body mass index in Brazilian adolescents<br />
Insatisfação com a imagem corporal e sua relação com atividade física<br />
e índice de massa corporal em adolescentes brasileiros<br />
Maria F. Laus, Telma M. Braga Costa, Sebastião S. Almeida....................................................................................................... 315<br />
Revisões de literatura – Literature reviews<br />
A patogênese genética e molecular da síndrome de Angelman<br />
The genetic and molecular pathogenesis of the Angelman syndrome<br />
Angelica Francesca Maris, Alexis Trott .......................................................................................................................................321<br />
Revisão dos métodos empregados na avaliação da dimensão<br />
corporal em pacientes com transtornos alimentares<br />
Review of methods employed in the assessment of body size in patients with eating disorders<br />
Bianca Elisabeth Thurm, Maria Luiza de Jesus Miranda, Fabio Tapia Salzano, Raphael Cangelli Filho,<br />
Táki Athanássios Cordás, Eliane Florêncio Gama.........................................................................................................................331<br />
Comunicações breves – Brief communications<br />
Formas deficitária e não deficitária da esquizofrenia não diferem quanto<br />
à sazonalidade de nascimentos nas regiões Sul e Sudeste do Brasil<br />
Deficit and non-deficit schizophrenia do not differ regarding season<br />
of birth in Brazilian Southern and Southeast regions<br />
Victor M. V. Lopes, Cláudio E. M. Banzato, Clarissa R. Dantas....................................................................................................337<br />
Escolha de alimentos durante a abstinência alcoólica:<br />
influência na fissura e no peso corporal<br />
Food choice during alcohol abstinence: influence in craving and body weight<br />
Mayla Cardoso Fernandes Toffolo, Izabelle de Sousa Pereira, Karine Aparecida Louvera Silva, Cláudia Aparecida Marliére,<br />
Aline Silva de Aguiar Nemer........................................................................................................................................................341<br />
Relato de caso – Case report<br />
Considerações sobre a clínica e o tratamento de uma<br />
manifestação incomum do transtorno dismórfico<br />
corporal: a síndrome de referência olfatória<br />
Considerations on the clinical picture and treatment of an unusual manifestation<br />
of body dysmorphic disorder: the olfactory reference syndrome<br />
Cristiane Maluhy Gebara, Tito Paes de Barros Neto....................................................................................................................347
Agradecimento aos pareceristas 2010<br />
pareceristas do jornal brasileiro de psiquiatria volume 60 de <strong>2011</strong><br />
Adriana Cardoso<br />
Albina Torres<br />
Alexandre Valença<br />
Alessandra Diehl<br />
Ana Carolina Mathias<br />
Ana Hounie<br />
Ana Luiza Camozzato<br />
André Carvalho<br />
André F. Carvalho<br />
Andrea Deslandes<br />
Andréa Lopez<br />
Angela Scippa<br />
Angélica Espinosa Miranda<br />
Antonio Teixeira<br />
Antonio Zuardi<br />
Arthur Guerra de Andrade<br />
Bruno Mendonça Coelho<br />
Bruno Nazar<br />
Camila Guindalini<br />
Camila Martiny<br />
Carla de Meis<br />
Carla Maluf<br />
Claiton Bau<br />
Claudia Roberta de Castro Moreno<br />
Daniela Braga<br />
Daniela Dantas Lima<br />
Daniele Marano<br />
Deniela Braga<br />
Elias Abdalla<br />
Elisabeth Meyer<br />
Elisa Kozasa<br />
Fabiana Kohlrausch<br />
Fábio Henrique Porto<br />
Fernando Silva Neves<br />
Flávio Alheira<br />
Fernando Volpe<br />
Gastão Soares Filho<br />
Gisele Gus Manfro<br />
Gisele Huf<br />
Heloisa Helena Alves Brasil<br />
Helena Moraes<br />
Hudson de Carvalho<br />
Humberto Correa<br />
Inah Proença<br />
Ivan Aprahamian<br />
Jair Mari<br />
João Felicio Rodrigues Neto<br />
José Augusto Bragatti<br />
José Taborda<br />
José Alexandre Crippa<br />
Júlia Fontenelle<br />
Juliana Gois<br />
Julio Peres<br />
Kátia Petribú<br />
Leonardo Fontenelle<br />
Leandro Malloy-Diniz<br />
Lisieux Telles<br />
Lívia Santana<br />
Luciana de Avila Quevedo<br />
Manoel Freire de Oliveira Neto<br />
Marcelo Cruz<br />
Marcelo Papelbaum<br />
Maria Antonia Serra<br />
Maria Paula Magalhães<br />
Maria Tavares Cavalcanti<br />
Marina Bandeira<br />
Marle Alvarenga<br />
Michelle Levitan<br />
Neusa Sica da Rocha<br />
Paula V. Nunes<br />
Patricia Tirico<br />
Pedro de Alvarenga<br />
Priscila Duarte<br />
Rafael Ferreira Garcia<br />
Rafael Freire<br />
Rafael Garcia<br />
Regis Barros<br />
Ricardo Arida<br />
Roberto Ratzke<br />
Rodolfo N. Campos<br />
Rodrigo de Oliveira Moreira<br />
Rodrigo Moreira<br />
Ronaldo Laranjeiras<br />
Rosemeri Pedroso<br />
Sérgio Blay<br />
Táki Athanássios Cordás<br />
Themis Torres<br />
Tiago da Silva Alexandre<br />
Tatiana Moya<br />
Valéria Pagnin<br />
Valeska Pereira<br />
Valeska Marinho<br />
Vera Lemgruber<br />
Vilma Aparecida da Silva<br />
William Berger<br />
Ygor Ferrão
artigo original<br />
Validação psicométrica do Cocaine Craving<br />
Questionnaire-Brief – Versão Brasileira Adaptada<br />
para o Crack para dependentes hospitalizados<br />
Psychometric validation of Cocaine Craving Questionnaire-Brief<br />
– Brazilian Crack Adapted Version inpatients dependents<br />
Renata Brasil Araujo 1 , Maria da Graça Tanori de Castro 2 , Rosemeri Siqueira Pedroso 3 , Paola Lucena dos<br />
Santos 4 , Letícia Leite 4 , Marcelo Rossoni da Rocha 4 , Ana Cecília Petta Roselli Marques 5<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
CCQ-B, craving, validação,<br />
crack/cocaína.<br />
Introdução: O craving (ou fissura) é um fator muito importante no tratamento da dependência<br />
de substâncias psicotrópicas. Objetivo: Validar o Cocaine Craving Questionnaire-<br />
-Brief – Versão Brasileira Adaptada para o Crack. Método: O delineamento foi experimental<br />
e seus participantes foram randomizados, em grupos: experimental, para o qual foi apresentada<br />
uma imagem de um indivíduo consumindo crack (G1), e controle (G2), para o qual<br />
não foi apresentada nenhuma imagem. A amostra foi composta por 109 sujeitos (G1 = 50<br />
e G2 = 59) do sexo masculino, internados por causa da dependência do crack. Os instrumentos<br />
utilizados foram: Entrevista Clínica com dados sociodemográficos, CCQ-B Versão<br />
Adaptada para o Crack, Escala Analógico-Visual do Craving, Inventários Beck de Ansiedade<br />
e de Depressão e o Estímulo Visual indutor de craving para o G1. Resultados: Na análise<br />
fatorial, foram encontrados dois fatores: o fator 1, relacionado ao craving propriamente dito,<br />
e o fator 2, relacionado à percepção da falta de controle do uso do crack. Os dois fatores<br />
apresentaram variância total de 68,84%, e a correlação entre os fatores foi significativa e de<br />
baixa intensidade (r = 0,204; p = 0,041). O alfa de Cronbach do seu total de pontos foi 0,85.<br />
O instrumento no total de pontos foi correlacionado com a Escala Analógico-Visual (r =<br />
0,515; p < 0,01). Conclusão: O CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para o Crack demonstrou<br />
ser, psicometricamente, satisfatório para utilização em pesquisas e em ambiente clínico.<br />
ABSTRACT<br />
Background: The craving is a very important factor in the treatment of drug addiction. Objective:<br />
Validate the Cocaine Craving Questionnaire-Brief – Brazilian Crack Adapted Version. Method:<br />
Subjects enrolled in this experimental study were randomized into groups: experimental<br />
for this group was shown an image of a subject using crack (G1) and control (G2) for this group<br />
no pictures were shown. The sample was composed of 109 subjects (G1 = 50 and G2 = 59), ma-<br />
Recebido em<br />
28/7/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
1/12/<strong>2011</strong><br />
1 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Hospital Psiquiátrico São Pedro, Cognitá – Clínica de Terapia Cognitivo-<br />
-Comportamental.<br />
2 PUCRS.<br />
3 Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas.<br />
4 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).<br />
5 Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).<br />
Endereço para correspondência: Maria da Graça Tanori de Castro<br />
Rua Mariante, 288, sala 407, Rio Branco – 90430-181 – Porto Alegre, RS<br />
Tels.: (51) 3222-1154/(51) 9983-8430<br />
E-mail: mgdc@uol.com.br
234 Araujo RB et al.<br />
artigo original<br />
Keywords<br />
CCQ-B, craving, validation,<br />
crack/cocaine.<br />
les, crack/cocaine dependent inpatients. The assessment instruments were: Clinical Interview with<br />
social and demographic data, CCQ-B – Crack Adapted Version; Visual Analogic Scale for Craving,<br />
Anxiety and Depression Beck and Inventories Visual Cue to elicit craving. Results: On the factorial<br />
analysis two factors were found: Factor 1, related to craving itself, and Factor 2, the perceived lack<br />
of control of crack use. The two-factor factorial analysis presented a total variation of 68.84%, and<br />
the correlation between these factors was significant and of low intensity (r = 0.204; p = 0.041).<br />
A Cronbach’s alpha value from total of points of scale was 0.85. We observed a correlation between<br />
the scale total score and the Visual Analogic Scale (r = 0.515; p < 0.01). Conclusion: The Cocaine<br />
Craving Questionnaire-Brief – Brazilian Crack Adapted Version proved to be an adequate psychometric<br />
instrument for use in research and in clinical settings.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A cocaína, utilizada na forma de pedra, denominada “crack”, é<br />
uma substância psicoativa e psicotrópica, cujo consumo tem<br />
aumentado, assim como a busca por tratamento 1 . Esse consumo<br />
está associado à alta mortalidade entre os usuários 2 .<br />
O craving ou fissura, por outro lado, é uma variável muito<br />
importante na compreensão da dependência, pois influencia<br />
a evolução e a gravidade da síndrome de abstinência, como<br />
também pode determinar a recaída 3,4 . O craving é um dos critérios<br />
da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) a ser<br />
avaliado no diagnóstico de dependência de substância, sendo<br />
descrito no critério A como um desejo forte ou senso de<br />
compulsão por consumir a substância 5 ; o DSM-IV 6 também<br />
lista o craving como um dos critérios a ser considerado, descrito<br />
como um desejo persistente. Sabe-se que o craving do<br />
crack é muito intenso, fenômeno que pode estar relacionado<br />
à via de administração, que produz rápida sensibilização<br />
das áreas dopaminérgicas, e da mesma forma ocorre rápida<br />
diminuição do seu efeito 7 . Apesar da relevância do craving,<br />
não existem muitos instrumentos de avaliação desse sintoma<br />
em usuários de crack/cocaína. O craving tem sido pesquisado<br />
por alguns autores utilizando “gatilhos” como imagens<br />
associadas à substância, para sua indução e aferição, como<br />
o estudo conduzido por Tiffany e Drobes 8 e Zeni e Araujo 9 .<br />
Em nosso meio, Zeni e Araujo utilizaram estímulo visual com<br />
fotografias para induzir o craving por nicotina e crack 9 .<br />
Assim, o Cocaine Craving Questionnaire-Brief (CCQ-B) foi<br />
desenvolvido por Sussner et al. em 2006 10 , a partir do Cocaine<br />
Craving Questionnaire-Now (CCQ-Now) 11 , versão longa do<br />
instrumento, a qual foi validada no Brasil por Silveira et al. 12 .<br />
Na validação psicométrica da versão original do CCQ-B,<br />
foi realizado um estudo de validade convergente com o<br />
CCQ-Now, o qual obteve correlação positiva de intensidade<br />
muito alta, demonstrando a excelente consistência interna<br />
do instrumento 10 . Palihal et al. 11 também utilizaram o CCQ-B<br />
e verificaram que escores mais altos nesse instrumento eram<br />
indicadores de recaída em dependentes de cocaína.<br />
Em 2009, foi publicada, no Brasil, a Validação Semântica<br />
do CCQ-B e de sua versão adaptada para o crack 12 . A validação<br />
semântica é um primeiro passo no processo de validação<br />
de um instrumento, já que proporciona a confiança de<br />
que as adaptações de linguagem relacionadas a diferentes<br />
países foram realizadas, no entanto é necessário que haja<br />
uma confirmação de que as propriedades psicométricas do<br />
instrumento também estão adequadas, sendo definida a sua<br />
forma de análise e seus pontos de corte 13 . Assim, o objetivo<br />
deste estudo é realizar, de forma inédita, a validação psicométrica<br />
do CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para o Crack<br />
em dependentes internados para desintoxicação.<br />
MÉTODO<br />
Delineamento<br />
Foi realizado um estudo experimental, no qual a variável craving<br />
foi manipulada pela exposição de um estímulo visual.<br />
Os pacientes foram divididos, por sorteio, em dois grupos:<br />
o G1 (grupo experimental), para o qual foi apresentada uma<br />
fotografia de um indivíduo utilizando crack, e G2 (grupo controle),<br />
para o qual não foi apresentado nenhum estímulo.<br />
Amostra<br />
O tamanho da amostra foi definido segundo o critério de Hair<br />
Jr., que preconiza um número de 10 sujeitos por variável para a<br />
utilização da análise fatorial 14 . A amostra foi composta por 109<br />
indivíduos dependentes de crack/cocaína, segundo os critérios<br />
da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) 5 , hospitalizados<br />
para desintoxicação em uma unidade masculina especializada,<br />
na faixa etária de 18 a 60 anos, com escolaridade mínima<br />
de quatro anos. O crack era a droga de preferência, sendo<br />
o último uso relatado no mínimo há sete e, no máximo, 21 dias.<br />
Foram excluídos participantes com dificuldades para a<br />
leitura e a compreensão do questionário, aferidas na entrevista<br />
clínica, que prejudicassem o entendimento das escalas.<br />
Os participantes foram divididos, aleatoriamente por sorteio,<br />
em dois grupos: no Experimental (G1), foi apresentada uma<br />
foto com a imagem de alguém consumindo crack antes da<br />
aplicação dos instrumentos, e no Controle (G2), não foi apresentada<br />
a foto antes da aplicação.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
artigo original<br />
Cocaine Craving Questionnaire versão brasileira<br />
235<br />
Instrumentos<br />
1) Entrevista composta por informações sociodemográficas<br />
e descrição do padrão de uso de substâncias psicoativas e<br />
psicotrópicas.<br />
2) Cocaine Craving Questionnaire-Brief (CCQ-B) 10 : escala<br />
com 10 itens, tipo Likert, de 7 pontos, que vai de “discordo<br />
totalmente” até “concordo totalmente”. O escore do CCQ-B,<br />
na validação original 10 , foi obtido a partir da soma de pontos<br />
de todas as questões, não sendo subdividida em fatores. Foi<br />
utilizada, neste estudo, a Versão Brasileira Adaptada para o<br />
Crack, publicada por Araujo et al. 13 . A versão brasileira, na validação<br />
psicométrica, distribuiu-se em dois fatores: o fator 1<br />
representa o constructo do craving, e o fator 2, a falta de controle<br />
do uso do crack. A escala pode ser avaliada a partir de<br />
seu escore total (com as questões 4 e 7 invertidas, devendo<br />
ser somadas às demais), a partir dos pontos do fator 1 (soma<br />
de todas as questões, exceto a 4 e a 7) e do fator 2 (soma<br />
das questões 4 e 7 invertidas). Os pontos de corte da escala<br />
podem ser observados na tabela abaixo:<br />
Pontos de Corte do CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para o Crack<br />
Escala Grau<br />
Craving<br />
CCQ-B – Versão Brasileira<br />
Adaptada para o Crack –<br />
Escore Total<br />
Fator 1 Fator 2<br />
Mínimo 0 a 11 pontos 0 a 7 pontos 0 a 2 pontos<br />
Leve 12 a 16 pontos 8 a 9 pontos 3 a 4 pontos<br />
Moderado 17 a 22 pontos 10 a 11 pontos 5 a 6 pontos<br />
Grave 23 ou mais pontos 12 ou mais pontos 7 ou mais pontos<br />
3) Escala Analógico-Visual de avaliação do craving pelo<br />
crack no momento (EAV): consiste em uma linha de 10 centímetros,<br />
numerados de 0 a 10, que visa medir a intensidade<br />
de craving (fissura) pelo crack, significando o 0 “nenhuma<br />
fissura” e o 10 “muita fissura”. Essa escala já foi utilizada no<br />
estudo de Zeni e Araujo 9,15 .<br />
4) Inventário Beck de Ansiedade (BAI), desenvolvido por<br />
Steer e Beck 16 , validado para o Brasil por Cunha 17 . Consiste em<br />
um questionário que tem por objetivo medir a gravidade dos<br />
sintomas de ansiedade e é composto por 21 itens. O escore<br />
total é obtido pelo somatório dos escores de cada item. Os<br />
pontos de corte para pacientes psiquiátricos são: de 0 a 10: mínimo;<br />
de 11 a 19: leve; de 20 a 30: moderado; de 31 a 63: grave.<br />
5) O Inventário Beck de Depressão (BDI) é um dos instrumentos<br />
mais usados, tanto na clínica quanto em pesquisa,<br />
para avaliar sintomas depressivos. É uma escala de autorrelato,<br />
composta por 21 itens, desenvolvida por Steer e Beck 16 (1993)<br />
e validada no Brasil 17 . Os pontos de corte para pacientes psiquiátricos<br />
são: 0-11: sintomas mínimos/ausentes; 12-19: sintomas<br />
leves; 20-35: sintomas moderados; 36-63: sintomas graves.<br />
6) Estímulo evocador do craving: composto por uma fotografia<br />
do tamanho A4 com um indivíduo fazendo uso do<br />
crack. Esses estímulos já tinham sido utilizados em outros<br />
estudos 9,15 .<br />
Aspectos éticos<br />
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa<br />
do Hospital Psiquiátrico São Pedro. Os dados foram coletados<br />
após o indivíduo ter aceitado participar por meio da<br />
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.<br />
Coleta de dados<br />
Foi realizada uma entrevista individual em uma sala pequena,<br />
com poucos estímulos visuais e sonoros, para os dois grupos:<br />
para o Grupo Experimental (G1) foi apresentado, por 60<br />
segundos, o estímulo evocador de craving e para o Grupo<br />
Controle (G2) não foi apresentado nenhum estímulo. Para o<br />
G1, 1 minuto após a apresentação do estímulo, era feito o<br />
preenchimento dos questionários na seguinte ordem: Escala<br />
Analógico-Visual, CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para<br />
o Crack, BAI e BDI. Para o G2, os mesmos instrumentos, na<br />
mesma ordem, eram aplicados após 2 minutos de seus participantes<br />
terem entrado na sala, para que houvesse equivalência<br />
de tempo entre os dois grupos. Se algum participante<br />
relatasse ter craving ao final da aplicação, era realizada a técnica<br />
comportamental do relaxamento diafragmático 15 .<br />
Análise de dados<br />
Os dados foram analisados por meio do software Statistical<br />
Package for the Social Sciences (SPSS), versão 17.0, com testes<br />
descritivos e de frequências para a análise exploratória dos<br />
dados. O teste qui-quadrado e o teste exato de Fisher foram<br />
utilizados para analisar a associação entre variáveis categóricas;<br />
o teste t de Student, para amostras independentes, para<br />
comparar G1 e G2 quanto às variáveis contínuas e na validade<br />
discriminante; o coeficiente de correlação linear de Pearson<br />
foi utilizado na validade convergente e de critério e no<br />
estudo correlacional; o alfa de Cronbach, no estudo de confiabilidade;<br />
o Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), o teste de Bartlett e<br />
a ANOVA, na análise fatorial e a regressão linear para verificar<br />
o modelo de composição do craving. O nível de significância<br />
utilizado foi 5%.<br />
RESULTADOS<br />
A amostra de 109 dependentes foi distribuída em: G1, com<br />
50 sujeitos (45,87%), e G2, com 59 sujeitos (54,13%). Todos,<br />
exceto um paciente, iniciaram o uso de cocaína pela via<br />
inalada e depois passaram para o uso do crack. O tempo<br />
médio de diferença entre o início do uso de uma via de<br />
administração para a outra foi de 5,27 anos (SD = 5,01, mínimo<br />
= -3; máximo = 29). Quanto ao uso de outras substâncias,<br />
96,33% eram dependentes de maconha, 91,7%, de<br />
nicotina e 18,35%, de álcool. Não houve diferença significativa<br />
entre os grupos com relação às variáveis analisadas<br />
(Tabela 1).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
236 Araujo RB et al.<br />
artigo original<br />
Tabela 1. Comparação entre médias e (desvios-padrão) entre grupo 1 e grupo 2, segundo aspectos sociodemográficos, padrão de<br />
consumo de substâncias e momentos do tratamento/abstinência<br />
Variáveis Grupo 1<br />
(n = 50)<br />
Idade 29,09 (±6,34) 26,95 (±6,81) 1,648 0,102<br />
Anos de estudo 7,70 (±2,24) 8,53 (±2,73) -1,663 0,100<br />
Tempo de internação 11,67 (±9,31) 14,15 (±5,22) -1,545 0,111<br />
Idade do início do uso da cocaína 17,14 (±2,44) 17,61 (±4,03) -0,666 0,507<br />
Tempo do último uso de cocaína (dias) 436,46 (±778,34) 254,51 (±341,25) 1,523 0,132<br />
Quantidade de cocaína utilizada/semana (gramas) 14,51 (±21,58) 8,01 (±13,99) 1,648 0,103<br />
Idade do início do uso de crack 23,30 (±6,11) 22,38 (±6,42) 0,739 0,461<br />
Tempo do último uso de crack (dias) 12,10 (±10,01) 15,31 (±10,79) -1,732 0,080<br />
Quantidade de crack utilizada/ semana (gramas) 14,68 (±16,57) 11,27 (±14,32) -1,534 0,122<br />
Ansiedade (Inventário Beck de Ansiedade) 16,11 (±38,65) 15,88 (±32,81) 0,655 0,333<br />
Depressão (Inventário Beck de Depressão) 14,07 (±9,22) 15,97 (±8,76) 0,822 0,524<br />
Grupo 2<br />
(n = 59)<br />
T<br />
P<br />
Confiabilidade<br />
Para avaliar a consistência interna do instrumento, foram<br />
calculados os valores do alfa de Cronbach no questionário<br />
como um todo e de seus dois fatores. O alfa total foi de 0,85<br />
(10 itens), o do fator 1 foi 0,93 (8 itens) e o do fator 2 foi 0,66<br />
(2 itens). O método split-half foi utilizado para avaliar a confiabilidade<br />
do instrumento, sendo obtido o coeficiente 0,88.<br />
Análise fatorial<br />
O Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o teste de Bartlett foram utilizados<br />
com o intuito de comprovar a adequação dos dados<br />
do CCQ-B para a análise fatorial. Os resultados deles foram,<br />
respectivamente, 0,851 e p < 0,001 e comprovaram que a<br />
utilização da ANOVA seria adequada para a validação da escala.<br />
Na tabela 2, estão distribuídas as questões nos fatores<br />
da escala a partir da utilização da rotação promax.<br />
O critério utilizado para a colocação dos itens nos fatores<br />
foi o descrito por Tiffany e Drobes 18 , os quais consideraram,<br />
na validação do Questionnaire of Smoking Urge (QSU), como<br />
pertencentes a um determinado fator itens com carga fatorial<br />
igual ou superior a 0,40, cuja carga no outro fator fosse<br />
menor do que 0,25, devendo a diferença entre ambas ser de,<br />
no mínimo, 0,20.<br />
Os fatores 1 e 2 do CCQ-B apresentaram autovalor de<br />
5,50 e 1,39 e variância de 54,98% e 13,86%, respectivamente,<br />
sendo o total da variância equivalente a 68,84% e a correlação<br />
entre os dois fatores significativa e de baixa intensidade<br />
(r = 0,204; p = 0,041).<br />
Validade convergente e de critério<br />
A validade convergente e de critério do CCQ-B foi mensurada,<br />
respectivamente, por meio da análise das correlações do<br />
CCQ-B e seus fatores com os escores da Escala Analógico-<br />
-Visual e pelas correlações do CCQ-B entre seus fatores (Tabela<br />
3).<br />
Tabela 2. Questões do CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para o<br />
Crack e distribuição fatorial<br />
Amostra = 109<br />
Fatores<br />
Questões Fator 1 Fator 2<br />
CCQ-B 1 0,734* 0,234<br />
CCQ-B 2 0,795* 0,049<br />
CCQ-B 3 0,935* -0,035<br />
CCQ-B 4 -0,033 0,830*<br />
CCQ-B 5 0,819* 0,016<br />
CCQ-B 6 0,739* -0,098<br />
CCQ-B 7 -0,030 0,836*<br />
CCQ-B 8 0,774* -0,104<br />
CCQ-B 9 0,912* -0,075<br />
CCQ-B 10 0,847* 0,031<br />
* Participa da composição do fator.<br />
Tabela 3. Correlações do CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada<br />
para o Crack, fatores 1 e 2 e a Escala Analógico-Visual<br />
Amostra = 109 CCQB Total Fator 1 Fator 2<br />
Escala<br />
Analógico-<br />
Visual<br />
CCQ-B total 1,00 0,925** 0,550** 0,515**<br />
Fator 1 0,925** 1,00 0,209* 0,447**<br />
Fator 2 0,550** 0,209* 1,00 0,350**<br />
EAV 0,515** 0,447** 0,350** 1,00<br />
*p < 0,05; **p < 0,01.<br />
Validade discriminante<br />
Foi avaliada pelo escore total do CCQ-B, pelo escore de seus<br />
fatores e pela pontuação na Escala Analógico-Visual, no G1<br />
e no G2 (Tabela 4).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
artigo original<br />
Cocaine Craving Questionnaire versão brasileira<br />
237<br />
Tabela 4. Comparação de médias e (desvios-padrão) do craving<br />
entre grupo 1 e grupo 2<br />
Variáveis<br />
CCQ-B total<br />
CCQ-B fator 1<br />
CCQ-B fator 2<br />
Escala Analógico-Visual<br />
Grupo 1<br />
(n = 50)<br />
19,82 (±12,27)<br />
13,38 (±10,29)<br />
6,44 (±4,18)<br />
5,22 (±2,14)<br />
Grupo 2<br />
(n = 59)<br />
15,80 (±6,03)<br />
10,22 (±3,42)<br />
5,57 (±4,23)<br />
3,45 (±2,02)<br />
T<br />
2,045<br />
2,028<br />
1,006<br />
4,617<br />
P<br />
0,044<br />
0,045<br />
0,317<br />
0,001<br />
Modelo do craving<br />
Por meio da regressão linear, foi verificado quais eram as variáveis<br />
indicativas do total de pontos do CCQ-B. O modelo<br />
que melhor explicou essa variável foi o composto por: total<br />
de pontos do BDI e do BAI [R 2 = 0,949; F (4,15) = 23,009;<br />
p < 0,001]. O valor do coeficiente beta do total de pontos do<br />
BDI foi de 0,584 (p = 0,01) e o do BAI, de 0,493 (p = 0,05). As<br />
variáveis excluídas pela regressão linear foram: idade, escolaridade,<br />
estado civil, idade de início do uso de cocaína e de<br />
crack, quantidade consumida de cocaína e de crack e último<br />
consumo de cocaína e de crack.<br />
Craving e fatores associados<br />
O coeficiente de correlação linear de Pearson foi empregado<br />
no estudo correlacional entre o total de pontos do CCQ-B e<br />
algumas variáveis. Foram encontradas correlações positivas<br />
de baixa intensidade (0,20 < r < 0,40) a muito baixa (0 < r <<br />
0,20) e com os sintomas de depressão pelo BDI (r = 0,382;<br />
p = 0,010) e a quantidade de crack consumida em gramas<br />
por semana (r = 0,194; p = 0,044) e correlação negativa de<br />
intensidade baixa com o tempo do último uso de tabaco<br />
(r = -0,230; p = 0,028). O fator 1 teve correlação positiva de intensidade<br />
baixa apenas com os sintomas de depressão pelo<br />
BDI (r = 0,335; p = 0,025), e o fator 2 teve correlação positiva<br />
de intensidade baixa com os sintomas de depressão, BDI (r =<br />
0,299; p = 0,046), e correlação negativa de baixa intensidade<br />
com o tempo do último uso de tabaco (r = -0,234; p = 0,025).<br />
Não foi identificada correlação entre o total do CCQ-B, nem<br />
entre os dois fatores dessa escala e idade, escolaridade em<br />
anos de estudo, idade de início do uso do crack, tempo de internação,<br />
sintomas de ansiedade (BAI) e tempos do último uso<br />
do crack, da cocaína inalada, da maconha e do álcool (p > 0,05).<br />
DISCUSSÃO<br />
Propriedades da escala<br />
O CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para o Crack demonstrou<br />
ser um instrumento adequado para mensurar o craving<br />
do crack, a partir da avaliação de suas propriedades psicométricas.<br />
Pela análise fatorial, foram obtidos dois fatores com<br />
cargas fatoriais altas, demonstrando a forte participação de<br />
cada questão nos respectivos fatores. Os resultados foram<br />
adequados, segundo os parâmetros de Tiffany e Drobes 18 .<br />
O fator 1 seria o craving e o fator 2, a falta de controle do uso<br />
do crack. Sussner et al. 10 e Palihal et al. 11 não realizaram análise<br />
fatorial do CCQ-B, no entanto, na análise fatorial da escala<br />
original, o CCQ-Now 11 , foi obtida uma solução de quatro fatores,<br />
os quais continham questões relativas a duas ou mais<br />
das seguintes categorias: desejo de usar cocaína, intenção e<br />
planejamento de usar cocaína, antecipação do efeito positivo,<br />
antecipação do alívio dos sintomas de abstinência ou da<br />
disforia e falta de controle do uso da cocaína. Assim, Tiffany<br />
et al. 7 consideraram que as categorias já destacadas na validação<br />
do QSU 18 e que comporiam o craving pelo tabaco<br />
também fariam parte do craving pela cocaína, no entanto salientaram<br />
a presença de uma nova categoria: a falta de controle<br />
do uso. A presença dessa nova categoria igualmente foi<br />
observada em nosso estudo.<br />
Foram encontradas, na validade de critério, correlações<br />
positivas do total de pontos com os dois fatores, no entanto<br />
a correlação com o fator 2 foi de intensidade moderada e<br />
com o fator 1, muito alta, demonstrando que a avaliação do<br />
somatório de pontos da escala e de seu fator 1 mensurou o<br />
mesmo constructo. A correlação entre os dois fatores, por<br />
outro lado, foi de intensidade baixa 19 . Isso significa que o fator<br />
1, denominado de “craving”, mensura o mesmo que o total<br />
de pontos da escala, sendo facultativo utilizar este último<br />
cálculo, por outro lado, demonstra que o fator 2 – falta de<br />
controle do uso do crack – não faz parte do constructo craving,<br />
sendo uma análise separada. O fato de o fator 2 aparecer<br />
como um fator separado pode estar relacionado ao fato<br />
de o seu craving ser muito intenso 15 . Mas deve-se destacar<br />
que as questões que compõem o fator 2 são invertidas, o<br />
que pode ter influenciado nesse resultado, como já alertado<br />
por Tiffany et al. 7 .<br />
O instrumento apresentou um nível satisfatório de consistência<br />
interna e de confiabilidade, de acordo com Bisquerra<br />
et al. 19 . Apesar de o fator 2 ter um valor de alfa inferior a<br />
0,70, foi muito próximo dele (0,66) e pode ser justificado<br />
pelo pequeno número de questões – apenas duas – que<br />
compõem esse fator, não prejudicando a confiabilidade do<br />
instrumento. A confiabilidade do CCQ-B já havia sido encontrada<br />
em outros estudos 10,11 .<br />
Na análise convergente, pode-se observar que o CCQ-B<br />
em seu total de pontos e seu fator 1 tiveram correlações positivas<br />
e moderadas e, em seu fator 2, uma correlação positiva<br />
de intensidade baixa com a Escala Analógico-Visual para<br />
mensurar o craving, resultados também destacados por Palihal<br />
et al. 11 e Sussner et al. 10 . O fato de as correlações serem<br />
de intensidades moderada e baixa, pode-se inferir, ocorreu<br />
em virtude de a Escala Analógico-Visual analisar o craving de<br />
forma uni e não multidimensional, como é o caso do CCQ-B.<br />
Outro ponto que se observa na clínica e que responderia pelos<br />
valores dessas correlações é que os dependentes, quando<br />
questionados diretamente a respeito do craving como<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
238 Araujo RB et al.<br />
artigo original<br />
desejo, o confundem com a intenção de realizar esse desejo,<br />
outro componente do craving 4 . A crítica à utilização de escalas<br />
unidimensionais para avaliar o craving já foi feita por<br />
alguns autores, os quais destacam o aspecto multifatorial do<br />
fenômeno 4,18 .<br />
Como não houve diferenças significativas entre os grupos<br />
experimental e controle em variáveis que poderiam interferir<br />
no craving, foi possível realizar a validade descriminante<br />
da escala. A apresentação do estímulo visual foi efetiva<br />
em induzir o craving, como ocorre em outros estudos 8,9,15 .<br />
Segundo a validade descriminante, pode-se verificar que o<br />
CCQ-B foi sensível para perceber diferenças entre o craving<br />
nos grupos experimental e controle, tanto pelo seu total de<br />
pontos quanto pelo seu fator 1 (Craving). O fator 2 (falta de<br />
controle do uso do crack), por outro lado, não variou nos dois<br />
grupos. Isso faz com que se infira que a falta de controle não<br />
faça parte do constructo craving 4 , mas que seja uma consequência<br />
dele, o que torna mais consistente a constatação da<br />
baixa correlação entre os dois fatores da escala. Neste ponto,<br />
os achados são discordantes dos encontrados por Tiffany et<br />
al. 7 , que acreditam que a falta de controle não é uma consequência<br />
do craving, mas que faz parte do automatismo do<br />
comportamento de usar a droga que ocorre em indivíduos<br />
com uma longa história de consumo. A falta de controle do<br />
uso da substância não havia sido destacada como um componente<br />
do craving em estudo relacionado a outra substância<br />
utilizada pela via fumada, o tabaco 18 .<br />
O modelo que melhor explicou o total de pontos do<br />
CCQ-B foi o composto por sintomas de depressão e de ansiedade,<br />
o que está de acordo com o já defendido por alguns<br />
autores como o uso da substância como alívio do afeto negativo<br />
fazer parte do constructo craving 4,7,18 .<br />
Correlações com sintomas psiquiátricos<br />
Na análise correlacional, foi observada correlação positiva de<br />
intensidade baixa entre o total de pontos do CCQ-B, entre os<br />
dois fatores, e os sintomas de depressão no BDI, o que está<br />
de acordo os resultados da literatura 10,11 , sendo encontrada<br />
correlação positiva, mas de intensidade muito baixa, do total<br />
de pontos da escala com a quantidade de crack consumida<br />
em gramas por semana. Tanto os pacientes que apresentavam<br />
mais sintomas de depressão, quanto aqueles que consumiam<br />
mais crack, em nossa amostra, tinham craving mais<br />
intenso, no entanto apenas os deprimidos percebiam uma<br />
maior falta de controle do uso do crack. Tiffany et al. 7 encontraram<br />
correlações positivas do total de pontos dessa escala<br />
e a frequência de utilização da cocaína nos últimos seis meses<br />
utilizando o CCQ-Now.<br />
Foram encontradas correlações negativas de intensidade<br />
baixa entre o total de pontos do CCQ-B e entre o fator 2 e<br />
o tempo do último uso de tabaco, ou seja, quanto menos<br />
tempo passou do último uso do tabaco, maior é o craving<br />
pelo crack e mais o indivíduo percebe-se como não tendo<br />
o controle do uso desta última substância, o que está de<br />
acordo com Zeni e Araujo 9 , que salientaram a associação entre<br />
o craving por ambas as substâncias e a importância do<br />
tratamento concomitante das duas dependências 9 . Pode-se<br />
destacar um dado que contrasta com o de outros estudos 7,10 ,<br />
que foi não encontrar a correlação entre o craving e sintomas<br />
de ansiedade pelo BAI.<br />
Não foram encontradas correlações entre o craving e fatores<br />
associados à gravidade da dependência como: idade<br />
de início do uso do crack, tempo de internação e tempo decorrido<br />
do último uso de crack e de cocaína inalada. Pode-se<br />
inferir que esses achados estejam relacionados, no caso do<br />
crack, à pouca variação dessas variáveis na amostra pesquisada<br />
e, no caso da cocaína inalada, pelo fato de o craving pelo<br />
crack ter suas especificidades como seu efeito fugaz e característico<br />
ritual de consumo 15 . Deve-se destacar que Sussner<br />
et al. 10 também não encontraram associação entre o craving<br />
medido pelo CCQ-B e o número de dias de consumo de cocaína<br />
no último mês.<br />
Limitações<br />
É um estudo com amostra composta apenas por pacientes<br />
adultos, do sexo masculino e em regime de internação,<br />
o que pode influenciar os pontos de corte do questionário<br />
estudado. Outras limitações deste estudo foram a não apresentação<br />
de um estímulo neutro para o G2 e a não mensuração<br />
do craving nos dois grupos antes da apresentação do<br />
estímulo visual.<br />
Diferentes ambientes de tratamento devem ser estudados,<br />
pois a maioria dos dependentes é encontrada no tratamento<br />
ambulatorial. Mulheres e adolescentes dependentes<br />
devem compor novas amostras de pesquisas. Perspectivas<br />
futuras apontam para estudos que também utilizem biomarcadores<br />
na avaliação do craving.<br />
CONCLUSÃO<br />
Conclui-se que o CCQ-B – Versão Brasileira Adaptada para<br />
o Crack possui propriedades psicométricas satisfatórias, podendo<br />
ser um instrumento de avaliação do craving em pesquisas,<br />
como também em ambientes clínicos especializados<br />
no tratamento da dependência, no entanto ressaltamos que<br />
o mesmo deve ser avaliado em outros contextos clínicos.<br />
A amostra neste estudo permitiu sua avaliação em pacientes<br />
masculinos, adultos e hospitalizados, mas são necessários estudos<br />
com outros sujeitos.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Ao Dr. Bradley Sussner e ao Dr. Stephen Tiffany, pela permissão<br />
de validar o CCQ-Brief – Versão Brasileira e o CCQ-Brief<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
artigo original<br />
Cocaine Craving Questionnaire versão brasileira<br />
239<br />
– Versão Brasileira Adaptada para o Crack. Ao referir-se às<br />
versões brasileiras do CCQ-Brief, solicitamos que sejam citados<br />
os artigos Tiffany et al. 7 e Sussner et al. 6 encontrados nas<br />
referências deste artigo.<br />
REFERÊNCIAS<br />
1. Guimarães CF, Santos DVV, Freitas RC, Araujo RBl. Perfil do usuário de crack e fatores<br />
relacionados à criminalidade em unidade de internação para desintoxicação no Hospital<br />
Psiquiátrico São Pedro de Porto Alegre (RS). Rev Psiquiatr Rio Gd Sul. 2008;30(2):101-8.<br />
2. Dias AC, Araújo MR, Dunn J, Sesso RC, De Castro V, Laranjeira R. Mortality rate among<br />
crack/cocaine-dependent patients: a 12-year prospective cohort study conducted in<br />
Brazil. J Subst Abuse Treat. <strong>2011</strong>;41(3):273-8.<br />
3. Marques AC, Seibel SD. O craving. In: Seibel SD, Toscano Jr. A, editores. Dependência de<br />
drogas. São Paulo: Atheneu; 2001. p. 239-48.<br />
4. Araujo RB, Oliveira MS, Pedroso RS, Miguel AC, Castro MGT. Craving e dependência química:<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):233-9.
ORIGINAL artigo original ARTICLE<br />
Eating habits and psychopathology:<br />
translation, adaptation, reliability of the<br />
Nutrition Behavior Inventory to Portuguese<br />
and relation to psychopathology<br />
Hábitos alimentares e psicopatologia: tradução, adaptação,<br />
confiabilidade do Nutrition Behavior Inventory para o<br />
português e correlação com a psicopatologia<br />
Cássia Roberta Benko 1 , Antonio Carlos de Farias 2 , Mara L. Cordeiro 3<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Eating habits,<br />
psychopathology, children,<br />
mental health.<br />
Objective: The Nutrition-Behavior Inventory (NBI) is a self-administered instrument that allows<br />
eating habits to be correlated with psychopathological symptoms. The objective was to translate<br />
and adapt the NBI to Portuguese, and test the Portuguese NBI’s reliability. The second aim was to<br />
verify its sensitivity for identification of risk factors in terms of behavior/eating habits in children and<br />
adolescents. Methods: The NBI was translated, adapted, and back-translated. The Portuguese<br />
version of the NBI was then applied (N = 96; 9-12 years). In order to verify the internal consistency,<br />
Cronbach’s alpha was used. The psychopathological indicators of the participants were accessed<br />
using the Child Behavior Checklist (CBCL). The mean CBCL scores were analyzed in relation to the<br />
NBI data (cutoff point: ≥ 30 with indicators, and < 30 without). Results: Internal consistency was<br />
high (Cronbach’s alpha = 0.89) for the NBI. The CBCL scores correlated significantly with NBI<br />
(> 30) on the following: anxiety and depression (p = 0.041), social difficulties (p = 0.028), attention<br />
problems (p = 0.001), aggressive behavior (p = 0.015); ADHD (p < 0.001), and conduct problems<br />
(p = 0.032). Conclusion: The present results indicate that the NBI is a reliable instrument. The<br />
NBI can be useful for evaluating psychopathological symptoms related to the eating habits and<br />
behaviors of children and adolescents.<br />
resumo<br />
Objetivo: O Nutrition-Behavior Inventory (NBI) é um instrumento de autorrelato que permite<br />
que os hábitos alimentares sejam acessados e correlacionados com sintomas psicopatológicos.<br />
O objetivo foi traduzir, adaptar e testar a confiabilidade do NBI para o português. O segundo<br />
Recebido em<br />
18/7/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
31/10/<strong>2011</strong><br />
1 Pelé Pequeno Príncipe Research Institute, Department of Neuropsychopharmacology; Faculdades Pequeno Príncipe; Children’s Hospital<br />
Pequeno Príncipe, Department of Psychology, Curitiba, Brazil.<br />
2 Pelé Pequeno Príncipe Research Institute, Department of Neuropsychopharmacology; Faculdades Pequeno Príncipe; Children’s Hospital<br />
Pequeno Príncipe, Department of Neuropediatrics, Curitiba, Brazil.<br />
3 Pelé Pequeno Príncipe Research Institute, Department of Neuropsychopharmacology; Faculdades Pequeno Príncipe; University of California<br />
Los Angeles, Semel Institute for Neuroscience and Human Behavior, Department of Psychiatry and Biobehavioral Sciences of the<br />
David Geffen School of Medicine, United States.<br />
Address for correspondence: Mara L. Cordeiro<br />
Instituto Pelé Pequeno Príncipe,<br />
Departamento de Neuropsicofarmacologia<br />
Av. Silva Jardim, 1632, Água Verde – 80250-200 – Curitiba, PR, Brazil<br />
Tel.: (+55 41) 3310-1036/Telefax: (+55 41) 3322-1446<br />
E-mail: mcordeiro@mednet.ucla.edu
ORIGINAL ARTICLE<br />
Eating habits and psychopathology in children and adolescents<br />
241<br />
Palavras-chave<br />
Hábitos alimentares,<br />
psicopatologia, crianças,<br />
saúde mental.<br />
objetivo foi verificar a sua sensibilidade para a identificação de fatores de risco em termos<br />
de comportamento/hábitos alimentares em crianças e adolescentes. Métodos: O NBI foi<br />
traduzido, adaptado e retrotraduzido. A versão em português do NBI foi então aplicada<br />
(N = 96; 9-12 anos). O instrumento foi analisado em relação à consistência interna por meio do<br />
índice alfa de Cronbach. Os indicadores psicopatológicos dos participantes foram acessados<br />
utilizando o Child Behavior Checklist (CBCL). Os escores médios do CBCL foram analisados em<br />
relação aos dados do NBI (ponto de corte: ≥ 30 com indicadores, e < 30 sem). Resultados:<br />
A consistência interna foi alta (alfa de Cronbach = 0,89) para o NBI. As pontuações do CBCL<br />
foram associadas significativamente com NBI (> 30) em relação aos indicadores: ansiedade<br />
e depressão (p = 0,041), dificuldades sociais (p = 0,028), problemas de atenção (p = 0,001),<br />
comportamento agressivo (p = 0,015), TDAH (p < 0,001) e problemas de conduta (p = 0,032).<br />
Conclusão: Os resultados indicam que o NBI é um instrumento confiável. O NBI pode<br />
ser útil para avaliar sintomas psicopatológicos relacionados com os hábitos alimentares e<br />
comportamentos de crianças e adolescentes.<br />
INTRODUCTION<br />
The etiology of mental disorders is complex and multifactorial,<br />
and more research is needed to decipher it. One of the most<br />
commonly accepted scientific hypotheses regarding the<br />
etiology of mental disorders is that there is a strong interaction<br />
between genetic predisposition and positive and/or negative<br />
environmental factors and that, therefore, interaction with<br />
the environment can affect the development of mental or<br />
physical health problems during a person’s lifespan 1 .<br />
The growing number of mental health problems has<br />
motivated scientists worldwide to study factors that provide<br />
protection from or increase vulnerability to the development<br />
of mental illness 2 . Furthermore, there is a need to find<br />
treatment approaches that are more effective than existing<br />
treatments, as well as to adopt a preventive posture.<br />
Nutrition and eating habits are environmental factors<br />
that can have a substantial positive or negative influence on<br />
mental health 3 . Nutrition and eating behavior merit particular<br />
during childhood and adolescence when maturation and<br />
brain development are accelerated. Appropriate attention<br />
to diet and adequate consumption of nutrients can be vital<br />
to the proper development of neurobiological processes<br />
during this period 4 . Moreover, a child’s dietary choices can<br />
have a strong impact on the way in which s/he learns, feels,<br />
and behaves 5 . The manifestation of early psychopathological<br />
symptoms of mental illness during adolescence, even<br />
when temporary, can be a harbinger of continued and<br />
even more serious mental health problems in adulthood 6 .<br />
Prevention measures should consider the timing of pediatric<br />
susceptibility and what environmental factors may “trigger”<br />
genetic predispositions to mental and behavioral disorders 6 .<br />
A number of studies have demonstrated a relationship<br />
between diet and mental health, but few clearly delineated<br />
scientific studies have addressed this question in subjects<br />
that are in important developmental phases, such as late<br />
childhood and the start of adolescence 7 . During this period,<br />
there are biological, psychological, and a social change that<br />
commonly gives rise to many behavioral changes.<br />
Although it is clear that there is a relationship between<br />
diet and mental disorders, there is not yet a consensus<br />
among scientists as to whether food preferences and choices<br />
are causative or consequential factors of mental disorders 8 .<br />
Early diagnosis can help to prevent problems of increasing<br />
prevalence in the West, especially if diagnosis is followed<br />
by appropriate preventative and therapeutic measures,<br />
including improvements in the quality of dietary practices<br />
in order to reduce the social and personal impact of mental<br />
disorders and behavioral problems in young people 9 .<br />
In 1980, Alexander Schauss developed the “Nutrition-<br />
Behavior Inventory” (NBI) for research examining the<br />
influence of diet on behavior. The NBI addresses behavioral,<br />
physical, and metabolic symptoms and their relationship<br />
to nutrition. It includes questions that enable evidence of<br />
habits involving high consumption of sugar, carbohydrates,<br />
and caffeine, as well as evidence of behaviors arising from<br />
metabolic and behavioral disorders, to be ascertained 10 . The<br />
NBI is an inventory with 52 questions, with each question<br />
addressing a particular symptom(s) of health, dietary habits,<br />
and behaviors. The form can be filled out with a pencil and<br />
takes 15~20 minutes. The higher the score (especially ≥ 30),<br />
the greater the probability that an individual has nutritional<br />
factors that affect their health and behavior 10 . The instrument<br />
can be applied in a self-reporting format with four answer<br />
choices, graded according to frequency as follows: “most<br />
of the time” (3 points); “often” (2 points); “rarely” (1 point);<br />
and “never” (0 points). Of the 52 questions on the NBI, 10<br />
probe for evidence that a person may have a blood sugar<br />
disorder; responses to these questions may also indicate a<br />
high consumption of refined carbohydrates and caffeine 10 .<br />
At the moment, the NBI is the only instrument that allows for<br />
this type of analysis, as most scales used in studies examining<br />
the relationship between dietary habits and behaviors<br />
are specifically directed at identifying eating disorders,<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
242 Benko CR et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
such as anorexia, bulimia, and obesity. For example, the<br />
“Eating Attitude Test (EAT)” 11 is an instrument that reveals<br />
susceptibility toward the development of anorexia and<br />
bulimia nervosa in adults, whereas the “Children’s Eating<br />
Attitude Test (ChEAT)” 12 evaluates symptoms of bulimia<br />
and a preoccupation with body weight in children and<br />
adolescents.<br />
The first aim of the present work was to translate<br />
to Portuguese, adapt, and to test the reliability for the<br />
Brazilian population an instrument that is comparable to<br />
the English-language NBI in terms of being capable of<br />
flagging indicators of dietary behaviors or habits that may<br />
be related to mental disorders in people in late childhood<br />
and the start of adolescence. The second aim was to test the<br />
hypothesis that the NBI would be sufficiently sensitive to<br />
reveal associations between eating habit related risk factors<br />
and behavior in a group of children with psychopathologies<br />
relative to a healthy control group using the Child Behavior<br />
Checklist (CBCL) 13 . The CBCL is a broad spectrum inventory<br />
that documents behavioral and emotional problems and<br />
competencies in children 6 to 18 years of age 13 . The CBCL<br />
has been translated into over 80 languages and research has<br />
shown that it has great reliability and validity in clinical and<br />
non-clinical populations 14-19 . Furthermore, studies have also<br />
shown that the CBCL has good convergence with structured,<br />
interview-derived diagnostic categories 20 .<br />
The long-term objective of this work is to provide a<br />
means for performing triage (that can be used not only in<br />
Brazil, but also in English speaking countries) for mental<br />
and/or behavioral problems during the critical period of<br />
development that occurs in late childhood and adolescence,<br />
thereby facilitating the administration of further preventative<br />
actions during this stage.<br />
Method<br />
Participants<br />
This research was carried out in accordance with the<br />
Guidelines established by the Brazilian Ministry of Health’s<br />
National Commission for Research Ethics, Resolution 196/96,<br />
and was approved by the Research Committee for Human<br />
Subjects. The present investigation was part of an ongoing<br />
longitudinal clinical assessment of behavioral, mood, and<br />
learning disorders conducted in our research institute. The<br />
assessment and diagnostic methods employed are described<br />
in detailed elsewhere 21,22 . The study included only children/<br />
adolescents between 9 and 12 years of age, of both sexes,<br />
who were students in schools belonging to the Municipal<br />
Education system of Curitiba, a southern city in Brazil, and<br />
who were sent for evaluation by a multi-professional team<br />
during the period between March 2007 and November<br />
2009. To be included, the participants were required to have<br />
an intelligence quotient (IQ) ≥ 70 as determined by the third<br />
version of the Wechsler Intelligence Test (WISC-III) 23 .<br />
Parents or guardians accompanying enrolled children<br />
provided written informed consent. Since the NBI only<br />
gives indicators of eating habit behavior associated with<br />
psychological problems, we tested the applicability of the<br />
NBI by comparing the results with results obtained from the<br />
CBCL, a well established (worldwide) inventory for evaluating<br />
psychopathology in children and adolescents 14 .<br />
Study procedures<br />
The experimental strategy basically consisted of two steps:<br />
(1) “Translation, back-translation, and adaptation of the NBI”<br />
and (2) “Applicability of the NBI” utilizing results from the<br />
“Child Behavior Checklist” (CBCL).<br />
First step: translation, back-translation, and<br />
adaptation of the NBI<br />
For the translation, adaptation, and validation of the<br />
NBI for the Brazilian population, the researchers sought<br />
the authorization of the original instrument’s author in<br />
accordance with previously suggested guidelines 24-26 .<br />
Briefly, the original NBI was first translated to Portuguese by<br />
two independent professionals fluent in both the original<br />
and target languages; both versions were analyzed and<br />
synthesized. Subsequently, the synthesized version was<br />
back-translated to its original language and reviewed by an<br />
expert committee comprised of two clinical psychologists, a<br />
pediatric neurologist with an MD and a neuroscientist with a<br />
PhD. The Portuguese version of the NBI was then pretested<br />
on 20 respondents to probe for their understanding and<br />
acceptability of the test as well as for the emotional impact<br />
that the test makes. Small changes were necessary in order to<br />
adapt it to Brazilian culture. However, we avoided changing<br />
the essence of the questions as posed by the original author.<br />
Participants who were able to read fluently responded<br />
the questionnaire by self-reporting. The evaluator – a<br />
psychology professional trained and directed to maintain<br />
neutrality while reading the instrument’s questions – read<br />
the questions aloud for those who were not yet able to read<br />
fluently and helped them fill out the form in accordance with<br />
their answers.<br />
In order to verify the internal consistency of the<br />
instrument’s items, Cronbach’s alpha was used. A construct<br />
can be indirectly validated with an internal base of consistency<br />
or no relation between the questions that make up part of<br />
the scale, indirectly leading to the conclusion that the scale is<br />
a valid construction 27 . The Cronbach’s alpha coefficient is the<br />
simplest and best-known measure of internal consistency<br />
and is the primary approach used in constructing the<br />
validation of a scale. In general, a group of items that explore<br />
a common factor have a high Cronbach’s alpha value.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Eating habits and psychopathology in children and adolescents<br />
243<br />
The minimum acceptable value for the Cronbach’s alpha<br />
coefficient is 0.70; alpha values between 0.80 and 0.90 are<br />
considered ideal 28 .<br />
Second step: applicability of the NBI (annex)<br />
Based on their responses in the Portuguese-language version<br />
of the NBI, the subjects were separated into two groups,<br />
using a cutoff of 30 points 10 . The groups (< 30 and ≥ 30)<br />
were analyzed in relation to the scales for the “Child Behavior<br />
Checklist” (CBCL). This instrument, answered by the children’s<br />
guardians, is used across the world, and has been validated in<br />
Brazil 29 , to measure psychopathological indicators and social<br />
and behavioral problems in subjects between 6 and 18 years<br />
old. The CBCL provides scales concerning overall problems<br />
and two scales of Internalizing and Externalizing problems<br />
of the following kind: depression, withdrawal, rule-breaking<br />
behavior, aggressiveness, social problems, and problems in<br />
thinking, attention, and somatization. In addition, the CBCL<br />
has a subscale based on the diagnostic criteria established<br />
by the Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders<br />
(DSM), which gives indicators for affective, anxiety and<br />
somatic problems as well as indicators for the diagnosis of<br />
attention deficit/hyperactivity disorder, oppositional defiant<br />
disorder, and conduct problems 29 .<br />
For the scoring, we used software developed by Achenbach<br />
Assessment Data Manager (ADM) 13 , which converts raw<br />
scores into scores that are T-normalized for age and gender.<br />
The 98 th percentile of the normative sample of T scores was 70<br />
or greater and the subclinical (borderline) range for T scores<br />
was 65-70. For total Internalizing and Externalizing Problems,<br />
a T score in the range of 60-63 points is considered borderline<br />
and a T score above 63 points in the clinical range 13 .<br />
Data analyses<br />
For the statistical analyses, Statistica-7.0 (StatiSoft® South<br />
America) software was used. Data were verified in relation<br />
to normality and descriptive analyses using Kolmogorov-<br />
Smirnov tests. The Levene test, one of the strongest and most<br />
robust tests in terms of deviations, was also used to verify<br />
the homogeneity of the variations. In cases where there was<br />
no homogeneity (p < 0.05), Welch’s Student’s T-test (Test W/<br />
Separate Variance Estimates in Statistica) was applied. The<br />
Student T-Test was used to examine relationships between<br />
the dependent variables (IQ, CBCL) and the independent NBI<br />
variable (NBI < 30 or NBI ≥ 30). Comparisons were considered<br />
significant when they had two-tailed values of p < 0.05.<br />
Results<br />
Demographics<br />
The demographic data are summarized in table 1. A total of<br />
96 participants, 9 to 12 years of age, of both sexes (83 boys<br />
and 13 girls), completed the inventory. Average age did not<br />
differ between the groups (p = 0.84). The two groups were<br />
found to be similar with respect to potentially interfering<br />
factors, such as age and IQ. As the children were referred<br />
from the same local public schools, we could presume that<br />
there were not substantial socioeconomic differences in the<br />
groups studied.<br />
Table 1. Demographic data for the study population<br />
Parameter NBI < 30<br />
(N = 28)<br />
Sex<br />
M<br />
(N = 83)<br />
F<br />
(N = 13)<br />
29%<br />
(N = 24)<br />
30.8%<br />
(N = 4)<br />
NBI ≥ 30<br />
(N = 68)<br />
71%<br />
(N = 59)<br />
69.2%<br />
(N = 9)<br />
Age (years) 9.7 ± 1.2 9.8 ± 1.0 0.837<br />
IQ Total (WISC-III) 100.3 ± 20.7 99.3 ± 17.0 0.838<br />
Cultural and sample related adaptations<br />
The cultural adaptation was tested in 20 participants. We<br />
found that after translation and back-translation, some<br />
questions needed to be adapted or withdrawn, as shown<br />
in table 2, to obtain the final version of the adapted<br />
questionnaire. An analysis performed to verify the internal<br />
consistency of the translated instrument yielded a Cronbach’s<br />
alpha index value of 0.8896.<br />
Table 2. Questions on the original NBI inventory that were<br />
changed during adaptation<br />
Original question Translation Adaptation<br />
23. I feel better after<br />
my first snack or meal of<br />
the day<br />
26. I eat sweet things or<br />
drink caffeinated coffee,<br />
tea or cola<br />
31. I drink alcoholic<br />
beverages<br />
36. I constantly worry<br />
about things<br />
23. Eu me sinto melhor<br />
depois do primeiro lanche<br />
ou refeição do dia [I feel<br />
better after my first snack<br />
or meal of the day]<br />
26. Eu como coisas doces<br />
ou bebidas cafeinadas<br />
como café, chá ou Coca-<br />
Cola [I eat sweet things<br />
or caffeinated drinks like<br />
coffee, tea or Coca-Cola]<br />
31. Eu bebo bebidas com<br />
álcool [I drink alcoholic<br />
beverages]<br />
36. Eu constantemente me<br />
preocupo com as coisas<br />
[I constantly worry about<br />
things]<br />
48. I want to kill myself 48. Eu quero me matar<br />
[I want to kill myself]<br />
52. Do you smoke<br />
cigarettes?<br />
52. Você fuma cigarros?<br />
[Do you smoke cigarettes?]<br />
* Questions removed since the study population were underage (9-12 years old).<br />
23. Eu me sinto melhor<br />
depois do café da manhã<br />
[I feel better after<br />
breakfast]<br />
26. Eu como doces ou bebo<br />
Coca-Cola, chá ou café<br />
frequentemente [I often<br />
eat sweets or drink Coca-<br />
Cola, tea or coffee]<br />
Question removed*<br />
35. Eu estou sempre<br />
preocupado com alguma<br />
coisa [I am always worried<br />
about something]<br />
47. Eu já pensei em me<br />
matar [I have thought<br />
about killing myself]<br />
Question removed*<br />
p<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
244 Benko CR et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
Analyses of the NBI with respect to CBCL<br />
psychopathological indicators<br />
The averages obtained in the analyses of the subscales of<br />
the CBCL were compared between the groups, according<br />
to their NBI scores (NBI < 30 and NBI ≥ 30) to verify the<br />
statistical difference for each subscale. Figure 1 summarizes<br />
the results obtained for the two groups, participants with an<br />
NBI < 30 versus those with an NBI ≥ 30 points. These analyses<br />
indicate that significant correlations were detected by the<br />
CBCL for the problems of: anxiety and depression (p = 0.041);<br />
social difficulties (p = 0.028); attention problems (p = 0.001);<br />
aggressive behavior (p = 0.015); ADHD (p < 0.001); and<br />
conduct problems (p = 0.032); as well as for the externalizing<br />
problems (p = 0.03); and total problems (p = 0.017).<br />
T-SCORE<br />
71<br />
68<br />
65<br />
62<br />
59<br />
56<br />
AD<br />
DW<br />
SC<br />
SP<br />
NBI: “Nutritional Behavior Inventory”; CBCL: “Child Behavior Checklist”; AD: anxiety/depression; DW: depression/<br />
withdrawal; SC: somatic complaints; SP: social problems; TP: thought problems; AP: attention problems; RRB:<br />
rule-breaking behaviors; AB: aggressive behaviors; AfP: affective problems; AnP: anxiety problems; SP: somatic<br />
problems; ADHP: attention deficit/hyperactivity problems; ODP: oppositional defiance problems; CP: conduct<br />
problems; IP: internalizing problems; EP: externalizing problems; TP: total problems. * (p < 0.05).<br />
Figure 1. Graph comparing the NBI scores and the average T<br />
scores of the CBCL.<br />
Discussion<br />
CBCL – Psychopathologies<br />
TP<br />
AP<br />
RBB<br />
AB<br />
AfP<br />
AnP<br />
NBI < 30<br />
NBI ≥ 30<br />
SP<br />
ADHP<br />
ODP<br />
CP<br />
IP<br />
EP<br />
TP<br />
The present results indicate that the Portuguese version of<br />
the NBI is a reliable instrument. Furthermore, a comparison of<br />
the NBI results with data obtained with the CBCL – a widely<br />
used instrument with excellent psychometric properties<br />
and convergence between structured interview-derived<br />
diagnoses – demonstrated that the NBI can also be useful<br />
for assessing psychopathological symptoms related to the<br />
eating habits and behavior of children and adolescents.<br />
Participants with high NBI scores also presented indicators<br />
of mood, attentional, and behavioral problems in the CBCL.<br />
There is a general consensus that the incidence rate of<br />
psychiatric disorders in children and adolescents has risen over<br />
the last few decades. Although the reasons for this increase<br />
remain speculative, some important research has focused<br />
on possible causes and preventions for these disorders. The<br />
first aim of the present work was to translate and validate the<br />
NBI for Portuguese language speakers, and the second aim<br />
was to analyze whether factors such as eating behaviors and<br />
habits could be associated with psychopathology during<br />
late childhood and early adolescence. The goal was to find<br />
simple ways to identify symptoms and factors that negatively<br />
contribute to the mental health of this population or cause<br />
it to deteriorate. The NBI is a paper and pencil questionnaire<br />
that provides a straightforward analyzable inventory that can<br />
be applied in triage clinical settings or even at schools.<br />
Cultural adaptations and adaptations in relation<br />
to the sample<br />
After the translation and back-translation of the original NBI,<br />
some questions needed to be withdrawn or adapted in light<br />
of the equivalence of construction comparison. Specifically,<br />
questions about smoking (an open question) and alcohol use<br />
(question 31) were removed from the study. We observed<br />
discomfort and resistance to these questions during the pilot<br />
application of the first questionnaire related to the age range<br />
(9-12 years) of the study’s participants. The questions were<br />
removed in order to facilitate the participants’ adherence.<br />
The cultural adaptations proposed did not imply changes<br />
to the main content of the questions; we confirmed this by<br />
observing comparisons between the back-translation and<br />
the original instrument, so as to identify the equivalence<br />
of construction. However, for those wishing to investigate<br />
issues related to alcohol and tobacco use in adults, the<br />
omitted questions may be left in the NBI.<br />
The NBI was analyzed for internal consistency using<br />
Cronbach’s alpha index 27 , which assesses the reliability of<br />
a test in situations in which the researcher is not able to<br />
do other interviews with the individual, but which require<br />
an appropriate estimate of the average degree of error. In<br />
general, scales with an alpha value lower than 0.70 should be<br />
avoided. The alpha value for our translated, adapted NBI was<br />
0.8896, and there were no questions outside the expected<br />
average, indicating that the instrument had good internal<br />
consistency, in accordance with what we expected for its<br />
validation.<br />
Clinical implications and study limitations<br />
The present study had some limitations. First, our sample<br />
was made up mainly of male participants. This gender<br />
imbalance was related to the characteristics of our center’s<br />
line of research, as the students were referred to us from<br />
local schools 21,22 . In this population, teachers tend to<br />
recommend or refer students with externalizing symptoms,<br />
rather than those with internalizing symptoms, and research<br />
has shown 30 that boys tend to have more externalizing<br />
problems than girls. Second, since the NBI has not been<br />
translated to other languages (e.g., Spanish), we were unable<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Eating habits and psychopathology in children and adolescents<br />
245<br />
to compare our results with those of other translations and<br />
cultures. Nonetheless, our work may open new avenues of<br />
research in the area of eating habits and psychopathology<br />
in other countries. Third, we only analyzed the results of<br />
the NBI with respect to CBCL indicators, and not with the<br />
respective conclusive diagnoses of the disorders in the<br />
children. However, several studies have well documented<br />
that the CBCL has good convergence with structured<br />
psychiatric interview 16,31-35 . Fourth, because of the research<br />
characteristics of our center, we could only include children<br />
and adolescents in the sample. Thus, we do not know<br />
whether the NBI as translated would be useful for the adult<br />
population in Brazil. This indicates that further research<br />
validating our already translated NBI may be tested in an<br />
adult Brazilian population.<br />
In spite of the limitations mentioned above, the results<br />
presented indicate that the NBI has sensitivity for identifying<br />
psychopathological symptoms related to the dietary habits of<br />
children and adolescents (Figure 1). It supports current data<br />
in the literature that suggests that emotional difficulties and<br />
problems are correlated with eating habits and consumption<br />
of so-called junk-food 36,37 . Furthermore, early studies showed<br />
that adolescents who together with their parents exhibited<br />
aggressive behavior had very high NBI scores 10 . The present<br />
study showed that pre-adolescents with social problems,<br />
aggressive behavior issues, and conduct problems also had<br />
NBI scores above the cut-off point of 30 (Figure 1). Certainly,<br />
additional studies are needed to extend our seminal findings.<br />
In addition, studies suggest that children who eat more<br />
junk-food may have nutritional imbalances over the longterm,<br />
since these foods are normally rich in sugar and fat,<br />
and in many instances, contain additives, food coloring,<br />
and preservatives, and provide poor quality nutrition 36 .<br />
Consumption of junk-food has been shown to make<br />
adolescents more prone to hyperactivity and attention<br />
problems, as well as other emotional problems that are<br />
often comorbid with these conditions, such as behavioral<br />
disorders and social problems 37 . High consumption of<br />
caffeine and sugar, mainly in the form of soft drinks, has been<br />
associated with aggressive behavior, ADHD, social problems<br />
and somatic complaints 38 .<br />
An unhealthy dietary regimen can also be considered<br />
a subjacent symptom of mental disorders 39 . In addition,<br />
changes in the reward circuit of the brain during puberty<br />
can also be related to depressive symptoms in adolescents.<br />
It is possible; however, that an increase in reward seeking<br />
behavior, at this point in development, may compensate for<br />
changes in affect 40 .<br />
The continual search for foods that are very tasty,<br />
though being poor in nutritional value, uses neutral paths<br />
of behavioral reinforcement, including the dopaminergic<br />
system, progressively degrading the equilibrium of the brain’s<br />
reward circuit and thereby generating more consumption<br />
and a compulsion for this type of food. This circumstance,<br />
termed “dietary dependence”, is considered a mental health<br />
risk factor, especially during childhood and adolescence 40 .<br />
Mood, anxiety disorders and substance abuse disorders<br />
are among the most studied, common, serious, and<br />
incapacitating disorders that arise during adolescence 41 .<br />
Moreover, the manifestation of these disorders during early<br />
adolescence is associated with subsequent development<br />
of serious forms of these diseases, and anxiety symptoms<br />
often precede mood disorders during childhood and<br />
adolescence 40 . Therefore, this issue in and of itself underscores<br />
why early diagnosis and detection of risk factors for mental<br />
health problems during these phases is crucial.<br />
Conclusion<br />
The presently developed Portuguese-language NBI is the first<br />
instrument that allows for triage to evaluate emotional and<br />
behavioral problems and dietary habits related to behavioral<br />
and mood disorders in Portuguese speaking people. The presently<br />
reported analyses of its internal consistency after translation<br />
and adaptation when administered to Brazilian children<br />
and adolescents offer sufficient proof of its validation. Furthermore,<br />
our results suggest that there is a strong association<br />
between NBI findings and CBCL psychopathological indicators<br />
for several mental health problems, such as depression,<br />
anxiety, attention problems, aggressiveness, and conduct<br />
and social problems. The indicators for externalizing and total<br />
problems were also significant.<br />
The results presented in this study suggest that poor diet<br />
may be associated with mental disorders and demonstrate<br />
that the NBI can be used for early identification of symptoms<br />
of emotional problems and behaviors and related dietary<br />
habits in an inexpensive, easy, and rapid manner. The<br />
NBI is easy to administer in walk-in clinics or by teachers<br />
in schools, thus facilitating the early identification of risk<br />
factors that contribute to mood or behavioral disorders.<br />
NBI findings can also serve as a basis for planning possible<br />
complementary actions and therapeutic interventions, such<br />
as modifying dietary habits or secondary prevention tactics.<br />
Such interventions can prevent problems from progressing<br />
or becoming chronic, which is important considering<br />
adolescents’ vulnerability to mental illness.<br />
ACKNOWLEGMENTS<br />
This study was supported by the State of Paraná Department<br />
of Science and Technology (SETI nº 003/07) and the State<br />
Health Department (SESA nº 009/07), Mr. Norbert Gehr and<br />
the UCLA Foundation. We thank social worker Ms. Rosilda<br />
Ferreira for her assistance, the public school teachers, the<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
246 Benko CR et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
students and their families for participating in the study. We<br />
also thank Dr. Alexander Schauss for giving us the opportunity<br />
to translate and adapt to Portuguese his questionnaire.<br />
DISCLOSURES<br />
None to declare.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):240-6.
artigo original<br />
Simulator Sickness Questionnaire:<br />
tradução e adaptação transcultural<br />
Simulator Sickness Questionnaire: translation and cross-cultural adaptation<br />
Marcele Regine de Carvalho¹, Rafael Thomaz da Costa¹, Antonio Egidio Nardi¹<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Cybersickness, realidade<br />
virtual, adaptação<br />
transcultural, equivalência<br />
semântica.<br />
Contexto: O estudo de cybersickness, sintomas desconfortáveis relacionados à interação em<br />
ambientes virtuais, é importante para a implementação de melhorias destes, para ajudar a<br />
preservar o bem-estar dos usuários e reduzir o abandono às exposições virtuais. Usar um<br />
instrumento adequado para identificar e mensurar os sintomas de cybersickness, de forma<br />
padronizada, pode contribuir para essa finalidade. Objetivo: Este estudo tem como objetivo<br />
apresentar as etapas de tradução e adaptação para a língua portuguesa do instrumento<br />
Simulator Sickness Questionnaire, que mede os sintomas de cybersickness. Métodos: Três<br />
traduções e retrotraduções foram realizadas por avaliadores independentes; realizaram-se<br />
a equivalência semântica e a avaliação das versões, sendo elaborada uma versão síntese. Os<br />
comentários dos participantes sobre a versão preliminar do questionário foram examinados.<br />
Resultados: Foi construída a versão brasileira preliminar do questionário. Verificou-se que a<br />
maioria dos participantes entendeu as descrições dos sintomas expostas no questionário em<br />
português. Conclusão: A utilização de três versões de tradução e retrotradução, discussão<br />
sobre a versão síntese e a interlocução com a população-alvo proporcionaram viabilidade ao<br />
processo de equivalência semântica da versão final brasileira.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Cybersickness, virtual reality,<br />
cross-cultural adaptation,<br />
semantic equivalence.<br />
Background: The study of cybersickness, uncomfortable symptoms related to interaction in virtual<br />
environments, is important for these environments’ improvement that help to preserve the welfare<br />
of users and reduce the abandonment of virtual exposures. Using an appropriate instrument to<br />
identify and measure the symptoms of cybersickness in a standardized way can contribute to this<br />
purpose. Objective: The objective of the current study is to present the stages of translation and<br />
adaptation into Portuguese of the instrument “Simulator Sickness Questionnaire”, which measures<br />
cybersickness’ symptoms. Methods: Three translations and back translations were conducted by<br />
independent evaluators, the semantic equivalence and versions’ evaluation were made, producing<br />
a synthesized version. Comments from participants on the preliminary version of the questionnaire<br />
were examined. Results: The preliminary Brazilian version of the questionnaire was developed. It<br />
was found that most participants understood the symptoms’ descriptions given in the translated<br />
questionnaire. Conclusion: The use of three different versions of translation and back translation,<br />
the discussion of the synthetic version and the interaction with the target population have provided<br />
viability for the process of semantic equivalence of the Brazilian final version.<br />
Recebido em<br />
11/4/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
15/6/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), Instituto de Psiquiatria, Laboratório do Pânico e Respiração; Instituto Nacional de Ciência<br />
e Tecnologia em Medicina Translacional (INCT-TM).<br />
Endereço para correspondência: Marcele Regine de Carvalho<br />
Av. das Américas, 1155/2005, Barra da Tijuca – 22631-000 – Rio de Janeiro, RJ<br />
E-mail: marcelecarvalho@gmail.com
248 Carvalho MR et al.<br />
artigo original<br />
INTRODUÇÃO<br />
A realidade virtual pode ser definida como uma interface tridimensional<br />
que coloca o sujeito em condição de troca com<br />
um ambiente recriado via computador 1 . Em ambientes virtuais,<br />
os usuários são imersos em ambientes com estímulos<br />
multissensoriais amparados por um sofisticado aparato que<br />
permite interação com o ambiente virtual tridimensional. Em<br />
psiquiatria e psicologia, a exposição de pacientes a ambientes<br />
virtuais é uma técnica psicoterapêutica utilizada como uma<br />
ferramenta para eliciar ansiedade e desencadear o processo<br />
de habituação a estímulos ansiogênicos e também para testar<br />
e modificar cognições distorcidas, principalmente a partir<br />
da abordagem da terapia cognitivo-comportamental 2 . Mas<br />
é possível que nesses ambientes virtuais os usuários sintam<br />
sintomas desconfortáveis (como vista cansada, fadiga, tontura,<br />
ataxia) que atrapalham a experiência virtual e fazem parte<br />
da experiência denominada de “cybersickness”. Além dos<br />
efeitos de cybersickness imediatos, sintomas de cybersickness<br />
consequentes à interação, como flashbacks visuais, desorientação<br />
e distúrbios de equilíbrio podem acontecer até 12 horas<br />
após a exposição ao ambiente virtual 3 .<br />
Sendo assim, muitos usuários experimentam desconforto<br />
durante e, às vezes, depois de uma sessão em um ambiente<br />
virtual 4 . Cobb 5 verificou que 80% de todos os participantes<br />
de sua pesquisa apresentaram aumento nos sintomas de cybersickness<br />
dentro de 10 minutos após ficarem imersos em<br />
um ambiente de realidade virtual. Regan e Ramsey 6 verificaram<br />
que indivíduos expostos à realidade virtual apresentaram<br />
sintomas por até 5 horas após a imersão. A severidade<br />
e a duração desses sintomas podem ser influenciadas pelo<br />
tempo de exposição ao ambiente virtual e da intensidade<br />
da experiência 4 .<br />
Parece existir uma correlação entre a percepção do próprio<br />
movimento sem um movimento físico real e a sensação<br />
de mal-estar (sickness) 7,8 . A experiência de cybersickness é,<br />
provavelmente, o resultado da mescla de estímulos visuais<br />
e de movimento, e não apenas devida ao movimento em si 9 .<br />
Alguns estudos avaliaram a habituação aos efeitos colaterais<br />
de imersão em realidade virtual, observando que ela<br />
ocorria quando a realidade virtual era repetidamente apresentada<br />
10,11 . Apesar disso, os sintomas de cybersickness podem<br />
ser potencialmente graves, já que podem perdurar após<br />
a exposição e ter um efeito sobre a capacidade do usuário<br />
para executar tarefas no mundo real 12 . Outra consequência<br />
de cybersickness é que as pessoas que experimentam esses<br />
sintomas podem evitar o uso de realidade virtual no futuro 13 .<br />
Investigações preliminares demonstraram que sintomas<br />
de cybersickness estão associados com aumento da frequência<br />
cardíaca, da condutância da pele, da taquiarritmia gástrica<br />
e dos níveis plasmáticos de catecolaminas. Mudanças na<br />
atividade do córtex cerebral também foram detectadas por<br />
meio de eletroencefalograma 4 .<br />
Acredita-se que conflitos sensoriais são a chave para o<br />
entendimento da provocação dos sintomas de cybersickness.<br />
Porém, existem algumas outras hipóteses possíveis e coerentes<br />
para o desencadeamento dos sintomas 14 . Uma teoria<br />
bem difundida sobre o assunto foi formulada por Oman 15 sobre<br />
o mal-estar relacionado ao movimento (motion-sickness):<br />
o movimento produz um conflito entre o input sensorial real<br />
e as informações sensoriais esperadas. Essa teoria foi atualizada<br />
para a aplicação em ambientes virtuais 16 .<br />
Na síndrome de cybersickness, os usuários recebem sinais<br />
visuais que podem induzir uma ilusão de movimento do<br />
corpo, enquanto seus corpos são fisicamente parados. Isso<br />
provocaria desacordo entre os estímulos visuais, vestibulares<br />
e proprioceptivos, culminando nos sintomas 14 . Esses desacordos<br />
podem ser consequência de uma gama de fatores<br />
como: erro no rastreamento de posição do usuário em relação<br />
ao programa, atraso na atualização da posição do corpo,<br />
tremor ou oscilação das partes do corpo representadas, gráficos<br />
distorcidos, ótica pobre, tremulação de imagem. A ilusão<br />
do próprio movimento (vection), o atraso entre o tempo<br />
que um movimento físico é realizado e o tempo de resposta<br />
do computador com modificação na imagem gerada, o<br />
campo de visão, variáveis individuais e quantidade de movimentos<br />
da cabeça também são apontados como fatores de<br />
influência para o desacordo entre estímulos 3 .<br />
O Simulator Sickness Questionnaire (SSQ) 17 é um instrumento<br />
bastante utilizado nas investigações sobre cybersickness.<br />
Uma revisão de literatura identificou que 40 estudos, de um<br />
total de 50, utilizaram-no para medir o nível de cybersickness 14 .<br />
O SSQ foi formulado a partir do Motion Sickness Questionnaire<br />
(MSQ) 18 , que consiste de 27 itens que descrevem o desconforto<br />
geral. Para estudar os efeitos individuais da realidade virtual,<br />
o MSQ foi revisto após análise fatorial realizada por Lane<br />
e Kennedy 19 , sendo renomeado como SSQ. Três fatores específicos<br />
(Oculomotor, Desorientação e Náuseas) e um escore<br />
total de Gravidade emergiram desta análise 3 . O SSQ consiste<br />
em 16 itens (sintomas). Os sintomas “boredom, drownsiness,<br />
decreased salivation, depression, visual flashbacks, faintness,<br />
awareness of breathing, decreased appetite, increased appetite,<br />
desire to move bowels, confusion e vomiting” contidos na versão<br />
do MSQ foram retirados. Os sintomas podem ser classificados<br />
como: ausente, leve, moderado ou grave e pontuados de 0<br />
a 3, respectivamente. Para obter os escores de cada subescala<br />
(Oculomotor, Desorientação e Náuseas), os sintomas recebem<br />
pesos específicos, que devem ser multiplicados pelo<br />
valor da pontuação atribuída a cada um deles pelo respondente.<br />
Depois, basta somar os valores obtidos para chegar<br />
ao valor total de cada subescala, que deve ser colocado em<br />
fórmulas de conversão para o escore final de cada subescala.<br />
O escore total de gravidade é obtido pela soma dos valores<br />
obtidos em cada subescala (valores anteriores ao escore final<br />
obtido pelas fórmulas de conversão) e a aplicação em uma<br />
fórmula específica que indicará o resultado final da escala 17 .<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):247-52.
artigo original<br />
SSQ: tradução e adaptação transcultural<br />
249<br />
As etapas de tradução e adaptação para a língua portuguesa<br />
do instrumento Simulator Sickness Questionnaire<br />
(SSQ) 17 são apresentadas neste trabalho. O objetivo do presente<br />
estudo foi traduzir e avaliar a equivalência semântica<br />
do SSQ, realizando um estudo piloto na população brasileira<br />
de diferentes níveis de escolaridade. Com isso, buscou-se<br />
produzir uma versão preliminarmente adaptada do SSQ que<br />
possa ser validada em momento posterior. Outro objetivo<br />
foi examinar se o SSQ é aplicável a indivíduos de diferentes<br />
níveis educacionais.<br />
Nota-se a importância em identificar e mensurar os sintomas<br />
de cybersickness, de forma padronizada, assim como<br />
descobrir os fatores a que estão relacionados, para que melhorias<br />
técnicas possam ser feitas nos sistemas de realidade<br />
virtual, preservando o bem-estar dos usuários e reduzindo o<br />
risco de abandono às exposições em ambientes virtuais.<br />
A tradução e a adaptação cultural de instrumentos autoaplicáveis<br />
são uma forma de poupar tempo, já que o desenvolvimento<br />
de um instrumento é uma tarefa que demanda um<br />
longo período de trabalho. Assim, é mais viável usar um instrumento<br />
que já foi desenvolvido e sistematicamente utilizado.<br />
MÉTODOS<br />
É recomendado que o processo de adaptação transcultural<br />
seja uma combinação entre um componente de tradução<br />
literal de um idioma ao outro e um processo de sintonização<br />
que contemple o contexto cultural e o estilo de vida<br />
da população-alvo da versão 20 . O processo de adaptação<br />
transcultural aconteceu em quatro etapas. Foi utilizado o<br />
processo de equivalência semântica, conforme descrito por<br />
Reichenheim e Moraes 20 , que consiste em uma das principais<br />
etapas para avaliação da equivalência transcultural de instrumentos<br />
de aferição.<br />
As primeiras etapas dizem respeito ao processo de tradução<br />
(etapa 1), retrotradução (etapa 2) e avaliação da equivalência<br />
semântica da versão brasileira preliminar (etapa 3).<br />
A última etapa consistiu em um estudo piloto em que 32 participantes<br />
de diferentes níveis acadêmicos foram convidados<br />
a preencher o questionário traduzido e adaptado e apontar<br />
se houve alguma dificuldade quanto ao preenchimento do<br />
questionário ou sugestão para aprimorar a clareza dos itens.<br />
Na etapa 1, dois psicólogos e uma tradutora profissional,<br />
todos brasileiros bilíngues, realizaram, independentemente,<br />
três traduções diferentes do instrumento original em inglês<br />
para o português brasileiro. Cada um dos colaboradores<br />
possui estudos avançados em língua inglesa. Os tradutores<br />
podem ser considerados cegos entre si. Contudo, esses profissionais<br />
foram escolhidos por estarem familiarizados com<br />
os constructos usados no instrumento. Foi pedido para que<br />
prestassem atenção à consistência semântica dos termos e<br />
construções utilizados.<br />
Na segunda etapa, retrotraduções para o inglês foram<br />
feitas de uma versão traduzida preliminarmente por três<br />
psicólogos brasileiros bilíngues, independentemente e sem<br />
conhecimento da escala original.<br />
Na etapa 3, a avaliação da equivalência semântica foi feita<br />
pelos autores deste estudo, e a versão preliminar brasileira<br />
em português foi aperfeiçoada com base nas três traduções<br />
e retrotraduções feitas e a comparação em relação ao instrumento<br />
original (Tabela 1). Para compor a versão brasileira<br />
do questionário, os itens foram incorporados de uma das<br />
três versões, podendo ter sido ligeiramente modificados de<br />
modo a encontrar a melhor combinação de critérios para<br />
equivalência semântica.<br />
Após a elaboração da versão brasileira preliminar do SSQ,<br />
foi realizada a quarta etapa, que consistiu em um estudo<br />
piloto com 32 participantes adultos, que assinaram um termo<br />
de consentimento livre e esclarecido, selecionados de<br />
uma amostra de conveniência (Tabela 2) com base no nível<br />
educacional dos indivíduos, abordados no campus da Praia<br />
Vermelha da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Isso<br />
ocorreu em virtude da grande diferença cultural observada<br />
na população brasileira e a fim de garantir a compreensão do<br />
questionário por uma parcela grande da população em geral.<br />
Trinta e cinco sujeitos foram abordados. Apenas dois sujeitos<br />
se recusaram a participar do estudo alegando motivo<br />
de horário. Para excluir a possibilidade de algum diagnóstico<br />
psiquiátrico atual ou pregresso, os sujeitos foram entrevistados<br />
pelos autores, utilizando a versão brasileira da entrevista<br />
diagnóstica estruturada Mini International Neuropsychiatric<br />
Interview (MINI 5.0). Os participantes não tinham histórico de<br />
transtorno psiquiátrico. Dos voluntários abordados, apenas<br />
um foi excluído por apresentar diagnóstico de depressão<br />
maior. Os participantes foram divididos em três categorias de<br />
acordo com o nível educacional, tendo em vista o objetivo<br />
exposto acima: educação elementar (oito anos de educação<br />
ou menos), ensino médio (de oito a onze anos de educação)<br />
e ensino superior (nível superior ou acima).<br />
Os participantes foram solicitados a preencher o questionário<br />
e a reportar se cada item estava claro o suficiente e<br />
se havia alguma sugestão para melhorar a compreensão do<br />
instrumento. Os participantes comentaram a versão preliminar<br />
do questionário apontando as dificuldades para melhor<br />
compreensão, ou concordando integralmente com a versão<br />
do questionário. Considerando essas sugestões, foi elaborada<br />
a versão brasileira final do SSQ. O projeto foi submetido<br />
ao Comitê de Ética em Pesquisa.<br />
RESULTADOS<br />
O instrumento original, as traduções (T1, T2e T3), suas respectivas<br />
retrotraduções (B1, B2 e B3) e sua versão final em<br />
português encontram-se na tabela 1.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):247-52.
250 Carvalho MR et al.<br />
artigo original<br />
Tabela 1. Versão original, traduções, retrotraduções e versão final do SSQ<br />
Versão original Traduções Retrotraduções Versão brasileira<br />
1. General discomfort T1: Mal-estar generalizado<br />
T2: Desconforto geral<br />
T3: Mal-estar<br />
R1: Generalized discomfort<br />
R2: Generalized uneasiness<br />
R3: Generalized malaise<br />
Mal-estar generalizado<br />
2. Fatigue T1: Fadiga<br />
T2: Cansaço<br />
T3: Cansaço<br />
3. Headache T1: Dor de cabeça<br />
T2: Dor de cabeça<br />
T3: Dor de cabeça<br />
4. Eyestrain T1: Vista cansada<br />
T2: Vista cansada<br />
T3: Vista cansada<br />
5. Difficulty focusing T1: Dificuldade em focalizar<br />
T2: Dificuldade em manter o foco<br />
T3: Dificuldade de concentração<br />
6. Salivation increase T1: Aumento de salivação<br />
T2: Aumento de salivação<br />
T3: Aumento de salivação<br />
7. Sweating T1: Sudorese<br />
T2: Suor<br />
T3: Sudorese<br />
8. Nausea T1: Náusea<br />
T2: Enjoo<br />
T3: Enjoo<br />
9. Difficulty concentrating T1: Dificuldade de concentração<br />
T2: Dificuldade de concentração<br />
T3: Dificuldade de concentração<br />
10. “Fullness of the head” T1: “Cabeça cheia”<br />
T2: “Cabeça pesada”<br />
T3: “Cabeça pesada”<br />
11. Blurred vision T1: Visão borrada<br />
T2: Visão turva<br />
T3: Visão embaçada<br />
12. Dizziness eyes open<br />
Dizziness eyes close<br />
T1: Tontura com olhos abertos<br />
Tontura com olhos fechados<br />
T2: Tontura com olhos abertos<br />
Tontura com olhos fechados<br />
T3: Tontura com os olhos abertos<br />
Tontura com os olhos fechados<br />
13. Vertigo T1: Vertigem<br />
T2: Vertigem<br />
T3: Vertigem<br />
14. Stomach awareness T1: Consciência estomacal<br />
T2: Consciência estomacal<br />
T3: Desconforto abdominal<br />
15. Burping T1: Arroto<br />
T2: Arroto<br />
T3: Soluço<br />
16. Other T1: Outro<br />
T2: Outro<br />
T3: Outro<br />
R1: Fatigue<br />
R2: Tiredness<br />
R3: Tiredness<br />
R1: Headache<br />
R2: Headache<br />
R3: Headache<br />
R1: Eyestrain<br />
R2: Tired sight<br />
R3: Tired eyes<br />
R1: Difficulty in keeping focus<br />
R2: Difficulty to maintain focus<br />
R3: Difficulty to maintain focus<br />
R1: Salivation increase<br />
R2: Increased salivation<br />
R3: Increase in salivation<br />
R1: Sweating<br />
R2: Sudoresis<br />
R3: Sweating<br />
R1: Nausea<br />
R2: Nausea<br />
R3: Nausea<br />
R1: Concentration difficulty<br />
R2: Difficulty concentrating<br />
R3: Concentration difficulty<br />
R1: Heavy head<br />
R2: Heavy head<br />
R3: Heavy head<br />
R1: Blurred vision<br />
R2: Blurred vision<br />
R3: Blurred vision<br />
R1: Dizziness with eyes open<br />
Dizziness with eyes closed<br />
R2: Dizziness with open eyes<br />
Dizziness with closed eyes<br />
R3: Dizziness with open eyes<br />
Dizziness with closed eyes<br />
R1: Vertigo<br />
R2: Vertigo<br />
R3: Vertigo<br />
R1: Abdominal disconfort<br />
R2: Abdominal disconfort<br />
R3: Abdominal disconfort<br />
R1: Eructation<br />
R2: Belching<br />
R3: Belching<br />
R1: Other<br />
R2: Other<br />
R3: Other<br />
Cansaço<br />
Dor de cabeça<br />
Vista cansada<br />
Dificuldade de manter o foco<br />
Aumento de salivação<br />
Sudorese<br />
Náusea<br />
Dificuldade de concentração<br />
“Cabeça pesada’’<br />
Visão embaçada<br />
Tontura com olhos abertos<br />
Tontura com olhos fechados<br />
Vertigem<br />
Desconforto Abdominal<br />
Arroto<br />
Outro<br />
A versão revisada pelos tradutores coincidiu entre si com<br />
os itens 3, 4, 6, 7, 9, 12, 13 e 16. Os itens 1, 2, 5, 8, 10, 11 e 14<br />
apresentaram pequenas diferenças, que não alteram o significado<br />
global dos termos. O item 15 foi o único que apresentou<br />
diferença mais significativa entre os significados das traduções.<br />
Nesse item, para a palavra “burping” foram atribuídas<br />
duas diferentes traduções: arroto e soluço.<br />
Em relação às retrotraduções, coincidiram entre si os<br />
itens: 3, 8, 10, 11, 13, 14 e 16. Os itens restantes tiveram retrotraduções<br />
similares, sem que as diferenças de termos utilizados<br />
interferissem no sentido deles.<br />
Comparando as traduções com a versão original, apenas<br />
o item 14 obteve versões não congruentes em relação ao<br />
significado dos termos. “Stomach awareness” foi traduzido li-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):247-52.
artigo original<br />
SSQ: tradução e adaptação transcultural<br />
251<br />
teralmente como “consciência estomacal” e também como<br />
“desconforto abdominal”.<br />
Já na comparação das retrotraduções com a versão original,<br />
observou-se que apenas nos itens 10 e 14 houve divergências,<br />
relacionadas à dificuldade de equivalência de<br />
sentido das expressões nas duas línguas. No item 10, a expressão<br />
“heavy head” extraída das traduções foi proveniente<br />
da utilização das palavras em inglês seguindo literalmente<br />
o sentido das em língua portuguesa, não correspondendo,<br />
assim, integralmente à versão original em inglês. Já no item<br />
14 o inverso ocorreu. As retrotraduções não seguiram necessariamente<br />
o sentido literal das palavras usadas na tradução,<br />
refletindo uma expressão (“abdominal disconfort”) que parece<br />
se aproximar ao sentido do item original.<br />
Sobre a versão final, os itens incorporados pertenciam a<br />
pelo menos uma das três versões de tradução. No caso das<br />
palavras que tivessem o mesmo significado nas traduções<br />
para o português, optou-se por preservar ao máximo aquelas<br />
que mais se aproximassem da tradução literal das da língua<br />
inglesa contidas na versão original.<br />
Sendo assim, na versão final do SSQ em português, nos<br />
itens 2, 8 e 15, a escolha pela tradução final se deu pela maior<br />
aproximação ao sentido literal da frase na tradução do inglês<br />
para o português, já que não havia divergência semântica<br />
entre as opções para tradução.<br />
Nos itens 1, 5, 10 e 11, a escolha final deveu-se ao julgamento<br />
de que os termos escolhidos seriam mais inteligíveis<br />
e/ou usuais do que as demais alternativas.<br />
Já no item 14, a escolha por “desconforto abdominal”<br />
em relação a “consciência estomacal” se deve ao fato de que<br />
essa segunda alternativa é a tradução literal da expressão original<br />
na língua inglesa; seu uso seria pouco coloquial e talvez<br />
de difícil compreensão ou identificação pelos sujeitos.<br />
No estudo piloto do questionário com os participantes<br />
da presente amostra, o propósito era testar a compreensão<br />
e verificar a necessidade de eventuais modificações de qualquer<br />
termo que poderia dificultar o entendimento, a fim de<br />
posteriormente testar a possibilidade de usar o questionário<br />
em uma ampla faixa de indivíduos, com diferenças culturais<br />
e em diferentes contextos educativos. A amostra usada nesse<br />
estudo foi composta por 15 homens e 17 mulheres, com<br />
idades variando de 16 até 71 anos. Dados demográficos dessa<br />
amostra são apresentados na tabela 2.<br />
Os participantes não demonstraram problemas em<br />
preencher o questionário. Dúvidas em apenas dois itens<br />
da versão final do questionário foram referidas por alguns<br />
dos participantes. No item 5, nove participantes de ambos<br />
os sexos, com ensino fundamental ou ensino médio concluído,<br />
acharam a expressão “dificuldade de manter o foco”<br />
vaga, de difícil compreensão, questionando em que manter<br />
o foco e sugerindo “dificuldade de manter a concentração”<br />
como alternativa. Porém, dificuldade de concentração já é<br />
um item (9) do questionário. Optou-se, então, por manter o<br />
Tabela 2. Características demográficas da amostra do estudo<br />
piloto<br />
Estudo Feminino Masculino Total<br />
Ensino fundamental 6 5 11<br />
Ensino médio 5 6 11<br />
Ensino superior 6 4 10<br />
Total 17 15 32<br />
Idade<br />
Média 38,25 38,93 38,57<br />
Desvio-padrão 16,63 18,93 17,43<br />
item inalterado, já que a versão original do questionário no<br />
item 5 não contempla o tipo de explicação requerida. Outro<br />
item comentado pelos participantes foi o 10. Cinco deles, de<br />
ambos os sexos, com ensino fundamental ou ensino médio<br />
concluído, tiveram dificuldade em caracterizar o que seria<br />
“cabeça pesada”. Também se optou por manter o item inalterado,<br />
respeitando a tradução mais próxima ao original.<br />
DISCUSSÃO<br />
O presente estudo para tradução e adaptação transcultural<br />
do SSQ enfatizou a equivalência semântica em vez da equivalência<br />
literal dos termos, com o propósito de expressar<br />
conceitos usuais na população-alvo de futuros estudos. Um<br />
ponto positivo para alcançar os bons resultados foi decorrente<br />
da participação de três tradutores e três retrotradutores<br />
cegos e independentes. Sendo assim, as versões puderam<br />
ser confrontadas e discutidas na elaboração da versão final.<br />
Isso permitiu que discrepâncias pudessem ser identificadas e<br />
discutidas amplamente e que soluções fossem criadas. Além<br />
disso, cinco dos seis colaboradores são psicólogos e têm familiaridade<br />
com os construtos do questionário, contribuindo<br />
ainda mais para a adequação dos resultados que foram avaliados<br />
no processo de equivalência semântica.<br />
Os participantes que preencheram os questionários possuem<br />
diferentes níveis educacionais, o que proporcionou a<br />
possibilidade de discutir a viabilidade da aplicação do instrumento<br />
em diferentes níveis educacionais da população<br />
brasileira. A maioria dos participantes entendeu os sintomas<br />
descritos no questionário. Apenas dois itens geraram dúvidas,<br />
foram discutidos e optou-se por mantê-los na versão<br />
traduzida preliminar. Como uma limitação do estudo aponta-se<br />
o pequeno número de participantes (n = 32) que compuseram<br />
a amostra no estudo piloto.<br />
Como citado anteriormente, para que melhorias técnicas<br />
possam ser implementadas nos sistemas de realidade vir tual<br />
de modo a preservar o bem-estar dos usuários e reduzir a<br />
evasão do tratamento, ressalta-se a importância de identificar<br />
e mensurar os sintomas de cybersickness. A partir da<br />
tradução e da adaptação para o português brasileiro desse<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):247-52.
252 Carvalho MR et al.<br />
artigo original<br />
instrumento já difundido na língua inglesa, essa identificação<br />
e mensuração de sintomas passam a ser possíveis de<br />
realização na população brasileira, agregando aos estudos<br />
sobre realidade virtual no país.<br />
Outros estudos construíram versões finais de escalas<br />
para o português brasileiro utilizando processo semelhante<br />
ao método de tradução e equivalência semântica adotado<br />
neste estudo. De Carvalho et al. 21 elaboraram a versão<br />
brasileira do Driving Cognitions Questionnaire, tendo esta se<br />
mostrado satisfatória em relação ao estudo piloto. Freitas et<br />
al. 22 elaboraram uma versão brasileira da Escala de Compulsão<br />
Alimentar Periódica e consideraram a versão final adequada<br />
para uso clínico. Mattos et al. 23 constataram um nível<br />
satisfatório de equivalência semântica entre a versão em<br />
português da escala ASRS-18, para avaliação de transtorno<br />
de déficit de atenção e hiperatividade em adultos, gerada a<br />
partir da adaptação transcultural e a original em inglês. Silva<br />
e Nardi 24 realizaram um estudo de equivalência semântica<br />
do Social Interaction Self-Statement Test, obtendo resultados<br />
favoráveis à utilização do instrumento na população-alvo. Já<br />
Cicconelli et al. 25 , além da tradução e adaptação transcultural,<br />
realizaram a validação do questionário genérico de avaliação<br />
da qualidade de vida SF-36, no qual a versão final foi considerada<br />
adequada para avaliação de pacientes com artrite<br />
reumatoide e outras patologias.<br />
CONCLUSÃO<br />
Para que um instrumento de pesquisa seja utilizado com<br />
segurança, é necessário que apresente validade e, consequentemente,<br />
boa confiabilidade, além de boa sensibilidade<br />
e especificidade. A adaptação transcultural e a equivalência<br />
semântica são apenas o primeiro estágio no processo de validação<br />
de um questionário. É necessário que, em estudos<br />
futuros, esta versão do SSQ tenha sua estrutura fatorial e<br />
consistência interna testadas e sua validade convergente e<br />
divergente avaliada.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):247-52.
artigo original<br />
Validade discriminante do Teste de<br />
Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey:<br />
comparação entre idosos normais e idosos<br />
na fase inicial da doença de Alzheimer<br />
Discriminant validity of the Rey Auditory Verbal Learning<br />
Test: comparison between normal elderly and elderly<br />
patients in early stages of Alzheimer’s disease<br />
Mariana Fonseca Cotta 1 , Leandro Fernandes Malloy-Diniz 2 , Fábio Lopes Rocha 3 , Maria Aparecida Camargos<br />
Bicalho 4 , Rodrigo Nicolato 5 , Edgar Nunes de Moraes 6 , Jonas Jardim de Paula 7<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
RAVLT, memória,<br />
envelhecimento, doença<br />
de Alzheimer.<br />
Objetivo: Este estudo transversal visa avaliar a validade discriminante do Teste de Aprendizagem<br />
Auditivo-Verbal de Rey (RAVLT), ao comparar uma amostra de idosos normais com<br />
uma de pacientes na fase inicial da doença de Alzheimer (DA). Métodos: Pacientes na fase<br />
inicial da DA (n = 35) e controles saudáveis (n = 35) pareados de acordo com a idade e a<br />
escolaridade foram submetidos ao Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey, ao Miniexame<br />
do Estado Mental e à Escala de Depressão Geriátrica. O desempenho dos dois grupos<br />
foi comparado por meio do teste de Mann-Whitney em cada etapa do RAVLT e, mediante a<br />
análise ROC, foi avaliada a validade discriminante do teste nas duas populações estudadas.<br />
Resultados: O grupo na fase inicial da DA teve desempenho significativamente pior em<br />
todas as etapas do RAVLT quando comparado ao grupo controle, e as etapas demonstraram<br />
bom poder diagnóstico, com áreas sobre a curva ROC oscilando entre 0,806 e 0,989 (A1 =<br />
0,806; A2 = 0,869; A3 = 0,958; A4 = 0,947; A5 = 0,989; A6 = 0,962; A7 = 0,985; TOTAL = 0,975;<br />
LOT = 0,895; REC = 0,915). Conclusão: Os resultados sugerem que o Teste de Aprendizagem<br />
Auditivo-Verbal de Rey é eficaz para discriminar idosos normais de idosos na fase inicial da<br />
doença de Alzheimer.<br />
ABSTRACT<br />
Objective: This transversal study aims to evaluate the discriminant validity of the Rey Auditory<br />
Verbal Learning Test (RAVLT) by comparing a sample of normal elderly with a patient at the initial<br />
stage of Alzheimer’s disease. Methods: Age and educational attainment matched patients<br />
Recebido em<br />
3/6/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
10/10/<strong>2011</strong><br />
1 Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG), Programa de Pós-Graduação; Universidade Federal de Minas<br />
Gerais, Hospital das Clínicas, Centro de Referência do Idoso do Núcleo de Geriatria e Gerontologia (UFMG-HC/NUGG).<br />
2 UFMG, Faculdade de Medicina, Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Medicina Molecular, Laboratório de Investigações Neuropsicológicas<br />
(INCT/LIN), Departamento de Saúde Mental.<br />
3 IPSEMG, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde.<br />
4 UFMG, NUGG/HC, Centro de Referência do Idoso, Departamento de Clínica Médica.<br />
5 UFMG, Faculdade de Medicina, Departamento de Saúde Mental.<br />
6 UFMG, NUGG/HC, Centro de Referência do Idoso, Departamento de Clínica Médica.<br />
7 UFMG, NUGG/HC, INCT/LIN, Centro de Referência do Idoso.<br />
Endereço para correspondência: Mariana Fonseca Cotta<br />
Rua Cyro Vaz de Melo, 508/03, Dona Clara – 31255-840 – Belo Horizonte, MG<br />
Telefax: (31) 3309-4222<br />
E-mail: mariana.cotta@gmail.com
254 Cotta MF et al.<br />
artigo original<br />
Keywords<br />
RAVLT, memory, aging,<br />
Alzheimer’s disease.<br />
at the initial stages of Alzheimer’s disease (n = 35) and normal elderly (n = 35) were submitted to<br />
the Rey Auditory Verbal Learning Test, Mini Mental State Examination and the Geriatric Depression<br />
Scale. The performance of the two groups was compared using the Mann-Whitney test at each<br />
stage of the RAVLT and by ROC analysis the discriminant validity of the test in both populations was<br />
evaluated. Results: The group at the initial stages of Alzheimer’s disease had significantly worse<br />
performance in all steps of the RAVLT compared to the control group, and the steps showed good<br />
diagnostic power, with areas under the curve ranging between 0.806 and 0.989 (A1 = 0,806; A2 =<br />
0,869; A3 = 0,958; A4 = 0,947; A5 = 0,989; A6 = 0,962; A7 = 0,985; TOTAL = 0,975; LOT = 0,895; REC =<br />
0,915). Conclusion: The results suggest that the Rey Auditory Verbal Learning Test is effective for<br />
discriminating normal elderly seniors from the ones in early stages of Alzheimer’s disease.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O declínio cognitivo da memória pode ser considerado um<br />
elemento fundamental para o diagnóstico diferencial entre<br />
o envelhecimento normal e o patológico. O Teste de Aprendizagem<br />
Auditivo-Verbal de Rey (RAVLT) tem se mostrado<br />
útil na avaliação da memória de idosos 1-4 , contribuindo particularmente<br />
para o diagnóstico diferencial entre o envelhecimento<br />
normal e quadros demenciais como a demência do<br />
tipo Alzheimer 5-7 . O teste é utilizado para avaliação da memória<br />
e aprendizagem 8 , sendo considerado um instrumento<br />
sensível ao déficit de memória episódica 2,5,9 .<br />
O teste foi desenvolvido por Rey, em 1958, e publicado<br />
em seu livro, L’exame clinique en psychologie, em 1964, baseado<br />
no Test of Memory for Words desenvolvido pelo psicólogo<br />
suíço Edouard Claparéde 10 . No Brasil, o RAVLT foi traduzido,<br />
adaptado e normatizado por Malloy-Diniz et al. 8 para aplicação<br />
em adolescentes, adultos e idosos. Posteriormente, o<br />
mesmo autor realizou um novo estudo com uma amostra<br />
de idosos normais, utilizando uma versão na qual as listas de<br />
palavras originais foram substituídas por dissílabos concretos<br />
de alta frequência no idioma português praticado no Brasil.<br />
A análise mostrou a importância do nível de escolaridade<br />
nos resultados, que se correlacionou de forma positiva no<br />
desempenho do teste, sugerindo um impacto benéfico do<br />
nível educacional no efeito da idade sobre a cognição 11 .<br />
Outros estudos brasileiros, com idosos saudáveis, também<br />
destacaram contribuições utilizando o teste, como o<br />
de Magalhães e Hamdan 12 , que analisaram a influência de<br />
variáveis demográficas, como idade, gênero e educação,<br />
sobre o desempenho no RAVLT. Constatou-se que a idade<br />
foi o principal fator que influenciou o desempenho no teste.<br />
Houve influência, ainda, da escolaridade, o que não ocorreu<br />
com gênero. Além disso, houve efeito significativo da idade<br />
sobre todas as medidas avaliadas e efeitos significativos<br />
também da escolaridade, com exceção do reconhecimento.<br />
O estudo de Fichman-Charchat et al. 13 constatou que o desempenho<br />
dos sujeitos melhorou com o fator educação e<br />
diminuiu com o aumento da idade, mas não foram encontradas<br />
diferenças significativas de gênero. Já Martins e Damasceno<br />
4 estudaram a memória prospectiva e retrospectiva<br />
em pacientes brasileiros com doença de Alzheimer (DA) leve<br />
e foi verificado desempenho pior na recordação tardia do<br />
teste.<br />
Os idosos com declínio da capacidade cognitiva apresentam<br />
maior risco de desenvolver a doença de Alzheimer,<br />
principalmente os que já evidenciam prejuízo da memória<br />
episódica 14 . O primeiro sintoma observado é exatamente<br />
uma alteração na capacidade de aprender e reter novos conteúdos<br />
1 . Para Fichman-Charchat et al. 14 , o pior desempenho<br />
da memória episódica anterógrada, em especial em tarefas<br />
de aprendizagem associativa e evocação livre após intervalo,<br />
predispõe à DA.<br />
O estudo estrangeiro de Barzotti et al. 15 , por meio do RA-<br />
VLT e testes de rastreio, confirma tais afirmativas. Ele verificou<br />
uma possível correlação entre disfunção cognitiva e prejuízo<br />
de memória verbal, cuja deficiência aparece precocemente<br />
na doença de Alzheimer, concluindo sobre a importância de<br />
avaliar a memória verbal de curto e longo prazo na fase inicial.<br />
O desempenho inferior de pacientes com DA e o comprometimento<br />
cognitivo leve (CCL) no RAVLT também são<br />
estudados, pois se observa que aqueles que têm maior risco<br />
de desenvolver DA são idosos com CCL, principalmente<br />
os que apresentaram prejuízo da memória episódica 14,16 .<br />
O CCL amnéstico é tido como uma transição entre o envelhecimento<br />
normal e a DA em estágio inicial. O teste, portanto,<br />
pode ser um instrumento neuropsicológico eficaz para<br />
também avaliar a memória nessa possível transição 9 . Balthazar<br />
et al. 3 constataram um desempenho inferior dos pacientes<br />
com CCL em relação aos controles que passaram pelo<br />
RAVLT. Pacientes com DA foram ainda piores que aqueles<br />
que tinham comprometimento cognitivo leve, e esses tiveram<br />
desempenho pior que os controles.<br />
Comparando o desempenho de idosos normais e idosos<br />
com doença de Alzheimer, a pesquisa de Sánchez e Sayago 1<br />
verificou a eficiência do RAVLT na avaliação da memória dos<br />
idosos com a demência. Enquanto os controles se sobressaíram<br />
no teste, observou-se que os demais pacientes tive-<br />
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artigo original<br />
Validade discriminante do RAVLT: comparação entre idosos normais e idosos na fase inicial da doença de Alzheimer<br />
255<br />
ram alteração na capacidade de aprender e reter uma nova<br />
informação. Concluiu-se que o teste consegue discriminar,<br />
com mínima margem de erro, os pacientes com a doença<br />
de Alzheimer. Estévez-González et al. 5 também confirmaram<br />
a aplicabilidade do RAVLT, ao avaliarem a possibilidade de<br />
diferenciação da fase pré-clínica da doença de Alzheimer,<br />
do comprometimento cognitivo leve e do envelhecimento<br />
normal.<br />
Além disso, idosos com síndrome depressiva também<br />
podem, com frequência, sofrer alterações cognitivas, sendo<br />
muitas alterações decorrentes da depressão semelhantes<br />
às das demências. Por outro lado, outras se assemelham ao<br />
envelhecimento normal 17 . A diferenciação entre depressão<br />
e demência também pode ser auxiliada pelo RAVLT, principalmente<br />
em casos de distração entre evocação imediata e<br />
tardia. Com dificuldade no teste de memória, os pacientes<br />
com DA esquecem o conteúdo das informações após intervalo<br />
de tempo 18 , diferentemente do que ocorre em idosos<br />
em depressão que passam pelo teste 17 .<br />
O estudo da avaliação da memória na população idosa,<br />
possível em testes como o RAVLT, é uma área de crescente<br />
interesse. No entanto, ainda é necessária a normatização brasileira<br />
do teste para auxiliar na diferenciação entre sujeitos<br />
normais e na fase inicial da DA.<br />
Apesar da existência de estudos normativos, ainda não<br />
há estudos sobre a validade de critério do RAVLT no Brasil,<br />
considerando diagnóstico diferencial entre sujeitos normais<br />
e na fase inicial da DA. Assim, este estudo tem como objetivo<br />
avaliar a capacidade do RAVLT em discriminar indivíduos<br />
normais e indivíduos com quadro inicial de demência do<br />
tipo Alzheimer, considerando cada um dos escores obtidos<br />
pela aplicação do instrumento nesses grupos distintos.<br />
MÉTODOS<br />
Participantes<br />
O estudo foi desenvolvido com delineamento transversal.<br />
Avaliaram-se 70 sujeitos de ambos os sexos com idade entre<br />
60 e 84 anos, divididos em dois grupos: o grupo caso (n = 35)<br />
e o grupo controle (n = 35).<br />
Os seguintes critérios foram estabelecidos como condições<br />
para inclusão dos participantes na amostra:<br />
1) Pontuação acima do ponto de corte no MEEM, proposto<br />
por Brucki et al. 19 , condizente com a escolarização formal<br />
do participante, sendo este um critério exclusivo ao grupo<br />
controle.<br />
2) Pontuação inferior a seis pontos na GDS-15, proposto<br />
por Paradela et al. 20 .<br />
3) Ter pelo menos quatro anos de escolaridade, na medida<br />
em que a versão brasileira do teste tem como grupo<br />
normativo indivíduos com esse nível de escolaridade 11 .<br />
O grupo caso foi composto por idosos examinados por<br />
médicos geriatras do Centro de Referência do Idoso do Hospital<br />
das Clínicas da UFMG e que preencheram os critérios<br />
diagnósticos para DA provável, com base no DSM-IV 21 . A escala<br />
de Avaliação Clínica das Demências 22 foi utilizada como<br />
instrumento objetivo para a seleção dos participantes, limitando<br />
a seleção de casos para demência em fase inicial (CDR<br />
= 1). Esses pacientes foram, então, convidados a participar<br />
do presente estudo, preenchendo o termo de consentimento<br />
livre e esclarecido, assim como seus cuidadores diretos.<br />
Os sujeitos incluídos no grupo controle foram selecionados<br />
em grupos de convivência de idosos, com base na<br />
entrevista clínica realizada por um dos autores (MFC). Participantes<br />
com histórico de transtornos psiquiátricos ou neurológicos<br />
foram excluídos da seleção.<br />
Para rastreio de declínio cognitivo patológico em ambos<br />
os grupos, utilizaram-se os testes Miniexame do Estado Mental<br />
(MEEM) 19 e para avaliação de sintomas depressivos, a versão<br />
brasileira da Escala de Depressão Geriátrica (GDS-15) 20-23 .<br />
Os participantes que atenderam aos critérios de inclusão foram,<br />
então, submetidos ao RAVLT e às tarefas, no intervalo<br />
de 20 a 25 minutos, que incluíram o teste Torre de Londres<br />
e Blocos de Corsi.<br />
O presente estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê<br />
de Ética em Pesquisa do Hospital Governador Israel Pinheiro<br />
– IPSEMG, estado de Minas Gerais, Brasil (CEP 374/09).<br />
Descrição do teste<br />
O RAVLT consiste em uma lista de 15 substantivos simples,<br />
palavras de alta frequência no português brasileiro (lista A),<br />
que são lidas em voz alta para o sujeito, com um intervalo<br />
de aproximadamente 1 segundo entre as palavras 10 , por cinco<br />
vezes consecutivas (A1 a A5). Após cada leitura da lista, é<br />
requerido ao probando que tente se lembrar do maior número<br />
possível de palavras da lista, não importando a ordem<br />
(a partir da segunda leitura, devem ser repetidas também as<br />
palavras recordadas anteriormente). Depois da quinta tentativa<br />
(A5), uma lista de interferência, também composta por<br />
15 substantivos (lista B), é lida para o sujeito, sendo seguida<br />
da evocação dela (tentativa B1).<br />
Logo após a tentativa B1, pede-se ao probando que recorde<br />
as palavras da lista A, sem que ela seja, nesse momento,<br />
reapresentada (tentativa A6). Após um intervalo de 20 a<br />
25 minutos, que deve ser preenchido com outras atividades<br />
que não envolvam testes verbais ou de memória, pede-se<br />
ao sujeito que tente se recordar novamente das palavras da<br />
lista A (A7), sem a apresentação do estímulo. Após a etapa<br />
A7 é realizada uma tarefa de reconhecimento, em que o sujeito<br />
deve identificar as 15 palavras da lista A em meio a 35<br />
distratores (palavras da lista B e outras palavras semântica ou<br />
foneticamente associadas às palavras-alvo).<br />
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artigo original<br />
A pontuação do teste de memória de reconhecimento é<br />
calculada somando todos os acertos (quando o sujeito identifica<br />
corretamente que a palavra pertence à lista A ou que a<br />
palavra não pertence à lista A) – 35 (total de distratores). Esse<br />
procedimento permite avaliar não apenas a identificação dos<br />
alvos (palavras da lista A), mas também leva em consideração<br />
o efeito de falsos-positivos (identificação de distratores)<br />
e falsos-negativos (palavras da lista A não identificadas). Porém,<br />
para as análises subsequentes, optou-se por transformar<br />
todos os valores em números positivos, de modo a facilitar<br />
a comparação entre os grupos. Assim, utilizou-se apenas o<br />
número total de acertos na tarefa de reconhecimento.<br />
Procedimentos<br />
Primeiramente, utilizou-se de estatística descritiva para caracterização<br />
da amostra. O teste de Kolmorogov-Sminorff foi<br />
realizado para verificar o tipo de distribuição amostral dos<br />
dados e para a escolha da estatística mais adequada para<br />
comparação entre os grupos (paramétrica ou não paramétrica).<br />
Considerou-se o valor p < 0,05 para estabelecimento<br />
da significância estatística. Em um segundo momento, cada<br />
etapa do RAVLT (A1, A2, A3, A4, A5, B1, A6, A7 e Reconhecimento)<br />
foi utilizada como critério para a discriminação entre<br />
os grupos caso e controle por meio de análise da curva ROC<br />
(Curva de Características de Operação do Receptor), avaliando<br />
o potencial de cada componente no RAVLT para a diferenciação<br />
dos dois grupos.<br />
A maior parte delas está acima de 0,9, indicando que o RAVLT<br />
é um teste bastante sensível e específico na separação dos<br />
dois grupos. As curvas das etapas A1 até A5 estão expostas<br />
no gráfico 1, enquanto as curvas de B1, A6, A7, Total e Reconhecimento,<br />
no gráfico 2.<br />
Tabela 1. Características sociodemográficas e clínicas: comparação<br />
entre os grupos<br />
Características Controle DA a Valor p<br />
Sexo n (%) n (%) < 0,001 b<br />
Masculino 4 (11,4) 17 (48,6)<br />
Feminino 31 (88,6) 18 (51,4)<br />
Idade Anos Anos 0,126<br />
60-80 60-84<br />
Média (DP c )<br />
Média (DP)<br />
71,4 (6,0) 71,7 (7,6)<br />
Escolaridade Anos Anos 0,284<br />
4-11 4-16<br />
Média (DP)<br />
Média (DP)<br />
6,1 (2,8) 7,1 (3,7)<br />
MEEM d 26,8 (1,9) 20,71 (3,9) < 0,001<br />
GDS-15 e 2,74 (1,75) 2,91 (2,13) 0,721<br />
a) DA: doença de Alzheimer; b) Valor de p obtido por meio do qui-quadrado de Pearson. Os demais valores de<br />
p foram obtidos por meio do teste não paramétrico de Mann-Whitney. Ambos significantes se p ≤ 0,05; c) DP:<br />
Desvio-padrão; d) Miniexame do Estado Mental; e) Escala de Depressão Geriátrica. Pontuação inferior a seis pontos.<br />
RESULTADOS<br />
Os dois grupos foram pareados por idade e escolaridade. Os<br />
limites de educação formal dos sujeitos estiveram entre 4 e<br />
16 anos. Para assegurar a equidade dos dois grupos, foram<br />
realizados testes t não paramétricos (Mann-Whitney) com as<br />
variáveis idade (p = 0,126), escolaridade (p = 0,284) e sintomas<br />
depressivos mensurados pela GDS (p = 0,721). Foi utilizado<br />
o teste de associação de qui-quadrado para verificar<br />
estatisticamente se houve diferença entre os grupos em relação<br />
ao sexo. Contudo, o grupo controle contou com mais<br />
mulheres do que homens quando comparado ao grupo clínico<br />
(χ 2 = 11,49 p < 0,001).<br />
A análise das variáveis demográficas mostrou que não<br />
houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos<br />
quanto a idade, escolaridade e GDS (valor p > 0,05). As<br />
características sociodemográficas e clínicas da amostra estão<br />
expostas na tabela 1.<br />
A comparação entre os dois grupos nas diferentes etapas<br />
do RAVLT revelou melhor desempenho do grupo controle<br />
sobre o grupo caso (p < 0,001) em todos os componentes do<br />
teste. Os resultados estão expostos na tabela 2.<br />
As áreas sobre a curva foram robustas na discriminação<br />
entre as duas condições conforme demonstra a tabela 3.<br />
Tabela 2. Comparação entre os grupos nas variáveis do RAVLT*<br />
Itens do teste A1 A2 A3 A4 A5 B1 A6 A7 REC<br />
Mann-Whitney U 238,0 160,0 51,5 64,5 13,0 249,5 46,0 18,0 107,0<br />
Valor p 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00<br />
* Resultado da análise pelo teste Mann-Whitney U. REC: Reconhecimento.<br />
Tabela 3. Áreas sobre curvas para tentativas A1, A2, A3, A4, A5, A6,<br />
A7 e os itens TOTAL, LOT e REC<br />
Variáveis do teste<br />
Área<br />
A1 0,806<br />
A2 0,869<br />
A3 0,958<br />
A4 0,947<br />
A5 0,989<br />
A6 0,962<br />
A7 0,985<br />
TOTAL 0,975<br />
LOT 0,895<br />
REC 0,915<br />
Total: aprendizagem auditivo-verbal; LOT: aprendizagem auditivo-verbal, considerando o aprendizado total em<br />
relação ao aprendizado inicial (A1); REC: reconhecimento.<br />
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Validade discriminante do RAVLT: comparação entre idosos normais e idosos na fase inicial da doença de Alzheimer<br />
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Curva ROC<br />
Curva ROC<br />
Sensibilidade<br />
Origem da curva<br />
A1<br />
A2<br />
A3<br />
A4<br />
1,0 A5<br />
1,0<br />
Linha de referência<br />
0,8 0,8<br />
0,6 0,6<br />
0,4 0,4<br />
Sensibilidade<br />
Origem da curva<br />
A6<br />
A7<br />
TOTAL<br />
LOT<br />
REC<br />
Linha de referência<br />
0,2 0,2<br />
0,0 0,0<br />
0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0<br />
1 – Especificidade 1 – Especificidade<br />
Diagonal segments are produced by ties<br />
Gráfico 1. Curva ROC para a tentativa A1, A2, A3, A4, A5.<br />
Diagonal segments are produced by ties<br />
Gráfico 2. Curva ROC para a tentativa A6, A7, TOTAL, LOT, REC.<br />
DISCUSSÃO<br />
O objetivo do presente estudo foi avaliar a validade discriminante<br />
do Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey,<br />
mas ainda não há estudos sobre a validade de critério do teste<br />
no Brasil comparando o desempenho de idosos normais<br />
e idosos na fase inicial da doença de Alzheimer. O principal<br />
resultado encontrado foi de que o RAVLT é um teste capaz<br />
de discriminar esses dois grupos, ao comprovar o desempenho<br />
inferior de pacientes demenciais em relação ao grupo<br />
controle.<br />
As medidas do RAVLT estudadas apresentaram diferença<br />
estatisticamente significativa comparando os idosos<br />
normais com os idosos com diagnóstico presumido da DA<br />
(valor p < 0,00).<br />
As análises dos itens também apontaram para o poder de<br />
discriminação entre sujeitos normais e demenciados, conforme<br />
pode ser observado pelas análises da curva ROC. Alguns<br />
itens mostraram-se particularmente úteis na distinção entre<br />
sujeitos normais e sujeitos demenciados, por exemplo, os<br />
itens A6, A7 e a memória de reconhecimento. Tais evidências<br />
sugerem que as medidas que dependem da sustentação da<br />
informação ao longo do tempo são particularmente importantes<br />
na distinção entre sujeitos normais e com doença de<br />
Alzheimer, sendo compatíveis com os resultados de outros<br />
estudos 1,4,18 .<br />
Além disso, confirmou ser um instrumento sensível ao<br />
déficit de memória episódica 2,5,9 . A aprendizagem de listas de<br />
palavras do RAVLT permitiu a avaliação da memória episódica<br />
na fase inicial da doença, fornecendo dados para caracterização<br />
do funcionamento mnêmico dos pacientes com<br />
DA que demonstraram alteração na capacidade de aprender<br />
e reter uma nova informação. Não apresentaram curva<br />
de aprendizagem, sendo observada uma associação entre<br />
aprendizagem e consolidação, conforme demonstrado em<br />
outros trabalhos 1,5,6,24 .<br />
Nossos resultados são condizentes com estudos anteriores<br />
1,5,24 conduzidos em amostras de países diferentes que<br />
comprovaram desempenho inferior de pacientes demenciais<br />
em relação ao grupo controle ao longo das etapas do<br />
RAVLT. Foi confirmado, semelhante ao estudo de Estévez-<br />
-González et al. 5 , que o RAVLT contribui para o diagnóstico<br />
diferencial da DA na fase inicial e distingue idosos normais,<br />
sendo um teste neuropsicológico útil para tal finalidade.<br />
Barzotti et al. 15 encontraram diferenças significativas entre<br />
controles normais e indivíduos com provável quadro de<br />
Alzheimer nas medidas do RAVLT, além de uma correlação<br />
negativa entre o desempenho no teste e o escore na CDR.<br />
No entanto, os autores não excluíram sujeitos com quadro<br />
depressivo. Nesse sentido, nosso estudo apresenta a vantagem<br />
de comparar sujeitos normais com uma amostra de<br />
indivíduos na fase inicial da doença e sem quadro depressivo<br />
instaurado, conforme resultados do teste de Mann-Whitney<br />
da GDS (valor p = 0, 721).<br />
A análise das variáveis demográficas e clínicas mostrou<br />
que não houve diferença estatisticamente significativa entre<br />
os grupos quanto a idade, escolaridade e escores da GDS<br />
(valor p > 0,05). Esses resultados demonstram a qualidade da<br />
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artigo original<br />
metodologia empregada para seleção dos indivíduos, uma<br />
vez que tais variáveis, importantes confundidores, não foram<br />
estatisticamente diferentes.<br />
O estudo apresenta limitações no tamanho da amostra<br />
e em relação à diferença da frequência de homens e mulheres<br />
na amostra. Cabe salientar, entretanto, que o efeito do<br />
gênero no RAVLT é controverso, existindo dados que apontam<br />
para um melhor desempenho feminino em alguns itens<br />
do teste 11,18,25-28 e outros que não encontraram tais diferenças<br />
8,12,13,29-31 . De forma a avaliar o papel do gênero no desempenho,<br />
subdividiu-se cada grupo em homens e mulheres,<br />
comparando seus desempenhos por meio do teste Mann-<br />
-Whitney. Não se encontraram diferenças estatisticamente<br />
significativas entre os dois subgrupos (DA: p = 0,053-0,935;<br />
Controles: p = 0,235-0,900). Estudos futuros, com amostras<br />
maiores, deverão utilizar modelos de regressão linear para<br />
avaliar o efeito específico dessa variável na discriminação entre<br />
homens e mulheres com doença de Alzheimer.<br />
Estudos futuros em amostras maiores e mais heterogêneas<br />
poderão fornecer dados adicionais sobre a validade da<br />
nova versão do RAVLT e suas propriedades clínicas em grupos<br />
brasileiros.<br />
CONCLUSÃO<br />
Os resultados do presente estudo apontam para as boas características<br />
de validade discriminante da versão do RAVLT<br />
composta por palavras de alta frequência no idioma português<br />
praticado no Brasil. Na medida em que já existem normas<br />
brasileiras para aplicação do teste em idosos, os resultados<br />
aqui apresentados reforçam as propriedades psicométricas<br />
adequadas do instrumento, sugerindo sua aplicabilidade na<br />
clínica e pesquisa brasileira com populações semelhantes.<br />
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artigo original<br />
Associação entre polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR e a<br />
resposta ao tratamento da dependência de nicotina<br />
Association between polymorphism SLC6A3 3’UTR VNTR<br />
and response to treatment of nicotine dependence<br />
Guilherme Rubino de Azevedo Focchi 1 , Ismael Dale Cotrim Guerreiro da Silva 2 , Sandra Scivoletto 3<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Dependência, nicotina,<br />
abstinência, polimorfismo.<br />
Objetivo: Avaliar a associação entre a resposta ao tratamento da dependência de nicotina<br />
com bupropiona e a presença do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR, localizado no gene que<br />
codifica o transportador dopaminérgico. Método: Foram acompanhados no Ambulatório<br />
de Tabagismo do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP 100 pacientes do<br />
sexo masculino com diagnóstico de dependência de nicotina, sem outras patologias. Todos<br />
receberam bupropiona até 300 mg ao dia por 12 semanas, associada à terapia cognitivo-<br />
-comportamental em grupo. A Escala de Fagerström foi aplicada no início e no final do tratamento,<br />
e avaliou-se a parada do uso de cigarros na última semana de tratamento e um mês<br />
após. Os pacientes tiveram 10 ml de sangue colhidos e genotipados para a existência do<br />
polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR. Resultados: Não foi encontrada associação entre cessação<br />
do uso de cigarro e presença do polimorfismo. Conclusão: São necessários mais estudos<br />
para avaliar se a presença do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR estaria relacionada à melhor<br />
resposta ao tratamento da dependência de nicotina.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Dependence, nicotine,<br />
withdrawal, polymorphism.<br />
Objective: To evaluate the association between response to treatment of nicotine dependence<br />
with bupropion and the presence of the polymorphism SLC6A3 3’UTR VNTR, in the gene that codifies<br />
the dopaminergic transporter. Method: A hundred patients were treated in the Nicotine Dependence<br />
Outpatient Clinic of the Institute of Psychiatry, University of São Paulo Medical School.<br />
All patients were male, diagnosed as nicotine dependents and had no other diseases. All received<br />
bupropion until 300 mg a day for 12 weeks, combined with cognitive-behavioral group therapy.<br />
The Fagerström Scale was applied at the beginning and at the end of treatment. Cigarette cessation<br />
was evaluated in the last week of treatment and one month later. Patients had 10 ml blood extracted<br />
and genotiped for SLC6A3 3’UTR VNTR polymorphism. Results: There was no association<br />
between cigarettes cessation and the presence of polymorphism. Conclusion: More studies are<br />
needed to assess whether the presence of polymorphism SLC6A3 3’UTR VNTR could be associated<br />
with a better response to treatment of nicotine dependence.<br />
Recebido em<br />
10/6/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
27/9/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina, Instituto de Psiquiatria (IPq), Hospital das Clínicas, Grupo Interdisciplinar de<br />
Estudos em Álcool e Drogas (GREA).<br />
2 Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Faculdade de Medicina, Departamento de Ginecologia, Laboratório de Ginecologia Molecular.<br />
3 USP, Faculdade de Medicina, Departamento de Psiquiatria, IPq, Hospital das Clínicas, Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência<br />
(SEPIA).<br />
Endereço para correspondência: Guilherme Rubino de Azevedo Focchi<br />
Rua Dr. Ovídio Pires de Campos, 785, Cerqueira César – 05403-903 – São Paulo, SP<br />
Telefone: (11) 2661-6960<br />
E-mail grfocchi@gmail.com
260 Focchi GRA et al.<br />
artigo original<br />
INTRODUÇÃO<br />
Atualmente, há cerca de 1,3 bilhão de fumantes no mundo,<br />
e a metade deles, se continuar fumando, morrerá prematuramente<br />
de doenças cardiovasculares, câncer ou doenças<br />
respiratórias. A expectativa de vida dos fumantes é em média<br />
25% menor que a dos não fumantes. O cigarro causa cerca de<br />
5 milhões de mortes anualmente no mundo e, se a tendência<br />
for mantida, o número de mortes em 2020 aumentará para<br />
10 milhões 1-5 . No Brasil, 35% dos homens e 27% das mulheres<br />
fumam, totalizando cerca de 35 milhões de fumantes, sendo<br />
que no país ocorrem cerca de 200 mil mortes ao ano associadas<br />
ao uso de cigarros 6 . Nos Estados Unidos, 60% dos gastos<br />
com saúde são empregados no tratamento de patologias relacionadas<br />
ao tabagismo, totalizando 1 bilhão de dólares ao<br />
dia; no Brasil, os gastos com doenças relacionadas ao tabagismo<br />
ultrapassam 330 milhões de reais ao ano 4,6 . Pode-se afirmar<br />
que a dependência de nicotina constitui hoje a principal<br />
causa de óbito passível de prevenção nos países ocidentais,<br />
sendo um enorme problema de saúde pública. Isso reforça a<br />
necessidade de investimento em pesquisas sobre seus determinantes<br />
e de novas abordagens terapêuticas 7,8 .<br />
Os tratamentos atualmente usados na dependência de<br />
nicotina são: a terapia cognitivo-comportamental, a terapia<br />
de reposição de nicotina (TRN) e os tratamentos farmacológicos<br />
com bupropiona, nortriptilina e, mais recentemente,<br />
com vareniclina 9,10 . No caso específico da bupropiona, as<br />
taxas de cessação do uso de cigarro variam de 25% a 35%<br />
por um período de seis meses, altas se comparadas a outras<br />
medicações 11 .<br />
Sabe-se que o comportamento de fumar é influenciado<br />
pelo genótipo, de forma que há efeito do polimorfismo DRD2<br />
Taq1A na iniciação do tabagismo e da redução da atividade<br />
do polimorfismo CYP 2A6 no aumento do consumo de cigarros<br />
8,10 . Nesse sentido, evidências em modelos humanos e<br />
animais sugerem a importância da dopamina como substrato<br />
do circuito de recompensa na dependência de nicotina.<br />
O foco atual das pesquisas tem se voltado para a influência<br />
da variação individual na transmissão dopaminérgica na resposta<br />
aos tratamentos farmacológicos para tabagismo 12 .<br />
A bupropiona liga-se ao transportador dopaminérgico; o<br />
polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR aumenta a codificação do<br />
transportador e, assim, poderia facilitar a ação desse fármaco.<br />
A associação entre a presença desse polimorfismo e o emprego<br />
da bupropiona, que funciona como agonista dopaminérgico,<br />
aumentaria a disponibilidade de dopamina endógena,<br />
e consequentemente o comportamento de procura<br />
pela nicotina seria reduzido 13 , facilitando a cessação do uso<br />
do cigarro. A presença do alelo 9 do referido polimorfismo<br />
estaria relacionada à maior taxa de cessação de cigarros em<br />
comparação ao alelo 10, o que justificaria o seu estudo 13 .<br />
Uma metanálise envolvendo cinco estudos, com um total<br />
de 2.155 sujeitos, investigou a presença do polimorfismo<br />
SLC6A3 3’UTR VNTR e sua relação com a parada do uso de<br />
cigarros. Verificou-se que em quatro deles houve tendência,<br />
porém sem resultado significativo, à associação entre a presença<br />
desse polimorfismo e a cessação do uso de cigarros.<br />
Os autores enfatizam a importância de mais pesquisas sobre<br />
esse polimorfismo no tratamento de fumantes 13 .<br />
No Brasil, não há estudos controlados farmacogenéticos<br />
sobre o referido polimorfismo e sua influência no tratamento<br />
de dependentes de nicotina com a bupropiona. Considerando<br />
que as diferentes etnias refletem diferenças genotípicas,<br />
faz-se necessário o estudo de polimorfismos na população<br />
brasileira, que é altamente miscigenada.<br />
Dessa forma, o objetivo deste estudo é avaliar a relação<br />
entre a resposta ao tratamento psiquiátrico da dependência<br />
de nicotina e a presença do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR<br />
em uma amostra clínica brasileira.<br />
MÉTODOS<br />
Seleção dos sujeitos<br />
Os pacientes foram acompanhados em ambulatório específico<br />
para o atendimento de dependentes de nicotina no<br />
Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto<br />
de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade<br />
de Medicina da Universidade de São Paulo (GREA-IPQ-HCF-<br />
MUSP), no período de agosto de 2008 a novembro de 2009.<br />
Foram selecionados 100 sujeitos dependentes de nicotina,<br />
mediante divulgação da pesquisa dentro do Complexo<br />
HC e da FMUSP. Os critérios de inclusão foram: indivíduos<br />
de ascendência europeia, segundo critério do avaliador, para<br />
possibilitar a comparação dos resultados com outros estudos<br />
10 ; sexo masculino; idade entre 18 e 50 anos; diagnóstico<br />
de dependência de nicotina pelo Diagnostic and Statistical<br />
Manual of Mental Disorders, quarta edição (DSM-IV) 7 ; uso de<br />
mais de 10 cigarros por dia há pelo menos um ano; residência<br />
fixa na grande São Paulo; primeiro grau completo; telefone<br />
para contato e assinatura do termo de consentimento<br />
livre e esclarecido 14 . Os critérios de exclusão foram: presença<br />
de patologias clínicas ou psiquiátricas que necessitassem de<br />
tratamento em regime de internação; patologias cardíacas,<br />
como arritmias e infarto agudo do miocárdio; comorbidades<br />
psiquiátricas; uso de medicação psiquiátrica; antecedentes<br />
de epilepsia e convulsões 14 e hipersensibilidade à bupropiona.<br />
A presença de patologias psiquiátricas foi verificada por<br />
meio de entrevista psiquiátrica, realizada pelo médico psiquiatra<br />
e principal pesquisador do estudo, e que também foi<br />
o responsável pela seleção da amostra.<br />
De início, foram triados 250 indivíduos; foram excluídos<br />
150 sujeitos, que não obedeceram aos critérios de seleção,<br />
pois apresentavam outros diagnósticos (por exemplo: depressão,<br />
dependência alcoólica) e pelo uso de outras medi-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):259-65.
artigo original<br />
Polimorfismo e tratamento do tabagismo<br />
261<br />
cações (por exemplo: antidepressivos). Estes foram encaminhados<br />
para outros serviços de tratamento de dependência<br />
de nicotina.<br />
O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para Análise<br />
de Projetos de Pesquisa (CAPPesq) da Diretoria Clínica do<br />
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade<br />
de São Paulo (protocolo nº 798/05).<br />
Tratamento e seguimento<br />
Após avaliação dos critérios de inclusão e exclusão, a proposta<br />
e a metodologia do estudo foram explicadas detalhadamente<br />
a cada paciente, enfatizando-se a obrigatoriedade<br />
da coleta de sangue no início do tratamento e o uso da medicação.<br />
Foi utilizado o antidepressivo bupropiona, combinado à<br />
terapia de grupo de modelo cognitivo-comportamental, por<br />
12 semanas 15,16 . As consultas médicas foram realizadas uma<br />
vez por semana, com duração de 30 minutos, e os pacientes,<br />
no mesmo dia da consulta individual, foram atendidos em<br />
grupo de terapia cognitivo-comportamental, pelo mesmo<br />
médico.<br />
Os grupos de terapia tiveram entre quatro e seis pacientes<br />
por grupo. As sessões de grupo tiveram duração de 50<br />
minutos, enfocando a prevenção de recaída no tabagismo,<br />
como a identificação dos fatores de recaída e estratégias<br />
para lidar com a “fissura” pelo cigarro. Os temas nos grupos<br />
não foram definidos previamente, e o terapeuta procurou<br />
coordenar as discussões, sempre enfocando a questão da<br />
dependência de nicotina e a prevenção de recaídas.<br />
Na primeira consulta individual, os pacientes receberam<br />
bupropiona na dose de 150 mg (1 cp) ao dia nos primeiros<br />
quatro dias, aumentando a dose após esse período para 300 mg<br />
ao dia (2 cps, sendo um de manhã e um à tarde). A bupropiona<br />
300 mg ao dia foi mantida até o final do tratamento,<br />
sendo então retirada abruptamente 17 . Os pacientes poderiam<br />
interromper a medicação caso apresentassem efeitos<br />
colaterais intoleráveis. O controle da medicação e de seu<br />
fornecimento aos pacientes foi realizado pelo médico, que<br />
dava aos pacientes comprimidos em quantidade suficiente<br />
até o retorno seguinte. Os efeitos colaterais pela medicação<br />
foram coletados durante as consultas individuais, pelo médico.<br />
Não foi empregado questionário para checagem dos<br />
efeitos colaterais, para evitar indução de relato pelos pacientes,<br />
dando-se, assim, liberdade para que estes observassem<br />
espontaneamente as reações adversas, quando ocorressem.<br />
Os pacientes que abandonaram o tratamento não foram repostos,<br />
sendo também considerados na avaliação dos resultados<br />
desta intervenção.<br />
A Escala de Fagerström, questionário que avalia a gravidade<br />
da dependência de nicotina, foi aplicada na primeira e<br />
na última consulta individual 18,19 .<br />
Os dados sociodemográficos e o perfil de consumo de cigarros<br />
foram coletados na anamnese, pelo médico. No caso,<br />
a anamnese foi realizada mediante entrevista semiestruturada,<br />
com as questões focadas no tema tabagismo.<br />
Na primeira consulta, foram colhidos 10 ml de sangue de<br />
cada paciente (para evitar perdas de material) e, em seguida,<br />
armazenados para estudo genético.<br />
Estudo genético<br />
Após a extração do DNA, foi realizada a amplificação por<br />
meio da reação de cadeia de polimerase (PCR). As sequências<br />
de “primer” utilizadas para a amplificação do DNA foram<br />
5’ – TGT GGT GTA GGG AAC GGC CTG AG – 3’ e 5’ – CTT CCT<br />
GGA GGT CAC GGC TCA AGG – 3’ (alelo 9 do polimorfismo<br />
SLC6A3 3’UTR VNTR) 20 .<br />
Seguimento pós-estudo<br />
Um mês após o final do tratamento, os pacientes foram avaliados<br />
uma única vez por telefone, no sentido de averiguar<br />
se estavam ou não abstinentes de nicotina 9 . Foi perguntado<br />
aos que pararam de fumar se mantinham a cessação do uso<br />
de cigarro e aos que não pararam se haviam conseguido parar.<br />
Em ambos os casos, registrou-se resposta do tipo “sim”<br />
ou “não”. O contato foi realizado pelo pesquisador, que lembrou<br />
os pacientes a respeito do telefonema na última semana<br />
de tratamento.<br />
Análise estatística<br />
Os dados sociodemográficos (estado civil, trabalho e escolaridade)<br />
foram analisados para a amostra completa. As pontuações<br />
na Escala de Fagerström, no início e no final do tratamento,<br />
foram comparadas. Ao final do estudo, os pacientes<br />
foram divididos em dois grupos: aqueles que cessaram o<br />
uso de cigarro e os que não cessaram seu uso. Os dois grupos<br />
foram comparados quanto à presença do polimorfismo<br />
SLC6A3 3’UTR VNTR, tentativas anteriores de parar de fumar,<br />
assiduidade no tratamento e número de cigarros fumados<br />
ao dia. Foi realizada análise bivariada (teste do qui-quadrado<br />
para variáveis categóricas e prova de Mann-Whitney para variáveis<br />
contínuas). Para avaliar a diferença na pontuação da<br />
Escala de Fagerström, foi empregado o teste de Wilcoxon.<br />
O nível de significância considerado foi de 5%.<br />
RESULTADOS<br />
Características sociodemográficas e padrão<br />
inicial de uso de nicotina<br />
Na amostra total, 64% dos pacientes (n = 64) eram casados,<br />
24% (n = 24), solteiros, 11% (n = 11), separados e 1% (1 paciente),<br />
viúvo. A maioria dos pacientes (97%, ou 97 pacientes)<br />
estava trabalhando; quanto à escolaridade, 67% (n = 67)<br />
tinham segundo grau completo, 28% (n = 28) tinham terceiro<br />
grau completo e apenas 5% (n = 5) tinham primeiro grau<br />
completo.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):259-65.
262 Focchi GRA et al.<br />
artigo original<br />
A média/desvio-padrão (DP) da pontuação da Escala<br />
de Fagerström no início do tratamento foi de 5,96 +/- 2,14.<br />
A média/DP do número de cigarros fumados ao dia no início<br />
do estudo foi de 31,85 +/- 14,52.<br />
Aderência ao tratamento e cessação do uso de<br />
cigarro<br />
Dos 100 pacientes que iniciaram o estudo, 80% (n = 80) se<br />
mantiveram até o final do tratamento. Conseguiu-se um<br />
total de 84% amostras de sangue (n = 84). Seis pacientes<br />
que colheram a amostra de sangue no início do tratamento<br />
abandonaram o estudo. Dos pacientes que permaneceram<br />
no estudo, 81% (n = 65) interromperam o uso do cigarro.<br />
Considerando apenas os pacientes que completaram o<br />
estudo (n = 80), a média/DP da Escala de Fagerström no início<br />
do tratamento foi de 5,96 +/- 2,14, e, no final do tratamento, de<br />
0,43 +/- 1,25, encontrando-se redução significativa na gravidade<br />
de dependência segundo esse instrumento (p < 0,0001).<br />
Análise da associação entre cessação de uso de<br />
cigarro versus polimorfismo<br />
Para o estudo da associação da cessação do uso e polimorfismo,<br />
considerou-se a amostra de 84 pacientes, que foram<br />
aqueles que foram genotipados.<br />
Observa-se, na tabela 1, que 75% (n = 63) cessaram o uso<br />
de cigarro e que 42,9% (n = 36) tinham o polimorfismo, ao<br />
passo que 32,1% (n = 27) não tinham o polimorfismo. Quando<br />
foi analisada a cessação um mês após o final do tratamento,<br />
41,6% (n = 35) dos pacientes pararam de fumar e<br />
apresentavam o polimorfismo, enquanto 28,6% (n = 24) não<br />
o apresentavam (Tabela 2). Nessas situações, as diferenças<br />
entre a cessação do uso de cigarro e a presença do polimorfismo<br />
não foram significativas.<br />
Associação entre cessação do uso de cigarros,<br />
assiduidade no tratamento e número de cigarros<br />
fumados<br />
Não foi encontrada associação entre cessar o uso de cigarro<br />
ao término do tratamento, tentativas anteriores de parar de<br />
fumar e assiduidade no tratamento entre os pacientes que<br />
permaneceram no estudo (Tabela 3). Porém, com relação ao<br />
número de cigarros consumidos, verificou-se tendência de<br />
diferença significativa: a média/DP do número de cigarros<br />
consumidos foi menor (30,15 +/- 13,4) entre aqueles que<br />
cessaram o uso de cigarro ao término do tratamento (p =<br />
0,06). Quando se considerou o período de um mês após o<br />
final do tratamento, quatro sujeitos que antes haviam parado<br />
de fumar retomaram o uso de cigarro. Não houve associação<br />
entre essas variáveis e a cessação do uso de cigarros<br />
(Tabela 4).<br />
Tabela 3. Associação entre parada do uso de cigarros ao<br />
término do tratamento e número de cigarros fumados,<br />
tentativas anteriores de parar de fumar e assiduidade durante<br />
o tratamento<br />
Cessação do<br />
uso ao final<br />
do estudo<br />
(n = 65)<br />
Não cessação<br />
do uso ao final<br />
do estudo<br />
(n = 15)<br />
Cigarros<br />
(Média/DP)<br />
Tentativas anteriores de<br />
parar de fumar<br />
Assiduidade<br />
Sim Não Sim Não<br />
30,15 (13,4) 93,8% (61) 6,2% (4) 35,4% (23) 64,6% (42)<br />
37,67 (15,2) 100,0% (15) 0,0% (0) 13,3% (2) 86,7% (13)<br />
P 0,060 0,324 0,097<br />
N total 80<br />
Tabela 1. Associação entre cessação do uso de cigarro e presença<br />
do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR no final do estudo<br />
Cessação no final do estudo<br />
Sim Não Abandonou<br />
Presença de polimorfismo 42,9% (36) 7,1% (6) 4,8% (4) 0,44<br />
Ausência de polimorfismo 32,1% (27) 10,7% (9) 2,4% (2)<br />
N Total 84<br />
Tabela 2. Associação entre cessação do uso de cigarro e<br />
presença do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR um mês após o final<br />
do tratamento<br />
Cessação após 1 mês<br />
Sim Não Abandonou<br />
Presença de polimorfismo 41,6% (35) 8,3% (7) 4,8% (4) 0,19<br />
Ausência de polimorfismo 28,6% (24) 14,3% (12) 2,4% (2)<br />
N total 84<br />
p<br />
p<br />
Tabela 4. Associação entre parada do uso de cigarros um<br />
mês após o tratamento e número de cigarros fumados,<br />
tentativas anteriores de parar de fumar e assiduidade durante<br />
o tratamento<br />
Cessação<br />
após 1 mês de<br />
tratamento<br />
(n = 59)<br />
Não cessação<br />
após 1 mês de<br />
tratamento<br />
(n = 21)<br />
Cigarros<br />
Média/(DP)<br />
Tentativas anteriores de<br />
parar de fumar<br />
Assiduidade<br />
Sim Não Sim Não<br />
30,66 (13,6) 93,4% (57) 6,6% (4) 34,4% (21) 65,6% (40)<br />
34,47 (14,9) 100,0% (19) 0,0% (0) 21,1% (4) 78,9% (15)<br />
P 0,301 0,252 0,272<br />
N total 80<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):259-65.
artigo original<br />
Polimorfismo e tratamento do tabagismo<br />
263<br />
Efeitos colaterais<br />
O efeito colateral mais importante nos pacientes que permaneceram<br />
no estudo foi insônia (25%), seguida de obstipação<br />
intestinal (15%) e gosto amargo na boca (13,7%). Um paciente<br />
relatou insônia grave e suspendeu a medicação, permanecendo,<br />
no entanto, até o final do tratamento. Esse paciente<br />
solicitou permanecer na terapia cognitivo-comportamental,<br />
foi incluído na análise genética e não apresentou o polimorfismo.<br />
Não houve relato de efeitos colaterais mais graves,<br />
como convulsões.<br />
DISCUSSÃO<br />
Foi verificada associação entre número de cigarros consumidos<br />
por dia e êxito na cessação do consumo destes: os pacientes<br />
que consumiam menos cigarros por dia tenderam a<br />
conseguir maior êxito na cessação do consumo. Isso evidencia<br />
o número de cigarros fumados ao dia como importante<br />
critério de gravidade, usado, inclusive, na Escala de Fagerström<br />
19 . A intervenção empregada proporcionou a queda da<br />
pontuação nessa escala durante o tratamento, com diferença<br />
significativa entre o início do estudo e seu término. Isso<br />
mostra que o tratamento empregado foi efetivo para reduzir<br />
a gravidade da dependência. De fato, no tratamento do tabagismo,<br />
a simples redução dos sintomas da dependência já<br />
é benéfica para a saúde do indivíduo e pode contribuir para<br />
a cessação do tabagismo em tentativas posteriores de parar<br />
o cigarro. A parada total do uso de cigarros é o objetivo final<br />
do tratamento, e o tratamento precoce é fundamental, antes<br />
que o número de cigarros fumados ao dia aumente 21 .<br />
Não foi verificada associação entre presença do alelo 9<br />
do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR e a parada do uso de<br />
cigarros ao final das 12 semanas de tratamento, o que difere<br />
do verificado em outros trabalhos 12,13 . Um estudo duplo-<br />
-cego randomizado controlado 10 , com 291 pacientes de<br />
ascendência europeia, que receberam bupropiona ou placebo,<br />
combinados à terapia de modelo cognitivo-comportamental<br />
por 12 semanas, fez a genotipagem para o receptor<br />
dopaminérgico D2 (DRD2-Taq1A), para o transportador de<br />
dopamina (SLC6A3 3’UTR VNTR) e para o citocromo CYP2B6.<br />
A dosagem de cotinina, marcador bastante confiável na averiguação<br />
da abstinência de nicotina, foi realizada durante o<br />
tratamento 9 . Nesse estudo, encontrou-se associação significativa<br />
entre o polimorfismo DRD2-Taq1A2A2 e a abstinência<br />
de nicotina com a bupropiona, havendo também interação<br />
estatisticamente significativa entre os polimorfismos DRD2<br />
Taq1A e CYP2B6, de modo que o encontro desses dois genótipos<br />
correspondeu a maiores taxas de abstinência entre<br />
os participantes do estudo. Os autores fazem uma crítica ao<br />
número pequeno de pacientes, no referente à investigação<br />
farmacogenética. Entretanto, deve-se salientar o uso da dosagem<br />
de cotinina e a importância do estudo da interação<br />
entre polimorfismos, no referido trabalho. A diferença com o<br />
presente estudo pode ser decorrente do tamanho menor da<br />
amostra, que teria sido insuficiente para identificar associação.<br />
Dessa forma, evidências indicam efeito do polimorfismo<br />
do sistema dopaminérgico DRD2Taq1 A2A2 e da interação<br />
dos polimorfismos DRD2Taq1A e CYP2B6 no processo de facilitação<br />
da abstinência de cigarros 22,23 .<br />
Outro estudo, com 583 pacientes tabagistas, examinou<br />
a associação entre o polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR e o<br />
tratamento da dependência de nicotina com terapia de reposição<br />
de nicotina ou bupropiona (à escolha do paciente)<br />
e terapia cognitivo-comportamental, por 12 semanas. Nesse<br />
caso, encontrou-se efeito positivo do polimorfismo na parada<br />
precoce de cigarros 24 . O número de pacientes nesse estudo<br />
é maior, porém o fato de os pacientes escolherem o tratamento<br />
medicamentoso criaria um viés no sentido de saber<br />
qual a medicação realmente efetiva na cessação do cigarro.<br />
De fato, a presença do polimorfismo pode não ser o<br />
único fator a se relacionar com a resposta ao tratamento.<br />
O tamanho do polimorfismo (número de “repeats”) poderia<br />
também contribuir para processos dinâmicos que regulariam<br />
a densidade do transportador de dopamina, incluindo<br />
sua expressão proteica. Nesse caso, não é possível calcular<br />
o equilíbrio de Hardy-Weinberg ( 13,25 ). A presença do alelo 9<br />
do polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR poderia reduzir a recaptação<br />
de dopamina, facilitando a cessação de cigarros<br />
pelo paciente, pois haveria maior disponibilidade desse neurotransmissor<br />
no circuito de recompensa cerebral 13,24 . Além<br />
disso, deve-se salientar que outros polimorfismos poderiam<br />
atuar em conjunto 10,13 . O polimorfismo SLC6A3 3’UTR VNTR<br />
poderia também interagir com adaptações neuropsicológicas<br />
persistentes resultantes do tratamento, podendo auxiliar<br />
na manutenção da abstinência 10 .<br />
Não houve problemas de tolerância à medicação, sendo<br />
a frequência de efeitos colaterais similar à encontrada em<br />
outros trabalhos, ressaltando-se a segurança da bupropiona<br />
no tratamento da dependência de nicotina 11,15 .<br />
O presente estudo apresenta algumas limitações. A<br />
amostra estudada foi limitada em 100 pacientes, um número<br />
considerado pequeno para estudos genéticos 10 . Porém, é<br />
importante lembrar que esse estudo era também de resposta<br />
ao emprego de medicação no tratamento de dependência,<br />
ou seja, um estudo clínico que apresenta dificuldades<br />
para ser realizado com amostras maiores, tais como a seleção<br />
da amostra segundo os critérios bastante específicos<br />
de inclusão e exclusão. Nesse sentido, outra limitação é o<br />
critério de seleção de indivíduos de ascendência europeia<br />
a critério do examinador, a saber, pela cor da pele (branca).<br />
A ascendência não está apenas relacionada à cor de pele,<br />
sendo influenciada pelo genótipo individual, não avaliado<br />
neste trabalho. Além disso, é questionável a seleção de indivíduos<br />
de ascendência europeia na população brasileira, que<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):259-65.
264 Focchi GRA et al.<br />
artigo original<br />
tem alto grau de miscigenação. Outro aspecto importante<br />
a ser considerado foi a não utilização de instrumentos de<br />
avaliação para a triagem de pacientes no sentido de excluir<br />
comorbidades psiquiátricas. Optou-se pela entrevista clínica<br />
como instrumento de triagem, porque muitos indivíduos<br />
poderiam apresentar sintomas ansiosos ou depressivos, não<br />
configurando, porém, diagnóstico psiquiátrico. Entretanto,<br />
estudos futuros poderão empregar instrumentos para avaliar<br />
a intensidade de sintomas e correlacioná-los com a resposta<br />
ao tratamento. Da mesma forma, a avaliação do grau de motivação<br />
dos pacientes para o tratamento poderia ser realizada,<br />
no sentido de homogeneizar os grupos de tratamento e<br />
reduzir, assim, a possibilidade de abandonos.<br />
Outro aspecto que merece discussão é o uso de dispositivos<br />
de nicotina, como goma e adesivo, que poderiam<br />
ser usados como forma de tornar a terapêutica mais abrangente.<br />
Porém, o seu uso neste trabalho criaria um viés, na<br />
medida em que não se saberia até que ponto a parada do<br />
uso de cigarros poderia ser atribuída ao efeito específico da<br />
bupropiona.<br />
Também, não foram analisados outros polimorfismos<br />
que poderiam interagir mutuamente e que poderiam estar<br />
associados de forma significativa à parada do uso de cigarros<br />
10 . O citocromo CYP2B6, por exemplo, metaboliza a nicotina,<br />
reduzindo seu nível sérico e reforçando, assim, a procura<br />
por cigarros 26 .<br />
Por fim, outro aspecto a ser considerado é o tempo de seguimento<br />
dos pacientes. Neste trabalho, o tempo de seguimento<br />
foi relativamente curto (12 semanas, mais um telefonema<br />
um mês após o término do tratamento), e a maioria dos<br />
trabalhos publicados sobre o tema faz o follow-up de 12 meses,<br />
haja vista o alto grau de recaídas a médio e longo prazo 14,22 .<br />
Entretanto, um tempo de seguimento mais longo aumentaria<br />
a possibilidade de outros fatores (por exemplo: sociais) interferirem<br />
no estudo, criando um viés e dificultando encontrar a<br />
associação entre o polimorfismo e a cessação do tabagismo.<br />
Apesar das limitações discutidas acima, este trabalho é<br />
o primeiro sobre psicofarmacogenética no tratamento psiquiátrico<br />
do tabagismo no Brasil, país com alto grau de miscigenação<br />
de sua população. Este estudo cria possibilidades<br />
futuras de desenvolvimento de outros trabalhos abordando<br />
a psicofarmacogenética do tabagismo e que contem com o<br />
emprego de metodologias mais refinadas e maior número<br />
de pacientes, tendo como objetivo a seleção de amostras de<br />
indivíduos que responderiam mais efetivamente a tratamentos<br />
propostos, com um mínimo de efeitos colaterais.<br />
CONCLUSÃO<br />
O maior entendimento dos mecanismos genéticos da dependência<br />
de nicotina oferece a possibilidade de tratamento<br />
personalizado aos pacientes, baseado no genótipo. Isso<br />
se configura como o futuro da medicina: o tratamento farmacogenético,<br />
individualizado, com a seleção de pacientes<br />
baseada em seu perfil gênico, levaria à maior efetividade do<br />
tratamento proposto, com um mínimo de efeitos colaterais.<br />
No caso da dependência de nicotina, deve-se salientar<br />
a necessidade de terapias combinadas – medicamentosa e<br />
cognitivo-comportamental –, pois é necessária a mudança<br />
do estilo de vida por parte do paciente para que este se mantenha<br />
abstinente de cigarros 10,24 . Este trabalho aponta para a<br />
necessidade de mais estudos, que contem com melhorias<br />
metodológicas, para avaliar se a presença do polimorfismo<br />
SLC6A3 3’UTR VNTR poderia melhorar a resposta ao tratamento<br />
da dependência de nicotina, sendo importante como modelo<br />
para outros estudos futuros.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
À Maria Rita Passos Bueno, do Instituto de Genômica da Universidade<br />
de São Paulo (USP), e à Cristiane Alves Oliveira, do<br />
Laboratório de Ginecologia Molecular da Universidade Federal<br />
de São Paulo (Unifesp).<br />
O presente trabalho recebeu apoio financeiro (auxílio-<br />
-pesquisa) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de<br />
São Paulo (Fapesp) (projeto 07-54410-4).<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):259-65.
artigo original<br />
Alterações cognitivas em indivíduos brasileiros<br />
com esclerose múltipla surto-remissão<br />
Cognitive profile of Brazilian individuals with<br />
relapsing-remitting multiple sclerosis<br />
Marco Aurélio Negreiros 1 , Jesus Landeira-Fernandez 2 , Cíntia Villela Kirchmeyer 3 , Renata Alves Paes 3 , Regina<br />
Alvarenga 3 , Paulo Mattos 4<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Esclerose múltipla,<br />
cognição, testes<br />
neuropsicológicos.<br />
Objetivo: O objetivo deste estudo é investigar o perfil neuropsicológico de uma amostra de<br />
pacientes brasileiros com esclerose múltipla surto-remissão (EMSR), descrevendo as funções<br />
cognitivas mais comprometidas. Métodos: Cinquenta e quatro pacientes com EMSR e 54<br />
controles pareados por sexo, idade e nível educacional foram avaliados por meio de uma<br />
longa e abrangente bateria neuropsicológica. Resultados: Observou-se que 59,2% dos pacientes<br />
com EMSR apresentaram algum tipo de comprometimento cognitivo em comparação<br />
com o grupo controle. Os testes neuropsicológicos identificaram disfunções executivas,<br />
da memória de longo prazo e da velocidade de processamento de informação. Conclusão:<br />
Os resultados encontram-se em conformidade com estudos anteriores relatados na literatura<br />
internacional. Contudo, mais estudos ainda são necessários para uma estimativa maior do<br />
perfil das alterações cognitivas da esclerose múltipla no Brasil.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Multiple sclerosis, cognition,<br />
neuropsychological tests.<br />
Objective: The goal of this study is to investigate neuropsychological profile of a sample of Brazilian<br />
patients with relapsing-remitting multiple sclerosis (RRMS) and to describe the cognitive functions<br />
more frequently affected. Methods: Fifty-four patients with RRMS and 54 controls matched<br />
by sex, age and education were assessed through a long and comprehensive neuropsychological<br />
battery. Results: We found that 59.2% of patients with RRMS had some sort of cognitive impairment<br />
as compared to the control group. Neuropsychological testing identified executive functions,<br />
long-term memory and speed of information processing as the cognitive functions most frequently<br />
impaired among patients. Conclusion: The results are in line with previous studies reported. However,<br />
as there are few studies of cognitive impairment in patients with multiple sclerosis in Brazilian<br />
literature, more studies are still necessary for a larger evaluation of the cognitive profile of<br />
multiple sclerosis in Brazil.<br />
Recebido em<br />
8/6/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
20/9/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Departamento de Psicologia,<br />
PUC-RJ.<br />
2 PUC-RJ, Departamento de Psicologia; Universidade Estácio de Sá (Unesa), Departamento de Psicologia.<br />
3 Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio).<br />
4 <strong>UFRJ</strong>, Instituto de Psiquiatria.<br />
Endereço para correspondência: Marco Aurélio Negreiros<br />
Rua Rita Ludolf, 17/202, Leblon – 22440-060 – Rio de Janeiro, RJ<br />
E-mail: marconegreiros@superig.com.br
artigo original<br />
Frequência da alterações cognitivas na esclerose múltipla no Brasil<br />
267<br />
INTRODUÇÃO<br />
A esclerose múltipla (EM) é uma doença inflamatória e desmielinizante<br />
do sistema nervoso central (SNC), de curso<br />
crônico e progressivo, com sintomas de comprometimento<br />
disseminado do SNC nas áreas motoras, sensitivas, cerebelares,<br />
do tronco cerebral, esfincterianas e mentais 1,2 . Há quatro<br />
subtipos clínicos de esclerose múltipla: surto-remissão<br />
(EMSR), progressiva primária (PP), progressiva secundária (PS)<br />
e progressiva recorrente (PR). Cada um deles possui diferentes<br />
perfis clínicos 3 e fisiopatológicos 4 . O comprometimento<br />
cognitivo em cada diferente subtipo parece ser também diferenciado<br />
5-7 .<br />
A disfunção cognitiva na esclerose múltipla caracteriza-<br />
-se por déficits de memória, atenção, velocidade de processamento<br />
de informação e funções executivas 8-10 . O comprometimento<br />
cognitivo dos pacientes com EM é considerado<br />
moderado quando comparado ao dos indivíduos normais 9 .<br />
A prevalência geral de comprometimento cognitivo é de<br />
45% a 65% 8,10,11 .<br />
A avaliação neurológica clínica, assim como outras medidas<br />
comuns como a Expanded Disability Status Examination<br />
Scale (EDSS) 2 ou o Mini-Mental Status Examination (MMSE) 12 ,<br />
é geralmente incapaz de detectar as alterações cognitivas de<br />
pacientes com EM 8,13 . Testes neuropsicológicos são os melhores<br />
instrumentos para a avaliação da cognição em EM e baterias<br />
de testes foram desenvolvidas para esse propósito 8,14-16 .<br />
Diferenças transculturais são consideradas uma importante<br />
questão em qualquer pesquisa referente à avaliação<br />
da cognição 17 . Há poucos dados disponíveis sobre comprometimento<br />
cognitivo na população brasileira de pacientes<br />
com EM. Um estudo 18 foi conduzido com 25 pacientes brasileiros<br />
com esclerose múltipla surto-remissão (EMSR), no qual<br />
foi constatado que a inteligência geral dos pacientes estava<br />
preservada, mas houve um pior desempenho na memória<br />
de longo prazo verbal e visual e em tarefas que requisitavam<br />
tempo de execução. Paes et al. 19 investigaram o comprometimento<br />
cognitivo em 26 pacientes com EM tipo progressiva<br />
primária e encontraram uma frequência de 50% de comprometimento<br />
geral, sendo 60% de alteração de memória<br />
recente, 40% de alteração de fluência verbal e 40% de alteração<br />
de velocidade de processamento de informação comparativamente<br />
ao grupo controle. Em um trabalho prévio 20 ,<br />
desenvolveu-se uma bateria neuropsicológica breve para<br />
identificar as alterações cognitivas em pacientes brasileiros<br />
com EMSR composta de três testes cognitivos (Fluência Verbal,<br />
Rey Auditorial Verbal Learning Test e Enhanced Cued Recall)<br />
com 80,6% de sensibilidade e 97,2% de especificidade, encontrando<br />
um perfil de alterações cognitivas nesta pesquisa<br />
cujo método e resultados serão discutidos a seguir.<br />
No presente artigo, o perfil cognitivo de uma amostra de<br />
pacientes brasileiros com EMSR foi investigado por meio de<br />
uma abrangente bateria neuropsicológica.<br />
MÉTODOS<br />
Sujeitos<br />
Foram selecionados 54 pacientes de um total de 74 consecutivamente<br />
admitidos no Setor de Doenças Desmielinizantes<br />
do Hospital da Lagoa no Rio de Janeiro. Todos foram diagnosticados<br />
com EMSR, clinicamente definida, de acordo com<br />
os critérios de Poser et al. 21 e possuíam níveis leve a moderado<br />
de incapacidade – 1 a 6,5 – na Expanded Disability Status<br />
Scale (EDSS) 2 . Quatro critérios de exclusão foram empregados<br />
com a finalidade de prevenir possíveis interferências<br />
no desempenho nos testes neuropsicológicos: 1) presença<br />
de déficit motor ou visual que comprometesse a resposta<br />
adequada aos testes cognitivos; 2) estado de surto ou piora<br />
dos sintomas; 3) uso de substâncias psicoativas, além dos<br />
antidepressivos prescritos; e 4) coexistência de condições<br />
clínicas que interferissem na cognição. Todos os pacientes<br />
passaram por uma entrevista-padrão, análise da ficha médica,<br />
exames neurológicos, imagem de ressonância magnética<br />
(RM) e exame de líquido cefalorraquidiano, com a finalidade<br />
de preencher os critérios mencionados. Seis não preencheram<br />
os critérios diagnósticos, cinco tinham EDSS mais alto<br />
do que 6,5, três estavam usando substâncias psicoa tivas, um<br />
apresentou surto agudo e cinco não completaram o processo<br />
de avaliação.<br />
Cinquenta e quatro adultos saudáveis, pareados de acordo<br />
com sexo, idade e escolaridade, formaram o grupo controle.<br />
A mesma entrevista aplicada aos pacientes foi conduzida<br />
com a finalidade de eliminar participantes que preenchessem<br />
algum dos critérios de exclusão. Todos os participantes<br />
assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, concordando<br />
em participar voluntariamente da pesquisa. Este<br />
estudo foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade<br />
Federal do Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>) e do Hospital da Lagoa em<br />
conformidade com os princípios da Declaração de Helsinki.<br />
Testes neuropsicológicos<br />
Rastreamento de demência: Foi aplicado o teste Memória-<br />
-Informação-Concentração (MIC), que é útil para esse propósito<br />
na EM por não conter tarefas visuais e motoras 22 .<br />
Atenção e velocidade de processamento de informação:<br />
Avaliadas pelo Digit Symbol versão oral adaptada por nós<br />
para EM 23 .<br />
Memória de curto-prazo: Avaliada pelo Digit Span Forward<br />
e Backward, respectivamente (Bateria WAIS III) 24 .<br />
Memória de longo prazo: Rey Auditory Verbal Learning<br />
Test (RAVLT) 25 foi empregado para medir a memória de longo<br />
prazo verbal. Uma fase de recordação livre tardia e outra<br />
relacionada ao reconhecimento foram incluídas para que<br />
esses dois processos de memória pudessem ser avaliados.<br />
Buschke Enhanced Cued Recall Test (BECR) 26 . Avalia simultaneamente<br />
memória verbal e não verbal e a memória de<br />
longo prazo com a ajuda de pistas semânticas durante o período<br />
de evocação.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):266-70.
268 Negreiros MA et al.<br />
artigo original<br />
Fluência verbal: Foi testada pelo Controlled Verbal Oral Association<br />
Test (COWAT), que mede também a função executiva<br />
nos subtestes de produção de palavras fonéticas (F-A-S) e<br />
semânticas (animais e frutas) 27 .<br />
Pensamento abstrato: Avaliado por meio da aplicação<br />
das séries A e C do teste Raven Progressive Matrices 28 .<br />
Análise dos dados<br />
As médias dos resultados e seus respectivos desvios-padrão<br />
foram apresentados. Um teste T bicaudado foi empregado<br />
para detectar diferenças significativas nas médias entre EMSR<br />
e grupo controle entre os 26 índices de variáveis cognitivas.<br />
O teste do c 2 foi usado para identificar a porcentagem de<br />
diferença entre os dois grupos. Uma análise de correlação<br />
de Pearson foi usada para acessar a relação entre déficit cognitivo<br />
entre os pacientes com EM e a severidade da doença<br />
de acordo com o EDSS. Um valor p de 0,05 foi considerado<br />
estatisticamente significativo.<br />
Disfunção cognitiva foi definida de acordo com o procedimento<br />
empregado por Rao et al. 8 , o qual controla as<br />
eventuais diferenças individuais nas habilidades cognitivas<br />
pré-mórbidas. A regressão múltipla foi realizada com o escore<br />
bruto de cada um dos 26 índices cognitivos como a variável<br />
dependente e as variáveis demográficas (sexo, idade e<br />
nível educacional) como as variáveis independentes. Como<br />
sexo não é uma variável contínua, foi retornado como uma<br />
variável falsa. Um padrão residual foi obtido subtraindo da<br />
pontuação regressa e da atual para cada um dos 26 índices<br />
de variáveis cognitivas. Falha em cada uma dessas variáveis<br />
foi definida como o quinto percentil ou abaixo do escore padronizado<br />
residual entre o grupo controle pareado.<br />
Déficit cognitivo entre os pacientes com EMSR foi definido<br />
como o quinto percentil do número total de falhas nos índices<br />
cognitivos dos sujeitos controles. A taxa de frequência<br />
de disfunção cognitiva nessa amostra de pacientes EMSR foi<br />
calculada como a diferença entre os percentuais de pacientes<br />
com EMSR que apresentaram déficit cognitivo a partir de<br />
uma taxa de falsos-positivos, definido como a porcentagem<br />
de indivíduos controles pareada, erroneamente classificada<br />
como cognitivamente alterada.<br />
RESULTADOS<br />
Dados sociodemográficos<br />
Não houve diferenças entre idade, escolaridade e sexo entre<br />
os dois grupos (todos ps > 0,1). Nossos resultados indicam<br />
que a incidência de EMSR nesta amostra foi maior em mulheres<br />
(61,1%) do que em homens (38,9%; c² = 7,1, p < 0,05).<br />
Pacientes com EMSR apresentaram um maior número de índices<br />
fracassados em comparação com os sujeitos controles<br />
pareados (t 104 = 6,67; p < 0,001).<br />
Frequência das alterações cognitivas<br />
Empregando um corte de quatro ou mais índices cognitivos<br />
fracassados, uma incidência de 59,2% de pacientes com<br />
EMSR e 7,4% de sujeitos controles foi encontrada com comprometimento<br />
cognitivo. Por isso, uma taxa de frequência<br />
de comprometimento cognitivo nesta amostra foi estimada<br />
em 51,8%. Curiosamente, nenhuma correlação entre o déficit<br />
cognitivo dos pacientes EMSR e a gravidade da doença<br />
(EDSS) foi encontrada (r = 0,03, p > 0,8).<br />
Funções cognitivas e testes alterados<br />
Os resultados indicaram que os pacientes com EMSR apresentam<br />
consistentemente piores desempenhos que os sujeitos<br />
controles (todos ps < 0,05) em todos os 26 índices dos<br />
testes neuropsicológicos. A tabela 1 apresenta as médias e<br />
os desvios-padrão dos 26 índices de variáveis cognitivas.<br />
Fluência verbal fonêmica e semântica foram as variáveis<br />
que apresentaram o maior comprometimento. Aproximadamente<br />
40% dos pacientes com EMSR apresentaram um<br />
déficit na geração de palavras que começam com a letra S<br />
(fonêmica) ou nomes de frutas (semântica).<br />
A memória de longo prazo, medida pelo RAVLT, também<br />
demonstrou um alto índice de comprometimento. Como<br />
pode ser observado na tabela 1, 35,2% dos pacientes apresentaram<br />
um fracasso na segunda evocação do RAVLT e no teste<br />
de reconhecimento, enquanto 33,3% dos pacientes fracassaram<br />
na primeira evocação do RAVLT. Uma considerável sobreposição<br />
entre a primeira e a segunda evocação no RAVLT<br />
no desempenho entre os pacientes EMRR foi detectada. Somente<br />
17% dos pacientes que fracassaram no desempenho<br />
da primeira evocação foram bem na segunda evocação.<br />
A avaliação da memória de longo prazo que inclui o BECR<br />
também demonstrou considerável déficit cognitivo entre os pacientes<br />
com EMSR. Aproximadamente 30% dos pacientes apresentaram<br />
um fracasso na primeira tentativa de evocação livre<br />
do BECR (BECR-Free 1) e durante toda a evocação (48 pontos)<br />
do BECR (BECR-Recall). Esses dois índices não foram redundantes,<br />
pois aproximadamente 58% dos pacientes com EMSR que<br />
apresentaram um déficit na primeira tentativa de evocação livre<br />
tiveram um bom desempenho durante a evocação do BECR.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os resultados obtidos indicaram que 59,2% dos pacientes<br />
com EMSR apresentaram algum tipo de comprometimento<br />
cognitivo. Esse resultado encontra-se em conformidade com<br />
estudos anteriores relatados na literatura, os quais indicavam<br />
que aproximadamente 45%-65% dos pacientes com esclerose<br />
múltipla possuem déficits cognitivos detectados por meio<br />
de testes neuropsicológicos 8,10,11 .<br />
Os déficits no pensamento abstrato e na fluência verbal,<br />
respectivamente detectados em 27,8% e 40,7% dos pacientes,<br />
estão relacionados ao comprometimento no funciona-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):266-70.
artigo original<br />
Frequência da alterações cognitivas na esclerose múltipla no Brasil<br />
269<br />
Tabela 1. Resultados de testes neuropsicológicos*<br />
Teste cognitivo EMRS Controle P % EMRS
270 Negreiros MA et al.<br />
artigo original<br />
memória de longo prazo foi entre 18,5%-29,6% nos pacientes.<br />
Déficits de evocação em todas essas medidas estavam razoavelmente<br />
altas, na extensão de 30%-35%. Interessantemente,<br />
pacientes com EMSR apresentaram 22% e 35% de déficit no<br />
reconhecimento nos testes RAVLT e BECR, respectivamente.<br />
Esses resultados não estão em acordo com a visão clássica<br />
que assume que memória de reconhecimento está preservada<br />
em pacientes com esclerose múltipla 8,14 . Uma maior investigação<br />
será necessária para confirmar esse achado.<br />
O teste que avaliou a velocidade de processamento de<br />
informações, o Digit Symbol, mostrou que 22,2% dos pacientes<br />
apresentaram comprometimento. Esse tipo de teste foi<br />
apontado na literatura como sendo um dos mais sensíveis<br />
para detectar disfunção cognitiva em esclerose múltipla e a<br />
principal função cognitiva afetada nos pacientes 29 . No nosso<br />
caso, embora a frequência de alteração de velocidade<br />
de processamento de informação tenha sido alta (22,2%),<br />
foi inferior ao índice de alteração de memória encontrado.<br />
O teste de rastreamento de demência (MIC) mostrou<br />
comprometimento em 9,3% dos pacientes com EMSR, e os<br />
resultados do Digit Span indicaram que 11,1% desses pacientes<br />
apresentaram comprometimento no span atencional. Esses<br />
resultados são um tanto incoerentes com os relatos da<br />
literatura, os quais indicavam que pacientes com esclerose<br />
múltipla tinham span atencional preservado e menor pontuação<br />
de demência 10,14 . É possível que se tenha que rever os critérios<br />
de pontuação em testes de rastreamento para demência<br />
na população brasileira, como já tem sido feito 30 , visto que<br />
variáveis educacionais e culturais influenciam esses critérios.<br />
CONCLUSÃO<br />
De forma geral, os resultados foram concordantes com a literatura<br />
sobre cognição da esclerose múltipla, visto que as<br />
funções que apresentaram maior comprometimento foram<br />
as funções executivas, memória de longo prazo e velocidade<br />
de processamento de informação. As divergências encontradas<br />
se referem ao comprometimento da memória de reconhecimento,<br />
ao span atencional e ao rastreamento de demência,<br />
tendo sido encontradas alterações não comumente<br />
observadas na literatura internacional. Existem poucos estudos<br />
de levantamento das alterações cognitivas na esclerose<br />
múltipla na literatura brasileira. Portanto, serão necessários<br />
mais estudos para que se conheça o perfil das alterações<br />
cognitivas da esclerose múltipla no Brasil.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):266-70.
artigo original<br />
Comorbidades clínicas e psiquiátricas em<br />
pacientes com transtorno bipolar do tipo I<br />
Psychiatric and medical comorbidities in type 1 bipolar disorder patients<br />
Izabela Guimarães Barbosa 1 , Rodrigo de Almeida Ferreira 2 , Rodrigo Barreto Huguet 3 , Fábio Lopes Rocha 4 ,<br />
João Vinícius Salgado 3 , Antônio Lúcio Teixeira 3<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Transtorno bipolar,<br />
comorbidades, mania,<br />
suicídio.<br />
Contexto: O transtorno bipolar tipo I está comumente associado a comorbidades clínicas e<br />
psiquiátricas, mas ainda há poucos dados disponíveis sobre pacientes brasileiros. Objetivos:<br />
O objetivo do presente estudo foi avaliar a prevalência de comorbidades clínicas e psiquiátricas<br />
em uma amostra brasileira de pacientes bipolares tipo I. O objetivo secundário foi investigar<br />
as associações de características clínico-demográficas e comorbidades com tentativas<br />
de suicídio. Métodos: Foram incluídos neste estudo 94 pacientes bipolares tipo I. O diagnóstico<br />
psiquiátrico foi determinado utilizando-se a avaliação Mini International Neuropsychiatric<br />
Interview (MINI-Plus). O diagnóstico de comorbidades clínicas foi baseado na história clínica<br />
e no acompanhamento de clínicos gerais. Resultados: As comorbidades mais prevalentes<br />
nos pacientes bipolares foram: transtorno de ansiedade generalizada (19,20%), dependência<br />
de substâncias (43,60%), hipertensão arterial (29,80%), diabetes mellitus (17,00%), dislipidemia<br />
(22,30%) e hipotireoidismo (19,10%). Não foram encontradas diferenças estatísticas em relação<br />
às características demográficas ou à prevalência de comorbidades nos grupos com e<br />
sem tentativa de suicídio. Conclusão: Pacientes bipolares atendidos em serviço psiquiátrico<br />
apresentam elevada prevalência de comorbidades psiquiátricas e clínicas. Nessa população,<br />
tentativas de suicídio não se associam com a presença de comorbidades ou características<br />
demográficas.<br />
ABSTRACT<br />
Background: Bipolar disorder type I is frequently associated with psychiatric and medical comorbidities,<br />
but data regarding Brazilian patients are lacking. Objectives: The aim of the present<br />
study was to evaluate the prevalence of psychiatric and medical comorbidities in a Brazilian sample<br />
of bipolar disorder patients type I. A secondary aim was to investigate the association of demographic<br />
characteristics and comorbidities with suicide attempts. Methods: Ninety four bipolar<br />
disorder type I patients were included in this study. Psychiatric diagnoses were performed following<br />
the Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI-Plus) evaluation. The diagnosis of medical<br />
comorbidities was based on clinical history and general practice consultation. Results: The com-<br />
Recebido em<br />
18/8/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
16/11/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Programa de Pós-Graduação em Neurociências, Belo Horizonte; Instituto de Previdência<br />
dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG), Hospital Governador Israel Pinheiro, Ambulatório de Transtorno Bipolar, Belo Horizonte;<br />
Estresse, Psiquiatria e Imunologia, Divisão de Medicina Psicológica, Instituto de Psiquiatria, King’s College London, London, UK.<br />
2 UFMG, Programa de Pós-Graduação em Neurociências; IPSEMG, Ambulatório de Transtorno Bipolar, Hospital; Governador Israel Pinheiro,<br />
Belo Horizonte.<br />
3 Estresse, Psiquiatria e Imunologia, Divisão de Medicina Psicológica, Instituto de Psiquiatria, King’s College London, London, UK.<br />
4 IPSEMG, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Belo Horizonte.<br />
Endereço para correspondência: Antônio Lúcio Teixeira – Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, UFMG<br />
Av. Alfredo Balena, 190, Santa Efigênia – 30130-100 – Belo Horizonte, MG<br />
E-mail: altexr@gmail.com
272 Barbosa IG et al.<br />
artigo original<br />
Keywords<br />
Bipolar disorder,<br />
comorbidities, mania,<br />
suicide.<br />
monest comorbidities in bipolar disorder patients were generalized anxiety disorder (19.20%), substance<br />
dependence (43.60%), arterial hypertension (29.80%), diabetes mellitus (17.00%), dyslipidemia<br />
(22.30%) and hypothyroidism (19.10%). There were no differences in demographic characteristics<br />
or the prevalence of comorbidities when comparing patients with and without previous suicide<br />
attempt. Conclusion: Bipolar disorder patients from a psychiatric unit present higher prevalence<br />
of psychiatric and clinical comorbidities. Previous suicide attempts were not associated with comorbidities<br />
or demographic characteristics.<br />
INTRODUÇÃO<br />
MÉTODOS<br />
O transtorno bipolar do tipo I se caracteriza por episódios<br />
recorrentes de mania e depressão e ocorre em 0,6% da população<br />
mundial 1 . Apesar dos avanços relacionados à terapêutica,<br />
os pacientes com transtorno bipolar, mesmo em períodos<br />
de eutimia, apresentam sintomas de humor residuais,<br />
assim como déficits cognitivos 2 . Estima-se que 15% a 20%<br />
das mortes em pacientes com transtorno bipolar possam ser<br />
atribuídas a suicídio 3 . Fatores sociodemográficos parecem<br />
ter pequena influência nas taxas de tentativa de suicídio e<br />
suicídio completo em pacientes com transtorno bipolar, entretanto<br />
a presença de comorbidades psiquiátricas é uma<br />
das principais variáveis associadas 4 .<br />
Comorbidade pode ser conceituada como a ocorrência<br />
de duas ou mais entidades nosológicas no mesmo paciente.<br />
A coocorrência de diagnósticos em um mesmo paciente<br />
pode influenciar o curso, a resposta ao tratamento e/ou o<br />
prognóstico da enfermidade. Pacientes bipolares tipo I apresentam,<br />
em média, 3,1 comorbidades psiquiátricas ao longo<br />
da vida 1 . Há um debate na literatura sobre se esse dado seria<br />
um artefato dos sistemas diagnósticos atuais, que empregam<br />
uma abordagem categórica, ou se refletiria a existência<br />
de entidades nosológicas distintas com um mesmo substrato<br />
neurobiológico 5 . Em relação à presença de comorbidades<br />
clínicas, descreve-se elevada prevalência de distúrbios metabólicos,<br />
cardiovasculares e endócrinos nesses pacientes 6 .<br />
Não se sabe se essas comorbidades clínicas se referem a condições<br />
ligadas ao transtorno bipolar per se, se seriam consequência<br />
do tratamento farmacológico ou uma combinação<br />
de ambos os fatores. Apesar de a presença de comorbidades<br />
psiquiátricas e clínicas ser importante na avaliação, no<br />
prognóstico e no curso do transtorno bipolar, a maioria dos<br />
estudos farmacoterápicos ignora esse fato.<br />
Na população brasileira, ainda há poucos dados sobre a<br />
prevalência de comorbidades e sua influência no transtorno<br />
bipolar. O objetivo deste estudo é, portanto, identificar a<br />
prevalência de comorbidade sem uma amostra de pacientes<br />
com transtorno bipolar do tipo I provenientes de um serviço<br />
psiquiátrico. O objetivo secundário foi avaliar quais as características<br />
do transtorno bipolar e comorbidades (psiquiátricas<br />
e clínicas) estariam relacionadas com a presença de<br />
tentativas de suicídio.<br />
Sujeitos<br />
Foram incluídos no presente estudo 94 pacientes com o<br />
diagnóstico de transtorno bipolar tipo I. Os pacientes foram<br />
recrutados em serviço psiquiátrico de atendimento especializado<br />
em transtorno bipolar no Instituto de Previdência<br />
dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG), Belo<br />
Horizonte. Esse serviço é responsável pelo atendimento de<br />
pacientes provenientes da rede ambulatorial e de internação<br />
do Hospital Governador Israel Pinheiro, que pertence<br />
ao IPSEMG. O diagnóstico de transtornos psiquiátricos baseou-se<br />
na entrevista clínica estruturada Mini International<br />
Neuropsychiatric Interview (MINI-Plus) 7 . Devido ao fato de os<br />
pacientes bipolares serem acompanhados regularmente por<br />
clínicos gerais no mesmo serviço, foi extraído do prontuário<br />
dos pacientes o diagnóstico das seguintes comorbidades clínicas:<br />
1) hipertensão arterial sistêmica; 2) diabetes mellitus; 3)<br />
hipotireoidismo; 4) dislipidemia.<br />
As medidas antropométricas foram realizadas no mesmo<br />
dia da entrevista clínica. Tentativa de suicídio foi definida<br />
como qualquer ato de injúria, deliberadamente autoinfligido,<br />
independentemente do risco da letalidade envolvido,<br />
em que o paciente tenha a intenção consciente de terminar<br />
a própria vida 8 .<br />
Todos os procedimentos descritos no estudo receberam<br />
autorização do comitê de ética local. Todos os participantes<br />
tinham idade superior a 18 anos, e o consentimento livre e<br />
esclarecido foi obtido previamente à entrada no estudo. Não<br />
houve critério de exclusão para a entrada neste estudo.<br />
Análise estatística<br />
A análise descritiva foi usada para apresentar os dados clínicos<br />
e sociodemográficos da população. As variáveis contínuas<br />
foram apresentadas como médias e desvios-padrão.<br />
Os pacientes foram divididos em dois grupos segundo a<br />
presença de tentativas prévias de suicídio. As variáveis categóricas<br />
dos dados sociodemográficos e prevalências de<br />
comorbidades foram comparadas entre o grupo de pacientes<br />
com tentativas prévias de suicídio e o grupo sem tentativas<br />
prévias, empregando-se o teste do qui-quadrado<br />
de Pearson ou o teste exato de Fisher, quando apropriado.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):271-6.
artigo original<br />
Comorbidades no transtorno bipolar<br />
273<br />
O teste de Kolmogorov-Smirnov foi aplicado para verificar a<br />
distribuição de variáveis contínuas entre pacientes bipolares<br />
que apresentaram ou não tentativas de suicídio. Devido ao<br />
fato de os dados dos pacientes referentes a idade, escolaridade,<br />
índice de massa corporal, primeiro episódio de humor,<br />
primeiro episódio depressivo, primeiro episódio maníaco e<br />
número de internações hospitalares possuírem distribuição<br />
normal, o teste t de Student foi empregado para a comparação<br />
dos dois grupos. As análises foram realizadas utilizando-<br />
-se o programa estatístico SPSS versão 17.0. Um valor de p<br />
bilateral menor que 0,05 foi adotado como nível de significância<br />
estatística para todos os testes.<br />
RESULTADOS<br />
Os dados sociodemográficos e clínicos dos participantes são<br />
apresentados na tabela 1. A prevalência do gênero feminino<br />
foi de 69,10%, e 32,30% dos pacientes eram solteiros. Apesar<br />
de os pacientes apresentarem idade média de 50,25 anos<br />
(DP = 12,02), apenas 68,10% se encontravam inativos laboralmente.<br />
A maioria dos pacientes apresentou longo tempo<br />
de evolução da doença (idade média ± DP em anos de 24,01<br />
± 12,77). Na presente amostra, 33,00% dos pacientes relataram<br />
tentativas de suicídio. O número médio de internações<br />
psiquiátricas foi de 4,18 (DP = 4,04) e o de tentativas de suicídio<br />
foi de 0,90 (DP = 1,58). Curiosamente, 24 pacientes não<br />
tinham apresentado, até o momento da entrevista, nenhum<br />
episódio depressivo.<br />
Tabela 1. Dados sociodemográficos e clínicos da população de<br />
pacientes com transtorno bipolar tipo I<br />
Pacientes bipolares tipo I (n = 94)<br />
Idade em anos (média ± DP) 50,25 ± 12,02<br />
Escolaridade em anos (média ± DP) 10,13 ± 3,63<br />
Gênero feminino 69,10%<br />
Pacientes com histórico de tentativas de suicídio 33,00%<br />
Número de tentativas (média ± DP) 0,90 ± 1,58<br />
Status funcional<br />
Ativo 31,50%<br />
Inativo 68,50%<br />
Idade de início da doença em anos (média ± DP) 26,39 ±10,12<br />
Idade do primeiro episódio depressivo (média ± DP) 26,02 ± 10,35<br />
Idade do primeiro episódio maníaco (média ± DP) 29,74 ± 12,12<br />
Duração da doença em anos (média ± DP) 24,01 ± 12,77<br />
Número de internações (média ± DP) 4,18 ± 4,04<br />
IMC (média ± DP) 29,22 ± 7,54<br />
Medicamentos em uso atual (prevalência)<br />
Lítio 54,30%<br />
Anticonvulsivantes 62,40%<br />
Antipsicóticos 68,50%<br />
Antidepressivos 9,50%<br />
IMC: índice de massa corporal; DP: desvio-padrão.<br />
A prevalência de comorbidades psiquiátricas e clínicas<br />
na amostra é apresentada na tabela 2. Cinquenta e nove<br />
(63,83%) pacientes apresentaram ao menos uma comorbidade<br />
psiquiátrica. Os transtornos mais prevalentes foram:<br />
transtorno de ansiedade generalizada (27,20%), dependência<br />
de álcool (35,50%) e tabaco (43,60%). Em relação a comorbidades<br />
clínicas, 52,13% dos pacientes apresentaram ao<br />
menos uma comorbidade.<br />
Os pacientes bipolares foram subdivididos em dois grupos:<br />
pacientes que apresentaram tentativas de suicídio e pacientes<br />
que não apresentaram tentativas de suicídio. Não foi<br />
encontrada nenhuma associação significativa entre as variáveis<br />
investigadas e a presença ou ausência de tentativas de<br />
suicídio (ver tabela 3).<br />
Tabela 2. Prevalência de comorbidades psiquiátricas e clínicas na<br />
população de pacientes com transtorno bipolar tipo I<br />
Pacientes bipolares tipo I (n = 94)<br />
Qualquer comorbidade psiquiátrica 63,83%<br />
TAG 27,20%<br />
TOC 4,30%<br />
Transtorno de pânico atual 5,30%<br />
Dependência de substâncias ao longo da vida<br />
Álcool 35,50%<br />
Tabaco 43,60%<br />
Outras substâncias 5,30%<br />
Hipertensão arterial sistêmica 29,80%<br />
Diabetes mellitus 17,00%<br />
Hipotireoidismo 19,10%<br />
Dislipidemia 22,30%<br />
TAG: transtorno de ansiedade generalizada; TOC: transtorno obsessivo-compulsivo.<br />
DISCUSSÃO<br />
O presente estudo avaliou as comorbidades clínicas e psiquiátricas<br />
em uma amostra clínica de pacientes bipolares do<br />
tipo I. Transtorno de ansiedade generalizada e dependência<br />
de substâncias foram as comorbidades psiquiátricas mais comuns.<br />
Hipertensão arterial sistêmica e dislipidemia foram as<br />
comorbidades clínicas mais prevalentes. História de tentativas<br />
de suicídio não se associou com comorbidades clínicas<br />
ou psiquiátricas.<br />
Os dados referentes à prevalência de comorbidades psiquiátricas<br />
em pacientes com transtorno bipolar estão em<br />
consonância com a literatura 1 , inclusive com outros estudos<br />
brasileiros 9-13 . Aparentemente, a presença de comorbidades<br />
em pacientes bipolares é mais regra do que exceção. Uma<br />
das hipóteses que poderia justificar tal dado pode ser um<br />
artefato dos sistemas diagnósticos contemporâneos que<br />
preconizam uma abordagem categórica. Essa abordagem,<br />
apesar de permitir maior confiabilidade dos diagnósticos<br />
psiquiátricos e melhorar a comunicação entre clínicos e<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):271-6.
274 Barbosa IG et al.<br />
artigo original<br />
Tabela 3. Comparação entre dados sociodemográficos e comorbidades em pacientes bipolares tipo I com tentativa de suicídio e sem<br />
tentativa de suicídio<br />
Pacientes bipolares tipo I (n = 94)<br />
Sem tentativa de suicídio (n = 63) Presença de tentativa de suicídio (n = 31)<br />
Valor de p<br />
Idade em anos (média ± DP) 49,79 ± 12,59 51,19 ± 10,89 0,60 †<br />
Escolaridade em anos (média ± DP) 10,16 ± 3,66 10,07 ± 3,64 0,91 †<br />
Gênero feminino 69,80 67,70 0,84 **<br />
Idade de início da doença em anos (média ± DP) 27,19 ± 10,40 24,79 ± 9,51 0,30 †<br />
Primeiro episódio depressivo (média ± DP) 26,77 ± 10,67 24,74 ± 9,90 0,46 †<br />
Primeiro episódio maníaco (média ± DP) 31,11 ± 12,94 26,68 ± 9,56 0,09 †<br />
Duração da doença em anos (média ± DP) 22,54 ± 12,95 26,80 ± 12,12 0,14 †<br />
Número de internações (média ± DP) 3,94 ± 4,45 4,64 ± 3,17 0,50 †<br />
Episódio depressivo prévio 69,8 83,9 0,14 **<br />
Presença de qualquer comorbidade psiquiátrica 60,32 70,97 0,31 **<br />
TAG 24,60 32,3 0,23 **<br />
TOC 1,6 9,7 0,10 *<br />
Transtorno do pânico atual 1,6 3,2 0,54 *<br />
Dependência de substâncias (atual)<br />
Álcool 4,8 6,5 1,00*<br />
Tabaco 34,9 38,7 0,72 **<br />
Outras substâncias 4,8 6,5 0,22*<br />
Hipertensão arterial sistêmica 27,0 35,5 0,40 **<br />
Diabetes mellitus 12,7 25,8 0,11 **<br />
Hipotireoidismo 15,9 25,8 0,25 **<br />
Dislipidemia 19,0 25,0 0,28 **<br />
†<br />
Teste t; * teste exato de Fisher; ** teste do qui-quadrado de Pearson; DP = desvio-padrão; TAG: transtorno de ansiedade generalizada; TOC: transtorno obsessivo-compulsivo.<br />
pesquisadores, apresenta algumas limitações 14 . Por exemplo,<br />
a definição individualizada de categorias diagnósticas<br />
como entidades nosológicas diferentes, ainda que baseada<br />
em consenso de especialistas, pode não ter validade discriminante<br />
que permita separar doenças distintas. Ademais, a<br />
ocorrência de dois transtornos em um mesmo paciente, em<br />
momentos diferentes ou concomitantes, pode sugerir mecanismo<br />
fisiopatológico subjacente em comum 6 . De nota,<br />
transtorno bipolar e transtornos de ansiedade apresentam<br />
aumento de atividade monoaminérgica 15 , alterações de neuroplasticidade<br />
na amígdala e estruturas do sistema límbico 15 ,<br />
assim como genes em comum 16 , o que sugere que possa<br />
haver um mesmo mecanismo fisiopatológico comum a dois<br />
transtornos.<br />
Em relação à prevalência das comorbidades psiquiátricas<br />
descritas no presente trabalho, estudos epidemiológicos<br />
anteriores apontam a mesma prevalência de transtornos de<br />
ansiedade em pacientes bipolares 6 . Entretanto, há estudos<br />
discordantes, não havendo consenso na literatura 1,17 . A prevalência<br />
de qualquer transtorno de ansiedade nos pacientes<br />
bipolares é mais elevada que na população em geral<br />
(18,1%) 18 . Possíveis hipóteses associadas à discrepância dos<br />
dados são diferenças no desenho do estudo, por exemplo,<br />
estudos populacionais e estudos clínicos, assim como o uso<br />
de diferentes instrumentos para entrevista e diagnóstico.<br />
Transtornos relacionados a substâncias apresentaram<br />
elevada prevalência na nossa população em comparação<br />
com estudos que usaram similares ferramentas de entrevista<br />
em pacientes bipolares 12 e mesmo quando comparados<br />
à população geral (3,8%) 18 . Os dados apresentados corroboram<br />
a prevalência de uso e/ou dependência de substâncias<br />
em pacientes bipolares na população brasileira 19 . Há inúmeras<br />
hipóteses que procuram explicar a elevada prevalência<br />
de dependência de substâncias associada ao transtorno<br />
bipolar. Em uma perspectiva baseada em crenças psicológicas,<br />
os pacientes com transtorno bipolar buscariam o uso de<br />
substâncias como uma forma de aliviar sintomas de humor<br />
considerados desagradáveis, como o taquipsiquismo e a irritabilidade<br />
20 . Por outro lado, o uso nocivo de substâncias poderia<br />
deflagrar o primeiro episódio maníaco 21 . Ainda, o fato<br />
de o transtorno bipolar estar relacionado com maior impulsividade,<br />
envolvimento excessivo em atividades prazerosas e<br />
prejuízo de crítica durante o episódio maníaco poderia estimular<br />
a busca de substâncias psicoativas 22 .<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):271-6.
artigo original<br />
Comorbidades no transtorno bipolar<br />
275<br />
Em relação às comorbidades clínicas, a alta prevalência<br />
demonstrada no presente estudo está em conformidade<br />
com dados prévios na literatura em pacientes bipolares 23 .<br />
A sobreposição de comorbidades clínicas no paciente com<br />
transtorno bipolar tem provável etiologia multifatorial. Pesquisas<br />
têm demonstrado que a desregulação do humor e do<br />
apetite compartilha alguns substratos neurobiológicos 24 . Dados<br />
de neuroimagem, por exemplo, mostram que há sobreposição<br />
dos circuitos neurais ligados à regulação do humor<br />
e do comportamento alimentar, como as conexões entre a<br />
amígdala e o córtex pré-frontal 25,26 . Além disso, a hiperatividade<br />
persistente do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal em<br />
pacientes bipolares pode estar relacionada a elevação da<br />
pressão arterial, aumento de resistência à insulina e dislipidemia<br />
27,28 . É importante mencionar que o uso de medicamentos<br />
psicotrópicos, particularmente os antipsicóticos atípicos,<br />
também está ligado a síndrome metabólica, aumento do<br />
apetite e preferência por alimentos doces, assim como redução<br />
da atividade física 29 . Reconhece-se também que o uso<br />
do lítio está associado ao hipotireoidismo.<br />
Em nosso estudo, não foram encontradas associações entre<br />
tentativas de suicídio e comorbidades clínicas ou psiquiátricas.<br />
Esse dado difere do relatado em outros trabalhos, que<br />
demonstraram que comorbidades psiquiátricas aumentam<br />
o risco de suicídio no transtorno bipolar 9,10,30 . É reconhecido<br />
que a inclusão de pacientes bipolares do tipo II nas amostras<br />
de estudo pode determinar o aumento da prevalência de<br />
tentativas de suicídio 11,31 . Ressalta-se ainda que, por se tratar<br />
de um estudo retrospectivo, pode existir viés de recordação.<br />
Como limitações de nosso trabalho, destacam-se alguns<br />
pontos. O fato de se tratar de uma amostra obtida de serviço<br />
de atenção psiquiátrica especializada pode comprometer a<br />
generalização dos achados para pacientes com transtorno<br />
bipolar na comunidade ou acompanhados em outros contextos.<br />
O diagnóstico de comorbidades clínicas por meio do<br />
registro em prontuário pode ter subestimado a prevalência<br />
delas. A inclusão de pacientes bipolares em diferentes estados<br />
de humor (mania, eutimia e depressão) pode ter influenciado<br />
a avaliação da prevalência das comorbidades psiquiátricas.<br />
Deve-se considerar também a possibilidade de que o<br />
presente estudo apresente o viés de Berkson 32 . Segundo esse<br />
viés, pessoas portadoras de mais de uma doença ou transtorno<br />
tendem a procurar mais frequentemente tratamento<br />
médico, o que faz com que amostras clínicas pos suam taxas<br />
de comorbidades maiores que a população geral. Por outro<br />
lado, pelo nosso conhecimento, este é o estudo brasileiro<br />
que investiga o maior número de comorbidades na maior<br />
amostra formada exclusivamente por pacientes portadores<br />
de transtorno bipolar tipo I. Novos estudos, com amostras<br />
ampliadas ou de base populacional, incluindo exames complementares<br />
ou de rastreio para o diagnóstico de comorbidades,<br />
são necessários.<br />
CONCLUSÃO<br />
Pacientes bipolares atendidos em centros psiquiátricos especializados<br />
apresentam elevada prevalência de comorbidades<br />
psiquiátricas e clínicas, particularmente transtornos de<br />
ansiedade, transtornos relacionados a substâncias, hipertensão<br />
arterial sistêmica e dislipidemia. Essas comorbidades não<br />
se associaram a tentativas de suicídio. Portanto, é importante<br />
que sejam incluídos na prática clínica exames complementares<br />
ou de rastreio para o diagnóstico de comorbidades clínicas<br />
em pacientes com transtorno bipolar.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Este trabalho foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento<br />
Científico e Tecnológico (CNPq, Brasil), Fundação<br />
de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais<br />
(Fapemig, Brasil) e Coordenação de Aperfeiçoamento de<br />
Pessoal de Nível Superior (CAPES, Brasil).<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):271-6.
artigo original<br />
Sintomas depressivos em crianças e<br />
adolescentes com anemia falciforme<br />
Depressive symptoms in children and adolescents with sickle cell anemia<br />
Felipe José Nascimento Barreto 1 , Rosana Cipolotti 2<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Anemia falciforme, sintomas<br />
depressivos, crianças,<br />
adolescentes.<br />
Objetivo: Determinar a frequência de sintomas depressivos em crianças e adolescentes<br />
com anemia falciforme, bem como caracterizar e associar tal sintomatologia aos dados<br />
individuais. Métodos: Realizou-se um estudo transversal com portadores de anemia falciforme<br />
dos 7 aos 17 anos, atendidos em um ambulatório de Hematologia Pediátrica, os<br />
quais preencheram o Inventário de Depressão Infantil (CDI). Resultados: Foram avaliados<br />
76 pacientes, estabelecendo-se em 13 o ponto de corte. Vinte e seis pacientes (34,2%)<br />
apresentavam sintomas sugestivos de depressão. “Não ser tão bom quanto os outros colegas”<br />
foi o item mais pontuado, além de ter predominado significativamente naqueles com<br />
escore de CDI maior ou igual a 13, assim como as variáveis: ter pais separados ou viúvos<br />
e renda familiar mensal menor ou igual a R$ 510,00. O item “preocupação com dores” foi<br />
bem pontuado, independentemente da presença de sintomas depressivos (p = 0,1). Conclusão:<br />
A depressão em crianças e adolescentes com anemia falciforme ainda é pouco<br />
estudada. Os dados obtidos indicam frequência elevada de sintomas depressivos nessa<br />
população. Possivelmente, conviver precocemente com a separação dos pais e pertencer<br />
a uma família com baixa renda esteja relacionado ao desenvolvimento desses sintomas.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Sickle cell anemia,<br />
depressive symptoms,<br />
children, adolescents.<br />
Objective: Determinate prevalence of depressive symptoms in children and adolescents<br />
with sickle cell anemia, characterize and associate then with individuals data. Methods:<br />
A transversal study was conducted with people with sickle cell anemia from 7 to 17 years old,<br />
followed at a Pediatric Hematology Center, which fulfilled the Children’s Depression Inventory<br />
(CDI). Results: A total of 76 children and adolescents were selected, considering a cut-off point of<br />
13. Twenty-six patients (34,2%) had suggestive symptoms of depression. “Not able to be as good<br />
as others siblings” was the most scored item of CDI, and it prevailed significantly in that with CDI<br />
score higher or equal than 13, as the variables: having divorced or widowed parents, and family<br />
income lower or equal to R$ 510,00. The item “worries about pain” obtained high score whether<br />
depressive symptoms were present or not (p = 0,1). Conclusion: Depression in children and<br />
adolescents with sickle cell anemia remains poorly discussed. Data obtained indicates high rates<br />
of depressive symptoms in this population. Probably, early experience of parental separation and<br />
low family income may contribute to development of these symptoms.<br />
1 Universidade Federal de Sergipe (UFS).<br />
2 UFS, Departamento de Medicina.<br />
Recebido em<br />
11/8/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
21/10/<strong>2011</strong><br />
Endereço para correspondência: Felipe José Nascimento Barreto<br />
Praça Tobias Barreto, 220, ap. 302 – 49015-130 – Aracaju, SE<br />
Tel.: (79) 3224-9059<br />
E-mail: lipegauche@hotmail.com
278 Barreto FJN, Cipolotti R<br />
artigo original<br />
INTRODUÇÃO<br />
A anemia falciforme é uma doença autossômica recessiva<br />
caracterizada pela homozigose do gene codificador da hemoglobina<br />
mutante S, que origina hemácias deformadas,<br />
propensas a hemólise e obstrução vascular 1-3 . Sua alta prevalência<br />
entre a população, mais precisamente naquelas em<br />
que a influência negra é predominante, faz dessa enfermidade<br />
um verdadeiro problema de saúde pública em várias<br />
partes do mundo 4 . Só no Brasil, 3.500 crianças nascem por<br />
ano com doença falciforme, grupo de hemoglobinopatias<br />
cuja principal representante é a anemia falciforme 5 .<br />
Em curto ou longo prazo, as várias complicações inerentes<br />
ao estado falcêmico, quando não levam a óbito, constituem<br />
constante ameaça à qualidade de vida 5,6 . Desde cedo,<br />
os portadores de anemia falciforme já sofrem com os efeitos<br />
das crises álgicas, infecções e outras urgências significativas,<br />
que, invariavelmente, aumentam o número de hospitalizações<br />
e diminuem as horas dispensadas à escola e às demais<br />
atividades produtivas 6-9 .<br />
O prejuízo funcional e social é notório e, por despontar<br />
já na infância e adolescência então, torna-se marcante para<br />
fases da vida tão cruciais para a construção da identidade<br />
adulta. Reflexo indireto do histórico de faltas por internações,<br />
o fraco desempenho escolar que muitos possuem favorece a<br />
repetência e dificulta o progresso acadêmico. O menor contato<br />
entre colegas é, em algum grau, uma realidade fatídica<br />
2,6,9,10 . Não é incomum nessa faixa etária que os sinais físicos<br />
da anemia falciforme motivem a exclusão do portador dos<br />
círculos de amizade, muitas vezes, com a errônea justificativa<br />
de que possui uma enfermidade contagiosa 11 .<br />
Diante do convívio prematuro com tantos obstáculos impostos<br />
pela natureza incapacitante, incurável e fatal da anemia<br />
falciforme, sintomas depressivos podem vir à tona ainda<br />
na infância e adolescência 12,13 . E como toda doença crônica<br />
é por si só um fator de risco para depressão 14 , com a anemia<br />
falciforme não poderia ser diferente. Em adultos com anemia<br />
falciforme, taxas de depressão variam de 18% a 44%, valores<br />
similares aos encontrados para outras condições crônicas<br />
severas 9 .<br />
Por sua vez, a depressão contribui de forma negativa no<br />
prognóstico da anemia falciforme 10 . Os sintomas depressivos<br />
são capazes de reduzir o limiar de tolerância para dor e a capacidade<br />
individual de lidar com essa experiência desagradável.<br />
O resultado é um aumento na frequência e intensidade<br />
das crises álgicas, maior número de admissões em pronto-<br />
-socorro e internações e menor adesão ao esquema terapêutico<br />
6,7,13,14 . Por fim, os sintomas depressivos em crianças e<br />
adolescentes são fortes preditores de transtorno depressivo<br />
maior, com ou sem ideação suicida, na fase adulta 6,11 .<br />
Na literatura está bem estabelecida a associação entre<br />
depressão e doenças crônicas da infância 14,15 . Quanto à anemia<br />
falciforme, há muitos estudos avaliando depressão nos<br />
portadores adultos, porém poucos que contemplem crianças<br />
e adolescentes 6,13 . Tendo em vista as nuances da depressão<br />
sobre o desenvolvimento infanto-juvenil 16 , acredita-se<br />
que não seja adequado simplesmente adaptar para essa faixa<br />
etária os achados obtidos em adultos.<br />
O presente estudo visa determinar a frequência de sintomas<br />
depressivos em crianças e adolescentes com anemia<br />
falciforme, caracterizar tal sintomatologia e correlacioná-la<br />
com dados individuais, antecedentes pessoais e familiares.<br />
MÉTODOS<br />
Entre julho de 2010 e março de <strong>2011</strong>, realizou-se um estudo<br />
transversal com crianças e adolescentes atendidos em ambulatório<br />
de Hematologia Pediátrica de um hospital universitário,<br />
entre 7 a 17 anos e com diagnóstico confirmado de<br />
anemia falciforme. Além de estarem em seguimento regular<br />
no serviço por no mínimo seis meses e/ou duas consultas de<br />
rotina, tinham que ser alfabetizados e estar aptos a entender<br />
orientações verbais. Pacientes que foram hospitalizados<br />
há menos de um mês ou que apresentavam intercorrências<br />
agudas eram abordados em consultas posteriores.<br />
As crianças e adolescentes elegíveis, bem como seus<br />
respectivos responsáveis, foram entrevistados por um único<br />
pesquisador no dia da consulta médica de rotina. Após<br />
esclarecimento sobre a natureza e os objetivos da pesquisa,<br />
paciente e responsável eram conduzidos a uma sala reservada.<br />
Com a autorização verbal e escrita, mediante assinatura<br />
de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo responsável,<br />
foram coletados dados referentes à identificação<br />
do paciente e de seu principal cuidador, condições socioeconômicas<br />
da família, antecedentes familiares de doença<br />
psiquiátrica e de anemia falciforme.<br />
A seguir, solicitou-se ao paciente que preenchesse o Inventário<br />
de Depressão Infantil ou Children’s Depression Inventory<br />
(CDI) 17,18 . Cada um dos 27 itens que o compõe possui<br />
três opções de resposta que correspondem a valores de 0 a<br />
2, conforme a gravidade dos sintomas depressivos. Coube<br />
ao sujeito da pesquisa assinalar a opção que melhor descrevesse<br />
seus pensamentos e sentimentos nas duas semanas<br />
anteriores à data da aplicação do CDI, tendo sido enfatizado<br />
que não há resposta certa ou errada e ratificado o sigilo dos<br />
dados fornecidos. Durante essa etapa, pesquisador e responsável<br />
aguardaram do lado de fora da sala até o completo preenchimento<br />
do inventário, a fim de garantir a privacidade do<br />
paciente e maior fidedignidade às suas respostas.<br />
Elaborado por Kovacs 17,18 , o CDI representa uma adaptação<br />
do Inventário de Depressão de Beck às particularidades<br />
desse transtorno afetivo na população infanto-juvenil,<br />
servindo como método de triagem de sintomas sugestivos<br />
de depressão em indivíduos dos 7 aos 17 anos completos 19 .<br />
Nos seus 27 itens, cinco dimensões relevantes de quadros<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
artigo original<br />
Sintomas depressivos e anemia falciforme<br />
279<br />
depressivos são avaliadas: humor negativo, problemas interpessoais,<br />
ineficiência, anedonia e autoestima negativa 18 .<br />
O somatório da pontuação obtida fornece um escore<br />
que varia de 0 a 54, sendo estabelecido em 19 o ponto de<br />
corte para a presença de sintomas depressivos em amostras<br />
populacionais e em 13 o ponto de corte para amostras clínicas<br />
19 . No Brasil, o CDI foi inicialmente adaptado e normatizado<br />
por Gouveia et al. 20 , que reduziram o número de itens de<br />
27 para 20, mantendo a consistência interna do instrumento,<br />
e sugeriram um ponto de corte de 17 para escolares e adolescentes<br />
brasileiros. Há ainda uma segunda versão brasileira<br />
do CDI, devidamente traduzida por Baptista 21 e que, por sua<br />
vez, respeita a estrutura original de 27 itens. No presente estudo,<br />
optou-se por empregar esta última adaptação do CDI,<br />
além de fixar um ponto de corte maior ou igual a 13 para a<br />
presença de sintomas depressivos.<br />
Os dados coletados foram analisados pelo programa EPI<br />
Info®, versão 3.5.3. Para as variáveis contínuas, calcularam-<br />
-se média e desvio-padrão, e para as discretas, fez-se a distribuição<br />
de frequências. Proporções foram comparadas<br />
pelos testes qui-quadrado ou de Fisher e comparações que<br />
envolviam médias, pelos testes ANOVA ou Mann-Whitney.<br />
Adotou-se um intervalo de confiança de 95% (p < 0,05).<br />
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa<br />
envolvendo seres humanos da Universidade Federal de Sergipe<br />
(CEP/UFS), sob o protocolo 0075.0.107.000-10.<br />
RESULTADOS<br />
Durante o período de coleta de dados, havia em seguimento<br />
ambulatorial 139 pacientes com idades entre 7 e 17 anos<br />
– 115 deles foram abordados, dos quais 76 pacientes eram<br />
elegíveis (Figura 1).<br />
Dos 76 pacientes avaliados, 41 (53,9%) eram meninos,<br />
com média de idade de 12,9 ± 2,73 anos, sendo oito crianças<br />
(10,5%) e 68 adolescentes (89,5%). A média de irmãos foi de<br />
3,01 ± 2,44 e a de número de pessoas no domicílio foi de 4,6<br />
± 1,88. Quarenta e um pacientes (53,9%) estavam com idade<br />
defasada para a série, ou seja, possuíam idade superior em<br />
no mínimo dois anos àquela recomendada para a série na<br />
qual se encontravam 22 .<br />
No momento da avaliação, 35 pacientes (46,1%) eram filhos<br />
de pais casados ou em união estável, 50,7% moravam<br />
somente com a mãe e sete (9,2%) eram órfãos de pai. Dentre<br />
os cuidadores, 68,6% relataram não ter ensino fundamental<br />
completo e 47,3% não exerciam trabalho remunerado.<br />
A média de renda mensal era de R$ 842,63 ± 591,08 (R$ 90,00-<br />
R$ 3.000,00). Vinte e duas famílias (28,9%) referiram renda<br />
mensal igual ou inferior a um salário-mínimo (R$ 510,00 na<br />
época da coleta). Quarenta e um pacientes (53,9%) recebiam<br />
auxílio-doença de um salário-mínimo do Instituto Nacional<br />
de Seguridade Social. Vinte pacientes (28,2%) tinham outro<br />
portador de anemia falciforme no mesmo domicílio e 19<br />
(25,3%) apresentavam antecedente familiar de transtorno<br />
psiquiátrico.<br />
Todas as crianças e adolescentes preencheram adequadamente<br />
o CDI, que apresentou um escore médio de 10,34 ±<br />
6,63 (0-31). Em 26 pacientes (34,2%), o escore do CDI foi igual<br />
ou superior a 13, sugestivo de sintomas depressivos.<br />
Os itens mais pontuados, em ordem decrescente, foram:<br />
24 (“não ser tão bom quanto os outros colegas”), 19 (“preocupação<br />
com dores”) e 15 (“esforço requerido para realizar<br />
tarefas escolares”) (Figura 2). Tanto o item 24 (p = 0,017)<br />
quanto o 15 (p = 0,012), pertencentes ao domínio “Ineficiência”<br />
do CDI, predominaram de maneira significativa no grupo<br />
com sintomas depressivos, com exceção do item 19, que<br />
foi bem pontuado independentemente da presença ou não<br />
de sintomas depressivos (p = 0,1). Junto com o item 14 (“alteração<br />
da imagem corporal”), o item 9 (“ideação suicida”) foi o<br />
décimo mais pontuado e, como o item 19, não predominou<br />
somente no grupo com sintomas depressivos (Figura 2).<br />
Total de pacientes entre<br />
7 e 17 anos de idade com<br />
anemia falciforme: 139<br />
Não abordados no estudo:<br />
24 (17,3%)<br />
Pacientes abordados no<br />
estudo: 115 (82,7%)<br />
Elegíveis para aplicação do<br />
CDI: 76 (66%)<br />
Não inclusos por<br />
analfabetismo: 34 (29,5%)<br />
Não inclusos por sequelas<br />
auditivas: 4 (3,5%)<br />
Recusou-se a participar do<br />
estudo: 1 (0,86%)<br />
Figura 1. Fluxograma de alocação dos pacientes elegíveis para o estudo.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
280 Barreto FJN, Cipolotti R<br />
artigo original<br />
2<br />
1,8<br />
1,6<br />
1,4<br />
Média de cada item e DP<br />
1,2<br />
1<br />
0,8<br />
0,6<br />
0,4<br />
0,2<br />
0<br />
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27<br />
Itens do CDI<br />
Figura 2. Distribuição da média dos 27 itens do CDI.<br />
Quando se compararam as variáveis descritivas com os<br />
grupos que apresentaram escores do CDI ≥ 13 e < 13, houve<br />
uma diferença estatisticamente significante para os quesitos<br />
possuir pais separados ou viúvos (p < 0,001) e renda familiar<br />
mensal ≤ R$ 510,00 (p = 0,034) (Tabela 1). Também houve<br />
associação significativa entre aqueles com escore do CDI<br />
≥ 13 e a média calculada a partir da renda mensal (p = 0,002).<br />
Não se observou correlação entre as médias de idade dos<br />
pacientes, de número de irmãos e de pessoas que moram<br />
no mesmo domicílio.<br />
Dentre os cinco domínios avaliados pelo CDI, o mais prevalente<br />
foi “Anedonia”, seja nos pacientes com escore ≥ 13<br />
ou < 13. Com base na figura 3, verifica-se uma maior varia-<br />
ção entre as pontuações obtidas em cada domínio no grupo<br />
com escore ≥ 13, ao contrário do grupo com escore < 13<br />
(Figura 3).<br />
Fez-se ainda a análise de cada domínio do CDI com as variáveis:<br />
pais separados ou viúvos, idade, renda mensal, sexo,<br />
defasagem idade-série e escolaridade do cuidador. Assim, observou-se<br />
média significativamente maior entre adolescentes<br />
no domínio “Humor deprimido” (p = 0,03). Também foram<br />
significativas as médias das pontuações obtidas nos domínios<br />
“Anedonia” e “Autoestima negativa” entre os pacientes com<br />
pais separados ou viúvos (p = 0,001 e p = 0,02, respectivamente).<br />
Para as demais variáveis pareadas com as médias de<br />
cada domínio, não houve diferença estatística (Tabela 2).<br />
Tabela 1. Comparação entre as variáveis descritivas e os grupos com escore do CDI ≥ 13 (n = 26) e < 13 (n = 50)<br />
CDI ≥ 13 CDI < 13 Total p<br />
n % n %<br />
Sexo Masculino 13 31,7 28 68,3 41<br />
Feminino 13 37,1 22 62,9 35<br />
0,798<br />
Idade (OMS) Criança (< 10 anos) 2 25 6 75 8<br />
Adolescente (10-20 anos) 24 35,3 44 64,7 68<br />
0,44<br />
Nasceram em Aracaju ou região metropolitana 11 34,4 21 65,6 33 0,826<br />
Vivem em Aracaju ou região metropolitana 7 29,2 17 70,8 24 0,711<br />
Defasagem idade-série presente 16 39 25 61 41 0,474<br />
Pais separados ou viúvos 4 11,4 31 88,6 35 < 0,001*<br />
Órfãos de pai 3 42,9 4 57,1 7 0,45<br />
Cuidador com pelo menos ensino fundamental completo 4 18,2 18 81,8 22 0,064<br />
Cuidador sem trabalho remunerado 12 34,3 23 65,7 35 0,941<br />
Renda mensal ≤ R$ 510 12 54,5 10 45,5 22 0,034*<br />
Ganha auxílio-doença 14 34,1 27 65,9 41 0,818<br />
Antecedente de anemia falciforme no mesmo domicílio 5 25 15 75 20 0,394<br />
Antecedente psiquiátrico na família 6 31,6 13 68,4 19 0,961<br />
* p < 0,05.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
artigo original<br />
Sintomas depressivos e anemia falciforme<br />
281<br />
Médias e DP<br />
9<br />
8<br />
7<br />
6<br />
5<br />
4<br />
3<br />
2<br />
1<br />
0<br />
-1<br />
CDI ≥ 13<br />
Anedonia<br />
Autoestima negativa<br />
Humor deprimido<br />
Ineficácia<br />
Problemas interpessoais<br />
CDI < 13<br />
Anedonia<br />
Autoestima negativa<br />
Humor deprimido<br />
Ineficácia<br />
Problemas interpessoais<br />
Figura 3. Distribuição das pontuações médias de cada domínio do CDI, com separação entre os grupos com escore de CDI<br />
≥ 13 e escore de CDI < 13.<br />
Tabela 2. Análise comparativa entre as médias dos cinco domínios do CDI e as variáveis descritivas: faixa etária e situação conjugal dos<br />
pais<br />
Domínios do CDI Faixa etária (OMS) Situação conjugal dos pais<br />
Criança Adolescente p Casados ou união estável Separados ou viúvos p<br />
Anedonia 1,87 ± 1,7 3,72 ± 2,6 0,05 2,42 ± 1,7 4,46 ± 2,8 0,001*<br />
Autoestima negativa 0,75 ± 0,8 1,92 ± 1,8 0,08 1,31 ± 1,5 2,2 ± 3,7 0,02*<br />
Humor deprimido 0,62 ± 0,7 1,82 ± 1,7 0,03* 1,31 ± 1,3 2,02 ± 1,8 0,06<br />
Ineficácia 2,12 ± 1,3 2,42 ± 1,7 0,64 2,08 ± 1,5 2,65 ± 1,8 0,14<br />
Problemas interpessoais 1,12 ± 2,0 0,89 ± 1,0 0,7 0,88 ± 1,4 0,95 ± 0,9 0,26<br />
* p < 0,05.<br />
DISCUSSÃO<br />
Na amostra analisada pelo estudo, houve ligeiro predomínio<br />
de meninos e uma nítida maioria de adolescentes. O uso da<br />
defasagem idade-série teve por objetivo identificar o desempenho<br />
escolar, que foi inadequado em pouco mais da metade<br />
dos pacientes. O nível de escolaridade também deixava<br />
a desejar em 68,6% dos cuidadores, que tinham o ensino<br />
fundamental incompleto. Em 50,7% dos casos, não havia um<br />
pai morando na casa do portador de anemia falciforme. No<br />
geral, as condições financeiras das famílias eram precárias,<br />
pois 47,3% dos cuidadores entrevistados nem trabalho remunerado<br />
possuíam. O auxílio-doença, benefício garantido<br />
por lei para custear as medicações e intercorrências ocorridas<br />
no curso de doenças crônicas como a anemia falciforme,<br />
só era cedido a 53,9% dos pacientes. Para 28,9% das famílias,<br />
a renda mensal relatada era de no máximo um salário-<br />
-mínimo. Não foi frequente a positividade para antecedentes<br />
de transtornos psiquiátricos na família, ou de outro portador<br />
de anemia falciforme que residisse no mesmo domicílio dos<br />
sujeitos da pesquisa.<br />
Estudos anteriores já apontavam para a presença de<br />
sintomas depressivos entre crianças e adolescentes com<br />
anemia falciforme. Em 1976, Kumar et al. 23 compararam dois<br />
grupos de crianças, um com portadores de anemia falciforme<br />
e outro sem doenças crônicas, e encontraram resultados<br />
conflitantes. As crianças com anemia falciforme tinham mais<br />
comportamentos de esquiva social e menores índices de<br />
autoconceito do que o grupo controle, entretanto exibiam<br />
as mesmas taxas de problemas de ajustamento que os colegas<br />
sem a doença, e eram até menos ansiosas que estes 23 .<br />
Posteriormente, demonstrou-se que adolescentes com anemia<br />
falciforme vivenciam problemas de ajustamento mais<br />
severos do que aqueles normalmente experimentados por<br />
adolescentes fisicamente saudáveis. Foram encontrados<br />
pior rendimento acadêmico, menor satisfação com o corpo<br />
e maior tendência a evitar contato social no grupo com<br />
anemia falciforme do que no grupo controle. Esses autores<br />
foram pioneiros no uso do CDI em pacientes com anemia<br />
falciforme, encontrando neles médias significativamente<br />
maiores de escore (9,04 ± 5,8) do que nos que não apresentavam<br />
a doença (4,54 ± 3,6) 24 .<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
282 Barreto FJN, Cipolotti R<br />
artigo original<br />
Por intermédio do CDI com o ponto de corte 13, o presente<br />
estudo revelou sintomas sugestivos de depressão em<br />
35,6% da amostra de crianças e adolescentes com anemia<br />
falciforme. Um percentual congruente, embora menor do<br />
que esse, foi encontrado por Yang et al. 25 em 36 pacientes de<br />
6 a 18 anos que preencheram o Children’s Depression Rating<br />
Scale-Revised (CDRS-R), uma escala de estrutura diferente,<br />
porém com finalidade semelhante à do CDI. Nesse estudo,<br />
29% dos portadores de anemia falciforme tiveram altos escores<br />
do CDRS-R, contra 12% daqueles que compunham o<br />
grupo controle. Entretanto, quando ambos os grupos foram<br />
submetidos a uma entrevista psiquiátrica, a prevalência de<br />
depressão clínica não diferiu significativamente entre eles 25 .<br />
Ainda no estudo de Yang et al., os quatro itens que contribuíram<br />
nos maiores escores de CDRS-R no grupo com<br />
anemia falciforme foram fadiga, queixas somáticas, preocupações<br />
sobre morte e problemas de autoestima 25 . Também<br />
fazendo uso de um instrumento de avaliação para sintomas<br />
depressivos, porém dirigida a pais e professores, Hijmans et<br />
al. 26 encontraram maiores dificuldades escolares e queixas<br />
somáticas e menor interação social em crianças com doença<br />
falciforme do que nos seus colegas saudáveis. No presente<br />
estudo, os itens mais pontuados no CDI foram os relacionados<br />
ao domínio “Ineficácia” (“não ser tão bom quanto os<br />
outros colegas” e “esforço requerido para realizar tarefas escolares”)<br />
e o item sobre “preocupação com dores”, do domínio<br />
“Anedonia”. Este último item foi bem pontuado tanto no<br />
grupo com escore de CDI ≥ 13 quanto naquele com escore<br />
< 13, sugerindo que a dor é sentida em ambos os grupos,<br />
não discriminando quem tem daqueles que não têm sintomas<br />
depressivos relevantes.<br />
Quando comparadas as variáveis descritivas com os escores<br />
do CDI, houve associação significativa entre os quesitos<br />
que apontavam problemas conjugais e restrições financeiras<br />
e as crianças e adolescentes com sintomas depressivos<br />
relevantes. Por outro lado, fatores frequentemente relacionados<br />
à depressão infanto-juvenil, como história familiar de<br />
depressão ou perda do pai 16 , não foram observados entre os<br />
pacientes com escores do CDI ≥ 13. Talvez o convívio precoce<br />
com a separação dos pais, a inclusão dos papéis paternos<br />
na figura da mãe e a renda familiar desfavorável interfiram<br />
negativamente na saúde mental dessas crianças e<br />
adolescentes, propiciando o desenvolvimento de sintomas<br />
depressivos.<br />
O domínio mais pontuado do CDI foi “Anedonia”, embora<br />
seja aquele que abarca maior número de itens entre os<br />
cinco domínios do instrumento. Esse achado encontra respaldo<br />
na literatura, que considera a anedonia como o componente<br />
mais específico da depressão em doentes crônicos,<br />
por ser, dentre toda a sintomatologia depressiva, aquele<br />
que menos é afetado pela condição de base 27 . Os escores<br />
significativamente maiores no domínio “Humor deprimido”<br />
entre os adolescentes estão em concordância com a literatura,<br />
que destaca o humor deprimido como um dos sintomas<br />
mais prevalentes no adolescente com depressão 16 .<br />
A avaliação específica de depressão em crianças e adolescentes<br />
com anemia falciforme ainda é objeto de poucos<br />
estudos, e no Brasil nenhum estudo dessa natureza foi encontrado<br />
na literatura pesquisada. Mesmo a literatura existente<br />
em nível mundial apresenta diferenças metodológicas<br />
que dificultam a interpretação de seus resultados. Sobre as<br />
duas versões brasileiras do CDI, a opção deste estudo foi por<br />
utilizar o inventário com 27 itens traduzido por Baptista 21 ,<br />
em vez daquele de 20 itens de Gouveia et al. 20 . Sabe-se que<br />
ambas cumprem bem o papel de triagem para sintomas depressivos<br />
e, por esse motivo, são utilizadas com frequência<br />
no meio científico brasileiro. No entanto, a versão com 27<br />
itens, cuja configuração é mais fiel ao CDI original, apresenta<br />
um índice mais alto de consistência interna quando comparado<br />
com a versão reduzida 19 . Um dos sete itens a mais<br />
inclusos no CDI com 27 itens, “preocupação com dores”, foi<br />
o segundo mais pontuado entre os pacientes deste estudo.<br />
Algumas dificuldades merecem destaque, como a considerável<br />
parcela de portadores de anemia falciforme que não<br />
são alfabetizados, os quais, pela exigência de o CDI ser autoaplicável,<br />
não puderam ser incluídos. Isso não só restringiu<br />
o tamanho da amostra como deixou de fora um grupo de<br />
indivíduos que já poderiam estar sofrendo com consequências<br />
da depressão em faixas etárias precoces, como o fraco<br />
desempenho escolar. Apesar de ser uma limitação do estudo,<br />
optou-se por não utilizar um grupo controle constituído<br />
de crianças e adolescentes saudáveis, uma vez que os pontos<br />
de corte do CDI são diferentes para populações clínicas e<br />
não clínicas. Não houve, também, uma avaliação psiquiátrica<br />
concomitante à coleta dos dados, já que o CDI não se presta<br />
ao diagnóstico de depressão clínica, mas à identificação de<br />
sintomas depressivos.<br />
Muitos desafios do dia a dia ainda precisam ser superados<br />
por aqueles que padecem da anemia falciforme. Sentimentos<br />
de desesperança e baixa autoestima subsequente a<br />
hospitalizações frequentes, dor e absenteísmo escolar são<br />
queixas comuns desses jovens enfermos 28 e podem sinalizar<br />
quadros depressivos em curso. Ainda é pequena a importância<br />
dada a esse transtorno afetivo em condições crônicas,<br />
sendo o seu subdiagnóstico nessas populações mais a regra<br />
do que a exceção. Além de sua sintomatologia se confundir<br />
muitas vezes com aquela da patologia de base, a depressão<br />
ainda é encarada por alguns profissionais, erroneamente,<br />
como uma reação “normal” à condição médica subjacente 29 .<br />
CONCLUSÃO<br />
Diante da elevada proporção de sintomas depressivos na<br />
amostra estudada, acredita-se que a saúde mental das<br />
crianças e adolescentes com anemia falciforme não deva<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
artigo original<br />
Sintomas depressivos e anemia falciforme<br />
283<br />
ser relegada a um segundo plano nas consultas de rotina.<br />
A implantação de meios de triagem para sintomas depressivos,<br />
ou mesmo capacitação de hematologistas e demais<br />
profissionais médicos, pode ser uma estratégia benéfica.<br />
Intervenções de cunho preventivo e terapêutico organizadas<br />
por equipes multidisciplinares devem ser fomentadas.<br />
Todavia, não haverá soluções realmente eficazes se não se<br />
compreen der o meio em que vive o portador de anemia falciforme,<br />
suas condições de escolaridade e aspectos socioeconômicos<br />
inerentes à sua família.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
À Profa. Msc. Karla Maria Nunes Ribeiro, pelas importantes<br />
sugestões e críticas ao projeto e à versão final deste estudo.<br />
CONFLITOS DE INTERESSE<br />
Não há.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):277-83.
artigo original<br />
Satisfação de familiares de pacientes<br />
psiquiátricos com os serviços de saúde<br />
mental e seus fatores associados<br />
Family satisfaction in mental health services and associated factors<br />
Marina Bandeira 1 , Mônia Aparecida da Silva 2 , Cleucimara Aparecida Camilo 3 , Cynthia Mara Felício 4<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Satisfação do usuário,<br />
serviços de saúde mental,<br />
avaliação de resultados<br />
(cuidados de saúde).<br />
Objetivo: Avaliar a satisfação de familiares cuidadores de pacientes psiquiátricos com os<br />
serviços de saúde mental e seus fatores associados. Método: Realizou-se uma pesquisa<br />
avaliativa de serviços, do tipo correlacional e de corte transversal, com uma amostra de<br />
85 familiares cuidadores de pacientes psiquiátricos, atendidos em três serviços de saúde<br />
mental públicos, situados em três cidades do interior de Minas Gerais. Utilizaram-se a Escala<br />
de Avaliação da Satisfação dos Familiares com os Serviços de Saúde Mental (SATIS-BR)<br />
e um questionário de variáveis sociodemográficas e clínicas. Resultados: A maioria dos<br />
familiares estava satisfeita ou muito satisfeita em relação aos aspectos avaliados dos serviços.<br />
A satisfação estava significativa e positivamente associada à idade dos pacientes e<br />
ao número de meses sem internação psiquiátrica. Não foi detectada influência do tipo de<br />
serviço no grau de satisfação. Conclusão: As variáveis dos pacientes foram os principais<br />
fatores associados à satisfação dos familiares. A satisfação dos familiares foi elevada, tendo-<br />
-se inferido a influência parcial do contraste com outros serviços de saúde. Foi apontada<br />
a necessidade de maior diferenciação entre os serviços. Estudos futuros, com amostras<br />
maiores e aleatórias, poderão reavaliar esses resultados.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Users’ satisfaction, mental<br />
health services, results<br />
evaluation (health care)<br />
Recebido em<br />
17/10/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
29/11/<strong>2011</strong><br />
Objective: To evaluate family caregivers’ satisfaction with mental health services and<br />
associated factors. Method: A cross-sectional correlational study of service evaluation<br />
was carried out with a sample of 85 family caregivers of psychiatric patients attending three<br />
public mental health services located in three towns in the state of Minas Gerais. Subjects were<br />
interviewed for the application of the Satisfaction with Mental Health Services Scale (SATIS-BR)<br />
and a sociodemographic and clinic variables questionnaire. Results: Results showed that<br />
most caregivers were satisfied or very satisfied with the services aspects evaluated. Family<br />
satisfaction was significantly and positively associated with patients’ age and time spent without<br />
hospitalization. The statistical analysis did not detect any effect of type of service on family<br />
satisfaction. Conclusion: Patients’ variables were the most important associated factors related<br />
to the family satisfaction. Family satisfaction was high, maybe due partly to a comparison with<br />
other health services. Data suggest the need for more differentiation among services. Future<br />
studies with bigger and randomized samples will be able to reevaluate theses results.<br />
1 Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ); Université de Montreal, McGill University.<br />
2 UFSJ, Programa de Mestrado em Psicologia.<br />
3 UFSJ, Programa de Mestrado em Psicologia, Ambulatório de Saúde Mental de Nepomuceno.<br />
4 UFSJ.<br />
Endereço para correspondência: Marina Bandeira<br />
Departamento de Psicologia – Laboratório de Pesquisa em Saúde Mental (LAPSAM) – UFSJPraça Dom Helvécio, 74, Dom Bosco São –<br />
36301-160 – João del Rei, MG<br />
E-mail: bandeira@ufsj.edu.br
artigo original<br />
Satisfação de familiares em serviços de saúde mental<br />
285<br />
INTRODUÇÃO<br />
A inclusão da perspectiva dos usuários no monitoramento<br />
e avaliação dos serviços de saúde mental tem sido altamente<br />
recomendada, visando assegurar que os cuidados<br />
prestados por esses serviços sejam adequados às necessidades<br />
dos pacientes e de seus familiares 1,2 . Segundo Donabedian<br />
3 , para que os serviços de saúde sejam de qualidade,<br />
os resultados devem ser congruentes com as perspectivas<br />
dos usuários. Além disso, as avaliações subjetivas dos usuários<br />
apresentam a vantagem de aferir o impacto real das<br />
mudanças produzidas pelo tratamento na vida dos pacientes<br />
4 . Incluir as perspectivas dos usuários na avaliação dos<br />
serviços fornece uma informação valiosa, pois muitas vezes<br />
não há uma correspondência direta entre o que os usuários<br />
percebem como mudança desejável e os resultados<br />
objetivos mensurados por terceiros. Pequenas mudanças<br />
produzidas pelo tratamento podem fazer uma grande diferença<br />
para os usuários, enquanto mudanças significativas<br />
em medidas clínicas objetivas podem ser consideradas irrelevantes<br />
para eles 5 .<br />
O envolvimento dos familiares, em colaboração com os<br />
profissionais dos serviços, apresenta vantagens para o sucesso<br />
do tratamento, estando associado à melhora no funcionamento<br />
social dos pacientes, à diminuição da duração das<br />
internações, à redução de conflitos familiares e à diminuição<br />
da sobrecarga dos familiares cuidadores dos pacientes 6,7 .<br />
Perreault et al. 7 apontaram para a necessidade de aumentar a<br />
participação dos familiares no tratamento e na avaliação dos<br />
serviços, tendo em vista que essa colaboração ainda deixa a<br />
desejar e que os familiares se ressentem com isso. As queixas<br />
dos familiares estão relacionadas com a falta de informação<br />
sobre os transtornos psiquiátricos e o tratamento dos pacientes<br />
e com a falta de orientações sobre como agir com os<br />
pacientes, no dia a dia e nos momentos de crise 7,8 .<br />
Utilizar as avaliações dos familiares sobre os resultados<br />
do tratamento pode ser particularmente útil, porque eles são<br />
os principais provedores de cuidados aos pacientes, nas atividades<br />
cotidianas, na supervisão aos comportamentos problemáticos<br />
e na tomada dos medicamentos, que afetam os<br />
próprios resultados do tratamento 9,10 . Eles podem, portanto,<br />
detectar mudanças em virtude do tratamento, em diversos<br />
aspectos da vida dos pacientes, e essas informações ajudam<br />
os profissionais a identificarem os aspectos do tratamento<br />
que já atendem às necessidades dos pacientes e aqueles<br />
que ainda necessitam ser melhorados para atingir esses objetivos.<br />
Além disso, incluir os familiares na avaliação do tratamento<br />
pode ter um efeito positivo em seu bem-estar e sentimento<br />
de empoderamento, podendo diminuir seu grau de<br />
sobrecarga com o papel de cuidador, segundo Perreault et<br />
al. 7 e Tessler e Gamache 9 .<br />
Uma das medidas mais utilizadas para a avaliação da qualidade<br />
dos serviços de saúde mental consiste na satisfação<br />
dos usuários 11 . A satisfação dos usuários tem sido associada<br />
com melhor adesão ao tratamento e menor taxa de abandono<br />
2,11,12 , além de ser um fator preditivo para menor taxa de<br />
hospitalizações futuras dos pacientes 13 . Hanson 2 destaca que<br />
as avaliações subjetivas de satisfação dos usuários com os<br />
serviços são importantes, porque estão mais associadas com<br />
a utilização de serviços do que as medidas objetivas tomadas<br />
por terceiros. O conceito de satisfação tem sido formulado<br />
por diferentes modelos explicativos, sendo o mais utilizado<br />
o modelo da expectativa, segundo o qual o usuário avalia o<br />
serviço a partir de uma comparação que ele faz entre as expectativas<br />
que possuía previamente e os resultados reais de<br />
sua experiência com o serviço. Três modelos de expectativa<br />
foram formulados, dentre os quais o modelo do contraste,<br />
que postula que a satisfação ocorre quando o usuário observa<br />
que sua experiência atual com um determinado produto<br />
ou serviço está acima das suas experiências prévias, em<br />
situa ções semelhantes 14 .<br />
Há um consenso de que a satisfação é um construto<br />
multidimensional, devendo, portanto, ser avaliado por<br />
medidas multifatoriais. Medidas multifatoriais, que são<br />
compostas por subescalas, são importantes para detectar<br />
aspectos específicos dos serviços que determinam a insatisfação<br />
ou a satisfação, o que não pode ser avaliado com<br />
medidas globais. Avaliações de serviços devem também ser<br />
feitas com medidas padronizadas, com suas propriedades<br />
psicométricas avaliadas, visando favorecer a validade dos<br />
dados coletados e garantir a possibilidade de comparação<br />
entre os estudos 11,14 .<br />
A maioria das pesquisas de avaliação de serviços de saúde<br />
mental tem focalizado a satisfação dos pacientes. Pouca<br />
ênfase tem sido dada à avaliação da satisfação dos familiares<br />
com esses serviços, apesar das recomendações feitas sobre a<br />
necessidade da inclusão dos familiares no monitoramento e<br />
avaliação dos serviços 1,8,15 .<br />
Alguns estudos internacionais levantaram os fatores associados<br />
à satisfação dos familiares com os serviços e com<br />
o papel de cuidador. Stengard et al. 8 entrevistaram, na Finlândia,<br />
uma amostra de 545 familiares de pacientes com<br />
esquizofrenia, deinstitucionalizados, após três anos de sua<br />
alta do hospital, usando uma medida de um único escore<br />
global de três pontos para avaliar a satisfação com os serviços.<br />
O estudo constatou que um terço da amostra estava<br />
insatisfeita com os serviços de saúde mental. A insatisfação<br />
era maior quando os pacientes recebiam menos tratamento<br />
ou frequentavam menos o serviço, apresentavam sintomatologia<br />
psicótica mais severa e menor nível de autonomia.<br />
Os autores concluíram que a satisfação dos familiares estava<br />
associada a dois fatores principais: ter uma participação mais<br />
ativa como colaboradores dos profissionais do serviço e ter<br />
serviços que ajudem o paciente a atingir o máximo de autonomia<br />
possível.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
286 Bandeira M et al.<br />
artigo original<br />
Perreault et al. 7 analisaram, por meio de regressão múltipla,<br />
a influência relativa de diversas variáveis na determinação<br />
da satisfação com os serviços, em uma amostra de<br />
145 familiares canadenses, tendo encontrado que o fator<br />
preditivo mais importante era o grau de colaboração entre<br />
familiares e profissionais. Além disso, a satisfação dos familiares<br />
era maior quando eles tinham um maior número de<br />
necessidades de tratamento preenchidas, menor grau de<br />
sobrecarga objetiva e subjetiva e quando os pacientes apresentavam<br />
menor número de comportamentos problemáticos.<br />
Observou-se que os familiares estavam mais satisfeitos<br />
com o relacionamento com os profissionais do que com as<br />
características da estrutura e organização dos serviços, o que<br />
confirma, segundo os autores, a tendência dos resultados<br />
dos estudos que avaliaram a satisfação dos próprios pacientes<br />
com os serviços.<br />
No contexto brasileiro, foram encontrados apenas quatro<br />
estudos, publicados em periódicos científicos indexados,<br />
que avaliaram a satisfação dos usuários com os serviços de<br />
saúde mental, utilizando escalas de medidas validadas para<br />
aferir a satisfação. Apenas um desses estudos focalizou a satisfação<br />
dos familiares, porém com o objetivo de fazer a validação<br />
de uma escala de medida 16 , e os três outros estudos<br />
avaliaram a satisfação dos pacientes 17-19 . Tendo em vista a<br />
carência de estudos com os familiares e a importância dessa<br />
temática, a presente pesquisa teve como objetivo avaliar a<br />
satisfação de familiares de pacientes psiquiátricos em relação<br />
aos serviços de saúde mental e seus fatores associados.<br />
MÉTODO<br />
Delineamento do estudo<br />
Trata-se de um estudo correlacional visando avaliar os fatores<br />
associados à satisfação dos familiares com os serviços de<br />
saúde mental. A pesquisa é de corte transversal, realizada a<br />
partir de dados coletados em uma única entrevista estruturada,<br />
com aplicação de uma escala de medida multifatorial da<br />
satisfação dos familiares.<br />
Consiste, também, em uma pesquisa avaliativa, do tipo<br />
somativa, definida como aquela que visa avaliar os efeitos de<br />
serviços ou programas de tratamento, segundo a classificação<br />
de Selltiz et al. 20 e de Contandriopoulos et al. 21 . No caso<br />
deste estudo, avaliou-se a satisfação dos familiares com os<br />
serviços oferecidos aos pacientes, em relação às dimensões<br />
dos resultados do tratamento, dos cuidados prestados e<br />
competência da equipe, da privacidade e confidencialidade<br />
dos serviços.<br />
Participantes<br />
Participaram deste estudo 85 familiares de pacientes<br />
psiquiá tricos que estavam sendo atendidos em três serviços<br />
de saúde mental de diferentes municípios do interior de Minas<br />
Gerais. Houve a participação de apenas um familiar por<br />
paciente. Foi utilizada uma amostra não probabilística de familiares,<br />
selecionados por meio de indicações dos profissionais<br />
dos serviços, que preenchiam os seguintes critérios de<br />
inclusão: ter idade igual ou superior a 18 anos, ser indicado<br />
como principal cuidador do paciente e conviver diariamente<br />
com ele. Foram excluídos os familiares que apresentavam<br />
transtornos psiquiátricos e que não tinham condições de<br />
compreender as questões dos instrumentos utilizados. Os<br />
serviços participantes desta pesquisa incluíram: dois Centros<br />
de Atenção Psicossocial (um CAPS tipo I e um CAPS tipo II) e<br />
um Ambulatório de Saúde Mental. Apesar de a amostra ser<br />
constituída, em geral, por familiares de pacientes de CAPS,<br />
a maioria dos pacientes estava sendo atendida em regime<br />
não intensivo, que inclui apenas consultas mensais, para<br />
acompanhamento da medicação aos pacientes com quadro<br />
clínico estável.<br />
Instrumentos de medida<br />
Escala de avaliação da satisfação dos familiares: A satisfação<br />
dos familiares foi avaliada por meio da versão abreviada da<br />
Escala de Avaliação da Satisfação dos Familiares com os Serviços<br />
de Saúde Mental (SATIS-BR). Essa escala foi elaborada<br />
pela Divisão de Saúde Mental da Organização Mundial de<br />
Saúde 22 e validada, para o Brasil, por Bandeira et al. 16 .<br />
Essa escala possui oito itens agrupados em três subescalas:<br />
1. Resultados do tratamento; 2. Acolhida e competência<br />
da equipe; e 3. Privacidade e confidencialidade do serviço. As<br />
alternativas de resposta aos itens estão dispostas em uma escala<br />
do tipo Likert, com 5 pontos (1 = muito insatisfeitos e 5 =<br />
muito satisfeitos). A escala SATIS-BR apresentou bons indicadores<br />
de consistência interna, avaliada pela análise da alfa de<br />
Cronbach, tendo obtido um valor de alfa de 0,79 para o escore<br />
global e valores entre 0,76 e 89 para suas subescalas. Esses<br />
valores situam-se dentro da faixa considerada ideal (0,75 a<br />
0,85) por Vallerand 23 , indicando que as questões da escala são<br />
homogêneas, sem serem repetitivas. A validade de construto<br />
da escala foi avaliada pela análise de sua estrutura dimensional,<br />
pelo método dos Componentes Principais, com rotação<br />
Varimax, tendo sido obtidos três fatores, com eigenvalues acima<br />
de 1.0, que explicaram 77% da variância dos dados 16 .<br />
Questionário sociodemográfico e clínico: Os dados sociodemográficos<br />
dos familiares e dos pacientes e os dados clínicos<br />
dos pacientes foram coletados por meio de um questionário,<br />
previamente testado em um estudo piloto, visando<br />
avaliar a compreensão das questões pela população-alvo.<br />
O questionário incluía questões sobre as seguintes variáveis:<br />
idade, gênero, data de nascimento, estado civil, escolaridade,<br />
renda, tipo de trabalho e parentesco com o paciente.<br />
As variáveis clínicas dos pacientes avaliadas foram: tipo de<br />
diagnóstico, presença de comorbidade psiquiátrica, duração<br />
do transtorno, duração do tratamento psiquiátrico, número<br />
de internações, tipo de medicação utilizada, existência de<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
artigo original<br />
Satisfação de familiares em serviços de saúde mental<br />
287<br />
doenças físicas e número de crises no último ano. Dados<br />
clínicos referentes ao diagnóstico, comorbidades, tempo<br />
de tratamento e tipo de medicação foram identificados nos<br />
prontuá rios dos pacientes.<br />
Coleta de dados<br />
Os dados foram coletados por meio de entrevistas estruturadas,<br />
com duração aproximada de 30 minutos, para aplicação<br />
dos instrumentos de medida, por estagiários de Psicologia<br />
previamente treinados. As entrevistas foram realizadas nos<br />
serviços de saúde mental, quando os familiares se apresentavam<br />
para acompanhar os pacientes, ou em suas residências,<br />
após agendamento prévio e conforme sua disponibilidade.<br />
A compreensão dos familiares acerca das questões da escala<br />
de satisfação foi verificada por meio da Técnica de Sondagem<br />
(Probe Technique) 24 , que consiste em solicitar aos sujeitos<br />
que justifiquem suas respostas a cada um dos itens da<br />
escala.<br />
O presente estudo foi aprovado pela Comissão de Ética<br />
em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos (CEPES) da UFSJ,<br />
processo nº 016-a/2010/CEPES, e pela direção das instituições<br />
participantes. Os entrevistados foram informados sobre<br />
os objetivos do estudo e sobre o sigilo e anonimato dos<br />
resultados, tendo assinado um Termo de Consentimento<br />
Livre e Esclarecido concordando em participar da pesquisa.<br />
Os participantes receberam uma cópia desse documento,<br />
com um número de telefone para contato com os pesquisadores.<br />
Análise dos dados<br />
Os dados foram computados e analisados por meio do programa<br />
SPSS, versão 13.0. As análises estatísticas foram propostas<br />
com base nas obras de Bisqueira et al. 25 e Dancey e<br />
Reidy 26 . Foram utilizados testes estatísticos não paramétricos,<br />
uma vez que os dados não apresentavam distribuição normal,<br />
conforme avaliado pelo teste Kolmogorov-Smirnov (KS:<br />
1,53; p = 0,02).<br />
Para a descrição das características sociodemográficas<br />
e clínicas da amostra e avaliação dos escores de satisfação<br />
global, por subescalas e por itens, foi utilizada a análise estatística<br />
descritiva, com cálculo de médias, desvios-padrão<br />
(DP) e porcentagens. Foram também calculadas as porcentagens<br />
de familiares que se declararam insatisfeitos, mais ou<br />
menos insatisfeitos ou satisfeitos com os serviços. Os escores<br />
médios das três subescalas da SATIS-BR foram comparados,<br />
utilizando-se os testes não paramétricos de Kendall’s W para<br />
verificar se havia diferença significativa entre eles. Além disso,<br />
essas médias foram comparadas duas a duas, pelo teste<br />
de Wilcoxon para duas amostras relacionadas, visando identificar<br />
quais pares de subescalas apresentavam diferenças<br />
significativas. Para identificar os itens específicos da escala<br />
que apresentavam escores médios mais elevados de satisfação,<br />
foi feita uma análise da média de postos, pelo teste não<br />
paramétrico de Friedman. Foi utilizado o nível de significância<br />
de p < 0,05.<br />
Foi realizada também uma análise estatística univariada,<br />
para identificar as variáveis clínicas dos pacientes e as variáveis<br />
sociodemográficas dos pacientes e familiares, associadas<br />
à maior satisfação dos familiares com os serviços de<br />
saúde mental. Para as variáveis categóricas, foram utilizados<br />
o teste Man-Whitney para comparar dois grupos e o teste<br />
de Kruskal-Wallis para comparar mais de dois grupos. Para as<br />
variáveis contínuas, foi utilizada a correlação de Spearman.<br />
Não foi feita uma análise multivariada de regressão múltipla,<br />
tendo em vista que os dados dos escores de satisfação não<br />
apresentaram distribuição normal.<br />
RESULTADOS<br />
Descrição das amostras<br />
As tabelas 1 e 2 mostram os principais dados descritivos da<br />
amostra dos familiares avaliados e as características dos pacientes<br />
dos quais eles cuidavam. A maioria dos familiares era<br />
do gênero feminino (80,00%), vivendo com companheiro<br />
em união estável (60,00%), com escolaridade de ensino fundamental<br />
(71,80%). A idade média era de 54,61 anos, sendo a<br />
idade mínima de 19 e a máxima de 78 anos. A maioria dos familiares<br />
não possuía trabalho formal (79,60%), mas tinha renda<br />
própria (62,40%), de um a dois salários-mínimos (79,30%),<br />
originada principalmente de aposentadoria (54,80%). Com<br />
relação ao grau de parentesco, as mães e pais eram os principais<br />
cuidadores dos pacientes (43,60%).<br />
Os pacientes que recebiam cuidados dos familiares estudados<br />
eram, em sua maioria, do gênero feminino (57,60%) e<br />
com escolaridade de ensino fundamental (78,70%). A idade<br />
média era de 43,53 anos, sendo a mínima de 20 e a máxima<br />
de 73 anos. Grande parte possuía renda própria (62,40%),<br />
cujo valor era, na maioria dos casos (79,30%), de um a dois<br />
salários-mínimos e as principais fontes de renda eram a<br />
aposentadoria (49,00%) e o auxílio do governo (20,80%).<br />
A maioria dos pacientes possuía diagnóstico da categoria<br />
“Esquizofrenia, Transtornos esquizotípicos e Transtornos delirantes”<br />
(60,00%), não apresentava comorbidade psiquiátrica<br />
(81,20%) e não possuía doenças físicas (55,30%). Metade<br />
dos pacientes (50,60%) não havia apresentado crises no último<br />
ano e 36,50% nunca tinham sido internados em hospitais<br />
psiquiátricos. A idade média de início do transtorno psiquiátrico<br />
era de 27,10 anos; a duração média do transtorno era de<br />
16,89 anos; e a duração média do tratamento psiquiátrico era<br />
de 13,02 anos. Os pacientes tomavam, em média, 2,99 tipos<br />
de medicamentos por dia. A maioria tomava a medicação<br />
de forma independente, sem a ajuda do familiar (65,90%).<br />
A maioria estava em regime de tratamento psiquiátrico não<br />
intensivo (56,50%).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
288 Bandeira M et al.<br />
artigo original<br />
Tabela 1. Principais características sociodemográficas dos familiares e dos pacientes<br />
Variáveis Categorias Familiares<br />
Frequência (%)<br />
Gênero<br />
Feminino<br />
Masculino<br />
Estado civil<br />
Solteiro<br />
Casado/Vivendo como casado<br />
Separado/divorciado/viúvo<br />
Nível de escolaridade<br />
Analfabeto<br />
Ensino fundamental completo ou incompleto<br />
Ensino médio completo ou incompleto<br />
Pós-graduação<br />
Trabalho formal<br />
Sim<br />
Não<br />
Possui renda própria<br />
Sim<br />
Não<br />
Renda (em salários-mínimos) < 1<br />
1 a 2<br />
2,1 a 3<br />
3,1 a 4<br />
Origem da renda<br />
Emprego ou trabalho regular<br />
Aposentadoria<br />
Pensão<br />
Auxílio do governo/Encostado<br />
Outra<br />
Parentesco entre familiar e paciente<br />
Mãe ou pai<br />
Irmão(a)<br />
Cônjuge<br />
Filho(a)<br />
Outro<br />
68 (80,00%)<br />
17 (20,00%)<br />
11 (12,90%)<br />
51 (60,00%)<br />
23 (27,10%)<br />
12 (14,10%)<br />
61 (71,80%)<br />
12 (14,10%)<br />
-<br />
11 (20,40%)<br />
74 (79,60%)<br />
53(62,40%)<br />
32 (37,60%)<br />
5 (9,40%)<br />
42 (79,30%)<br />
5 (9,40%)<br />
1 (1,90%)<br />
11 (20,70%)<br />
29 (54,80%)<br />
11 (20,70%)<br />
1 (1,90%)<br />
1 (1,90%)<br />
37 (43,60%)<br />
17 (20,00%)<br />
15 (17,60%)<br />
8 (9,40%)<br />
8 (9,40%)<br />
Pacientes<br />
Frequência (%)<br />
49 (57,60%)<br />
36 (42,40%)<br />
5 (5,90%)<br />
67 (78,70%)<br />
10 (11,80%)<br />
3 (3,60%)<br />
7 (13,20%)<br />
78 (86,80%)<br />
53 (62,40%)<br />
32 (37,60%)<br />
5 (9,40%)<br />
42 (79,30%)<br />
5 (9,40%)<br />
1 (1,90%)<br />
7 (13,20%)<br />
26 (49,00%)<br />
8 (15,10%)<br />
11 (20,80%)<br />
1 (1,90%)<br />
Tabela 2. Principais características clínicas dos pacientes<br />
Variáveis Categorias Frequência (%) Média ± desvio-padrão<br />
Categoria diagnóstica ––<br />
Esquizofrenia, transtornos esquizotípicos<br />
e delirantes<br />
––<br />
Transtornos do humor e afetivos<br />
––<br />
Transtornos neuróticos relacionados ao<br />
estresse e somatoforme<br />
––<br />
Transtornos fóbicos e ansiosos<br />
––<br />
Diagnóstico não especificado<br />
51 (60,00%)<br />
23 (27,00%)<br />
8 (9,40%)<br />
1 (1,20%)<br />
2 (2,40%)<br />
Comorbidade psiquiátrica<br />
Sim<br />
Não<br />
Não especificado<br />
15 (17,60%)<br />
69 (81,20%)<br />
1 (1,20)<br />
Regime de tratamento<br />
Idade de início do transtorno psiquiátrico<br />
Duração do transtorno<br />
Duração do tratamento psiquiátrico<br />
Crises no último ano<br />
Internações<br />
Número de tipos de medicamentos psiquiátricos<br />
Toma o medicamento sozinho<br />
Doenças físicas<br />
CAPS dia<br />
Ambulatorial<br />
Não teve crises<br />
Teve 1 crise<br />
Teve de 2 a 5 crises<br />
Teve de 6 a 10 crises<br />
Nunca foi internado<br />
1 a 5 internações<br />
6 a 10 internações<br />
Mais de 10 internações<br />
Não souberam informar<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
37 (43,50%)<br />
48 (56,50%)<br />
43 (50,60%)<br />
21 (24,70%)<br />
17 (20,00%)<br />
4 (4,70%)<br />
31 (36,50%)<br />
35 (41,20%)<br />
11 (12,90%)<br />
7 (8,20%)<br />
1 (1,20%)<br />
56 (65,90%)<br />
29 (34,10%)<br />
38 (44,70%)<br />
47 (55,30%)<br />
27,10 ± 11,88 anos<br />
16,89 ± 10,32 anos<br />
13,02 ± 9,33 anos<br />
2,74 ± 2,38 crises<br />
7,42 ± 18,00 internações<br />
2,99 ± 1,21 tipos<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
artigo original<br />
Satisfação de familiares em serviços de saúde mental<br />
289<br />
Satisfação dos familiares com os serviços<br />
Análise por subescalas: A tabela 3 apresenta os escores<br />
médios de satisfação dos familiares, para a escala global e<br />
para as três subescalas da SATIS-BR e os valores de p para a<br />
comparação entre elas, duas a duas, por meio do teste não<br />
paramétrico de Wilcoxon para amostras relacionadas. O escore<br />
médio de satisfação global foi de 4,41 (DP = 0,56), em<br />
uma faixa de variação entre 1 e 5, indicando que, em geral,<br />
os familiares dos pacientes estavam entre satisfeitos e muito<br />
satisfeitos com os serviços.<br />
Os escores médios de satisfação foram elevados também<br />
para as subescalas, sendo 4,55 para a subescala 1, “Resultados<br />
do tratamento”, 4,29 para a subescala 2, “Acolhida e<br />
competência da equipe” e 4,40 para a subescala 3, “Privacidade<br />
e confidencialidade do serviço”. Uma comparação<br />
dessas médias, pelo teste não paramétrico de Kendall’s W,<br />
indicou uma diferença significativa entre elas (χ 2 = 26,85;<br />
p < 0,001). A comparação das médias das subescalas duas<br />
a duas, pelo teste de Wilcoxon, confirmou que os familiares<br />
estavam significativamente mais satisfeitos em relação aos<br />
“Resultados do tratamento”, comparativamente à “Acolhida<br />
e competência da equipe” (p < 0,001) e à “Privacidade e confidencialidade<br />
do serviço” (p < 0,01). Não houve diferença estatisticamente<br />
significativa da satisfação dos familiares entre<br />
as subscalas 2 e 3 (p = 0,09).<br />
Tabela 3. Médias de satisfação dos familiares por subescalas e<br />
escala global e comparação das médias das subescalas, duas a<br />
duas, pelo teste não paramétrico de Wilcoxon<br />
Subescalas<br />
Média (DP)<br />
1. Resultados do tratamento 4,55 (0,64)<br />
Wilcoxon<br />
p (1-2) p (1-3) p (2-3)<br />
2. Acolhida e competência da equipe 4,29 (0,64) 0,00** 0,09<br />
3. Privacidade e confidencialidade do serviço 4,40 (0,59) 0,00*<br />
Escala global 4,41 (0,56)<br />
** p < 0,001; * p < 0,01; p (1-2): comparação das subescalas 1 e 2; p (1-3): comparação das subescalas 1 e 3;<br />
p (2-3): comparação das subescalas 2 e 3; DP: desvio-padrão.<br />
Análise por itens: A tabela 4 apresenta os resultados descritivos<br />
dos escores de satisfação dos familiares para cada<br />
item da escala SATIS-BR, em termos das porcentagens de familiares<br />
insatisfeitos, mais ou menos satisfeitos e satisfeitos<br />
com os serviços. Os resultados mostram que a maioria dos<br />
familiares estava satisfeita ou muito satisfeita (respostas 4 e 5)<br />
em relação aos diversos aspectos avaliados (81,20% a 96,40%).<br />
Os itens que apresentaram maiores porcentagens de satisfação<br />
dos familiares foram: as medidas tomadas para assegurar<br />
a privacidade do tratamento (item 5), a confidencialidade das<br />
informações (item 6), a competência do profissional (item 7)<br />
e a capacidade dos serviços em ajudar o paciente a lidar mais<br />
eficientemente com os seus problemas (item 3).<br />
No que se refere às porcentagens mais elevadas de insatisfação,<br />
destacaram-se os itens: compreensão do paciente<br />
pelo profissional que o admitiu (item 1), compreensão pela<br />
equipe do tipo de ajuda que o paciente necessitava (item 2)<br />
e obtenção do tipo de ajuda de que o paciente necessitava<br />
(item 4). Nenhum familiar estava insatisfeito em relação à<br />
competência do terapeuta principal.<br />
A tabela 4 apresenta também os dados referentes à comparação<br />
dos escores médios de satisfação aos itens específicos<br />
da escala, por meio de uma análise da média de postos<br />
de Friedman. Os resultados mostraram uma diferença significativa<br />
entre os escores de satisfação dos familiares nos oito<br />
itens da escala (χ 2 = 68,16; p < 0,001). As médias mais elevadas<br />
de satisfação se concentraram principalmente nos itens<br />
que avaliaram: os benefícios que o paciente recebeu com<br />
o tratamento (item 8), se os serviços recebidos ajudaram o<br />
paciente a lidar mais eficientemente com seus problemas<br />
(item 3), a competência do terapeuta principal (item 7) e se o<br />
paciente obteve o tipo de ajuda de que necessitava (item 4).<br />
Fatores associados à satisfação dos familiares<br />
Para a análise dos fatores associados à satisfação dos familiares,<br />
algumas categorias de variáveis foram agrupadas e<br />
outras não foram investigadas, por causa da ocorrência de<br />
Tabela 4. Porcentagens de resposta dos familiares para cada item da escala SATIS-BR e médias de postos de Friedman<br />
Itens<br />
Insatisfeitos<br />
Respostas<br />
1 e 2<br />
Mais ou menos<br />
satisfeitos<br />
Respostas<br />
3<br />
Satisfeitos<br />
Respostas<br />
4 e 5<br />
Média de postos<br />
1. Compreensão do paciente pelo profissional que o admitiu 5 (5,90%) 11 (12,90%) 69 (81,20%) 3,69<br />
2. Equipe compreendeu o tipo de ajuda de que o paciente necessitava 1 (1,20%) 14 (16,50%) 70 (82,30%) 3,86<br />
3. Serviços recebidos ajudaram o paciente a lidar melhor com os seus problemas 1 (1,20%) 4 (4,70%) 80 (94,10%) 5,27<br />
4. Obtenção do tipo de ajuda de que o paciente necessitava 3 (3,50%) 9 (10,60%) 73 (85,90%) 4,46<br />
5. Medidas tomadas para assegurar a privacidade do tratamento 2 (2,40%) 1 (1,20%) 82 (96,40%) 4,36<br />
6. Confidencialidade das informações 2 (2,40%) 3 (3,50%) 80 (94,10%) 4,43<br />
7. Competência do profissional - 5 (5,90%) 80 (94,10%) 4,64<br />
8. Beneficiou-se com o tratamento 1 (1,20%) 6 (7,10%) 78 (91,70%) 5,29<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
290 Bandeira M et al.<br />
artigo original<br />
baixas frequências de resposta. Os vários tipos de diagnósticos<br />
dos pacientes, que estavam sob cuidado desses familiares,<br />
foram agrupados em três categorias, de acordo com<br />
a CID-10 27 : (1) “Esquizofrenia, Transtornos esquizotípicos e<br />
Transtornos delirantes”, (2) “Transtornos do humor e afetivos”,<br />
e (3) “Transtornos neuróticos relacionados ao estresse e<br />
somatoforme”. A categoria diagnóstica Transtornos fóbicos<br />
ansiosos não foi analisada, porque tinha apenas um sujeito.<br />
Para a variável “local de tratamento”, foram comparados os<br />
dados de apenas dois serviços, ambulatório e CAPS, pois so-<br />
mente quatro pacientes faziam tratamento em um terceiro<br />
serviço.<br />
A tabela 5 apresenta os resultados referentes à análise das<br />
variáveis categóricas sociodemográficas e clínicas, associadas<br />
à satisfação dos familiares. Nessa tabela, para comparar duas<br />
categorias, foi utilizado o teste Man-Whitney e, para comparar<br />
mais de duas categorias, foi utilizado o teste de Kruskal-<br />
-Wallis. A tabela 6 apresenta a análise das variáveis contínuas<br />
sociodemográficas e clínicas associadas à satisfação dos familiares,<br />
por meio do coeficiente de correlação de Spearman.<br />
Tabela 5. Análise univariada das variáveis categóricas sociodemográficas e clínicas associadas à satisfação global dos familiares com os<br />
serviços, por meio dos testes Man-Whitney e Kruskal-Wallis<br />
Variáveis Categorias N Média (DP) P<br />
Gênero do paciente<br />
Feminino<br />
68<br />
4,46 (0,63)<br />
0,58<br />
Masculino<br />
17<br />
4,34 (0,50)<br />
Paciente frequentou escola<br />
Renda própria (paciente)<br />
Categoria diagnóstica<br />
Comorbidade psiquiátrica<br />
Local de tratamento<br />
Modalidade de tratamento<br />
Paciente possui doenças físicas<br />
Paciente faz outro tratamento de saúde<br />
Paciente internou-se<br />
Paciente toma o medicamento sozinho<br />
Tipo de medicação<br />
Gênero do familiar<br />
Familiar frequentou escola<br />
Renda própria do familiar<br />
Trabalho formal (familiar)<br />
Familiar reside com o paciente<br />
Estado civil do familiar<br />
Parentesco do familiar com o paciente<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
– Esquizofrenia, Transtornos Esquizotípicos e Transtornos Delirantes<br />
– Transtornos do Humor e Afetivos<br />
Esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e transtornos delirantes<br />
Transtornos neuróticos relacionados ao estresse e somatoforme<br />
Transtornos do humor e afetivo<br />
Transtornos neuróticos relacionados ao estresse e somatoforme<br />
Sim<br />
Não<br />
Ambulatório<br />
CAPS<br />
CAPS DIA<br />
Ambulatorial<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Via oral<br />
Oral e intramuscular<br />
Feminino<br />
Masculino<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Sim<br />
Não<br />
Solteiro<br />
Casado<br />
Vivendo como casado<br />
Separado<br />
Viúvo<br />
Mãe/pai<br />
Irmão<br />
Cônjuge<br />
Filho<br />
Outro<br />
80<br />
5<br />
53<br />
32<br />
51<br />
23<br />
51<br />
8<br />
23<br />
8<br />
15<br />
69<br />
46<br />
35<br />
37<br />
48<br />
38<br />
47<br />
35<br />
50<br />
54<br />
31<br />
56<br />
29<br />
68<br />
17<br />
68<br />
17<br />
74<br />
11<br />
53<br />
32<br />
53<br />
32<br />
12<br />
73<br />
11<br />
49<br />
2<br />
7<br />
16<br />
37<br />
17<br />
15<br />
8<br />
8<br />
4,38 (0,57)<br />
4,80 (0,19)<br />
4,46 (0,55)<br />
4,34 (0,57)<br />
4,40 (0,60)<br />
4,44 (0,54)<br />
4,40 (0,60)<br />
4,50 (0,42)<br />
4,44 (0,54)<br />
4,50 (0,42)<br />
4,28 (0,58)<br />
4,44 (0,56)<br />
4,41(0,51)<br />
4,44 (0,60)<br />
4,37 (0,51)<br />
4,44 (0,59)<br />
4,33(0,56)<br />
4,48 (0,55)<br />
4,41 (0,51)<br />
4,41 (0,59)<br />
4,43 (0,57)<br />
4,38 (0,54)<br />
4,37 (0,60)<br />
4,49 (0,47)<br />
4,46 (0,52)<br />
4,21 (0,67)<br />
4,40 (0,60)<br />
4,47 (0,38)<br />
4,43 (0,58)<br />
4,30 (0,36)<br />
4,42 (0,55)<br />
4,41 (0,58)<br />
4,58 (0,48)<br />
4,39 (0,57)<br />
4,39 (0,54)<br />
4,57 (0,63)<br />
4,42 (0,52)<br />
4,47 (0,52)<br />
4,56 (0,27)<br />
4,11 (0,53)<br />
4,34 (0,72)<br />
4,33 (0,60)<br />
4,62 (0,46)<br />
4,31 (0,48)<br />
4,47 (0,54)<br />
4,52 (0,70)<br />
0,12<br />
0,24<br />
0,93<br />
0,99<br />
0,96<br />
0,20<br />
0,41<br />
0,31<br />
0,14<br />
0,76<br />
0,48<br />
0,55<br />
0,17<br />
0,81<br />
0,17<br />
0,83<br />
0,32<br />
0,11<br />
0,60<br />
0,20<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
artigo original<br />
Satisfação de familiares em serviços de saúde mental<br />
291<br />
Os resultados das tabelas 5 e 6 mostraram que, de todas<br />
as variáveis analisadas, somente a idade do paciente e o<br />
tempo transcorrido desde a sua última internação estavam<br />
significativamente associados ao grau de satisfação dos familiares.<br />
Os familiares apresentaram maior grau de satisfação<br />
com os serviços quando os pacientes eram mais velhos (r =<br />
0,23; p = 0,04) e quando estavam há mais tempo, medido em<br />
meses, sem passar por uma internação psiquiátrica (r = 0,26;<br />
p = 0,05). Nenhuma variável sociodemográfica dos familiares<br />
estava associada à sua satisfação com os serviços de saúde<br />
mental avaliados.<br />
Tabela 6. Análise univariada das variáveis contínuas sociodemográficas<br />
e clínicas associadas à satisfação global dos familiares<br />
com os serviços, por meio da correlação de Spearman<br />
Variáveis Média (DP) R P<br />
Idade do paciente 43,53 (12,49) 0,23 0,04*<br />
Número de anos de escolaridade do paciente 4,99 (3,34) - 0,18 0,10<br />
Idade do início do transtorno psiquiátrico 27,10 (11,88) 0,04 0,74<br />
Duração do transtorno 16,89 (10,32) 0,20 0,08<br />
Duração do tratamento psiquiátrico 13,02 (9,33) 0,18 0,09<br />
Número médio de internações 7,42 (18,00) 0,06 0,65<br />
Duração da última internação 55,91 (67,66) 0,06 0,64<br />
Tempo desde a última internação (em meses) 96,85 (93,60) 0,26 0,05*<br />
Número de crises no último ano 2,74 (2,38) 0,03 0,82<br />
Número de tipos de medicamentos 2,99 (1,21) - 0,05 0,62<br />
Idade do familiar 54,61 (14,38) - 0,01 0,94<br />
Número de anos de escolaridade do familiar 4,98 (3,34) 0,00 0,99<br />
Renda do familiar (em reais) 555,06 (254,18) - 0,09 0,53<br />
* p ≤ 0,05.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os resultados do presente estudo mostraram que a grande<br />
maioria dos familiares (entre 81,20% e 96,40%) demonstrou<br />
satisfação ou muita satisfação em relação aos diferentes aspectos<br />
dos serviços. Uma minoria (1,20% a 5,90%) relatou estar<br />
insatisfeita ou muito insatisfeita, e uma porcentagem um<br />
pouco maior (1,20% a 16,50%) apresentou a resposta “mais<br />
ou menos”, intermediária entre satisfação e insatisfação.<br />
Dois estudos internacionais encontraram taxas mais baixas<br />
de satisfação dos familiares com os serviços de saúde<br />
mental, comparativamente ao presente estudo. Embora essa<br />
diferença de resultados possa estar relacionada com o tipo<br />
de serviço, sua organização e tratamentos envolvidos, não<br />
é possível fazer uma comparação nesse nível, uma vez que<br />
os autores não apresentaram descrições detalhadas sobre<br />
esses aspectos. Outras hipóteses, entretanto, podem ser levantadas<br />
para explicar as diferenças entre os resultados dos<br />
estudos. Na pesquisa de Perreault et al. 7 , as porcentagens<br />
mais baixas de satisfação ou muita satisfação encontradas<br />
(46,40% a 85,70%) talvez se expliquem pelo tipo de amostra<br />
avaliada, pois se tratava de familiares que faziam parte de<br />
grupos de suporte, portanto possivelmente mais organizados,<br />
informados e engajados em movimentos coletivos do<br />
que os familiares da amostra brasileira avaliada, o que poderia<br />
talvez contribuir para uma manifestação mais aberta<br />
de opiniões, expectativas e críticas. Além disso, a forma de<br />
coletar os dados, por meio de entrevistas por telefone, talvez<br />
tenha contribuído também para uma maior manifestação de<br />
insatisfação do que entrevistas face a face, tal como utilizada<br />
no presente trabalho.<br />
No estudo de Stengard et al. 8 , os familiares foram entrevistados<br />
em uma avaliação de follow-up após a alta de internação,<br />
sendo que dois terços da amostra demonstraram<br />
satisfação com os serviços, enquanto um terço apresentou<br />
insatisfação, particularmente com a falta de sua participação<br />
no tratamento e com a falta de informações por parte dos<br />
profissionais dos serviços. Neste estudo, o tipo de amostra<br />
também pode ter contribuído para uma maior manifestação<br />
de insatisfação, pois se tratava de 60% dos familiares<br />
da amostra total do estudo, cujos pacientes estavam em<br />
condições clínicas mais desfavoráveis do que o restante da<br />
amostra total, uma vez que usavam mais medicamentos, frequentavam<br />
mais os serviços e apresentavam menor grau de<br />
autonomia. Além disso, tratava-se de pacientes que tinham<br />
recebido alta dos hospitais há apenas três anos, possivelmente<br />
ainda em processo de readaptação. No presente estudo,<br />
ao contrário, a amostra era constituída por pacientes<br />
estabilizados, que estavam em regime ambulatorial, viviam<br />
na comunidade e tinham uma média de 17,89 anos de duração<br />
da doença, e a maioria (51,80%) tinha tido apenas uma<br />
ou nenhuma internação, há 96,85 meses em média. No último<br />
ano, a maioria (75,30%) tinha sofrido apenas uma ou nenhuma<br />
crise. A presente amostra apresenta, portanto, características<br />
diferentes das amostras dos dois estudos citados<br />
acima, que talvez expliquem as diferenças de resultados da<br />
satisfação dos familiares.<br />
No que se refere às condições clínicas dos pacientes, já<br />
foi constatado que essa variável está associada à satisfação<br />
dos familiares com os serviços. Por exemplo, Stengard et al. 8<br />
encontraram que familiares de pacientes com melhor funcionamento<br />
global estavam mais satisfeitos com os serviços<br />
de saúde mental (OR = 0,73; p = 0,003). O estudo de Perreault<br />
et al. 7 também mostrou que a satisfação dos familiares estava<br />
significativamente associada ao maior tempo de duração da<br />
doença do paciente (r = 0.21 e p = 0.014), o que sugere estabilidade<br />
do quadro clínico dos pacientes. No presente estudo,<br />
a maior satisfação dos familiares estava correlacionada<br />
com duas variáveis dos pacientes: maior tempo transcorrido<br />
desde a última internação e maior idade, o que também sugere<br />
uma estabilidade do quadro clínico. Na presente amostra,<br />
os pacientes com maior idade eram também aqueles<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
292 Bandeira M et al.<br />
artigo original<br />
que possuíam o transtorno psiquiátrico há mais tempo (r =<br />
0,39, p < 0,001), que faziam tratamento psiquiátrico por um<br />
período mais longo (r = 0,37, p ≤ 0,001) e que estavam há<br />
mais tempo sem internação (r = 0,54, p < 0,001).<br />
Outra hipótese explicativa dos resultados da presente<br />
pesquisa pode ser levantada examinando a realidade dos<br />
serviços de saúde do país, comparativamente aos serviços de<br />
saúde mental e os efeitos dessa comparação nas expectativas<br />
e apreciações dos familiares dos pacientes psiquiátricos.<br />
A alta satisfação dos familiares do presente trabalho talvez se<br />
explique à luz do modelo da expectativa, em particular a teoria<br />
do contraste, descrito na introdução deste artigo. Segundo<br />
esse modelo, os sujeitos avaliam um determinado serviço,<br />
com base em uma comparação que fazem entre a experiência<br />
atual com o serviço e experiências prévias com outros<br />
serviços de saúde. No presente estudo, uma comparação entre<br />
as experiências prévias dos familiares com os serviços de<br />
saúde em geral, tais como os postos de saúde, nos quais eles<br />
enfrentam filas de espera longas para conseguir uma consulta,<br />
em contraste com a de um serviço de saúde mental, como<br />
os CAPS, apontaria para as vantagens desse último serviço.<br />
No estudo de Silva 28 , os próprios pacientes haviam relatado<br />
que, nos CAPS, eles não necessitam enfrentar filas de espera<br />
para marcar consultas, além de terem medicamentos gratuitos,<br />
e que eles se sentiam satisfeitos com os serviços de saúde<br />
mental por causa dessas suas características. Essa interpretação<br />
é coerente com os resultados de outros estudos brasileiros<br />
com pacientes psiquiátricos, que também relataram alto<br />
nível de satisfação desses pacientes com os serviços 17-19 .<br />
No entanto, outro resultado da presente pesquisa, que<br />
merece comentários, foi o fato de a variável serviço não<br />
constituir um fator associado ao grau de satisfação dos familiares,<br />
embora se tratasse de dois tipos teoricamente diferentes<br />
de serviço, CAPS e ambulatório. Esses resultados<br />
são surpreendentes, pois serviços definidos por objetivos e<br />
organizações distintas tenderiam a proporcionar níveis diferenciados<br />
de satisfação dos familiares, por exemplo, quando<br />
esses serviços desenvolvem intervenções diferentes 7 . Os<br />
CAPS deveriam, em princípio, ser diferentes dos ambulatórios,<br />
em termos da diversidade de intervenções e da atenção<br />
mais frequente e intensiva aos pacientes e seus familiares,<br />
podendo gerar níveis diferentes de satisfação. Os resultados<br />
encontrados no presente trabalho talvez se expliquem pela<br />
semelhança de tratamento oferecido aos pacientes da presente<br />
amostra, independentemente do tipo de serviço que<br />
frequentavam. Como se tratava de pacientes estabilizados, o<br />
tratamento se limitou ao medicamento e consultas médicas<br />
infrequentes, em ambos os tipos de serviço. Esses dados sugerem<br />
uma realidade peculiar dos serviços de saúde mental<br />
avaliados e apontam para a necessidade de maior diferenciação<br />
entre eles. Destaca-se, em particular, a necessidade<br />
de maior desenvolvimento, nos CAPS, das ações previstas de<br />
intervenções psicoeducacionais de grupo, com os familiares<br />
e pacientes e visitas domiciliares. Uma tendência à “ambulatorização”<br />
dos CAPS já foi apontada em outras localidades,<br />
assim como a escassez de intervenções voltadas para a reinserção<br />
social dos pacientes, o que compromete a qualidade<br />
do atendimento em saúde mental 29 .<br />
O presente estudo apresenta a limitação de ter incluído<br />
uma amostra pequena, e do tipo não aleatório, de familiares<br />
participantes. Amostras não aleatórias podem influenciar os<br />
resultados em favor de um maior grau de satisfação dos familiares<br />
com os serviços. O tamanho reduzido da amostra<br />
pode também ter influenciado o resultado referente à falta<br />
de diferenciação entre os serviços. Pesquisas futuras com<br />
amostras aleatórias e de maior tamanho poderão reavaliar os<br />
resultados obtidos.<br />
CONCLUSÃO<br />
Os dados destacaram a elevada porcentagem de satisfação<br />
dos familiares com os serviços de saúde mental, o que talvez<br />
se explique pelo contraste cognitivo com outros serviços de<br />
saúde. Dentre os fatores associados à satisfação, destacou-<br />
-se a influência das variáveis dos pacientes, em particular<br />
suas condições clínicas, no grau de satisfação dos familiares<br />
cuidadores. O nível de satisfação não diferiu entre dois tipos<br />
teoricamente diversos de serviço, CAPS e ambulatório, provavelmente<br />
devido a semelhanças do tratamento oferecido<br />
nesses serviços. Esses resultados apontam para a necessidade<br />
de maior diferenciação entre os serviços, porém tais dados<br />
devem ser reavaliados em estudos futuros, com amostras<br />
maiores.<br />
CONFLITO DE INTERESSES<br />
Nenhum.<br />
FINANCIAMENTO<br />
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais<br />
(Fapemig) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal<br />
de Nível Superior (Capes).<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):284-93.
artigo original<br />
Tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio<br />
em um município no interior da Bahia<br />
Suicide attempts and suicide mortality in a countryside Bahia city<br />
Viviane dos Santos Souza 1 , Murilo da Silva Alves 1 , Lívia Angeli Silva 2 , Débora Cristiane Silva Flores Lino 3 ,<br />
Adriana Alves Nery 4 , Cezar Augusto Casotti 4<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Suicídio, tentativa de<br />
suicídio, epidemiologia,<br />
declaração de óbito.<br />
Objetivo: Descrever o perfil das tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio no município<br />
de Jequié/BA, no período entre 2006 e 2010. Método: Estudo epidemiológico descritivo.<br />
Os dados das tentativas de suicídio foram obtidos no Corpo de Bombeiros e DATASUS,<br />
enquanto aqueles referentes à mortalidade por suicídio foram coletados por meio das declarações<br />
de óbito (DOs) da 13ª Diretoria Regional de Saúde da Bahia (13ª DIRES) e complementados<br />
pelos registros do Instituto Médico Legal (IML). A análise foi feita por meio de estatística<br />
descritiva. Resultados: Nas tentativas de suicídio, a maior frequência foi na faixa etária<br />
de 20 a 39 anos (57,69%), entre indivíduos do sexo feminino (53,4%) e utilizando-se como<br />
meio a queda de altura (69,2%). Em relação ao suicídio, a taxa média de mortalidade foi de<br />
3,19/100.000 habitantes, com maior frequência em indivíduos acima dos 40 anos (54,16%), do<br />
sexo masculino (87,5%), por meio de enforcamento (58,3%) e tendo como local de ocorrência<br />
o domicílio (83,33%). Conclusão: O município mostrou-se dentro das estatísticas da região<br />
Nordeste e abaixo das taxas nacionais de suicídio. Houve diferenciação entre as características<br />
do perfil das tentativas de suicídio e mortalidade por suicídio, especialmente segundo o<br />
sexo, faixa etária e meios utilizados.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Suicide, suicide attempt,<br />
epidemiology, death<br />
certificate.<br />
Objective: Describing the profile of suicide attempts and suicide mortality in the city of Jequié/BA,<br />
in the period between 2006 and 2010. Method: A descriptive epidemiological study. Data of suicide<br />
attempts were obtained from the Fire Department and DATASUS, while those related to suicide mortality<br />
were collected by means of Death Certificates (DOs) of the 13 th Regional Health Board of Bahia<br />
(13 th DIRES) and supplemented by records from the Forensic Medicine Institute (IML). The analysis<br />
was made using descriptive statistics. Results: In suicide attempts, the biggest frequency was in<br />
people aged from 20 to 39 years (57.69%); among females (53.4%) and using as means the fall from<br />
height (69.2%). Regarding suicide, the average mortality rate was 3.19/100,000 inhabitants, most<br />
frequently in people over 40 years (54.16%), male (87.5%), by hanging (58.3%) and taking the place<br />
of occurrence as the home (83.33%). Conclusion: The city showed up in the statistics of the Northeast<br />
region and below the national rates of suicide. There was differentiation between the profile<br />
characteristics of suicide attempts and suicide mortality, especially by gender, age and used means.<br />
Recebido em<br />
11/8/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
29/11/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e Saúde (PPGES).<br />
2 UESB, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA), PPGES.<br />
3 Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Grupo de Pesquisa em Saúde Mental.<br />
4 UESB, Departamento de Saúde, PPGES.<br />
Endereço para correspondência: Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Programa de Pós-Graduação em Enfermagem e<br />
Saúde (PPGES). Rua José Moreira Sobrinho, s/n, Jequiezinho – 45206-190 – Jequié, BA<br />
Telefax: (73) 3528-9738<br />
E-mail: ppgesjq@uesb.edu.br
artigo original<br />
Tentativas e suicídios em um município da Bahia<br />
295<br />
INTRODUÇÃO<br />
O suicídio constitui-se como um grave problema de saúde<br />
pública mundial, em especial por seu crescimento entre a<br />
população mais jovem 1,2 . Segundo estimativas da Organização<br />
Mundial de Saúde (OMS), o suicídio é definido como<br />
o ato humano de causar a cessação da própria vida, sendo<br />
uma das dez principais causas de morte em todo o mundo,<br />
chegando a ocupar a terceira posição entre os óbitos ocorridos<br />
na faixa etária de 15 a 35 anos 3,4 .<br />
As tentativas de suicídio e o comportamento suicida<br />
podem ser conceituados como atos intencionais de autoagressão<br />
que não resultam em morte, podendo envolver atos<br />
mais graves, para os quais são necessárias hospitalizações.<br />
Algumas autoagressões podem, ainda, não necessitar de<br />
atendimento médico, o que dificulta a realização de estudos<br />
acerca das tentativas de suicídio 5 .<br />
Dados da OMS mostram que, no ano de 2000, 1 milhão<br />
de pessoas cometeram suicídio no mundo, o que representou<br />
uma morte a cada 40 segundos 5,6 . Anualmente, 10 a 20<br />
milhões de pessoas tentam o suicídio 7 . O Brasil apresenta<br />
uma taxa geral de suicídio considerada baixa na escala mundial<br />
(4 a 6 óbitos por 100.000 habitantes), ocupando o 71º<br />
lugar quando comparado com outros países no mundo e 9ª<br />
posição em números absolutos de mortes por suicídio 2,8 .<br />
O Brasil encontra-se distante das maiores taxas de suicídio<br />
mundiais, mais de 16/100.000 habitantes, como encontradas<br />
na França, China, Suíça, Bélgica, Áustria, Estados Unidos e no<br />
Leste Europeu. Contudo, registros nacionais sobre a mortalidade<br />
demonstram o aumento da incidência de suicídios na<br />
faixa etária de adulto jovem, principalmente no sexo masculino,<br />
mesmo considerando as possíveis subnotificações<br />
existentes 3,5,9 . De acordo com dados de 2006, a mortalidade<br />
por suicídio no Brasil computou um total de 8.506 mortes,<br />
correspondendo a 6,7% do total de mortes naquele ano 3 .<br />
Entre as regiões brasileiras, a região Sudeste concentra<br />
50% dos registros de suicídio; a região Sul possui os maiores<br />
coeficientes de suicídio; e as regiões Norte e Nordeste apresentam<br />
os menores índices. Os estados brasileiros com maiores<br />
taxas de suicídio são o Rio Grande do Sul (8 a 10/100.000<br />
habitantes), Santa Catarina (7 a 8,5/100.000 habitantes), Paraná<br />
(7,1 suicídios por 100.000 habitantes), seguidos de São<br />
Paulo e Goiás 7,10,11, .<br />
A região Norte apresentou a média de 3,4 mortes por 100<br />
mil/habitantes e a Nordeste, uma média de 2,7 mortes por<br />
100 mil/habitantes. Os maiores aumentos de suicídio foram<br />
verificados na região Nordeste, que experimentou um incremento<br />
de 130% entre 1980 e 2006, e na região Centro-Oeste,<br />
com aumento de 68% no mesmo período 12 .<br />
Diversos estudos comprovaram fatores associados ao<br />
suicídio, principalmente os socioeconômicos. Nesse sentido,<br />
a baixa escolaridade e a pobreza, normalmente associadas<br />
entre si, além de viuvez, perda de uma pessoa querida, separação<br />
afetiva, desentendimentos com familiares ou amigos,<br />
divórcio e solidão das grandes cidades, são considerados<br />
fatores ou circunstâncias que podem aumentar o risco de<br />
suicídio por serem produtores de estresse, bem como outros,<br />
que incluem religião, problemas legais, desemprego e<br />
trabalho, especialmente o agrícola 3,4,8 .<br />
Uso abusivo de álcool e drogas, disponibilidade dos meios<br />
para efetuar o ato suicida, violência física e/ou sexual na infância,<br />
isolamento social, baixo suporte social e familiar, baixa<br />
qualificação profissional, histórico de tratamento psiquiátrico<br />
e distúrbios psíquicos, como depressão, esquizofrenia ou falta<br />
de esperança, podem, ainda, ser contributivos para o aumento<br />
de risco e a consumação da tentativa de suicídio 4,9,10,13 .<br />
Tais observações demonstram que esse ato não possui<br />
uma única causa ou razão, mas resulta de uma complexa<br />
interação de fatores, entre eles os biológicos, genéticos, psicológicos,<br />
sociais, culturais e ambientais, sendo difícil explicar<br />
como a exposição aos mesmos fatores de risco implicam condutas<br />
diferenciadas dependendo dos sujeitos envolvidos 3,4,8 .<br />
O comportamento autodestrutivo, como o uso de substâncias<br />
psicoativas, recusa de tratamento médico, determinados<br />
estilos de vida que também podem resultar em morte,<br />
é considerado por alguns autores como comportamento<br />
suicida, mas que pode ser distorcido ou mascarado como se<br />
tivesse sido natural 5 .<br />
O suicídio tem impactos diretos sobre a vida de familiares<br />
e pessoas próximas ao suicida. Além disso, representa prejuízos<br />
para a sociedade, pelos investimentos necessários para a<br />
formação do indivíduo, anos potenciais de vida perdidos devido<br />
à morte precoce e aos custos de internações com indivíduos<br />
que não obtêm sucesso com o ato. Na perspectiva de<br />
prevenir comportamentos suicidas, foi publicado em 2006,<br />
pelo Ministério da Saúde, o Manual de Prevenção ao Suicídio,<br />
destinado aos profissionais das equipes de saúde mental 14 .<br />
No Brasil e em outros países, a qualidade dos dados<br />
disponibilizados referentes aos óbitos é fator que limita as<br />
pesquisas sobre a mortalidade por suicídio 10 . A ocorrência<br />
de subnotificação dos casos de suicídio acontece devido a<br />
motivações religiosas, sociais, culturais, entre outras 15 . Alguns<br />
autores indicam que essa distorção deve variar no espaço e<br />
no tempo, entre 20% e 100% 5 .<br />
Tais distorções podem estar relacionadas a estigma social<br />
acerca do óbito por suicídio, razões jurídicas, religiosidade devido<br />
à não aprovação do suicídio e, ainda, a relutância ou preenchimento<br />
inadequado pelo profissional médico ao registrar o<br />
óbito como “morte acidental” ou “causa indeterminada” 16 .<br />
Os acidentes e as violências têm causado intenso impacto<br />
na morbimortalidade da população brasileira. Por isso, o<br />
governo tem implementado políticas públicas, a exemplo<br />
da Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por<br />
Acidentes e do Plano Nacional para Prevenção do Suicídio,<br />
lançado em 2009. Estas surgem como iniciativas do Ministério<br />
da Saúde para tentar diminuir a incidência de casos no<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):294-300.
296 Souza VS et al.<br />
artigo original<br />
Brasil, visando à redução das taxas de mortes por suicídio e<br />
danos causados às pessoas envolvidas direta e indiretamente<br />
nesse ato 3 .<br />
Tais políticas são importantes, uma vez que a rede de<br />
saúde enfrenta desafios para desenvolver ações preventivas<br />
e assistenciais relacionadas ao suicídio. Nesse sentido, mais<br />
estudos são necessários, com o objetivo de produzir informações<br />
que colaborem na formulação de estratégias para<br />
a redução da morbimortalidade da população, reduzindo as<br />
taxas de tentativas de suicídio no Brasil.<br />
Assim, visando melhorar a situação de saúde e subsidiar<br />
o planejamento de ações preventivas nos serviços de saúde,<br />
este estudo objetivou descrever o perfil das tentativas de suicídio<br />
e mortalidade por suicídio no município de Jequié/BA,<br />
no período de 2006 a 2010.<br />
MÉTODO<br />
Trata-se de estudo epidemiológico descritivo, com dados do<br />
Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) obtidos na 13ª<br />
Diretoria Regional de Saúde da Bahia (13ª DIRES) e do 8º Grupamento<br />
de Bombeiro Militar (8º GBM) de Jequié/BA, complementados<br />
com dados do Instituto Médico Legal (IML) e<br />
do Sistema de Informação Hospitalar (SIH) do DATASUS.<br />
O município de Jequié localiza-se na região Sudoeste da<br />
Bahia, distante 365 quilômetros de Salvador, capital do estado,<br />
e possui uma população de 151.921 habitantes 17 .<br />
Os dados de mortalidade foram obtidos na 13ª DIRES, por<br />
meio das declarações de óbito (DOs) registradas no SIM, correspondentes<br />
às Causas Externas da Classificação Internacional<br />
de Doenças (CID-10). Quando necessário esclarecimento<br />
ou confirmação da causa de morte, uma vez que alguns<br />
campos da DO não estavam preenchidos ou remetiam à<br />
duplicidade de causa entre suicídio e homicídio, foram consultados<br />
os registros do IML do município.<br />
Para identificar as tentativas de suicídio, recorreu-se aos<br />
dados do 8º GBM de Jequié/BA, por este possuir melhor qualidade<br />
de informações, uma vez que é o serviço requisitado<br />
para atendimento nesses casos. Para fins deste estudo,<br />
foram incluídas nessa categoria as ameaças de suicídio que<br />
não se concretizaram em virtude da intervenção desse serviço<br />
e que são registradas por ele. Os dados foram obtidos<br />
nas planilhas de controle de ocorrência, nas quais existe um<br />
campo específico para as tentativas de suicídio, sendo descartadas<br />
as que obtiveram sucesso, com óbito, uma vez que<br />
já estavam presentes nas DOs da 13ª DIRES e IML.<br />
Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva,<br />
utilizando o programa Excel versão 2007. Foram<br />
definidas como variáveis para o suicídio: sexo, idade, etnia,<br />
escolaridade, estado civil, ocupação, local de ocorrência do<br />
evento, local de moradia, meio utilizado, CID-10, horário, dia<br />
da semana, mês e ano do óbito.<br />
Em relação às tentativas, as variáveis foram em menor<br />
número, devido à pequena quantidade de informações disponibilizadas<br />
nos relatórios do Corpo de Bombeiros sobre<br />
as ocorrências. Assim, utilizaram-se as variáveis: sexo, idade,<br />
local de ocorrência do evento, local de moradia, meio utilizado,<br />
horário, dia da semana, mês, ano da ocorrência e consumação<br />
das tentativas. Analisou-se, ainda, a tendência das<br />
internações por tentativa de suicídio no período de 2006 a<br />
2010, com base nos dados do SIH/DATASUS.<br />
O projeto de pesquisa foi avaliado pelo Comitê de Ética<br />
em Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia<br />
(CEP/UESB), sendo aprovado com o parecer nº 210/2010.<br />
RESULTADOS<br />
No período 2006 a 2010, foram registrados no município de<br />
Jequié 24 suicídios (taxa média de mortalidade de 3,19 por<br />
100.000 habitantes) e 26 tentativas de suicídio, com média<br />
de 3,45 casos por 100.000 habitantes. Na distribuição ao<br />
longo dos cinco anos, há uma tendência decrescente nos<br />
casos de suicídio, apresentando um pico no ano de 2009<br />
(4,64/100.000) com a maior taxa do período. Em contrapartida,<br />
as tentativas apresentam uma tendência crescente, conforme<br />
a figura 1.<br />
Coeficiente<br />
6<br />
5<br />
4<br />
3<br />
2<br />
1<br />
0<br />
2006 2007 2008 2009 2009 2010<br />
Tentativas<br />
Suicídio<br />
Figura 1. Distribuição do coeficiente de mortalidade por<br />
suicídio e tentativas de suicídio no período de 2006 a 2010<br />
(Jequié/BA, <strong>2011</strong>).<br />
Dentre as tentativas, verificou-se que a maioria, 61,53% (n<br />
= 16), não consumou o ato planejado, geralmente por causa<br />
da intervenção do serviço de resgate e/ou de pessoas da comunidade,<br />
enquanto 30,76% (n = 8) consumaram o ato, mas<br />
não foram a óbito. Ressalta-se que, das tentativas, dois casos<br />
(7,69%) não possuíam informações quanto à consumação<br />
do ato.<br />
Observou-se predominância de suicídio no sexo masculino,<br />
com 87,5% (n = 21), enquanto nas tentativas predominou<br />
o sexo feminino, com 53,4% (n = 14). Assim, a taxa de mor-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):294-300.
artigo original<br />
Tentativas e suicídios em um município da Bahia<br />
297<br />
talidade por suicídio entre os homens foi de 5,71/100.000<br />
e entre as mulheres foi de 0,78/100.000. Já em relação aos<br />
casos de tentativas entre os homens, constatou-se uma taxa<br />
média de 2,71/100.000 e entre as mulheres, de 3,64/100.000.<br />
A proporção de suicídios de mulheres em relação aos homens<br />
foi de 1:4. Em comparação, nas tentativas, a proporção<br />
de homens em relação às mulheres foi de 1:1,4.<br />
No que se refere à idade, verificou-se que, nos casos de<br />
suicídio, houve uma concentração na faixa etária de 40 anos<br />
e mais. Já nos casos de tentativas, concentrou-se entre 20 e<br />
39 anos, conforme se observa na tabela 1. Quanto ao intervalo<br />
entre idade mínima e máxima, encontrou-se uma variação<br />
de 16 a 76 anos para as tentativas e 16 a 77 anos para os<br />
casos de suicídio.<br />
Tabela 1. Distribuição dos casos de tentativas de suicídio e<br />
suicídio, segundo sexo e idade, no período de 2006 a 2010<br />
(Jequié/BA, <strong>2011</strong>)<br />
Características segundo<br />
sexo e idade<br />
Sexo<br />
Tentativas de<br />
suicídio<br />
Evento<br />
Suicídio<br />
Total<br />
N % N % N %<br />
Masculino 10 38,46 21 87,5 31 62<br />
Feminino 14 53,84 3 12,5 17 34<br />
Sem registro 2 7,96 - - 2 4<br />
Faixa etária (em anos)<br />
< 20 2 7,69 3 12,5 5 10<br />
20-30 8 30,77 4 16,67 12 24<br />
30-40 7 26,92 4 16,67 11 22<br />
40-50 6 23,08 8 33,33 14 28<br />
Acima dos 50 anos 1 3,85 5 20,83 6 12<br />
Sem registro 2 7,69 - - 2 4<br />
TOTAL 26 100 24 100 50 100<br />
No que diz respeito à ocupação das vítimas de suicídio,<br />
identificou-se que não havia essa informação no campo correspondente<br />
na DO em 25% (n = 6) dos casos. Nas demais,<br />
12,5% (n = 3) eram estudantes, seguidos de profissionais autônomos,<br />
carpinteiros, comerciantes e trabalhadores rurais,<br />
e cada uma dessas classes correspondia a 8,33% (n = 2). E<br />
com menor percentual, verificaram-se as seguintes ocupações:<br />
agrônomo, aposentado, do lar, funcionário público,<br />
industriá rio, motorista e pedreiro, com 4,16% (n = 1) cada.<br />
Em relação ao campo raça/cor da DO, foram encontrados<br />
41,66% pardos (n = 10), 29,16% brancos (n = 7), 16,66%<br />
ignorados (n = 4) e 12,5% de cor preta (n = 3). Em relação ao<br />
estado civil, prevaleceram os solteiros (41,66%, n = 10), seguidos<br />
dos casos ignorados (41,66%, n = 10) e casados (16,66%,<br />
n = 4). A escolaridade apresentou a maior taxa de não preenchimento<br />
com 91,66% (n = 22) e 8,3% preenchidos com 4 a<br />
7 anos de estudos concluídos (n = 3).<br />
Para o suicídio, os meios utilizados foram enforcamento<br />
58,33% (n = 14), seguido de arma de fogo, envenenamento<br />
e queda de altura, com o mesmo percentual de 12,5% (n = 3)<br />
cada um deles, e queimadura (4,17%, n = 1). Já nos casos das<br />
tentativas, os meios utilizados foram a queda de altura em<br />
69,23% (n = 18) dos casos, seguida de envenenamento, com<br />
23,08% (n = 6) e 7,69% (n = 2) sem informação.<br />
Nos casos de óbitos por suicídio, foram identificadas as<br />
seguintes causas de morte de acordo com a Classificação Internacional<br />
de Doenças, conforme a tabela 2.<br />
Tabela 2. Distribuição da Classificação Internacional de Doenças<br />
(CID-10) nos casos de suicídio, no período de 2006 a 2010 (Jequié/<br />
BA, <strong>2011</strong>)<br />
Classificação Internacional de Doenças – CID-10<br />
Suicídio<br />
N %<br />
X68 Autointoxicação por pesticidas 2 8,33<br />
X69 Autointoxicação por substâncias não especificadas 1 4,17<br />
X70 Lesão autoprovocada intencionalmente por enforcamento 14 58,3<br />
X74 Lesão autoprovocada intencionalmente por disparos de arma de fogo 3 12,5<br />
X76 Lesão autoprovocada intencionalmente pela fumaça, pelo fogo e por chamas 1 4,17<br />
X80 Lesão autoprovocada intencionalmente por precipitação de lugar elevado 3 12,5<br />
TOTAL 24 100<br />
Os suicídios ocorreram com maior frequência no inverno<br />
(29,17%) e no verão (29,17%), principalmente nos dias<br />
de quinta-feira (20,83%), sexta-feira (16,87%) e domingo<br />
(16,87%). Já as tentativas ocorreram, mais frequentemente,<br />
no outono (26,92%) e primavera (26,92%), prevalecendo os<br />
dias de sábado (23,1%) e terça-feira (19,23%).<br />
Em relação aos horários predominantes para o suicídio,<br />
não foi possível essa identificação, pois o horário em que<br />
ocorreu o evento que precipitou o suicídio não constava<br />
no registro da declaração de óbito, mas apenas o horário do<br />
próprio óbito, que nem sempre coincide com o horário do<br />
ato suicida. Quanto às tentativas, estas acontecem, preferencialmente,<br />
nos turnos da manhã (46,15%) e noite (30,77%).<br />
No município, os suicídios ocorrem com maior frequência<br />
em residentes do Centro da cidade (20,83%) e no bairro<br />
do Joaquim Romão (16,67%). Este último é um dos maiores<br />
bairros do município que, por sua grande extensão, abrange<br />
tanto o perímetro central da cidade quanto o periférico;<br />
enquanto as tentativas foram mais frequentes nos bairros<br />
Joaquim Romão (23,08%) e Curral Novo (19,23%), sendo este<br />
último um bairro periférico.<br />
Tal bairro possui uma característica geográfica que merece<br />
destaque no estudo, uma vez que a existência de uma<br />
elevada formação rochosa denominada Pedra do Curral<br />
Novo tem favorecido a acessibilidade para tentativas de<br />
suicídio.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):294-300.
298 Souza VS et al.<br />
artigo original<br />
Nos casos de suicídio, verificou-se uma relação entre<br />
meio utilizado e local da ocorrência. Dentre os casos, 83,33%<br />
(n = 20) ocorreram no domicílio, estando mais relacionados<br />
a enforcamentos (65%), lesões por armas de fogo (15%), envenenamentos<br />
(10%), queimaduras (5%) e queda de altura<br />
(5%). Quanto aos demais locais, 8,33% (n = 2) dos casos de<br />
suicídio ocorreram em decorrência da queda de altura, em<br />
que foi utilizada a formação rochosa existente no município<br />
e 8,33% (n = 2) em local não informado, sendo um caso de<br />
envenenamento e outro de enforcamento.<br />
Nas tentativas, a relação verificada decorreu entre o meio<br />
utilizado e o local de residência. Houve predomínio da precipitação<br />
de altura (69,23%), estando estas relacionadas com<br />
os ambientes próximos ao local de residência, como pontes,<br />
viaduto, telhados, sacadas e mais destacadamente a Pedra<br />
do Curral Novo (61,11%).<br />
Nota-se que, apesar da tendência ascendente nos casos<br />
de tentativa de suicídio, com variação de 2,01/100.000 habitantes<br />
em 2006 para 5,26/100.000 habitantes em 2010, os<br />
dados de internação referente ao mesmo período apresentam<br />
certa linearidade. As taxas anuais foram, respectivamente,<br />
0,67, 1,34, 0,66, 0,0 e 0,65.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os resultados do estudo mostram que a taxa de mortalidade<br />
por suicídio no município apresenta oscilações, variando de<br />
4,02 em 2006 a 1,97 em 2010, com a maior taxa no período<br />
de 4,64 em 2009 e taxa média de 3,19/100.000 habitantes.<br />
No âmbito nacional, outros estudos apresentam a taxa geral<br />
de mortalidade por suicídio, no Brasil, estimada entre 4,1 e<br />
5,7/100.000 12,18-20 , e, no Nordeste, essa taxa varia entre 2,4 e<br />
3,1 suicídios por 100 mil/habitantes 12,20 .<br />
Assim, acompanhando as estimativas nacionais, o município<br />
apresenta uma taxa média de mortalidade baixa,<br />
contudo, de acordo com o perfil epidemiológico da região<br />
Nordeste, essa taxa no município apresenta-se no limiar máximo<br />
para a região, constituindo-se em fator relevante para<br />
o planejamento das políticas públicas e gestão da saúde em<br />
nível local.<br />
Identificou-se que a tentativa de suicídio encontra-se<br />
em ascensão no período estudado, constituindo-se em risco<br />
para o aumento da mortalidade por suicídio. As taxas de<br />
tentativas mais elevadas que as de suicídios convergem com<br />
outros estudos 19,21 , estimando-se que as tentativas de suicídio<br />
sejam 20 vezes mais frequentes do que os suicídios 19 .<br />
Apesar de no Brasil os óbitos associados ao suicídio constarem<br />
nos bancos de dados do SIM, no que se refere às informações<br />
sobre as tentativas de suicídio não há registro ou<br />
notificação sistemática nos serviços de saúde, fazendo-se<br />
necessário consultar informações em outros serviços, como<br />
a Polícia Militar 21 e, neste estudo, o Corpo de Bombeiros.<br />
Mesmo nos casos de suicídio, em que há um sistema de<br />
informação que disponibiliza dados sobre o evento, observam-se<br />
falhas no preenchimento das DOs e lacunas na alimentação<br />
do sistema. Esses fatores geram subnotificação e/<br />
ou discrepâncias entre os dados sobre suicídios nas pesquisas<br />
e aqueles disponibilizados no DATASUS 1,19,20 . Inconsistências<br />
de dados foram identificadas neste estudo ao comparar<br />
o número de casos de suicídio registrados no SIM/DATASUS<br />
de domínio público com os dados do mesmo período, obtidos<br />
diretamente das DOs na 13ª DIRES, onde foi encontrado<br />
um número menor de casos, semelhante ao que foi identificado<br />
no estudo de Parente et al. 20 .<br />
Quanto ao preenchimento das DOs, verificou-se incompletude<br />
de modo geral e, principalmente, nas variáveis raça/<br />
cor (16,66% ignorados), estado civil (41,66% ignorados) e escolaridade<br />
(91,66% ignorados), que apresentaram baixo índice<br />
de completude como também foi observado em outro<br />
estudo 1 . As duas últimas variáveis apresentaram, respectivamente,<br />
o índice de completude ruim (não completude de<br />
20% a 50%) e muito ruim (não completude acima de 50%),<br />
segundo o escore proposto por Romero e Cunha 22 .<br />
Alguns estudos destacam o suicídio como a mais passível<br />
de subestimação entre as causas externas 1,23 de mortalidade,<br />
relacionando-se a vários motivos (religiosos, sociais, culturais,<br />
políticos, econômicos etc.), os quais geram omissão de informações<br />
e subnotificação 1,15,16 . O suicídio apresenta um dos<br />
piores índices de preenchimento das DOs, de acordo com<br />
o estudo de Macente e Zandonade 1 , que realizaram uma<br />
avaliação da completude do sistema de informação sobre<br />
mortalidade por suicídio.<br />
No que se refere ao perfil dos casos de suicídio e de tentativas,<br />
verificaram-se significativas diferenças, principalmente<br />
em relação às características sexo, idade e meios utilizados,<br />
que convergem com os resultados encontrados por Macente<br />
et al. 21 . Quanto ao sexo, os resultados estão em conformidade<br />
com a produção científica, ocorrendo o predomínio<br />
de suicídio no sexo masculino 5,12,19-21,24-27 , com proporção de<br />
quatro casos masculinos para um feminino, corroborando o<br />
estudo de Viana et al. 24 , enquanto as tentativas ocorrem mais<br />
destacadamente entre o sexo feminino 13,19,21,28 .<br />
Em relação à idade, as tentativas são mais comuns entre<br />
os jovens, enquanto o suicídio é mais frequente entre a população<br />
acima de 40 anos, também identificado em outros<br />
estudos 9,12,13,19,21-26,28 . Isso reflete a influência que os fatores socioeconômicos<br />
e psicossociais 19 relacionados às fases do ciclo<br />
vital exercem sobre a tentativa de suicídio, mais comum<br />
em adultos jovens 9,13,28 , enquanto a consumação com êxito<br />
se observa mais nas idades avançadas 12,19,21,24-26 .<br />
Nota-se uma relação entre os meios utilizados e o índice<br />
de letalidade 19 , tendo em vista que, nos suicídios, o meio<br />
mais utilizado foi o enforcamento (58,33%) 12,19-21,24-27 , enquanto<br />
nas tentativas os meios mais utilizados foram a ameaça<br />
de precipitação de altura (69,23%) e o envenenamento<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):294-300.
artigo original<br />
Tentativas e suicídios em um município da Bahia<br />
299<br />
(23,08%), aproximando-se de outros estudos com resultados<br />
semelhantes 12,19,20,24-26,28, . A ameaça de precipitação de altura<br />
como meio mais utilizado nas tentativas merece destaque,<br />
pois 61,11% ocorreram em uma elevação rochosa no município,<br />
sugerindo que os fatores geográficos podem favorecer<br />
a escolha do método.<br />
Ainda em relação às tentativas na elevação rochosa, observou-se<br />
que, nos casos em que houve intervenção da equipe<br />
de resgate, foi possível evitar a precipitação, por causa do<br />
treinamento específico que o Corpo de Bombeiros possui<br />
para esse tipo de intervenção. Isso reforça a necessidade de<br />
que as equipes do SAMU também sejam qualificadas para o<br />
atendimento às tentativas de suicídio em lugares de risco.<br />
Verificou-se que nas tentativas as intervenções foram realizadas<br />
pela equipe de bombeiros e população local (religiosos,<br />
familiares, vizinhos, amigos e pessoas que passavam no<br />
local). Logo, o papel das equipes de saúde restringiu-se à<br />
prestação de atendimento nos casos de lesão física em consequência<br />
da efetivação do plano suicida.<br />
Os meios utilizados estão associados ao perfil das pessoas<br />
que cometem e tentam o suicídio, principalmente ao<br />
sexo e idade. A maioria dos que obtêm sucesso é de homens<br />
com faixa etária de mais idade 19,26 , logo utilizam meios mais<br />
violentos e letais, como enforcamento e disparo de arma de<br />
fogo 24,25,27 , enquanto nas tentativas a maioria é de mulheres<br />
e jovens 26 , que escolhem métodos mais suaves e lentos, com<br />
destaque para o envenenamento e a queda de altura 19,21 . Tais<br />
características perpassam os signos da masculinidade e da<br />
feminilidade e relacionam-se à produção de sentidos acerca<br />
do suicídio e da tentativa, para ambos os sexos 21,29 .<br />
Aos meios utilizados relacionou-se, ainda, o local do<br />
evento e residência. Estes, por sua vez, possuem influência,<br />
respectivamente, sobre a disponibilidade e a acessibilidade<br />
aos meios 19 . Observou-se que 83,33% dos suicídios ocorreram<br />
na residência 12,25 , por meio de enforcamento (65%),<br />
seguido de disparos de arma de fogo, envenenamentos e<br />
queda de altura, convergindo com outros estudos 12,25 . Nesse<br />
sentido, as equipes de saúde da família e de saúde mental<br />
podem ser capacitadas para a identificação das pessoas e<br />
grupos vulneráveis ao evento, a fim de orientar as famílias e<br />
pessoas que convivem com tais grupos, visando à vigilância<br />
e à prevenção do evento 14,30 .<br />
Em relação às tentativas, o meio mais utilizado foi a precipitação<br />
de altura (69,23%) 19,21 , estando relacionadas aos<br />
ambientes próximos da residência, como pontes, viaduto,<br />
telhados, sacadas e, mais destacadamente, a Pedra do Curral<br />
Novo (61,11%). O fato de ocorrerem em locais públicos favorece<br />
a intervenção em tempo oportuno, enquanto os casos<br />
que ocorrem no domicílio, na maioria das vezes, não são percebidos<br />
antes da consumação do ato. Nos casos de tentativa<br />
no domicílio, a intervenção ocorre após o dano, como nas<br />
tentativas por ingestão de substâncias químicas e medicamentos<br />
(30,77%).<br />
No que se refere aos dias da semana, constatou-se que,<br />
no suicídio, houve maior concentração na quinta-feira, seguida<br />
da sexta-feira e do domingo, convergindo com outro<br />
estudo em relação à sexta-feira 21 . Nas tentativas, essa concentração<br />
ocorreu no sábado, seguido da terça-feira. Os turnos<br />
de maior ocorrência das tentativas são as manhãs e as<br />
noites, percebendo-se que no período da manhã ocorreram,<br />
principalmente, as tentativas por precipitação de altura.<br />
Quanto à morbidade por tentativas de suicídio, ao investigar<br />
os registros do SIH, encontrou-se discrepância em<br />
relação à característica ascendente das tentativas. Apenas<br />
os casos mais graves levam à internação hospitalar, sendo<br />
a maioria dos casos atendida nas emergências, o que acaba<br />
não gerando AIHs 21 .<br />
Assim, os dados de internação obtidos no Sistema de Informação<br />
Hospitalar, referentes a 2009, destoam dos dados<br />
de mortalidade e tentativas encontrados no estudo, pois<br />
esse foi o ano que apresentou maior taxa de mortalidade<br />
(4,64/100.000 habitantes) e a segunda maior taxa de tentativas,<br />
enquanto as internações registradas decorrentes das tentativas<br />
de suicídio, no ano de 2009, apresentaram taxa zero.<br />
Dentre as limitações do estudo, destaca-se a escassez de<br />
dados oficiais sobre tentativas de suicídio, que levou à restrição<br />
da utilização aos casos atendidos pelo Corpo de Bombeiros.<br />
Ao observar que muitas intervenções são feitas por<br />
populares, amigos e familiares das vítimas, ou pelas equipes<br />
de Saúde Mental, Saúde da Família e Serviço Pré-hospitalar,<br />
considera-se uma provável subestimação de casos.<br />
Outra limitação diz respeito à impossibilidade de verificação<br />
das reincidências dos casos, dado o caráter transversal<br />
do estudo. Logo, faz-se necessário desenvolver pesquisas,<br />
com maior amplitude e utilização de fontes de dados diversas,<br />
que apresentem uma caracterização mais fidedigna<br />
do perfil de tentativas, bem como a correlação destas com<br />
transtornos psiquiátricos e uso de substâncias psicoativas.<br />
Além disso, percebe-se grande lacuna de conhecimento<br />
no que se refere aos estudos sobre suicídio e tentativas<br />
de suicídio na região Nordeste, bem como pesquisas em<br />
municípios de pequeno e médio porte. Assim, este estudo<br />
visa contribuir com a construção de conhecimento nessa<br />
perspectiva e também apontar para a necessidade de novos<br />
estudos na área.<br />
CONCLUSÃO<br />
Os resultados apontam para a diferenciação entre as características<br />
do perfil das tentativas de suicídio e mortalidade por<br />
suicídio, especialmente segundo o sexo, faixa etária e meios<br />
utilizados. As tentativas são mais frequentes entre as mulheres<br />
jovens, por meio da precipitação de altura ou outros métodos<br />
que não levam à morte imediata, sendo a maioria em<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):294-300.
300 Souza VS et al.<br />
artigo original<br />
locais públicos, onde a atuação dos serviços tem conseguido<br />
diminuir a consumação do ato. Quanto aos suicídios, acontecem<br />
entre homens acima de 40 anos, por enforcamento,<br />
escolhendo o domicílio como local para a sua consumação,<br />
o que dificulta a intervenção.<br />
Os dados de mortalidade por suicídio entre os anos de<br />
2006 e 2009, no município, encontram-se em consonância<br />
com as estatísticas da região Nordeste e abaixo das taxas<br />
nacionais de suicídio. Quanto aos dados encontrados, verificou-se<br />
a incompletude no preenchimento das DOs, principalmente<br />
em relação à escolaridade, estado civil e raça/cor.<br />
Além disso, foi identificada a necessidade da melhoria dos<br />
registros oficiais, dos serviços de saúde, especialmente, em<br />
relação às tentativas.<br />
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ORIGINAL ARTICLE<br />
Cardio-respiratory symptoms in panic disorder: a<br />
contribution from cognitive-behaviour therapy<br />
Sintomas cardiorrespiratórios no transtorno de pânico: uma<br />
contribuição da terapia cognitivo-comportamental<br />
Anna Lucia Spear King 1 , Adriana Cardoso de Oliveira e Silva 2 , Alexandre Martins Valencça 3 , Antonio Egidio Nardi 4<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Panic, anxiety, phobia,<br />
exposures.<br />
Palavras-chave<br />
Pânico, ansiedade, fobia,<br />
exposições.<br />
Objective: To compare patients with panic disorder with agoraphobia treated with cognitive-<br />
-behavioural therapy (CBT) associated with the medication with patients treated only with medication<br />
and verify the behaviour of the cardio-respiratory symptoms of both groups. Methods:<br />
Randomized sample in the Psychiatry Institute of the Federal University of Rio de Janeiro, divided in<br />
two groups of 25 participants each. Group 1 undertook 10 weekly sessions of CBT with one hour of<br />
duration each together with medication. Group 2, Control, were administered medication that only<br />
consisted of tricyclic anti-depressants and selective inhibitors of the re-uptake of serotonin. Evaluation<br />
instruments were applied at the beginning and to the end of the interventions. Results: According<br />
to the applied scales, group 1 showed statistically more significant results than group 2, with:<br />
reduction of panic attacks, cardio-respiratory symptoms, anticipatory anxiety, agoraphobia avoidance<br />
and fear of bodily sensations. Conclusion: Exposures (in vivo and interoceptive), especially<br />
for induction symptom exercises and relaxation, were considered essential to prepare patients with<br />
panic disorder to handle future cardio-respiratory symptoms and panic attacks with agoraphobia.<br />
RESUMO<br />
Objetivo: Comparar pacientes com transtorno de pânico com agorafobia, tratados com<br />
terapia cognitivo-comportamental (TCC) e medicação, com pacientes com o mesmo diagnóstico,<br />
tratados apenas com medicação, e verificar o comportamento dos sintomas cardiorrespiratórios<br />
em ambos os grupos. Métodos: Amostra randomizada com 50 voluntários<br />
diagnosticados no Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro, dividida<br />
em dois grupos de 25 pacientes: o grupo 1 realizou 10 sessões semanais e individuais de TCC<br />
com uma hora de duração combinada com medicação. O grupo 2, controle, foi tratado apenas<br />
com medicação. A medicação para ambos os grupos consistiu de antidepressivos tricíclicos<br />
e inibidores seletivos de recaptação da serotonina. Instrumentos de avaliação foram aplicados<br />
no início e ao final das intervenções. Resultados: De acordo com as escalas aplicadas,<br />
o grupo 1 apresentou resultados estatisticamente mais significativos do que o grupo 2, com<br />
redução dos ataques de pânico, dos sintomas cardiorrespiratórios, ansiedade antecipatória,<br />
esquiva agorafobia e medo das sensações corporais. Conclusão: As exposições (in vivo e interoceptivas)<br />
e os exercícios de indução dos sintomas e de relaxamento foram considerados<br />
essenciais para os pacientes aprenderem a lidar com o transtorno de pânico, com os ataques<br />
e com as possíveis situações agorafóbicas futuras.<br />
Recebido em<br />
10/2/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
1/6/<strong>2011</strong><br />
1 Federal University of Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>), Psychiatry Institute (<strong>IPUB</strong>), Panic and Respiration Laboratory (LABPR), National Institute of<br />
Technological Science – Translational Medicine (INCT – Translational Medicine/CNPq), Rio de Janeiro, Brazil.<br />
2 Federal University Fluminense (UFF), Laboratory of Thanatology and Psychometrics, LABPR/<strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong> – INCT-TM.<br />
3 UFF, Medical Sciences Centre, LABPR/<strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong> – INCT-TM/CNPq.<br />
4 LABPR/<strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong> – INCT-TM/CNPq.<br />
Address for correspondence: Anna Lucia Spear King<br />
Rua Almirante Gomes Pereira, 8 (casa), Urca – 22291-170 – Rio de Janeiro, RJ, Brasil<br />
Tel.: (55 21) 2295-4477/(55 21) 9219-1233<br />
E-mail: annaluciaking@gmail.com
302 King ALS et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
INTRODUCTION<br />
Panic disorder (PD) 1 is characterized by the presence of frequent<br />
and recurrent acute attacks of anxiety, followed by<br />
physical and cognitive symptoms originating from mistaken<br />
associations of body sensations (BS) related to a premonition<br />
of something serious or of some potential illness. According to<br />
the cognitive theory 2 , due to this cognitive distortion, the individual<br />
assumes a badly adapted level of behaviour and loses<br />
the capability of identifying BS as natural forms of reactions<br />
stemming from the physiological mechanisms of adaptation 3 .<br />
We hypothesized that patients with panic disorder may<br />
reduce their number of panic attacks after the cognitive behavioural<br />
therapy (CBT) 4 sessions with symptom induction<br />
exercises (SIE) 5 and can also learn to deal with the cardiorespiratory<br />
symptoms such as tachycardia and abnormal<br />
breathing.<br />
Individuals with PD fear BS, and frequently suffer from<br />
panic attacks 6 (PAs) in certain stressful situations. PAs are described<br />
as traumatic, aggressive, and unpredictable.<br />
CBT 4 has the characteristic of being a short and well<br />
recom mended type of psychotherapy for the treatment<br />
of PD. Its methods include psycho education (educational<br />
techniques for the individual to learn to deal with anxiety<br />
and ample knowledge by the patient of the disorder in question),<br />
respiratory re-education (RR) exercises; progressive<br />
muscular relaxation (PMR) and cognitive restructuring (CR),<br />
which consists of giving a new meaning to the mistaken<br />
thought levels, are procedures of great importance in CBT.<br />
Finally, Interceptive exposure (IE) techniques have the objective<br />
of correcting catastrophic interpretations of the physical<br />
symptoms (bodily sensations) experienced by the patient. In<br />
vivo exposure (IVE) of the individual to feared places or situations<br />
is considered to be the primary intervention applied<br />
in the treatment, so that the patient with PD can overcome<br />
agoraphobic avoidance 7 .<br />
During the patient’s treatment, the techniques of IE<br />
and IVE are intended to interact to assist in the remission of<br />
the components of cognitive dysfunctions that are linked<br />
to agora phobic avoidance and to autonomic symptoms<br />
verified in PD. According to Rangé 8 , CBT is very efficient<br />
when compared to placebo, psychopharmacological treatments<br />
9,10 , and other forms of psychotherapy. However, some<br />
studies 11,12 have shown a good clinical response of panic disorder<br />
only to psychopharmacological treatment.<br />
IE and IVE can be administered by means of SIE and personal<br />
contact of the person with places and situations that<br />
the person has specifically defined as stressful. The successful<br />
overcoming of the initial stages of the treatment by the<br />
patient is required for the success of the subsequent steps.<br />
From the application of these exposures, the patient builds<br />
new internal defences that make him or her capable of staying<br />
naturally in prolonged contact with their own BS.<br />
The objective of this study is to compare PD patients<br />
treated with CBT associated with antipanic medication and<br />
patients treated only with antipanic medication and observe<br />
the evolution of cardio-respiratory symptoms in both groups.<br />
METHODOLOGY<br />
Patient selection<br />
For inclusion in the research the criteria adopted was, patients<br />
over 18 years old of both sexes with a diagnosis of PD<br />
with agoraphobia and no serious comorbidities. Patients<br />
that showed alcohol or drug dependency, mental retard, or<br />
serious mental disorders were excluded from the study. The<br />
randomized controlled trials were undertaken at the Panic<br />
and Respiration Laboratory (LABPR) at the Psychiatry Institute<br />
(<strong>IPUB</strong>) of the Federal University of Rio de Janeiro (<strong>UFRJ</strong>)<br />
and National Institute of Technologic Science – Translational<br />
Medicine (INCT-TM).<br />
All patients who agreed to participate in the study signed<br />
a “Term of Free and Clarified Consent” and were made aware<br />
of all the procedures to be undertaken, as approved by the<br />
Committee of Ethics for the research <strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong>.<br />
Patients with PD with agoraphobia were diagnosed by<br />
clinical psychiatrists from the team at the LABPR/<strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong>,<br />
according to the diagnostic criteria of the Manual of Diagnostic<br />
and Statistics of Mental Disorder 1 and the Structured<br />
Clinical Interview Diagnostic (SCID-I) evaluation instrument 13 .<br />
The sample consisted of 50 voluntary patients divided<br />
into two groups by means of a random draw. The first group<br />
(n = 25) received 10 sessions of CBT in conjunction with<br />
pharmacotherapy. The second group, the control group (n<br />
= 25), received only medication. The patients started on concomitant<br />
medication and CBT.<br />
We found that there was no loss in the sample. Fifty two<br />
volunteers were evaluated in the total survey. Of all the study<br />
volunteers, only two dropped out. We noted that all the remaining<br />
volunteers felt welcome and receptive to the study<br />
from the beginning and therefore continued till the end.<br />
Of the two who dropped out, one was due to travel and<br />
the other just dropped without any explanation. The raters<br />
were blind to refer patients to one group or another.<br />
Variables before and after treatment were collected by<br />
the same psychologist evaluator with training in cognitive<br />
behavioural therapy, the same professional also implemented<br />
all the scales and questionnaires. This professional psychologist<br />
received supervision from a multidisciplinary team<br />
from the LABPR/<strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong>.<br />
Patient evaluation<br />
With a view to comparing the results of the groups after the<br />
interventions, the following evaluation instruments were ap-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):301-8.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Panic and cardio-respiratory symptoms<br />
303<br />
plied at the beginning and at the end of the research: Beck<br />
Anxiety Inventory 14 ; Sheehan Disability Scale 15 ; Global Assessment<br />
of Functioning (AXIS V) 13 ; questionnaire of fears and phobias<br />
16 ; questionnaire of cognitive agoraphobias 17 ; questionnaire<br />
of body sensations 17 ; and Panic and Agoraphobia Scale 18 .<br />
The scales used in the study sought to assess anxiety,<br />
fears, phobias, bodily sensations, and the individual’s ability<br />
to work, to relate socially and with his or her family, among<br />
others. The scales were selected in order to answer the questions<br />
inherent in the study. Assessments were made only at<br />
the beginning and at the end of the study, there being no<br />
application of scales during treatment.<br />
Pharmacotherapy<br />
Tricyclic anti-depressants (TAD) or selective serotonin reuptake<br />
inhibitors (SSRI) were prescribed with fortnightly reevaluation<br />
and/or sending to CBT treatment. The SSRI used<br />
in this study was paroxetine 20 mg once daily and 150 mg of<br />
TAD imipramine was also administered once daily.<br />
Patients were not receiving medication before the study<br />
and began to use it from the beginning of the study. The psychiatrist<br />
after the collection of personal records and the data<br />
obtained in SCID was able to make a diagnosis from clinical<br />
signs and prescribe the medication best suited, TAD or SSRI.<br />
Cognitive-behavioural therapy<br />
The 10 CBT sessions were based on an earlier study 19 with<br />
some modifications and adaptations appropriate to the<br />
characteristics of patient population being studied. The contents<br />
of the sessions were distributed in the following way:<br />
psycho education, agoraphobia, panic, and hyperventilation;<br />
respiratory re-education (RR) exercises; progressive muscular<br />
relaxation (PMR) 20 exercises; preparation of a scale of patient<br />
fears, ordered from the smallest to the greatest cause<br />
of anxiety; identification of cognitive distortions; cognitive<br />
restructuring (CR); symptom induction exercises (SIE); IE; IVE;<br />
reinforcement of conquests; observation of procedural difficulties;<br />
and maintenance of treatment gains.<br />
Patients were encouraged to apply cognitive strategies<br />
at home (for example, to expose themselves to changes of<br />
temperature, physical exercise, and other sources of anxiety)<br />
several times, with the purpose of inducing and tolerating<br />
the sensations without therapeutic assistance. Learning in<br />
the first treatment phase of the treatment that body sensations<br />
related to panic are not really dangerous is essential to<br />
overcoming agoraphobia and controlling panic.<br />
Standard model of the 10 CBT sessions<br />
First session: Psycho education concerning the trajectory<br />
of PD and relaxation techniques. RR exercise: Placing ones<br />
hand above ones stomach, feeling the air passing through<br />
the diaphragm, with perception of the abdominal movement<br />
at each respiration. Slow inspiration through the nose<br />
while counting to three, holding the respiration while counting<br />
to three, and releasing the air slowly through the mouth<br />
while counting to six. Repetition of the exercise several times<br />
in a row. PMR is undertaken with the individual, whereby the<br />
individual respectively tenses and relaxes each of four muscle<br />
groups (face; arms, shoulders, chest, and neck; abdomen,<br />
spine, and genitals; legs and feet) for ten seconds each of<br />
tensioning and relaxing.<br />
Second S<br />
Session: Explanation concerning the physiological mechanism<br />
of “fight and flight” 3 , and verification of the similarity<br />
between the sensation originating from this mechanism and<br />
BS that emerge from panic. Conducting the RR exercise. The<br />
patient should understand that when one manages to alter<br />
thoughts referring to the capacity to deal with feared situations,<br />
one is capable of controlling physical symptoms.<br />
Third session: Modelling of hyperventilation, as delineated<br />
by the exaggerated rhythm and depth of respiration in<br />
the context of the needs of the body at a given moment. Hyperventilation<br />
modelling 5 as the patient inspires and expires<br />
deeply for 90 seconds, observation of patient reactions and<br />
explanation of the reason for the emerging symptoms. Conducting<br />
the RR exercise. The patient should understand that<br />
anticipated anxiety is characterized by anticipatory thought<br />
processes (generally negative) of feared situations.<br />
Fourth session: SIE: sitting, the patient looks fixedly<br />
at a light for one minute and afterwards stands up quickly<br />
and tries to read something. Analysis with the patient of the<br />
sensations felt and the levels of negative, catastrophic, and<br />
repetitive thoughts that have occurred. The patient begins<br />
to understand the origin of their symptoms and to perceive<br />
them as inoffensive. Conducting the RR exercise.<br />
Fifth session: Explanation of the concepts of BS that<br />
can be accentuated due to a situation or to substances. Examples<br />
include: exercising oneself or moving oneself quickly,<br />
brusque changes of temperature, bright light, and use of caffeine,<br />
alcohol, medicines, and irregular levels of respiration 8 .<br />
Conducting SIE: turning around in circles for one minute, and<br />
understanding and giving a new positive significance to the<br />
reactions verified after stopping. Conducting the RR exercise<br />
immediately after IE.<br />
Sixth session: Patient complaints during PAs included:<br />
“I cannot breathe”, “I am going to suffocate”, “I am going to<br />
lose control”, “I am going to die”, “I am going to have a heart<br />
attack” or I am going mad”. The concepts of hyperventilation<br />
are remembered and SIE from the 4 th session is repeated, followed<br />
by the RR exercise.<br />
Seventh session: Education concerning CR. The patient<br />
should try to identify and give a new significance to specific<br />
badly-adapted thoughts. The concepts of anticipated an-<br />
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304 King ALS et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
xiety (AA) and agoraphobic avoidance (PA-aa) 7 are clarified.<br />
Patients have the custom of myths in relation to PA, including<br />
but not limited to: the patient is instructed to question<br />
and contest his or her conjectures and beliefs, concentrate<br />
on realistic probabilities, and gather evidence and formulas<br />
to deal with events.<br />
Eighth session: The IE refers to the fear learned from internal<br />
states. Certain sensations of terror, similar to previously<br />
experienced fear, may precipitate new Pas 6 . The automatic<br />
stimulus generated intensifies the feared sensations, creating<br />
a vicious circle. Conduct two SIEs: first, the patient sits<br />
down and places their head between their legs for 30 seconds,<br />
after which they sit up quickly and look to the ceiling.<br />
Second, the patient holds their breath until it can no longer<br />
be held while turning around in circles for 30 seconds. In<br />
continuity, analysis of the symptoms and trying to understand<br />
the originating causes. RR exercise is conducted.<br />
Ninth session: Conduct three SIEs: first, repeat the SIE<br />
from the 5 th session. Then follow the first SIE with the two<br />
SIEs from the 8 th session. Subsequently conduct the RR exercise.<br />
The purpose for the patient is to associate the symptom<br />
with the cause. Explain that the symptoms emerge from<br />
physiological alterations triggered for some reason, and that<br />
BS do not emerge from nowhere, with no apparent reason.<br />
Before CBT, the patient would make distorted associations<br />
of facts, interpreting tachycardia, perspiration, and loss of<br />
breath, among others, as signs of imminent death or loss of<br />
control, and not as resulting from specific triggering factors.<br />
Tenth session: Conduct one SIE: the patient standing<br />
up and turns his or her head from side to side for 30 seconds,<br />
stops, and tries to fix his or her eyes on a spot on the wall.<br />
Repeat this exercise after the SIE from the third session, in<br />
continuity; recover the patient’s physical balance and respiration<br />
with RR or PMR exercises. Evaluate the IVE concept regarding<br />
confronting the patient with agoraphobic situations<br />
or locations. Real confrontation with the feared situation was<br />
repeated with each item on the priority list of each patient’s<br />
fears, beginning with the least anxiety-provoking and culminating<br />
with the most feared. Patients were asked to practice<br />
IVE whenever possible. The IVEs conducted were reviewed,<br />
practical repetitions were encouraged, and difficulties in the<br />
procedures were discussed with each patient.<br />
The therapist stimulated thoughts concerning the avoided<br />
tasks and helped the patients with CR. The fact was<br />
commented upon that additional diagnostics, including comorbidities<br />
such as depression, generalized anxiety and social<br />
phobia, tended to decline after PD treatment. The therapist<br />
also reaffirmed that the fear response was inoffensive,<br />
passing, and controllable, and that BS appear and disappear<br />
and do no need to be actively avoided.<br />
After the end of all the stages of the research, the two<br />
groups were re-evaluated with the same initial instruments.<br />
The groups were compared, and the changes that had occurred,<br />
relative benefits, losses, and differences between the<br />
two groups were observed and documented.<br />
Statistical analysis<br />
Inferential analysis of the results was undertaken by means of<br />
Chi-square tests for several categories and analysis of variance<br />
(ANOVA) for the continuous variables, considering the<br />
differences between the averages of the scores obtained by<br />
the participants at the beginning and the end of treatment,<br />
in each of the separate evaluator instruments. In the characterization<br />
of the groups, the tests were undertaken with the<br />
values identified at the beginning of treatment. Thus, the<br />
effi ciency of the initiatives undertaken could be perceived.<br />
The confidence interval was arbitrated at 95% and p-valu es<br />
≤ 0.05 were considered significant. Data processing and<br />
analysis were conducted using SPSS software (version 14.0).<br />
RESULTS<br />
Patient characteristic<br />
Table 1 presents the socio-demographic and clinical features<br />
of the general population and clinical comorbidity (both<br />
groups).<br />
Administered pharmacotherapy: in the intervention<br />
group 44% of patients were using TAD and 56% used SSRI,<br />
while in the control group we observed 64% of patients with<br />
TAD and 36% with SSRI.<br />
Age of the participants<br />
Group 1 and group 2 (control) differed significantly in age.<br />
The minimum age for both groups was 22 and the maximum<br />
was over 55 years old. However, the average age for the<br />
group 1 was 44.5 (standard deviation, SD = 12.8; confidence<br />
interval (CI) (95%) = 39.0 – 49.8) and for the Control group<br />
(2) was 33.7 (SD = 9.6; CI (95%) = 29.7-37.7). The analysis of<br />
variance (ANOVA) test of means showed 0.000 significance,<br />
which is lower than the p – value 0.05, with 95% confidence.<br />
Test results<br />
At the end of the study, cardio-respiratory symptoms, PAs,<br />
anticipated anxiety, agoraphobic avoidances and fear of BS<br />
were significantly reduced in group 1 compared to group<br />
2 (Table 2). In the global assessment of functioning scale,<br />
group 1 increased its overall well-being from 60.8 to 72.5,<br />
while overall well-being in group 2 progressed, but to a<br />
slightly lesser extent, 66.0% to 71.3%. In the respiratory<br />
subtype 21 PAs, the following respiratory symptoms were<br />
prominent during PAs: sensation of suffocation, respiratory<br />
difficulty, paresthesias, dizziness, and fear of death 22 . It was<br />
observed that 77.6% of the surveyed patient population<br />
presented the respiratory subtype and 22.4% presented the<br />
non-respiratory subtype.<br />
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ORIGINAL ARTICLE<br />
Panic and cardio-respiratory symptoms<br />
305<br />
Table 1. Socio-demographic and clinical descriptions of the<br />
general population<br />
n<br />
% or<br />
Mean (Standard<br />
Deviation)<br />
Age 50 39,08 (± 12,46)<br />
Minimum = 22;<br />
Maximum = 67<br />
Sex<br />
Male 39 78%<br />
Female 11 22%<br />
Marital status<br />
Single 18 36%<br />
Married 21 42%<br />
Separated 11 11%<br />
Religion<br />
Roman catholic 31 62%<br />
Evangelical 11 22%<br />
Other 8 16%<br />
Schooling<br />
First grade 14 28%<br />
Second grade 19 38%<br />
Higher education 17 34%<br />
Years of study 50 11,82 (± 3,39)<br />
Minimum = 6;<br />
Maximum = 20<br />
Occupational situation<br />
Working 27 54%<br />
Away from work/on leave from work 10 20%<br />
Other 13 26%<br />
Subtype of PD<br />
Non-respiratory 14 28%<br />
Respiratory 36 72%<br />
Clinical comorbidity<br />
No 21 42%<br />
Yes 29 58%<br />
Psychiatric comorbidity<br />
No 26 52%<br />
Yes 24 48%<br />
The combination of CBT with pharmacotherapy was<br />
efficacious for Group 1, compared to the control group 2.<br />
The results of these tests were classified, according to sociodemographic<br />
data, presence of patients with physical and<br />
psychic comorbidity, and administration of medication.<br />
The test results of group 1 are summarized in table 2. Of<br />
the tests applied, 6 (67%) showed positive results in group<br />
1. In the scale of panic and agoraphobia, anticipated anxiety<br />
symptoms were satisfactorily reduced from 2.9 to 2.1;<br />
PAs were reduced from 1.4 to 0.7; agoraphobic avoidance<br />
was reduced from 2.4 to 1.6. In scale of Global Assessment<br />
of Functioning (GAF) 1 , which was scored from 0 to 100 and<br />
considered psychological, social, and occupational function<br />
in a hypothetical continuum, group 1 obtained a significant<br />
statistical increase in global well-being from 60.8 to 72.5.<br />
Patients in group 1 showed a reduced loss of control from<br />
2.8 to 2.1, and reduced fears of physical problems from 2.6 to 2.0,<br />
as evaluated by the agoraphobic cognitions questionnaire 17 .<br />
Patients in group 1 also showed reduction in general anxiety<br />
from 34.9 to 20.0, as evaluated by the Beck Anxiety Inventory 14 ;<br />
and reductions in individual work disability from 5.2 to 0.4; in social<br />
life disability from 4.8 to 2.2, and in family life disability from<br />
4.6 to 1.8, as evaluated by the Sheehan Disability Scale 15 . Overall,<br />
personal disability in Group 1 was reduced from 14.6 to 4.4.<br />
Symptoms in group 1 resulting from PD (including tachycardia,<br />
breathlessness, dizziness, tingling, nausea, perspiration,<br />
and disorientation, among others), was verified through<br />
the application of the Body Sensation questionnaire 17 . The<br />
results showed a general reduction from 3.1 to 2.4.<br />
PA in group 1 was reduced from 1.4 to 0.7, in avoidance<br />
agoraphobia was reduced from 2.4 to 1.6, and anticipated<br />
anxiety was reduced from 2.9 to 2.1, as evaluated by the<br />
panic and agoraphobia scale 18 . Overall, group 1 reduced the<br />
main behaviours verified in PD from 27.9 to 18.6.<br />
Group 2 did not show significant statistical differences<br />
between the beginning and the end of the treatment. The<br />
results of the Sheehan scale showed that the only revea ling<br />
factor leading to comprehension of the difference in the<br />
Sheehan total and Sheehan work value scales is the strong<br />
independent association of the Sheehan work value scale<br />
with psychiatric comorbidity, when controlled for by the<br />
other variables.<br />
It is worth noting that group 2 (the control group) has<br />
more individuals with psychiatric comorbidities than group 1.<br />
This may explain the distinct difference between the Sheehan<br />
total and Sheehan work results.<br />
The psychiatric comorbidity of depression is responsible<br />
for depressive symptoms that can interfere in the professional<br />
work and social life of the individual.<br />
The Sheehan scale showed significant variation in relation<br />
to family when the final averages of group 1 and group<br />
2 were compared. However, this variation is no longer relevant<br />
when the results are controlled against the other variables.<br />
If there are real differences between group 1 and group<br />
2, they may be due simply to pharmacotherapy, with or without<br />
CBT.<br />
The group receiving medication alone had fortnightly<br />
contact with the psychiatrist as well as with the psychologist<br />
for progress of treatment monitoring. We truly believe that<br />
this group was at a disadvantage compared to the group<br />
that received 10 sessions of CBT, borne out in final results of<br />
the study, from the benefits achieved in a number of aspects<br />
with exposure to CBT, such as reduction of panic attacks, reduction<br />
in hyperventilation and cardio-respiratory symptoms<br />
and learning about the restructuring of negative thoughts,<br />
among others. The study was relevant in demonstrating the<br />
important role of CBT in the treatment of panic disorder.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):301-8.
306 King ALS et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
Table 2. Comparison between the Intervention and Control groups percentage of responders at the end of treatment period<br />
Tests<br />
Group 1 (G1)<br />
Group 2 (G2)<br />
Sig Dif.**<br />
Baseline 1 Week Baseline 1 Week<br />
Sig Dif.** G1 (%) G2 (%) Sig Dif.**<br />
BAI (Beck Anxiety Inventory) 34.9 ± 11.2 20.0 ± 7.3 0.001 29.3 ± 15.3 26.8 ± 12.0 0.531 60 56 0.116<br />
Sheehan Disability Scale – Total 14.6 ± 3.2 4.4 ± 0.8 < 0.001 13.2 ± 4.3 10.3 ± 4.2 0.228 44 36 0.013<br />
Sheehan Work 5.2 ± 1.1 0.4 ± 0.1 < 0.001 4.0 ± 1.6 3.0 ± 1.8 0.290 52 60 0.001<br />
Sheehan Social 4.8 ± 2.0 2.2 ± 0.6 0.009 4.7 ± 2.0 3.5 ± 2.0 0.195 32 28 0.179<br />
Sheehan Family 4.6 ± 1.9 1.8 ± 0.8 0.005 4.5 ± 1.2 3.8 ± 1.5 0.451 48 44 0.035<br />
Phobic Fear Questionnaire (PFQ) – Total 49.4 ± 17.2 38.3 ± 9.7 0.186 44.6 ± 5.8 39.5 ± 13.2 0.491 56 60 0.872<br />
PFQ – Agoraphobia Score 20.2 ± 3.3 14.7 ± 3.5 0.132 14.1 ± 2.8 14.1 ± 5.7 0.990 64 68 0.860<br />
PFQ – Blood Score 15.6 ± 3.8 11.6 ± 1.8 0.207 15.6 ± 4.8 13.8 ± 3.9 0.531 48 40 0.431<br />
PFQ – Sociability Score 13.7 ± 4.2 12.0 ± 2.1 0.584 14.9 ± 5.0 11.6 ± 5.4 0.118 52 60 0.882<br />
Agoraphobic Cognitions Questionnaire (ACQ) 2.7 ± 0.5 2.1 ± 0.8 0.012 3.9 ± 2.1 2.3 ± 1.3 0.283 60 52 0.233<br />
ACQ – Loss of Control 2.8 ± 1.4 2.1 ± 1.0 0.021 2.3 ± 1.2 2.3 ± 1.2 0.852 68 76 0.384<br />
ACQ – Physical Problems 2.6 ± 0.6 2.0 ± 0.6 0.027 2.7 ± 1.3 2.4 ± 0.9 0.114 44 40 0.161<br />
Body Sensations Questionnaire 3.1 ± 1.0 2.4 ± 1.1 0.008 2.3 ± 1.0 2.4 ± 1.2 0.739 56 52 0.957<br />
Panic and Agoraphobia Scale (PAS) 27.9 ± 8.6 18.6 ± 3.4 0.012 25.5 ± 4.4 22.4 ± 5.3 0.372 64 70 0.304<br />
PAS – Panic Attacks 1.4 ± 0.5 0.7 ± 0.2 0.016 1.4 ± 0.5 1.1 ± 0.7 0.413 72 64 0.149<br />
PAS – Avoidance Agoraphobia 2.4 ± 0.7 1.6 ± 0.5 0.033 1.7 ± 0.8 1.6 ± 0.6 0.596 56 60 0.965<br />
PAS – Anticipated Anxiety 2.9 ± 0.6 2.1 ± 0.9 0.028 2.7 ± 1.2 2.3 ± 1.0 0.235 52 48 0.609<br />
PAS – Disability 2.2 ± 1.0 1.6 ± 1.0 0.109 2.1 ± 0.6 1.9 ± 0.7 0.480 56 52 0.359<br />
PAS – Over precaution 2.1 ± 0.7 1.5 ± 0.8 0.117 2.4 ± 0.7 2.1 ± 0.8 0.465 60 68 0.098<br />
Mobility Inventory - Accompanied 2.4 ± 1.1 1.9 ± 0.5 0.056 2.1 ± 1.1 2.5 ± 1.7 0.353 40 36 0.235<br />
Mobility Inventory - Alone 3.5 ± 0.9 3.0 ± 0.7 0.183 3.2 ± 1.6 3.1 ± 1.4 0.781 52 48 0.869<br />
Global Well-being Assessment 60.8 ± 12.3 72.5 ± 9.2 0.015 66.0 ± 20.4 71.3 ± 25.0 0.139 68 60 0.769<br />
# Evaluation Scales for group 1 (Cognitive Behaviour Therapy and Medication) and Evaluation Scales for group 2 (Control – with Medication and no Cognitive Behaviour Therapy). Results observed between the beginning and the end of the<br />
treatment for both groups.<br />
DISCUSSION<br />
These study results corroborate other research findings 24 ,<br />
which suggest that the combination of CBT with pharmacotherapy<br />
19 produces better results than using therapy alone.<br />
The advent of effective drugs 25 revolutionized the treatment<br />
of psychiatric diseases, reducing the number and length of<br />
hospitalizations and restoring quality of life for patients.<br />
Self-evaluated quality of life evaluation improved, with<br />
reduced phobic-hypochondriac behaviour 26 resulting in<br />
greater freedom in daily life. Not all mental disorders need<br />
to be treated through pharmacological approaches. Other<br />
therapeutic strategies 27 are available, the physician may indicate<br />
the optimal treatment for patients, psychotherapy<br />
alone or in combination with pharmacological treatment. It<br />
is important to establish a good doctor-patient relationship<br />
and discuss all procedures and fears of the patient, such as<br />
becoming medication dependent, of being “different”, sedated,<br />
etc.<br />
Most prior research also restricted surveyed populations<br />
to patients without agoraphobia or with light agoraphobia,<br />
leaving unknown the efficiency of CBT in patients with more<br />
serious agoraphobias 7 . In the population studied, all the patients<br />
showed “with agoraphobia” symptoms.<br />
De-Melo-Neto et al. 22 studied patients with respiratorysubtype<br />
PD with agoraphobia, in which specific hyperventilation<br />
exercises were used for the purpose of producing<br />
symptoms similar to panic. The objective was CR of certain<br />
negative levels of behaviour and response, and the<br />
comprehension by patients that the symptoms expressed<br />
were inoffensive and could be handled. In the present<br />
study, we also had the opportunity to observe the importance<br />
of CR in the sample studied, as this technique made<br />
an important contribution to the reduction of PD related<br />
symptoms.<br />
During the research, it was observed that the satisfactory<br />
evolution of patients depended on several procedures, including<br />
the use of medication prescribed after the psychiatric<br />
evaluation, together with CBT techniques such as SIE, CR,<br />
RR and PMR exercises. At the end of the SIE, patients were<br />
able to perceive that although the sensations produced by<br />
the exercises were similar to those of panic, they did not produce<br />
the feared consequences, were inoffensive, and were<br />
caused by specific stimuli.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):301-8.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Panic and cardio-respiratory symptoms<br />
307<br />
This practice allows the patient to find adequate individual<br />
CR, lose the fear of being alone with his or her BS, and<br />
perceive that the physiological reactions that he or she is<br />
having are normal, that they are not originating from something<br />
serious, and that they can be handled by the patient.<br />
It was verified that patients with PD with agoraphobia lost<br />
the fear of natural BS that emerged from physiological alterations<br />
as they were able to perceive, by means of SIE, that the<br />
sensations had a triggering reason and did not arise spontaneously.<br />
Before, the patients usually made erroneous associations<br />
about their BS, interpreting tachycardia, perspiration,<br />
and breathlessness among other symptoms, as signs of<br />
imminent death or loss of control.<br />
According to Barlow 3 , the proposed techniques, IE, and<br />
feared in vivo situations are widely recognised as primary, fundamental,<br />
and efficacious in the reduction of phobic anxiety<br />
reactions. According to Carvalho et al. 2 , the exposure of the<br />
patient to situational generators of anxiety during treatment<br />
should act as a habit-creating process, producing a reduction<br />
of anxiety in the face of stimuli that generate patho logical<br />
anxiety. He 2 verified the efficiency of cognitive interventions,<br />
behavioural interventions, and their combination.<br />
Attention should be given to the improvement of important<br />
methodological aspects in studies that evaluate the<br />
efficiency of CBT, with a view toward obtaining increasingly<br />
true results, thereby indicating which directions that may<br />
contribute to the refining of the techniques used.<br />
In making comparison between the two groups, significant<br />
differences were found in the progress of patients in<br />
the group 1 compared with the control group 2 in the scales:<br />
Sheehan Disability Scale (Total), Sheehan (Work), Sheehan<br />
(Social) and Sheehan (Family). Group 1 showed an improvement<br />
compared to group 2 in all respects. We observed<br />
in group 1 increased motivation to work and to social and<br />
family relationships after 10 sessions of CBT. We believe that<br />
these results were those that involved increased self-esteem<br />
and self-confidence due to the reduction of fears and PA.<br />
Despite the difference found between beginning and<br />
end of treatment period, comparing the two groups was not<br />
statistically significant for the other measurements. Observing<br />
the results of group 1 individually, who received CBT<br />
intervention through the model; we found statistically significant<br />
differences between measurements performed before<br />
and after intervention in most of these parameters, indicating<br />
an improvement in clinical status.<br />
This same improvement cannot be observed in the results<br />
of the control group, considering the same period of<br />
time. Such progress in group 1 should not be discarded,<br />
even by their clinical value.<br />
We therefore suggest that future work on these variables<br />
can be controlled to better understand the effectiveness of<br />
CBT in the context studied. It is necessary to verify if the results<br />
and differences found at the end of the treatment were<br />
actually due to CBT or to the existing variations in the profile<br />
of the group, including, physical or psychiatric comorbidity.<br />
CONCLUSION<br />
The techniques of SIE in the controlled laboratory setting<br />
were essential to reduce and/or remove the hyperventilation<br />
symptoms, tachycardia and changes in breathing as well as<br />
other symptoms. Patients treated with CBT had significant<br />
improvement compared to the group treated with medication.<br />
The techniques of psycho education, CR, IVE and IE, the<br />
PMR exercises and RR exercises were key to the reduction<br />
and management of symptoms in panic disorder.<br />
Our study showed that patients with PD may lower the<br />
PA, hyperventilation and cardio vascular symptoms after the<br />
CBT sessions with SIE.<br />
The main purpose of the study was achieved, which was<br />
to test and observe the efficacy and limitations of the proposed<br />
CBT model in the treatment of PD patients. In spite of<br />
some limitations, the results of this study showed the importance<br />
of CBT and its various techniques, in the treatment of<br />
PD with agoraphobia.<br />
ACKNOWLEDGEMENTS<br />
We would like to express our acknowledgements for the<br />
team of the Panic and Respiration Laboratory (LABPR/<strong>IPUB</strong>/<br />
<strong>UFRJ</strong>, National Institute of Technological Science – Translational<br />
Medicine (INCT-TM) and the National Council for Technological<br />
and Scientific Development (CNPq) for supporting<br />
this research program.<br />
Clinical Trial register number: NCT 00772746.<br />
Committee of Ethics in Research (CEP – <strong>IPUB</strong>/<strong>UFRJ</strong>) Number:<br />
07-06 Approved in 09/03/2006.<br />
Sources of funding: National Council for Scientific and Technological<br />
Development (CNPq).<br />
Conflict of interest: Not declared.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):301-8.
artigo original<br />
Insatisfação corporal de adolescentes<br />
atletas e não atletas<br />
Body dissatisfaction of teen athletes and non-athletes<br />
Leonardo de Sousa Fortes 1 , Valter Paulo Neves Miranda 1 , Ana Carolina Soares Amaral 1 ,<br />
Maria Elisa Caputo Ferreira 2<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Imagem corporal,<br />
adolescente, atletas.<br />
O objetivo deste estudo foi comparar a insatisfação corporal de adolescentes atletas e não<br />
atletas. Foram avaliados 58 atletas e 61 não atletas do sexo masculino, com idade média de<br />
15 ± 2,12 e 16 ± 1,67 anos, respectivamente. Aplicou-se o Body Shape Questionnaire (BSQ) para<br />
mensurar a insatisfação corporal. O índice de massa corporal (IMC) foi obtido pela razão entre<br />
a massa corporal (kg) dividida pela estatura (m) elevada ao quadrado (IMC = massa corporal/<br />
estatura²). Utilizou-se o software SPSS 17.0 para análise dos dados por meio de estatística<br />
descritiva, Kolmogorov-Smirnov, qui-quadrado de Pearson e ANCOVA. Os resultados apresentaram<br />
diferenças de pontuações no BSQ e de prevalência de insatisfação corporal entre os<br />
grupos de atletas e não atletas (p < 0,05). Concluiu-se que adolescentes não atletas são mais<br />
insatisfeitos com peso e aparência corporal, além de apresentarem maior prevalência desse<br />
fenômeno comparado aos atletas de futsal e natação do sexo masculino.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Body image, adolescent,<br />
athletes.<br />
The objective of this study was to compare body dissatisfaction among adolescents athletes and<br />
non-athletes. We evaluated 58 athletes and 61 non-athletes sex male, mean age 15 ± 2,12 and 16<br />
± 1,67 years, respectively. We applied the Body Shape Questionnaire (BSQ) to measure the dissatisfaction<br />
body. The body mass index (BMI) was calculated as the ratio of body mass (kg) divided by<br />
height (m) squared (BMI = body mass/height²). We used the SPSS 17.0 software for data analysis<br />
through descriptive statistics, Kolmogorov-Smirnov test, Pearson chi-square and ANCOVA. The results<br />
showed differences in BSQ scores and prevalence of body dissatisfaction among groups of<br />
athletes and non-athletes (p < 0.05). It was concluded that adolescent non-athletes are more dissatisfied<br />
with weight and body appearance, and have a higher prevalence of this phenomenon<br />
compared to athletes in soccer and swimming males.<br />
Recebido em<br />
7/7/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
31/10/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal de Visçosa (UFV); Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Faculdade de Educação Física e Desportos.<br />
2 Universidade de São Paulo (USP); UFJF, Faculdade de Educação Física e Desportos.<br />
Endereço para correspondência: Leonardo de Sousa Fortes<br />
Rua Guaçui, 525/202, São Mateus – 36025-190 – Juiz de Fora, MG<br />
E-mail: leodesousafortes@hotmail.com
310 Fortes LS et al.<br />
artigo original<br />
INTRODUÇÃO<br />
Durante o crescimento, o ser humano sofre diferentes alterações<br />
em sua forma e composição corporal, bem como<br />
em suas características psíquicas 1 . Um dos períodos em que<br />
ocorrem as mudanças mais significativas é a adolescência,<br />
marcada por grandes modificações 2 .<br />
A adolescência é definida pela OMS 3 como o período compreendido<br />
entre 10 e 19 anos de idade. Nessa etapa, o crescimento<br />
e o desenvolvimento biológico são fortemente influenciados<br />
pela interação de fatores genéticos e ambientais 4 .<br />
Nesse período, muitos jovens engajam-se em processo<br />
de treinamento físico sistematizado com o propósito de otimizar<br />
o rendimento esportivo 5 . O número de atletas adolescentes<br />
tem aumentado substancialmente 6 , o que determina<br />
a importância de avaliar esses indivíduos sob o olhar de diversas<br />
áreas do conhecimento.<br />
O ambiente atlético possui características peculiares, tais<br />
como exigência de perda/controle de peso, pressão exercida<br />
por treinadores no anseio por melhores resultados e uma morfologia<br />
considerada ideal para atingir um bom pico de rendimento<br />
7 . Essas características acabam levando atletas a serem<br />
mais exigentes com seus corpos. Em caso de não aceitação<br />
corporal, esses sujeitos podem apresentar altos índices de insatisfação<br />
com o corpo 8 . Esta, por sua vez, é definida como a<br />
depreciação que o indivíduo tem com sua aparência física e,<br />
segundo Ricciardelli et al. 9 , é considerada sintoma de primeira<br />
ordem no desencadeamento de transtornos alimentares.<br />
A insatisfação corporal faz parte de um componente da<br />
imagem corporal relacionado com as atitudes e comportamentos<br />
em relação ao próprio corpo 2,9 . Ela pode ser avaliada<br />
por meio de figuras do corpo, partes dele (como barriga,<br />
braços, pernas e quadris) e questionários com perguntas sobre<br />
peso corporal e aspectos relacionados com a aceitação<br />
corporal.<br />
A insatisfação corporal sofre influência de diversos fatores,<br />
entre eles: índice de massa corporal 10 (IMC), mídia, cultura<br />
9 , idade 11 , sexo 12 e prática de atividade física 13 . A cultura<br />
atual veicula como ideal de corpo, por intermédio da mídia,<br />
uma estética magra para as meninas e musculosa para os<br />
meninos 2 . Por isso, a gordura corporal é considerada aspecto<br />
depreciado em nossa sociedade 11 . Portanto, a prática de<br />
atividade física pode ser vista como um fator positivo na<br />
satisfação com a imagem corporal, considerando as alterações<br />
morfológicas (ganho de massa magra e perda de massa<br />
gorda) provocadas por ela 13 . Atletas geralmente apresentam<br />
maior massa muscular e menor perfil lipídico comparados a<br />
indivíduos não atletas 5 .<br />
Estudos têm apresentado que os atletas possuem imagem<br />
corporal mais positiva que os não atletas 13,14 . No entanto,<br />
outros achados identificaram que atletas são mais<br />
insatisfeitos com o corpo do que aqueles que não praticam<br />
atividade física sistematizada 15 . Portanto, ainda há uma inconsistência<br />
da literatura a respeito da associação dos componentes<br />
atitudinais da imagem corporal à prática ou não<br />
de atividade física sistemática. Ainda não se sabe se atletas<br />
são mais satisfeitos com seus corpos em relação aos não<br />
atletas, principalmente entre o público adolescente, que é<br />
considerado a faixa etária com maiores graus de insatisfação<br />
corporal na população 2 . Diante do exposto, o objetivo<br />
do presente estudo foi comparar a insatisfação corporal de<br />
adolescentes atletas e não atletas.<br />
MÉTODOS<br />
Trata-se de um estudo transversal e comparativo realizado<br />
no ano de 2010, na cidade de Juiz de Fora/MG, com alunos<br />
do sexo masculino de uma escola da rede particular de ensino<br />
e atletas competitivos de um clube esportivo, com idades<br />
entre 11 e 19 anos.<br />
Aspectos éticos<br />
Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa<br />
em Seres Humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora<br />
(Protocolo 342/2009; parecer nº 129.273.2009).<br />
Todos os participantes apresentaram o termo de consentimento<br />
livre e esclarecido, (TCLE) assinado pelos pais ou<br />
responsáveis. Nesse documento, explicavam-se os objetivos<br />
e procedimentos do estudo.<br />
Amostra<br />
Foram avaliados 58 atletas do sexo masculino das modalidades<br />
de futsal (n = 26) e natação (n = 32), com idade média<br />
de 14,66 ± 2,14 anos, selecionados por conveniência. Nesse<br />
método de seleção amostral, a participação é voluntária ou<br />
os elementos da amostra são escolhidos por uma questão<br />
de conveniência. Contudo, o método tem a vantagem de<br />
ser rápido, barato e de fácil aplicabilidade. O tempo médio<br />
de treinamento físico desses sujeitos era de 3 ± 2,65 anos.<br />
Os indivíduos com menos de um ano de treinamento físico<br />
sistematizado ou que não fossem participar de competições<br />
no ano de 2010 foram excluídos do grupo “atletas”.<br />
Além desse grupo, avaliaram-se 61 adolescentes escolares,<br />
com média de 15,69 ± 1,81 anos, selecionados por amostragem<br />
casual simples. Indivíduos que estivessem em processo<br />
de treinamento físico sistematizado ou inscritos em alguma<br />
competição foram excluídos do grupo “não atletas”.<br />
O sexo feminino não foi incluído nas análises do presente<br />
estudo em virtude de alguns motivos que merecem destaque:<br />
1) haviam poucas meninas nos clubes avaliados que<br />
cumpriam os critérios de inclusão no grupo “atletas”; 2) poucas<br />
meninas que pertenciam ao grupo “não atletas” apresentaram<br />
o TCLE assinado pelo responsável; 3) estudos com o<br />
sexo feminino sobre variáveis afetivas são abundantes no Brasil,<br />
devendo-se priorizar estudos utilizando o sexo masculino.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):309-14.
artigo original<br />
Insatisfação corporal de atletas e não atletas<br />
311<br />
Instrumentos<br />
Foi aplicado o Body Shape Questionnaire (BSQ) 16 , com o intuito<br />
de avaliar a insatisfação corporal. Trata-se de um questionário<br />
de autopreenchimento, com 34 questões, em escala<br />
Likert de pontos de 1 (nunca) a 6 (sempre), destinadas a<br />
avaliar a preocupação que o sujeito apresenta com seu peso<br />
e com sua aparência física. A versão utilizada neste estudo<br />
foi validada para adolescentes brasileiros por Conti et al. 16 .<br />
Sua análise de consistência interna revelou um α de 0,96<br />
para ambos os sexos; seu coeficiente de correlação entre os<br />
escores do teste-reteste foi significativo, variando de 0,89 a<br />
0,91 para mulheres e homens, respectivamente. O escore é<br />
calculado a partir da soma das respostas e varia de 34 a 204,<br />
e quanto maior o escore obtido, maior a insatisfação com o<br />
corpo. Segundo o escore total, o sujeito é classificado como<br />
livre de insatisfação corporal (pontuações abaixo de 80), com<br />
leve insatisfação corporal (entre 80 e 110), moderadamente<br />
insatisfeito (entre 110 e 140) e com grave insatisfação corporal<br />
(escores acima de 140).<br />
O peso dos adolescentes foi aferido utilizando-se balança<br />
de Bio-Impedância G-Tech®, com graduação em 0,1 kg, usando<br />
roupas leves e descalços. A estatura foi mensurada com<br />
um estadiômetro portátil de marca Tonelli® com graduação<br />
em 1 mm.<br />
O índice de massa corporal (IMC) foi obtido pela razão<br />
entre a massa corporal (kg) dividida pela estatura (m) elevada<br />
ao quadrado (IMC = massa corporal/estatura²).<br />
Procedimentos<br />
Primeiramente, os pesquisadores buscaram autorização dos<br />
treinadores do clube e diretores da escola privada para efetuar<br />
a coleta de dados. Após esse consentimento, atletas e<br />
escolares foram abordados em seus locais de treinamento e<br />
em sala de aula, respectivamente, por um dos pesquisadores.<br />
Todos os sujeitos da pesquisa foram informados sobre os<br />
objetivos e procedimentos do estudo. Solicitou-se aos menores<br />
de 18 anos que levassem a seus responsáveis o TCLE.<br />
Esse documento deveria ser devolvido assinado na semana<br />
subsequente a esse encontro. Os adolescentes que não entregaram<br />
o TCLE foram excluídos do estudo.<br />
Antes de iniciar a coleta de dados, o profissional de educação<br />
fí sica envolvido na avaliação antropométrica (LSF)<br />
participou de treinamento para padronizar medidas, com o<br />
objetivo de obter maior precisão dos dados coletados (massa<br />
corporal e estatura), seguindo as recomendações da National<br />
Center for Health Statistics (2000) 17 . Para aferir a massa<br />
corporal, foram adotados os seguintes critérios: adolescente<br />
em pé, descalço com o mínimo de roupas, posicionado no<br />
centro da plataforma com os braços estendidos ao longo do<br />
corpo e com olhar fixo à frente, de modo a evitar oscilação<br />
na leitura da medida. Para a estatura, os indivíduos deveriam<br />
ficar em pé, olhando para o infinito, sem sapatos, com calcanhares,<br />
glúteos, dorso e cabeça encostados ao plano vertical<br />
e os pés e calcanhares unidos formando um ângulo de 45°.<br />
Nessa posição, a peça do estadiômetro em ângulo reto foi<br />
posicionada sobre o topo da cabeça do adolescente, e a medida<br />
foi anotada.<br />
Para o BSQ, um único pesquisador (LSF) ficou responsável<br />
por sua aplicação nos sujeitos para que não houvessem<br />
interferências interavaliadores nas explicações sobre o instrumento.<br />
As instituições onde foram realizadas as coletas de dados<br />
deste estudo disponibilizaram para nossa equipe salas<br />
adequadas para aferição antropométrica e aplicação do<br />
questionário. Esses procedimentos foram realizados em dias<br />
subsequentes. O primeiro encontro foi destinado apenas à<br />
avaliação de massa corporal e estatura, e no segundo dia os<br />
adolescentes responderam ao BSQ.<br />
Durante o primeiro encontro, os pesquisadores autorizavam<br />
apenas um jovem a adentrar no ambiente em que se<br />
realizavam as medidas antropométricas. No segundo dia, os<br />
questionários foram entregues aos indivíduos, que receberam<br />
então a mesma orientação verbal. Uma orientação escrita<br />
sobre os procedimentos adequados também estava presente<br />
nestes. As eventuais dúvidas foram esclarecidas pelo<br />
responsável pela aplicação do BSQ. Os sujeitos do estudo<br />
não se comunicavam entre si. Além disso, não houve limite<br />
de tempo para preencher o questionário.<br />
Análise estatística<br />
Para as variáveis idade, IMC e insatisfação corporal, utilizou-<br />
-se a estatística descritiva (média e desvio-padrão). O teste<br />
Kolmogorov-Smirnov foi aplicado para averiguar a distribuição<br />
dos dados por grupo. Como a normalidade dos dados foi<br />
violada no grupo não atletas, utilizou-se teste Mann-Whitney<br />
para comparar idade e IMC entre os grupos (atletas e não<br />
atletas). Análise univariada de covariância (ANCOVA), incluindo<br />
a idade como covariável, foi conduzida para comparar a<br />
insatisfação corporal entre os grupos (atletas e não atletas),<br />
pois se constatou que escolares eram mais velhos (p < 0,05)<br />
do que os atletas, o que poderia de alguma forma interferir<br />
nos resultados. A comparação de prevalência de insatisfação<br />
corporal entre atletas e não atletas foi realizada por meio do<br />
teste qui-quadrado de Pearson. Para isso, as classificações de<br />
insatisfação corporal do BSQ (leve insatisfação, moderadamente<br />
insatisfeito e grave insatisfação) foram agrupadas em<br />
“insatisfeito”. Para todas as análises, utilizou-se o software SPSS<br />
17.0. Em todos os casos, o nível de significância foi de 5%.<br />
RESULTADOS<br />
A tabela 1 apresenta a comparação de idade e IMC entre os<br />
grupos atletas e não atletas. Foram encontradas diferenças<br />
apenas para a idade (p < 0,05).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):309-14.
312 Fortes LS et al.<br />
artigo original<br />
Tabela 1. Comparação da idade, IMC e insatisfação corporal entre<br />
atletas e não atletas pelo teste Mann-Whitney<br />
Variável/Grupo Atletas Não atletas p valor<br />
Idade 14,66 ± 2,14 15,69 ± 1,81 p < 0,02<br />
IMC 21,19 ± 2,76 20,74 ± 3,48 p < 0,17<br />
Em relação à comparação da insatisfação corporal utilizando<br />
a idade como covariável na análise univariada de<br />
covariância (ANCOVA), os não atletas apresentaram pontuações<br />
superiores no BSQ comparados aos atletas (p < 0,05)<br />
(Tabela 2).<br />
Tabela 2. Comparação da insatisfação corporal entre atletas e<br />
não atletas avaliada por meio da análise univariada de covariância<br />
(ANCOVA)<br />
Variável/Grupo Atletas Não atletas p valor<br />
BSQ 49,30 ± 2,70 57,40 ± 2,63 p < 0,04<br />
A comparação da prevalência de insatisfação corporal<br />
entre os grupos está ilustrada na tabela 3. Adolescentes não<br />
atletas apresentaram maiores frequências de insatisfação<br />
com a imagem corporal (14,8) do que os atletas (3,4), havendo<br />
diferenças estatisticamente significativas entre os grupos<br />
(p < 0,05).<br />
Tabela 3. Comparação da prevalência (%) de insatisfação corporal<br />
entre adolescentes atletas e não atletas<br />
Insatisfação/Grupo Atletas Não atletas p valor<br />
Satisfeito 96,6 85,2 p < 0,001<br />
Insatisfeito 3,4 14,8 p < 0,001<br />
DISCUSSÃO<br />
O estudo teve como premissa comparar a insatisfação corporal<br />
entre adolescentes atletas e não atletas do sexo masculino.<br />
Os resultados revelaram diferença de idade entre os<br />
grupos (p < 0,05 – Tabela 1), mas não foi identificada diferença<br />
de IMC entre atletas e não atletas. Foi evidenciada diferença<br />
de insatisfação corporal entre os dois grupos (p < 0,05<br />
– Tabela 2), mesmo utilizando a idade como covariável na<br />
análise univariada de covariância (ANCOVA). Além disso, os<br />
não atletas apresentaram maior prevalência de insatisfação<br />
corporal comparados aos atletas (p < 0,05 – Tabela 3).<br />
O presente estudo apresentou limitações importantes.<br />
Uma delas foi utilizar como instrumento principal um questionário.<br />
Pesquisadores afirmam que os indivíduos podem<br />
não responder com fidedignidade a instrumentos autoaplicáveis<br />
2,12 . Portanto, os resultados podem não refletir a realidade<br />
do contexto avaliado, visto que o resultado final é fruto<br />
de respostas subjetivas. Outra limitação da presente pesquisa<br />
foi apresentar um tamanho amostral relativamente baixo<br />
para ambos os grupos. Entretanto, ressalta-se a dificuldade<br />
de acesso em avaliar atletas na cidade de Juiz de Fora/MG,<br />
pois geralmente treinadores recusam a participação voluntária<br />
de seus atletas nesse tipo de estudo. Por outro lado,<br />
pesquisas desse gênero têm utilizado amostras com número<br />
de participantes semelhantes ao do presente estudo 6,15 .<br />
Contudo, este estudo mostra importantes evidências a respeito<br />
da comparação da insatisfação corporal entre atletas<br />
e não atletas do sexo masculino, acrescentando à literatura<br />
algumas questões relevantes sobre esse tema, que tem sido<br />
pouco explorado no Brasil.<br />
Os resultados do presente estudo demonstram uma prevalência<br />
de 14,8% dos meninos não atletas com insatisfação<br />
corporal, indicando que existiam baixas taxas de depreciação<br />
com peso e aparência física comparado a outros achados<br />
2,12 . Os estudos que se destinam a investigar esse aspecto<br />
têm encontrado altas prevalências de insatisfação corporal<br />
no público adolescente 2,11,18 . O número de casos de adolescentes<br />
do sexo masculino insatisfeitos com o corpo tem aumentado<br />
nos últimos anos 19 . Já são encontradas pesquisas<br />
que demonstram que os meninos têm maior prevalência de<br />
insatisfação com aparência física do que as meninas 10,20 . Pelegrini<br />
e Petroski 10 , utilizando escala de silhuetas, encontraram<br />
prevalência de insatisfação corporal em 66% dos adolescentes<br />
do sexo masculino da rede pública de Florianópolis. Em<br />
outro estudo semelhante, Petroski et al. 12 identificaram que<br />
60% dos adolescentes do sexo masculino do município de<br />
Chapecó/SC estavam insatisfeitos com a aparência física.<br />
Os achados do presente estudo demonstram maior prevalência<br />
de insatisfação corporal no grupo de não atletas<br />
(Tabela 3), corroborando a metanálise realizada por Hausenblas<br />
e Downs 13 . A insatisfação corporal parece se manifestar<br />
em atletas com frequências diferentes em relação aos não<br />
atletas. Estudos têm apresentado que essa população possui<br />
baixa prevalência de insatisfação corporal 6,13 . Vieira et al. 6 avaliaram<br />
a insatisfação corporal de atletas de judô do estado do<br />
Paraná e encontraram prevalência de 7% nessa amostra. Por<br />
outro lado, alguns autores encontraram grandes prevalências<br />
de insatisfação com peso corporal em atletas 5,15 . Talvez<br />
a exposição do corpo em público, em uniformes que salientam<br />
o formato corporal, juntamente com a pressão imposta<br />
por treinadores no anseio pela otimização do desempenho<br />
esportivo ou simplesmente controle de peso corporal possam<br />
ser fatores que influenciem negativamente a imagem<br />
corporal, fazendo com que jovens esportistas preocupem-se<br />
ainda mais com peso e aparência física 5,17 .<br />
A presente pesquisa buscou utilizar esportes que não<br />
apresentassem características estéticas, nem que exigissem<br />
baixo peso corporal (futsal e natação). Além disso, é necessário<br />
averiguar se há ou não diferenças de variáveis entre grupos<br />
de atletas e não atletas que podem influenciar na insatis-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):309-14.
artigo original<br />
Insatisfação corporal de atletas e não atletas<br />
313<br />
fação corporal. Em uma metanálise comparando a imagem<br />
corporal de atletas e não atletas 13 , foi identificado que atletas<br />
apresentavam imagem corporal mais positiva do que os não<br />
atletas. Alguns estudos têm corroborado esses achados 21,22 .<br />
No entanto, os resultados de outras pesquisas recentes vêm<br />
conflitando com a tendência retromencionada 5,7 . Sobretudo,<br />
existem vários fatores peculiares do ambiente atlético que<br />
podem influenciar a imagem corporal em atletas e impossibilitar<br />
comparações generalizadas. Um destes aspectos<br />
é o tipo de esporte que o sujeito pratica. Sundgot-Borgen<br />
e Torstveit 7 e Krentz e Warschsburger 5 argumentam que<br />
atletas que praticam esportes com características estéticas<br />
e com exigência de baixo peso corporal tendem a ser mais<br />
insatisfeitos com o corpo. Dependendo das modalidades esportivas<br />
em que são comparadas com os não atletas, podem<br />
ser encontrados resultados diversos.<br />
Na presente pesquisa, identificou-se diferença apenas na<br />
idade entre os grupos (Tabela 1), o que poderia interferir nos<br />
resultados da comparação de insatisfação corporal. Por isso,<br />
decidiu-se utilizar uma análise (ANCOVA) que reconfigura as<br />
pontuações do BSQ igualando a idade de todos os participantes.<br />
Esse teste revelou que adolescentes não atletas do<br />
sexo masculino eram mais insatisfeitos com o corpo comparados<br />
ao grupo de atletas (p < 0,05 – Tabela 2). Esses achados<br />
corroboram as afirmações de Hausenblas e Downs 13 , que<br />
apontaram maior insatisfação corporal em sujeitos que não<br />
praticam atividade física sistematizada. Autores como Conti<br />
et al. 11 e Scherer et al. 2 afirmam que a idade e o IMC são fatores<br />
que influenciam a imagem corporal. Várias pesquisas têm<br />
apresentado que o IMC é fortemente associado com a insatisfação<br />
corporal no público adolescente 10,12 . Estudos têm<br />
mostrado que adolescentes mais velhos do sexo masculino<br />
tendem a ser menos insatisfeitos com peso e aparência corporal<br />
comparados aos mais jovens 11 .<br />
Para futuros estudos, sugere-se que sejam avaliados atletas<br />
de outros esportes, além de se incluir o sexo feminino nas<br />
análises. É recomendado que sejam realizadas análises multivariadas<br />
de covariância utilizando fatores de instrumentos<br />
como o BSQ, como variáveis dependentes, e medidas antropométricas<br />
(IMC e percentual de gordura) como covariáveis,<br />
a fim de se identificarem com mais precisão diferenças de<br />
imagem corporal entre atletas e não atletas. Ademais, recomenda-se<br />
que sejam incluídos instrumentos que avaliem<br />
pressão do ambiente esportivo na tentativa de identificar se<br />
treinadores e colegas de equipe influenciam positiva ou negativamente<br />
em variáveis afetivas de jovens atletas.<br />
CONCLUSÃO<br />
Pode-se dizer, entre a amostra do presente estudo, que os<br />
não atletas são mais insatisfeitos com peso e aparência corporal,<br />
além de apresentarem maior prevalência desse fenômeno<br />
comparado aos atletas de futsal e natação do sexo<br />
masculino. Dessa forma, destaca-se a importância de intervenções<br />
nas escolas que visem a uma melhor aceitação do<br />
corpo na adolescência, a fim de promover maior satisfação<br />
com a imagem corporal nessa fase, prevenindo o desenvolvimento<br />
de problemas psicológicos.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Aos adolescentes participantes deste estudo, pela colaboração;<br />
à diretora da escola privada Flávia Marcele Cipriani; aos treinadores<br />
das equipes avaliadas, Artur Castellões (futsal) e Luiz<br />
Francisco Junqueira Marques (natação), pela permissão de os<br />
adolescentes participarem da pesquisa; ao Laboratório de Estudos<br />
do Corpo (UFJF), pela disponibilização dos instrumentais<br />
do estudo; ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico<br />
e Tecnológico (CNPq), pelo financiamento do projeto.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):309-14.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Body image dissatisfaction and its<br />
relationship with physical activity and body<br />
mass index in Brazilian adolescents<br />
Insatisfação com a imagem corporal e sua relação com atividade<br />
física e índice de massa corporal em adolescentes brasileiros<br />
Maria F. Laus 1 , Telma M. Braga Costa 2 , Sebastião S. Almeida 1<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Body image, physical<br />
activity, body mass index,<br />
adolescent.<br />
Objective: To evaluate body image dissatisfaction and its relationship with physical activity and<br />
body mass index in a Brazilian sample of adolescents. Methods: A total of 275 adolescents (139<br />
boys and 136 girls) between the ages of 14 and 18 years completed measures of body image dissatisfaction<br />
through the Contour Drawing Scale and current physical activity by the International<br />
Physical Activity Questionnaire. Weight and height were also measured for subsequent calculation<br />
of body mass index. Results: Boys and girls differed significantly regarding body image dissatisfaction,<br />
with girls reporting higher levels of dissatisfaction. Underweight and eutrophic boys preferred<br />
to be heavier, while those overweight preferred be thinner and, in contrast, girls desired to be thinner<br />
even when they are of normal weight. Conclusion: Body image dissatisfaction was strictly related<br />
to body mass index, but not to physical activity.<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Imagem corporal,<br />
atividade física, índice<br />
de massa corporal,<br />
adolescentes.<br />
Objetivo: Investigar a insatisfação com a imagem corporal e sua relação com atividade física<br />
e índice de massa corporal em adolescentes brasileiros. Métodos: Participaram do estudo<br />
275 adolescentes (139 meninos e 136 meninas) com idade entre 14 e 18 anos. A coleta de<br />
dados consistiu na tomada de medidas de peso e altura, seguida pela aplicação da Escala<br />
de Figuras de Silhuetas e do Questionário Internacional de Atividade Física. Resultados:<br />
As meninas apresentaram índices significativamente maiores de insatisfação com a imagem<br />
corporal. Meninos eutróficos e com baixo peso relataram o desejo de pesar mais, enquanto<br />
meninos acima do peso gostariam de pesar menos. Em contrapartida, as meninas desejam<br />
ser mais magras, mesmo quando estão com peso normal. Conclusão: A insatisfação com a<br />
imagem corporal foi estritamente relacionada ao índice de massa corporal, mas não manteve<br />
relação com a prática de atividade física.<br />
Recebido em<br />
14/9/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
28/11/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Departamento de Psicologia.<br />
2 Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP), Curso de Nutrição.<br />
Address for correspondence: Sebastião S. Almeida<br />
Laboratório de Nutrição e Comportamento, Departamento de Psicologia, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto,<br />
Universidade de São Paulo<br />
Av. Bandeirantes, 3900 – 14040-901 – Ribeirão Preto, SP, Brasil<br />
Tel.: (16) 3602-3663<br />
E-mail: sebasalm@usp.br
316 Laus MF et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
INTRODUCTION<br />
Body image has been considered an internal representation<br />
of an individual’s body shape, weight, size, or other features<br />
related to physical appearance 1 . However, researchers have<br />
long argued that body image has a multifactorial etiology<br />
involving perceptual, affective, cognitive, evaluative, and investment/behavioral<br />
components 2 .<br />
Because adolescence is a period characterized by great<br />
emotional, social, and physical change, body image disturbance<br />
is among the most widespread disorders associated<br />
with the onset of adolescence 3 . Although the research on body<br />
image has primarily focused on women and patients with eating<br />
disorders 4 , increasing recognition of the psychosocial<br />
problems associated with body disturbance among adolescents<br />
has led to the need to understand the factors influencing<br />
body image for boys and girls in nonclinical populations.<br />
According to some authors, a number of studies have<br />
emphasized the problems of distorted body image, dissatisfaction<br />
with one’s body weight and symptoms of unhealthy<br />
weight control among adolescents as a social pressure 5 . The<br />
beauty ideal is conveyed and reinforced by many social influences,<br />
including media representations, cultural traditions<br />
and attitudes of friends and relatives 6 .<br />
Studies conducted in the West during the last three decades<br />
reflect general agreement that “ideal body” is equated<br />
with youth, beauty, health, competence, and self-control<br />
and is a key to many social benefits 7 . The male ideal is a<br />
V-shaped figure with emphasis placed on large biceps, chest,<br />
and shoulders; whereas the female ideal is to be extremely<br />
thin, with emphasis placed on slim hips, bottom, and thighs 8 .<br />
However, since for most people this ideal is impossible to<br />
achieve, body image disturbance is a likely consequence.<br />
It is known that body mass index (BMI) has been the most<br />
consistent biological characteristic related to body image<br />
satisfaction 9 with some studies finding that BMI explained<br />
unique variance in body dissatisfaction above and beyond<br />
socio-cultural variables 10 . The general finding from cross-sectional<br />
and longitudinal research has been that girls and boys<br />
who have greater body mass have expressed heightened<br />
body image disturbances 9 .<br />
A substantial body of literature data attests to the negative<br />
distress caused by body image disturbance in both females<br />
and males, as well as its association with depression<br />
symptoms, low self-esteem, and increased risk for suicide 3,11 .<br />
It is also known that body image disturbances might be associated<br />
with unhealthy weight-control behaviors 10 .<br />
In that way, physical activity is often considered as a way<br />
to reduce body weight and research shows that adolescents<br />
frequently relate fitness to appearance and to “looking<br />
good” 12 . Thus, according to Jankauskiené and Kardelis 5 ,<br />
several studies have revealed many problems related to<br />
weight, body image and physical activity such as pathological<br />
weight control concerns, drive for thinness (particularly<br />
in girls), drive for muscularity (particularly in boys), and commitment<br />
to exercise.<br />
On the other hand, some authors argue that regular<br />
physical activity among children and adolescents could be<br />
associated with high self-esteem, positive social skills, and<br />
a reduced risk of participating in health-risk behaviors 13 in<br />
which adolescents often engage, with immediate or longterm<br />
consequences to their health and well-being.<br />
On this basis, adolescents’ body concerns are an important<br />
issue and studies should be conducted in an attempt<br />
to answer a number of different questions related to body<br />
image disorders. Although this is an important issue, only a<br />
few published studies explore issues surrounding body image<br />
perception and its related factors among Brazilian adolescents.<br />
Thus, the main purpose of the present study was to<br />
evaluate body image dissatisfaction and its relationship with<br />
physical activity and body mass index in a Brazilian sample<br />
of adolescents.<br />
METHODS<br />
Participants<br />
Before the beginning of the study, a survey was conducted<br />
in the Municipal Secretary of Education to verify the number<br />
of adolescents regularly enrolled in high school in the city,<br />
resulting in 23.754 students. After that, a simple random and<br />
convenient sample corresponding to, at least, 1% of this total<br />
was defined. To ensure the inclusion of subjects from all socioeconomic<br />
strata, five public and five private schools were<br />
randomly selected from each region of the city (north, south,<br />
west, east and central). The authors made contact to each director<br />
and, after the agreement, students were randomly recruited<br />
to voluntarily participate in the study. At the end, 275<br />
adolescents (139 boys and 136 girls) agreed to participate in<br />
the study and there were no refusals during data collection.<br />
Participants ranged in age from 14 to 18 years (16.2 ± 1.0).<br />
Measures<br />
Body Mass Index (BMI): BMI is defined as the ratio of weight<br />
(kg) to height (m) squared. Weight was measured using a<br />
calibrated electronic scale (Kratos-Cas, Brazil) and subjects<br />
were weighed wearing light clothes, barefoot and carrying<br />
no heavy objects. Height was measured using a portable anthropometer<br />
(Kratos-Cas, Brazil) set against the wall, ensuring<br />
accurate subject posture before reading the fixed marker.<br />
Nutritional status was defined by the age- and sex-specific<br />
percentile of BMI based on Ministry of Health parameters 14 .<br />
Weight and height data were processed with the Epi-Info®<br />
software, which classified each individual according to the<br />
percentile limits as follows: underweight P < 3; normal weight<br />
P3 – P < 85; overweight ≥ P85 – P < 97, and obesity P ≥ 97.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):315-20.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Factors related to dissatisfaction in adolescents<br />
317<br />
International Physical Activity Questionnaire<br />
(IPAQ): The IPAQ was developed as an instrument for crossnational<br />
monitoring of physical activity and inactivity 15 . The<br />
Brazilian version of the questionnaire was validated for adolescents<br />
of both sexes by Guedes et al. 16 .<br />
The short version of the IPAQ assesses physical activity<br />
undertaken across a comprehensive set of domains including:<br />
leisure time physical activity; domestic and gardening (yard)<br />
activities, work-related physical activity, and transport-related<br />
physical activity, and asks about three specific types of activity<br />
undertaken in the above four domains. The specific types of<br />
activity assessed are walking, moderate-intensity activities<br />
and vigorous-intensity activities. The 3 items in the short<br />
IPAQ form were structured to provide separate scores on<br />
walking, moderate-intensity and vigorous-intensity activity.<br />
Computation of the total score for the short form requires<br />
summation of the duration (in minutes) and frequency<br />
(days) of walking and of moderate-intensity and vigorousintensity<br />
activities. For each question, participants are given<br />
examples of moderate, vigorous, and walking activities and<br />
physiological cues for breathing and heart rate to help them<br />
recall activities at an appropriate intensity level. The IPAQ<br />
does not take into account activities performed for less than<br />
10 consecutive minutes, and the intensity is based on selfreport<br />
15 . Data are analyzed as categorical variable.<br />
The Contour Drawing Scale (CDS): The Brazilian version<br />
of the scale was created and validated by Kakeshita<br />
et al. 17 . In this study it was used the adult scale, which was<br />
tested by the authors in adolescents * . The scale comprises<br />
a set of fifteen contour drawings of each gender presented<br />
on separate cards showing escalating measures, from leaner to<br />
wider drawings, and mean BMI ranging from 12.5 to 47.5 kg/m 2 ,<br />
which evaluates body image dissatisfaction. The method applied<br />
consisted of asking subjects to pick one card from a set<br />
of cards displayed in ascending order, which would better<br />
describe their own body contour at that time (“Perceived”<br />
BMI). Subjects were then asked to point out the card with<br />
their desired body contour (“Ideal” BMI) and the card which<br />
indicates a healthy BMI. Body dissatisfaction is represented<br />
as the discrepancy between perceived and ideal BMI. Results<br />
are given as a continuous variable, and the closer to zero, the<br />
lower dissatisfaction.<br />
Procedure<br />
The project was approved by the Institutional Ethics Committee.<br />
Data collection was carried out in rooms provided by the<br />
schools and comprised the application of contour drawing<br />
tests, weight and height measures and self-administration of<br />
the IPAQ. All data were collected in 2008 by one investigator<br />
* Laus MF, Murarole, MB, Braga Costa TM, Almeida SS. Estudo de fidedignidade<br />
teste-reteste de uma escala de silhuetas brasileira em adolescentes<br />
(unpublished manuscript).<br />
trained in the use of the instruments. Written informed consent<br />
was obtained from all subjects.<br />
Data analysis<br />
Data were analyzed using evaluation scales of each test and<br />
the calculation of BMI. Statistical analysis was performed using<br />
the Statistica 5.0 software. Data adhered to the assumption<br />
for parametric data. Analysis of Variance (ANOVA) was used<br />
to determine whether there were any differences in BMI, level<br />
of physical activity and body image dissatisfaction between<br />
boys and girls and possible interactions between these factors.<br />
When applicable, the multiple comparisons Newman-<br />
Keuls test was used to determine which groups were different.<br />
A Pearson correlation test between BMI and CDS was<br />
also performed. The level of significance was set at 5%.<br />
RESULTS<br />
Table 1 describes the characteristics of the sample in<br />
terms of physical activity level, nutritional status, BMI, body<br />
image perception, and dissatisfaction. As can be seen,<br />
approximately 73.4% of the boys and 54.4% of the girls were<br />
participating in moderate-intensity physical activity lasting<br />
for at least 10 min. Seventy-eight percent of the boys and<br />
83.1% of the girls were of normal weight and there was no<br />
significant difference in mean BMI between adolescent boys<br />
and girls (p < .05).<br />
Table 1. Descriptive statistics of the study sample (n = 275)<br />
Physical activity level †<br />
Boys<br />
(n = 139)<br />
Girls<br />
(n = 136)<br />
Sedentary 2.9 6.8<br />
Low activity 23.7 39.0<br />
Moderate activity 47.5 41.2<br />
High activity 25.9 13.2<br />
Nutritional status †<br />
Underweight 3.6 0.7<br />
Normal weight 78.4 83.1<br />
Risk of overweight 10.1 12.5<br />
Overweight 7.9 3.7<br />
Body mass index ‡ 22.0 (3.8) (16.0 – 35.6) 21.7 (3.5) (16.9 – 35.6)<br />
CDS ‡<br />
“Perceived” BMI 24.4 (6.2) 26.7 (6.2)<br />
“Ideal” BMI 24.2 (3.5) 24.2 (3.6)<br />
“Health” BMI 24.8 (3.6) 24.9 (3.5)<br />
Dissatisfaction ‡ -0.2 (5.5) -2.5 (5.6) a<br />
†<br />
Data are reported in percentage. ‡ Data are reported in kg/m 2 as mean (Standard Deviation). a p < .001 compared<br />
to boys.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):315-20.
318 Laus MF et al.<br />
ORIGINAL ARTICLE<br />
Still on table 1, it can be seen that, according to the CDS,<br />
girls would like to have a lower BMI than they think they have.<br />
Body image data were then submitted to one-way (dissatisfaction<br />
x gender) ANOVA to determine possible differences<br />
in dissatisfaction between boys and girls. Table 1 shows that<br />
boys and girls differed significantly in body dissatisfaction<br />
[F (1,273)<br />
= 11,26; p < .001)], with girls reporting higher levels of<br />
dissatisfaction than boys.<br />
In order to evaluate differences in body image dissatisfaction<br />
between boys and girls who currently do and do<br />
not participate in some form of physical activity, a two-way<br />
ANOVA was performed. As can be seen, ANOVA revealed no<br />
significant effect of the body image dissatisfaction x physical<br />
activity levels x gender interaction (p > .05) which indicates<br />
that, in this sample, dissatisfaction exist regardless physical<br />
activity level or gender (Table 2).<br />
Table 2. Means (and Standard Deviations) for body image<br />
dissatisfaction (in kg/m 2 ) of boys and girls according to physical<br />
activity level and nutritional status<br />
Physical activity level<br />
Boys<br />
(n = 139)<br />
Body image dissatisfaction<br />
Girls<br />
(n = 136)<br />
Sedentary -6.3 (1.6) -1.9 (1.9)<br />
Low activity -0.8 (1.2) -1.8 (0.7)<br />
Moderate activity 0.0 (0.7) -3.2 (0.8)<br />
High activity 0.6 (0.7) -2.2 (0.8)<br />
Nutritional status<br />
Underweight 6.0 (1.3) a 0.0 (0.0) a<br />
Normal weight 1.2 (1.3) a -1.5 (0.5) a<br />
Risk of overweight -4.5 (1.1) b -7.4 (1.3) b<br />
Overweight -11.4 (1.8) b -8.5 (1.0) b<br />
a, b<br />
p < .05 (means with different superscripts differ significantly).<br />
A two-way ANOVA also was conducted to determine differences<br />
in body image dissatisfaction between boys and<br />
girls according to the nutritional status. As can be seen on<br />
table 2, ANOVA demonstrated no significant effect of gender<br />
(p > .05) but revealed a significant effect of the dissatisfaction<br />
x nutritional status interaction [F (3,267)<br />
= 31.71; p < .05]. Posthoc<br />
analysis showed that respondents with higher BMI were<br />
more dissatisfied with their weight than respondents with<br />
lower BMI. As expected, underweight and normal weight<br />
boys would like to be heavier, while those overweight would<br />
like to be thinner. In contrast, girls would like to be thinner,<br />
even when they are normal weight.<br />
Significant correlations were observed between body<br />
image dissatisfaction and BMI in boys (r = -.79) and girls (r =<br />
-.60), indicating that, in this sample, dissatisfaction with body<br />
image proportionally increased with increasing BMI in both<br />
sexes (p < .05) (Table 3).<br />
Table 3. Pearson’s correlation coefficients between body mass<br />
index (kg/m 2 ) and body image dissatisfaction (kg/m 2 ) for boys<br />
and girls<br />
Boys<br />
Body image dissatisfaction<br />
Girls<br />
Body mass index -.79 a -.60 a<br />
a<br />
Significant at p < .05.<br />
DISCUSSION<br />
The objective of the present study was to investigate body<br />
image dissatisfaction and its relationship with physical activity<br />
and body mass index in a Brazilian sample of adolescents.<br />
The results showed a large proportion of adolescents engaged<br />
in some form of physical activity and that most participants<br />
were of normal weight. Body image dissatisfaction<br />
was strictly related to BMI, but not to physical activity.<br />
Our data concerning the levels of physical activity of adolescents<br />
tested by the IPAQ agree with other national studies<br />
18 . Thus, it is important to note that there is a difference<br />
between “physical activity” and “exercise”. Caspersen et al. 19<br />
define physical activity as any bodily movement produced<br />
by skeletal muscles that results in energy expenditure. In<br />
daily life it can be categorized into occupational, sports, conditioning,<br />
household, or other activities. On the other hand,<br />
exer cise is a subcategory of physical activity. In fact, both<br />
have a number of common elements; however, exercise<br />
is not synonymous with physical activity. Exercise is physical<br />
activity that is planned, structured, repetitive, and intentional,<br />
in the sense that improvement or maintenance of<br />
one or more components of physical fitness is an objective 19 .<br />
The IPAQ is a measure of total physical activity and includes<br />
transportation and occupational physical activities making<br />
no distinction between the two terms.<br />
Particularly in developing countries, occupational and<br />
transportation activities represent a substantial proportion<br />
of total physical activity 20 . Thus, most of the participants possibly<br />
practice this kind of activity, and not specifically “exercise”.<br />
Since it is known that exercise is more often performed<br />
for appearance-related reasons 21 compared to physical activities,<br />
this could be one explanation for the lacking relationship<br />
between physical activity and body image disturbance.<br />
Concerning nutritional status, Madrigal et al. 22 have<br />
pointed out that the relationship between body weight and<br />
body image self-perception is well-documented in the literature,<br />
as confirmed in the present study. The present study<br />
shows that body dissatisfaction scores of both boys and<br />
girls were significantly correlated with their BMI, indicating<br />
that body image disturbance increases with increasing BMI.<br />
Similarly, previous studies have also found a direct relationship<br />
between BMI and body image disturbance 23,24 . A review<br />
conducted by Wardle 25 examining recent empirical evidence<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):315-20.
ORIGINAL ARTICLE<br />
Factors related to dissatisfaction in adolescents<br />
319<br />
on the relationship between obesity and body dissatisfaction<br />
found, without exception, greater body dissatisfaction<br />
among heavier children and adolescents, confirming that<br />
overweight during adolescence may indicate greater body<br />
concern and discomfort.<br />
The high correlation between body image and anthropometric<br />
characteristics suggests that the analysis of body<br />
image perception could play an important role in nutritional<br />
surveillance 24 .<br />
According to Champion and Furnham 26 , many theorists<br />
have postulated that the media may play a central role in<br />
creating and exacerbating the phenomenon of body dissatisfaction.<br />
Television and other media represent one of the<br />
most important and underrecognized influences on children<br />
and adolescents’ behavior 27 . Figures in the media provide information<br />
on fashion, beauty, and body satisfaction, and have<br />
the potential to provide positive images for adolescents in<br />
the process of their social development and emerging sense<br />
of identity. However, adolescents often identify with media<br />
characters who are unnaturally thin or who engage in harmful<br />
behaviors, and often develop unrealistic and unhealthy<br />
norms of physical appearance 28 .<br />
The adult stereotypes of beauty and obesity are naturally<br />
assimilated by children and a review conducted by Feldman<br />
et al. 29 investigating the absorption of these stereotypes in<br />
children concluded that children by the age of 6-9 years old<br />
already acquire an active dislike of the obese body and by<br />
the age of 7 years have assimilated adult cultural perceptions<br />
of attractiveness 26 .<br />
According to Pesa et al. 30 , adolescence is a period of life<br />
marked by pronounced physical, psychological, emotional,<br />
and social changes. The physical changes that characterize<br />
this life stage have been implicated as a trigger for body<br />
image problems in both males and females. With pubertal<br />
development, girls experience an increase in body fat 31 . This<br />
new body often conflicts with the cultural ideal of a slender<br />
body and girls generally become more dissatisfied with their<br />
bodies. It stands to reason that excess body weight may have<br />
a negative impact on the well-being especially of female adolescents<br />
31 . In fact, dissatisfaction with body image in girls is<br />
normally shown by the desire to lose weight. In contrast, studies<br />
have shown that boys seem to be approximately equally<br />
divided between those desiring weight gain and those desiring<br />
weight loss 8 , as confirmed in the present study.<br />
This study has presented numerous interesting findings.<br />
Nevertheless, it is not without limitations. This study has presented<br />
numerous interesting findings. Nevertheless, it is not<br />
without limitations. The first one is related to the use of one<br />
self-applicable instrument, which may contain a bias component,<br />
once it depend on those who will answer the questions,<br />
fact that can result in subjective data. Second, there<br />
is the relatively small sample size, which could not properly<br />
represent all considered strata, but may provide baseline<br />
data to begin to examine body dissatisfaction and its related<br />
factors during adolescence.<br />
In conclusion, boys and girls differed significantly in body<br />
dissatisfaction, with girls reporting higher levels of dissatisfaction.<br />
In general, underweight and normal weight boys<br />
would like to be heavier, while those overweight would like<br />
to be thinner and, in contrast, girls would like to be thinner,<br />
even when they are of normal weight. Contrary to expectations,<br />
body image dissatisfaction was strictly related to BMI,<br />
but not to physical activity.<br />
These results demonstrated that biological factors, as<br />
BMI, may play an important role in the development and<br />
maintenance of body image dissatisfaction and provided<br />
helpful information about risk population that should be target<br />
of interventional programs.<br />
ACKNOWLEDGE<br />
The authors acknowledge Fundação de Amparo à Pesquisa do<br />
Estado de São Paulo – FAPESP for financial support (Process<br />
2006/01606-6).<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):315-20.
evisão de literatura<br />
A patogênese genética e molecular<br />
da síndrome de Angelman<br />
The genetic and molecular pathogenesis of the Angelman syndrome<br />
Angelica Francesca Maris 1 , Alexis Trott 2<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Síndrome de Angelman,<br />
UBE3A, retardo mental,<br />
deficiência mental,<br />
imprinting genômico,<br />
disfunção sináptica.<br />
Objetivo: Fornecer uma revisão atualizada em língua portuguesa sobre a síndrome de Angelman,<br />
com ênfase nos mecanismos genéticos e moleculares dessa patologia, uma causa<br />
de deficiência mental severa que em alguns casos pode apresentar recorrência familiar. Método:<br />
Foi feita uma revisão bibliográfica utilizando a base de dados do PubMed, tendo como<br />
critérios de busca o termo “Angelman syndrome” isoladamente e combinado com “UBE3A”,<br />
“clinical”, “genetics” e “molecular” no título dos artigos. Dentre esses, foram selecionados artigos<br />
de revisão e artigos originais sobre a fisiopatologia da síndrome, com ênfase nos últimos<br />
dez anos. Resultados: Utilizando-se “Angelman syndrome” na busca, apareceram cerca de<br />
1.100 artigos, incluindo 240 de revisão. Nos últimos dez anos são mais de 600 artigos, aproximadamente<br />
120 de revisão, 50% dos quais publicados nos últimos cinco anos. Na base<br />
de dados SciELO, são apenas nove artigos sobre a síndrome, dos quais três em português<br />
e nenhum artigo atual de revisão. Conclusão: Após ter sido uma das principais causas que<br />
atraíram atenção ao estudo e ao entendimento dos mecanismos do imprinting genômico, a<br />
síndrome de Angelman está agora se revelando como uma patologia das sinapses. Apesar<br />
de o entendimento da fisiopatologia molecular da síndrome de Angelman ainda estar longe<br />
de ser compreendida, seu estudo está fornecendo uma visão extraordinária sobre os mecanismos<br />
que regem a plasticidade sináptica, novamente atraindo a atenção de pesquisadores<br />
que trabalham na fronteira do conhecimento.<br />
ABSTRACT<br />
Objective: The aim of this work is to provide an actualized review in Portuguese language of the<br />
main clinical and behavioral features and in particular of the genetic and molecular aspects of<br />
Angelman syndrome, a cause of severe intellectual disability, which in rare cases can be recurrent<br />
in the family. Method: This paper is a literature review that used as a source of research, scientific<br />
papers with the terms “Angelman syndrome” or combined with UBE3A, clinical, genetics, and molecular<br />
in their title, retrieved trough the PubMed database. Among those, mainly review articles and<br />
original papers about cellular and molecular aspects of the pathology were selected, prioritarily,<br />
those published in the last ten years. Results: The term Angelman syndrome retrieved about 1100<br />
papers, including close to 240 review articles. During the last ten years there were over 600 publica-<br />
Recebido em<br />
29/6/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
18/10/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Departamento de Biologia Celular, Embriologia e Genética, Laboratório de Neurogenética<br />
do Desenvolvimento.<br />
2 Universidade do Oeste de Santa Catarina (UNOESC), Área de Ciências Biológicas e da Saúde.<br />
Endereço para correspondência: Angelica Francesca Maris<br />
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Centro de Ciências Biológicas, Departamento de Biologia Celular, Embriologia e Genética<br />
Trindade – 88040-900 – Florianópolis, SC, Brasil<br />
Tel.: (+55 48) 3721-9887<br />
E-mail: afmaris@gmail.com
322 Maris AF, Trott A<br />
revisão de literatura<br />
Keywords<br />
Angelman syndrome,<br />
UBE3A, mental retardation,<br />
intellectual disability,<br />
genetic imprinting, synaptic<br />
dysfunction.<br />
tions, with approximately 120 reviews, 50% of whom published in the last five years. The SciELO database<br />
was also searched and nine publications about the syndrome were found, three of which in<br />
Portuguese and no recent review article. Conclusion: After being one of the main causes to attract<br />
attention and stimulate studies to unravel the mechanisms of the genetic imprinting, Angelman<br />
syndrome is again in the spotlight because it is revealing itself as pathology of synaptic dysfunction.<br />
Albeit still long from understood, the molecular and cellular alterations in Angelman syndrome are<br />
allowing an extraordinary insight into the mechanisms which control synaptic plasticity.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Descrita pela primeira vez em 1965, pelo pediatra inglês Harry<br />
Angelman, a síndrome que atualmente leva seu sobrenome<br />
se caracteriza por retardo mental (RM) severo, acompanhado<br />
por incapacidade de falar palavras ou frases, andar atáxico<br />
desequilibrado e convulsões e pelo fato de seus portadores<br />
rirem excessivamente sempre que há um estímulo de<br />
qualquer natureza. Essas risadas inapropriadas, que ocorrem<br />
independentemente de um fato alegre, quase como um reflexo,<br />
além do andar vacilante, levou à denominação de “happy<br />
puppet syndrome” (síndrome da marionete feliz) para essa<br />
condição. Posteriormente, considerada pejorativa, foi renomeada<br />
de síndrome de Angelman (AS) 1 . As estimativas da incidência<br />
de AS variam de 1/10.000 a 1/40.000 nascimentos 2-4 .<br />
Em 1997, a causa da síndrome de Angelman foi relacionada<br />
à perda da função de UBE3A. O gene UBE3A, localizado<br />
no cromossomo 15, apresenta uma característica incomum,<br />
pois a transcrição desse gene não ocorre do alelo herdado<br />
do pai nos neurônios de pessoas normais, um mecanismo<br />
denominado de impressão genômica paterna (imprinting paterno),<br />
pois todas as pessoas dependem do alelo herdado da<br />
mãe para expressar a proteína UBE3A nessas células. Em todos<br />
os outros tecidos, a expressão de UBE3A ocorre de forma<br />
bialélica (dos alelos herdados de ambos os pais). A síndrome<br />
de Angelman se deve a alterações genéticas que impedem<br />
a produção de UBE3A do alelo materno, pois então não haverá<br />
a função dessa proteína nos neurônios. O produto do<br />
gene UBE3A codifica uma ubiquitina ligase, que é responsável<br />
por direcionar certas proteínas para degradação. Evidências<br />
recentes indicam que desbalanços na função de UBE3A comprometem<br />
a função e a plasticidade neuronal; quando não há<br />
atividade de UBE3A nos neurônios, desenvolve-se a síndrome<br />
de Angelman; já sua expressão aumentada está relacionada<br />
com sintomas de autismo 5,6 .<br />
Neste estudo, o objetivo foi revisar os principais mecanismos<br />
genéticos e moleculares envolvidos na patogênese<br />
e na fisiopatologia da síndrome de Angelman, delineando<br />
brevemente o impacto da síndrome no comportamento e<br />
desenvolvimento dos afetados.<br />
Aspectos clínicos e comportamentais da<br />
síndrome de Angelman<br />
As crianças com a síndrome de Angelman geralmente nascem<br />
com aparência e desenvolvimento inicial indistinguível<br />
de outros bebês saudáveis. A gestação costuma ser normal,<br />
os bebês nascem com tamanho e peso normais e, em geral,<br />
não há nenhum indício que possa levar os pais ou os médicos<br />
pediatras a suspeitarem de qualquer anormalidade 2-4 .<br />
Somente entre 6 meses e 1 ano é que começa a aparecer o<br />
retardo em seu desenvolvimento. Talvez um dos primeiros<br />
indícios seja a facilidade em sorrir e rir. Já muito cedo essas<br />
crianças sorriem mais que o usual, um fato inexplicável até<br />
o momento. Sinais de hipotonia podem se manifestar com<br />
dificuldades para sucção e deglutição, dificultando a alimentação.<br />
Além do retardo em todos os marcos do desenvolvimento,<br />
hiperatividade, risadas explosivas, ausência de linguagem<br />
verbal (restrita à sonorização de três a cinco sílabas<br />
e raramente quatro a cinco palavras) e o aparecimento de<br />
crises convulsivas, que ocorrem em 80% dos casos, geralmente<br />
antes dos 4 anos de idade, podem levar o médico<br />
a diagnosticar a AS 1,2,7-9 . Porém, a idade média de diagnóstico<br />
gira em torno dos 6 anos de idade e muitos pais ficam<br />
anos à procura de respostas 2 . O comportamento de alegria<br />
contagiante das crianças afetadas, sua disposição social e a<br />
facilidade de satisfazer emocionalmente a criança com AS<br />
também podem levar muitos pais a ignorarem por bastante<br />
tempo a condição 10 . Um dos sinais diagnósticos típicos é um<br />
padrão de eletroencefalograma (EEG) característico, com ondas<br />
trifásicas amplas e picos lentos 2 .<br />
O desenvolvimento motor dos portadores da AS mostra<br />
déficits desde os 6 ou 7 meses de idade, com atraso nos marcos<br />
mais característicos. Raramente sentam sem apoio antes<br />
do primeiro ano de vida e geralmente só conseguem andar<br />
sozinhos em torno dos 4 anos de idade ou mais, e cerca de<br />
10% não desenvolvem ambulação 10 . O seu andar é característico,<br />
desajeitado, como que desequilibrado, com frequência<br />
sendo acompanhado por tremores, com os braços posicionados<br />
com cotovelos flexionados, os antebraços erguidos e as<br />
mãos flexionadas para baixo. Todos apresentam dificuldade<br />
em coordenar a musculatura motora voluntária e possuem<br />
hipotonia do tronco e ao mesmo tempo contratividade de<br />
membros. A hiperatividade e a hiperexcitabilidade estão em<br />
100% dos casos, sendo que reagem aos menores estímulos físicos<br />
e mentais com explosões descontroladas de risos, vocalizações<br />
(gritos de excitação) e com agitação (abano) das mãos.<br />
Apesar de esse comportamento ser descrito como um mero<br />
reflexo motor, tem-se a impressão de que os afetados tendem<br />
a se sentir felizes e satisfeitos, exceto quando não estão conseguindo<br />
comunicar um desejo.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
evisão de literatura<br />
A patogênese da síndrome de Angelman<br />
323<br />
Por causa de sua hiperatividade, as crianças pequenas<br />
com AS sempre estão manuseando algum brinquedo e o<br />
colocando na boca, assim como os próprios dedos. Mais tarde,<br />
é comum empurrarem, puxarem cabelos, beliscarem e<br />
morderem outras crianças. Mesmo sem nada na boca, são<br />
frequentes os movimentos de mastigação, e sua dificuldade<br />
com a deglutição pode levá-los a apresentar sialorreia (escape<br />
oral de saliva) em graus variados. Além das dificuldades<br />
com alimentação, hiperatividade e hiperexcitabilidade, os<br />
distúrbios do sono também são muito comuns em pacientes<br />
com a síndrome, tornando-se um transtorno para toda a<br />
família e por isso é frequente que sejam administradas medicações<br />
para dormir 9 . Principalmente na infância, há grande<br />
dificuldade para pegar no sono e muita facilidade para acordar<br />
e uma aparente necessidade de somente cinco a seis horas<br />
de sono por noite, sem que isso perturbe a sua disposição<br />
e atenção durante o período de vigília 11,12 .<br />
Os indivíduos com AS atingem uma idade mental e funcional<br />
máxima considerada equivalente a 12 e 30 meses de<br />
idade 1,10,13 . Sua capacidade de compreensão é muito maior<br />
que sua capacidade de verbalização. Parece haver influência<br />
do tipo de mutação nessa condição, e os mais comprometidos<br />
são aqueles com deleções mais extensas, que se caracterizam<br />
pela ausência total de linguagem, seguidos pelos<br />
que têm mutação no gene UBE3A, que podem chegar a falar<br />
duas a cinco sílabas e, eventualmente, três a quatro palavras.<br />
Os menos afetados são os portadores de dissomia uniparental,<br />
cujo vocabulário pode chegar a mais de dez palavras, porém<br />
nunca há aquisição de linguagem verbal com mais de<br />
algumas palavras, exceto para casos de mosaicismo somático.<br />
A ausência de linguagem verbal associada ao comportamento<br />
de risadas reativas e descontroladas e a ausência de<br />
regressão nas habilidades adquiridas tendem a ser marcos<br />
inconfundíveis da síndrome, servindo quase sempre para a<br />
suspeita inicial de diagnóstico.<br />
Com o passar dos anos, a hiperatividade característica<br />
diminui e aumenta a capacidade prestar atenção e de seguir<br />
ordens simples. A maioria desenvolve comunicação suficiente<br />
para demonstrar sua vontade e fazer escolhas, como<br />
o que quer comer ou vestir. Portadores da AS podem aprender<br />
a se comunicar mais com gestos que com a linguagem<br />
verbal e há relato de que, mesmo com esforços consistentes<br />
para intervir no desenvolvimento da linguagem verbal, o sucesso<br />
é praticamente nulo. Por isso, a intervenção no quesito<br />
comunicação deveria se concentrar no desenvolvimento da<br />
capacidade de comunicação não verbal, ensinando-se comunicação<br />
com utilização de imagens, fotos e gestos, uma<br />
vez que a frustração com a incapacidade de comunicar seus<br />
desejos ou expressar sua contrariedade são as principais causas<br />
que originam comportamentos agressivos em portadores<br />
de AS 14,15 .<br />
Os indivíduos com AS necessitam de suporte intenso<br />
por toda a vida e de supervisão durante as 24 horas do dia.<br />
Apesar de desenvolverem certa independência para realizar<br />
algumas atividades, não têm noção de perigo e tendem a<br />
sempre necessitar de ajuda para realizar as tarefas mais básicas,<br />
como tomar banho, escovar os dentes, comer e vestir-se.<br />
Muitos aprendem a se despir e a manusear talheres<br />
simples, especialmente colheres. Um terço a 50% aprendem<br />
a utilizar o banheiro durante o dia, porém é comum molharem<br />
a cama à noite 2,11 . Podem exibir hipersensibilidade ao<br />
calor e uma das características marcantes em portadores da<br />
AS é sua fascinação por água, não sendo incomum jogarem-<br />
-se em uma piscina com roupa. Gostam de ver fotos, escutar<br />
música alta – inclusive para dançar –, assistir à TV, assim<br />
como manusear plásticos brilhantes ou papéis metalizados,<br />
como as embalagens de salgadinhos, balões e outros brinquedos<br />
que chamam atenção e não exigem coordenação<br />
motora fina.<br />
A entrada na puberdade ocorre no período normal, assim<br />
como o desenvolvimento sexual 16 . Indivíduos com AS<br />
são férteis e há ao menos um caso relatado de uma mulher<br />
com AS transmitindo a mutação para uma filha 17 . Sua<br />
expectativa de vida sob cuidados é considerada normal,<br />
porém, após os 50 anos, podem apresentar distonia ou parkinsonismo<br />
10 .<br />
Características físicas típicas dos portadores da<br />
síndrome de Angelman<br />
Apesar de indistinguíveis de bebês normais ao nascimento,<br />
80% dos portadores da AS apresentam atraso no crescimento<br />
cefálico, que resulta em microcefalia aos 2 anos de idade<br />
e, conforme crescem, muitos se caracterizam por prognatismo,<br />
com queixo proeminente, boca larga, com o lábio superior<br />
fino, a língua protusa e os dentes espaçados. A cabeça<br />
mais achatada no sentido anteroposterior também é achado<br />
comum. Muitos adultos desenvolvem obesidade devido a<br />
uma ingesta calórica grande (adoram comer) e uma relativa<br />
relutância em caminhar ou participar de atividades esportivas,<br />
mas também surge como efeito colateral de anticonvulsivantes<br />
1,4,18 .<br />
Entre os portadores de deleções que incluem o gene P, é<br />
comum a hipopigmentação da pele, dos olhos e da retina e<br />
uma alta proporção de estrabismo. O gene P, necessário para<br />
pigmentação normal, fica próximo ao gene UBE3A e codifica<br />
um transportador de membrana para pequenas moléculas,<br />
provavelmente envolvido no transporte de tirosina, precursora<br />
de melanina, nos melanócitos 19 .<br />
Síndrome de Angelman e autismo<br />
Alguns autores consideram que uma parte dos afetados<br />
por AS apresenta autismo, já que no autismo como na AS<br />
há ausência de linguagem e atraso no desenvolvimento<br />
social, satisfazendo alguns dos critérios mais relevantes.<br />
Porém, as controvérsias a esse respeito são muitas. Ao contrário<br />
dos autistas, é notória a disposição para interação<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
324 Maris AF, Trott A<br />
revisão de literatura<br />
social nos portadores de AS, mesmo que não desenvolvam<br />
muitas habilidades sociais 20 . Na realidade, são os casos<br />
mais graves, com maior comprometimento cognitivo, que<br />
se enquadrariam melhor no diagnóstico autista, porém<br />
há autores que alertam que para qualquer condição que<br />
resulta em uma deficiência intelectual profunda ou idade<br />
mental abaixo de 12 meses de idade é difícil a diferenciação<br />
do autismo com base nos critérios utilizados 21,22 . Vale<br />
mencionar que alterações na expressão do gene UBE3A<br />
têm apresentado uma relação com o autismo, mas o mecanismo<br />
seria justamente oposto ao que causa a AS, uma<br />
vez que cerca de 1% dos indivíduos com autismo apresenta<br />
duplicação da região do cromossomo 15 que contém o<br />
gene UBE3A. Portanto, a atividade aumentada (e não deficiente)<br />
de UBE3A poderia ser responsável pelos sintomas<br />
de autismo nessas pessoas 5,6 .<br />
O gene UBE3A<br />
Esse gene codifica a E6-AP ubiquitina ligase humana, um<br />
membro de uma classe de ubiquitina-proteína ligases funcionalmente<br />
relacionadas às E3 ubiquitina ligases definido<br />
por um domínio carboxiterminal denominado de HECT (Homologous<br />
to the E6-AP CarboxiTerminus) 23 . As proteína-ligases<br />
E3 participam de um sistema de degradação proteica não<br />
lisossomal, por meio da via ubiquitina-proteossoma, que é<br />
responsável pela degradação da maioria das proteínas e de<br />
vida curta, cuja síntese e eliminação são reguladas, assim<br />
como daquelas envolvidas em processos de sinalização celular,<br />
progressão do ciclo celular e reparação de DNA, além<br />
de também degradar proteínas anormais 24,25 . O sistema de<br />
ubiquitinização envolve a ação coordenada de três enzimas:<br />
enzimas ativadoras de ubiquitina (E1), enzimas conjugadoras<br />
de ubiquitina (E2) e (E3) proteínas ligases. As enzimas E3<br />
parecem ser críticas para definir que substrato será ubiquitinado,<br />
e aquelas com domínio HECT formam intermediários<br />
com os substratos para que estes possam receber a ubiquitina<br />
da proteína E2 23,26,27 .<br />
Além de seu papel como ubiquitina ligase, cuja função<br />
depende do domínio HECT e de um domínio de transativação<br />
localizados na porção C-terminal da proteína, o produto<br />
do gene UBE3A também funciona como coativador de transcrição<br />
pela família de receptores nucleares de hormônios.<br />
A atividade de coativador reside em um domínio localizado<br />
na porção terminal N-terminal de E6-AP, que, na maioria dos<br />
pacientes com AS por mutação em UBE3A, se encontra intacta,<br />
por isso não é considerada relevante para a patogênese<br />
da condição 28 .<br />
As alterações gênicas que causam a síndrome de<br />
Angelman<br />
A grande maioria dos casos da síndrome de Angelman é<br />
causada por quatro mecanismos genéticos distintos, definidos<br />
como classes de mutação I a IV, todos resultando em<br />
uma ausência de expressão do gene UBE3A materno, localizado<br />
na região 15q13. Em uma quinta classe – classe V –, são<br />
incluídos aqueles casos impossíveis de serem enquadrados<br />
nas classes anteriores 2 .<br />
A classe de mutação I representa 70%-75% dos casos de<br />
AS e envolve uma deleção na região 15q11-13 cujo tamanho<br />
varia, mas a maioria é de 4 Mb e ocorre em pontos de quebra<br />
típicos, provavelmente por crossing-over desigual devido à<br />
presença de sequências repetitivas nessa região. Essas deleções<br />
costumam representar mutações novas, geradas na<br />
gametogênese da mãe, e resultam na ausência da expressão<br />
de UBE3A do alelo materno. Quando a mesma deleção<br />
é herdada do pai, o indivíduo não desenvolve a síndrome de<br />
Angelman, mas a síndrome de Prader-Willi (PW) que não está<br />
relacionada ao gene UBE3A e seus portadores apresentam<br />
problemas mais leves.<br />
As mutações de classe II representam 2%-3% dos afetados<br />
e são devidas à dissomia uniparental do cromossomo<br />
paterno. Os mecanismos pelos quais essa dissomia ocorre<br />
são discutidos, havendo evidências de não disjunção meiótica,<br />
porém a maioria parece se dever a eventos pós-zigóticos<br />
e tendem a envolver o cromossomo inteiro. Nesse caso, ambos<br />
os cromossomos 15 apresentam padrão de imprinting<br />
paterno e o gene UBE3A não é expresso.<br />
A terceira classe de mutações, que representa 3%-5%<br />
dos casos de Angelman, é causada por alterações no padrão<br />
de metilação do cromossomo 15 materno e se deve<br />
a alterações no centro de imprinting envolvendo AC-SRO<br />
(Figura 1), de forma que resulta em um padrão de imprinting<br />
genômico paterno para ambos os cromossomos 15<br />
herdados.<br />
A classe IV se deve a mutações que envolvem somente<br />
o gene UBE3A, representando 5% a 10% dos casos identificados.<br />
A grande maioria das mutações identificadas se deve<br />
a pequenas deleções ou inserções que podem causar um<br />
deslocamento do quadro de leitura e geralmente levam a<br />
códons de terminação precoces, truncando a porção carboxiterminal<br />
da proteína codificada, e algumas são mutações<br />
de sentido trocado, que alteram apenas um ou dois aminoácidos<br />
da proteína codificada.<br />
Estrutura gênica de UBE3A<br />
O gene UBE3A apresenta 16 éxons que se estendem por<br />
aproximadamente 120 kb e é transcrito no sentido do centrômero<br />
para o telômero no braço longo do cromossomo<br />
15. Esse gene codifica para um número ainda não totalmente<br />
definido de isoformas, e ao menos cinco mRNAs<br />
distintos foram descritos, resultado de um processamento<br />
alternativo complexo da porção 5’ do transcrito primário 29 .<br />
Esse processamento pode levar à utilização de inícios de<br />
tradução alternativos, localizados nos éxons 4, 5 e 7-8 (Figura<br />
2).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
evisão de literatura<br />
A patogênese da síndrome de Angelman<br />
325<br />
Figura 1. Região cromossômica em 15q11-13. PAT: representando alelos expressos do cromossomo paterno (caixas escuras, no<br />
cromossomo do alto), e em cinza-claro os alelos com imprinting paterno (UBE3A e ATP10A). MAT: representando alelos expressos do<br />
cromossomo materno com caixas escuras (UBE3A e ATP10A) e em cinza-claro os alelos com imprinting materno. Seta representando<br />
a orientação da região cromossômica do trecho representado. Fonte: Adaptado de Lalande e Calciano, 2007 34 .<br />
Figura 2. Organização gênica de UBE3A, representando éxons 1-16, em escala proporcional, e os locais alternativos de iniciação<br />
de tradução (códons ATG), nos éxons 4, 5 e 7-8. Fonte: Adaptada de Lossie et al., 2001 18 .<br />
Impressão genômica (imprinting) e o gene<br />
UBE3A<br />
A impressão genômica ou o imprinting genômico (termo<br />
que na prática é mais utilizado e também será utilizado neste<br />
texto) marca a origem parental de cromossomos, de regiões<br />
cromossômicas ou de genes, resultando em padrões<br />
de expressão diferencial de até 100 genes identificados até<br />
o momento, sem alterar a sequência de bases no DNA. Mecanismos<br />
epigenéticos como metilação de DNA e modificações<br />
em histonas são os responsáveis por estabelecer o<br />
imprinting genômico, que inicialmente se pensava ocorrer<br />
somente em mamíferos placentários. Os genes que sofrem<br />
imprinting tendem a ter o alelo “imprintado” silenciado,<br />
portanto apresentam expressão monoalélica; aqueles com<br />
imprinting paterno somente se expressam do alelo materno<br />
e os com imprinting materno têm sua expressão apenas do<br />
alelo paterno 30 . Esse processo pode ser mais comum do que<br />
se imagina e já foi verificado em várias espécies de insetos<br />
e em plantas 31 . Talvez a principal razão para a evolução do<br />
imprinting genômico seja para servir como mais uma barreira<br />
à reprodução assexual ou partenogênica 32 . Curiosamente,<br />
vários dos genes regulados por esse mecanismo no início<br />
do desenvolvimento fetal estão envolvidos na alocação de<br />
recursos da mãe para o feto, e há uma teoria muito aceita de<br />
que o imprinting evoluiu como uma “disputa” de genomas<br />
paternos de mamíferos poligâmicos para alocar o máximo<br />
de recursos da mãe para seu descendente e a defesa da mãe<br />
para conservar recursos suficientes para garantir a sua sobrevivência<br />
e de outros filhos 30 .<br />
Acredita-se que a maioria dos genes exibe o padrão de<br />
imprinting genômico em todas as células do organismo ao<br />
longo de sua existência. Porém, mais recentemente se verificou<br />
que o imprinting pode reger a expressão diferencial<br />
de alelos, dependendo de sua origem paterna ou materna<br />
de forma não somente tecido-específica, mas também de<br />
forma diferencial em vários estágios do desenvolvimento<br />
embrionário 30 .<br />
A região 15q11-13, deletada no cromossomo materno da<br />
maioria dos pacientes com AS, contém uma série de genes<br />
sujeitos à impressão genômica materna ou paterna. Quando<br />
essa região está ausente (deletada) no cromossomo paterno,<br />
origina a síndrome de Prader-Willi, caracterizada por hipoto-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
326 Maris AF, Trott A<br />
revisão de literatura<br />
nia neonatal, atraso no crescimento, hiperfagia desde a infância<br />
que resulta em obesidade, baixa estatura, mãos e pés<br />
pequenos, hipogonadismo, problemas de comportamento<br />
e RM de leve a moderado 33 . A ausência da mesma região no<br />
cromossomo materno causa a síndrome de Angelman, cujas<br />
consequências no desenvolvimento mental e funcional são<br />
bem mais graves. O desenvolvimento de PW depende da<br />
ausência da expressão de vários genes da região no alelo paterno,<br />
enquanto para AS a ausência específica da expressão<br />
do gene UBE3A do alelo materno causa a condição.<br />
A regulação dessa região do cromossomo 15 parece ser<br />
coordenada por um centro de impressão genômica (PW/AS-<br />
-IC) com dois elementos funcionais, denominados PW-SRO<br />
e AS-SRO (SRO está para shortest region of overlap: região de<br />
mínima sobreposição entre todas as deleções que causam a<br />
condição por mecanismos que afetam o padrão de impressão<br />
genômica) 34,35 .<br />
A PW-SRO é uma região de 4,1 kb, que contém o promotor<br />
e o primeiro éxon do gene SNRP. Um cromossomo 15<br />
sem a PW-SRO se apresenta com o padrão de expressão de<br />
cromossomo de origem materna independentemente de<br />
ter sido transmitido pelo pai ou pela mãe, não expressando<br />
os vários genes do cromossomo que sofrem impressão<br />
genômica materna. Normalmente, a PW-SRO sofre metilação<br />
pós-zigótica (dependente de AS-SRO) no cromossomo<br />
de origem materna, permitindo a metilação secundária dos<br />
genes de impressão genômica materna da região 15q11-13,<br />
enquanto no cromossomo paterno PW-SRO não é metilado,<br />
conseguindo evitar a metilação dos alelos paternos daqueles<br />
genes.<br />
O AS-SRO representa uma região de 880 pb, distante 35 kb<br />
do éxon 1 de SNRPN, em direção ao centrômero. Essa região<br />
contém éxons u5 e u6 localizados antes da origem de transcrição<br />
usual de SNRPN, que estão presentes em uma proporção<br />
muito pequena de transcritos alternativos de SNRPN.<br />
A AS-SRO é necessária para estabelecer o padrão de expressão<br />
materno (essencial para expressão de UBE3A) de seu<br />
cromossomo somente quando a PW-SRO está funcional.<br />
Em caso de deleção ou metilação de PW-SRO, a função de<br />
AS-SRO é dispensável (Figura 1) 34,35 .<br />
O mecanismo de impressão genômica secundária de<br />
UBE3A difere funcionalmente da maioria dos genes da região<br />
por somente ser estabelecida em neurônios do cérebro<br />
e não apresentar alterações epigenéticas em seu DNA ou<br />
histonas que diferenciem sua origem parental. Foi reportado<br />
que o silenciamento da cópia paterna de Ube3a (camundongo)<br />
se deve a um transcrito de sentido contrário (antisense)<br />
ao gene Ube3a, expresso somente em neurônios cerebrais<br />
exclusivamente do cromossomo de origem paterna 36 . Porém,<br />
dados mais recentes contradizem esse fato, e o exato<br />
mecanismo de silenciamento do gene Ube3a ainda não está<br />
totalmente esclarecido 34,37 .<br />
Os alvos de UBE3A e efeitos da falta de expressão<br />
de UBE3A nas células<br />
Alguns dos alvos de ubiquitinização por UBE3A são conhecidos,<br />
como o supressor de tumor p53 38,39 , porém não parece<br />
ser esse o responsável pela síndrome. Apesar de, até pouco<br />
tempo atrás, nenhum alvo direto de ubiquitinização identificado<br />
esclarecer o fenótipo apresentado por afetados com<br />
AS, estudos em camundongo revelaram que a deficiência de<br />
UBE3A resulta em um aumento da fosforilação inibitória da<br />
proteína kinase dependente de cálcio/calmudolina tipo 2<br />
(CaMKII) e diminui sua concentração no terminal pós-sináptico<br />
40 . Isso pode indicar que a proteína kinase responsável<br />
pela fosforilação inibitória da CaMKII seja alvo de degradação<br />
regulada por UBE3A, que não ocorreria nos camundongos<br />
mutantes. Conhecida por seus efeitos na modulação<br />
da plasticidade neuronal, aprendizado e memória, a CaMKII<br />
também é essencial para o aprendizado motor cerebelar e<br />
a plasticidade de células de Purkinje 41 . Sua ativação provoca<br />
crescimento de filopódia e formação de espinhas dendríticas<br />
e sua inibição resulta na perda delas. Camundongos<br />
duplo-mutantes para AS e para uma mutação em CaMKII<br />
que impede a sua fosforilação inibitória demonstraram uma<br />
diminuição de 60% na incidência de crises convulsivas em<br />
relação a camundongos somente AS e uma reversão praticamente<br />
total para os fenótipos cognitivos, motores dos<br />
animais, assim como para os déficits severos no estímulo de<br />
potenciação de longa duração (LTP) verificada em hipocampo<br />
de camundongos AS. Isso sugere que a proteína kinase<br />
que provoca a fosforilação inibitória em CaMKII ou alguma<br />
proteína necessária para a via de fosforilação inibitória seja<br />
substrato de degradação por meio de UBE3A sempre que<br />
há a necessidade de ativar CaMKII. Os duplo-mutantes (AS e<br />
CaMKII mutada), que apresentam a atividade de degradação<br />
de proteínas regulada por UBE3A disfuncional, porém possuem<br />
uma CaMKII mutada de forma que não possa ocorrer a<br />
inibição por fosforilação, também não apresentam o aumento<br />
médio em 20% no peso visto em camundongos que somente<br />
têm a mutação AS 42 . Até que ponto esses resultados<br />
podem ser extrapolados para seres humanos não está claro,<br />
porém, fornecem um forte indicativo de um papel importante<br />
da CaMKII na fisiopatologia da síndrome de Angelman.<br />
Em 2010, finalmente alguns substratos de UBE3A que podem<br />
explicar os déficits cognitivos na AS foram identificados.<br />
Pesquisadores do grupo de Michael Greenberg (Harward<br />
Medical School) descobriram que UBE3A regula o desenvolvimento<br />
de sinapses excitatórias por meio do controle da<br />
degradação de ARC, uma proteína sináptica que promove a<br />
interiorização de receptores de glutamato do subtipo AMPA.<br />
Portanto, se não houver UBE3A nos neurônios, haverá mais<br />
proteína ARC, o que resulta em um aumento na interiorização<br />
(portanto, em uma diminuição no número) de receptores<br />
AMPA nas sinapses excitatórias. Desse modo, a desregulação<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
evisão de literatura<br />
A patogênese da síndrome de Angelman<br />
327<br />
da expressão dos receptores AMPA nas sinapses, importante<br />
para definir se uma sinapse será potenciada ou deprimida,<br />
pode ser uma das principais causas para a disfunção cognitiva<br />
que ocorre na síndrome de Angelman 43,44 . Outra proteína<br />
cuja degradação é regulada por UBE3A, a Ephexin-5 (Efexina-5),<br />
foi descoberta pelo mesmo grupo 45 . A Efexina-5 atua<br />
como uma proteína ativadora de RhoA, que é uma pequena<br />
proteína sinalizadora da família das proteínas G, que em seu<br />
estado ativo limita a formação de novas sinapses por antagonizar<br />
com a ação de Rac, outra proteína G sinalizadora, cuja<br />
função, porém, é estimular o desenvolvimento de espículas<br />
sinápticas. Após estímulo adequado, a Efexina-5 é fosforilada,<br />
ubiquitinada (marcada para degradação) via UBE3A e degradada,<br />
liberando, assim, Rac para agir no desenvolvimento<br />
sináptico. Na ausência da ação de UBE3A, a degradação da<br />
Efexina não ocorre de forma adequada, prejudicando a plasticidade<br />
sináptica.<br />
Expressão e função do gene UBE3A na estrutura<br />
cerebral e neuronal<br />
Os primeiros estudos de expressão do gene UBE3A verificaram<br />
expressão bialélica (do alelo materno e paterno) em<br />
linfócitos e fibroblastos humanos em cultura 46 , o que apresentou<br />
um paradoxo para os pesquisadores, uma vez que<br />
somente a ausência de um gene UBE3A funcional da cópia<br />
materna, mas não do alelo paterno, causava a síndrome. Até<br />
então existia a ideia generalizada de que o padrão de imprinting<br />
era estabelecido na gametogênese e que esse padrão<br />
seria expresso em todas as células do organismo 47 .<br />
Estudos com embriões humanos em estágio de pré-implantação<br />
(4 a 8 céls) constatam que o gene UBE3A já é expresso<br />
nessa fase, e provavelmente por ambos os alelos 48 . Análise<br />
direta em cérebros de fetos humanos e de afetados por AS<br />
com a deleção característica no cromossomo materno 49 demonstrara<br />
que o gene UBE3A sofre imprinting paterno específico<br />
no cérebro, e não em outros tecidos. Para analisar esse<br />
fenômeno mais em detalhe, os pesquisadores se valeram de<br />
modelos animais, mais especificamente de camundongos.<br />
Em 1997, um grupo de pesquisadores demonstrou um modelo<br />
de AS em camundongo devido à dissomia uniparental<br />
do cromossomo paterno que porta o gene Ube3a. Como as<br />
duas cópias de Ube3a neste caso sofrem imprinting paterno,<br />
não ocorre a expressão do alelo materno 50 . Isso tornou<br />
viável utilizar o camundongo como modelo para examinar<br />
a expressão de Ube3a em subgrupos específicos de células<br />
cerebrais e também durante o desenvolvimento embrionário.<br />
Em camundongos normais, ao contrário do relatado para<br />
embriões humanos, não foi detectada a expressão de Ube3a<br />
bem no início da fase embrionária até os 7,5 dias, somente<br />
a partir de 8,5 dias foi detectada a expressão no neuroepitélio<br />
e em vários tecidos mesenquimais, incluindo os arcos<br />
branquiais, que foi sendo vista na maioria dos tecidos analisados<br />
no decorrer do desenvolvimento do embrião 50 . Nessas<br />
fases, os autores não estabeleceram o padrão de expressão<br />
de Ube3a em camundongos com dissomia paterna para<br />
comparação, mas o fizeram em cérebros de camundongos<br />
adultos de 7-9 meses. Nestes, foram encontradas diferenças<br />
de expressão para grupos celulares específicos, mas nos mutantes<br />
não foi detectada expressão de Ube3a em neurônios<br />
do hipocampo e células Purkinje e uma expressão diminuída<br />
no córtex cerebral. No restante das regiões cerebrais e outros<br />
tecidos, não foram detectadas diferenças na expressão<br />
entre camundongos normais e mutantes, levando a concluir<br />
que nestes o gene Ube3a é expresso de forma bialélica. Os<br />
autores não detectaram diferenças histopatológicas entre as<br />
estruturas de animais com e sem a expressão do alelo materno.<br />
Atualmente se acredita que a expressão de Ube3a nos<br />
nichos de células-tronco que revestem os ventrículos laterais<br />
e no giro dentado da formação do hipocampo, assim como<br />
células progenitoras de neurônios e neurônios imaturos,<br />
ocorre de forma bialélica. A expressão monoalélica (exclusivamente<br />
do alelo materno) parece ser estabelecida somente<br />
no decorrer da maturação dos neurônios 51 .<br />
Para esclarecer se o imprinting de Ube3a era específico<br />
para regiões cerebrais ou se era específico de tipos celulares,<br />
Yamasaki et al. analisaram a expressão desse gene em<br />
culturas de células cerebrais (neurônios e células gliais) de<br />
camundongos normais e de camundongos com a mutação<br />
para AS. Foi verificado que, no cultivo de células neuronais,<br />
a expressão do gene Ube3a ocorria somente quando havia a<br />
expressão do alelo materno, enquanto nas células gliais (astrócitos)<br />
a expressão era bialélica 36 .<br />
Dindot et al. analisaram a expressão em detalhes ainda<br />
mais específicos, com o objetivo de localizar não somente as<br />
células que expressam o gene em seu contexto cerebral, mas<br />
encontrar a localização subcelular de UBE3A, assim como os<br />
efeitos da ausência da proteína na microestrutura neuronal 52 .<br />
Para tal, esses autores fusionaram o gene Ube3a de camundongo<br />
à proteína fluorescente amarela (UBE3A-YFP) e verificaram<br />
por imunoistoquímica que Ube3a é expressa quase<br />
exclusivamente do alelo materno em neurônios cerebrais de<br />
todas as regiões do cérebro em camundongos normais. Essa<br />
expressão ocorre em níveis mais elevados nas células piramidais<br />
do hipocampo e do córtex e nas células Purkinje do cerebelo,<br />
do que nas células gliais que delimitam os ventrículos<br />
o gene é expresso de forma bialélica. Em astrócitos de outras<br />
regiões do cérebro, não foi encontrada expressão da proteína<br />
codificada por Ube3a. A análise da localização subcelular<br />
de UBE3A demonstrou alta concentração no núcleo de todas<br />
as células em que é expressa, distribuição menos concentrada<br />
pelo corpo celular com concentração maior nos<br />
cones de crescimento dos neurônios e nos compartimentos<br />
pré e pós-sinápticos. Esses autores confirmaram a aparência<br />
normal da arquitetura celular do cérebro e da arborização<br />
dendrítica dos neurônios em camundongos mutados, porém<br />
encontraram nesses neurônios espinhas dendríticas de<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
328 Maris AF, Trott A<br />
revisão de literatura<br />
formato anormal e com tamanho e densidade reduzida, assim<br />
como dendritos secundários mais delgados e com algumas<br />
regiões nodulares (Figura 3).<br />
Esses resultados levaram à conclusão de que UBE3A não<br />
afeta a neurogênese em si, mas parece ter um papel local<br />
para regular o desenvolvimento das espinhas dendríticas<br />
ou a plasticidade sináptica 52 , o que vai de encontro com o<br />
envolvimento da proteína kinase cálcio/calmudolina dependente<br />
do tipo II (CaMKII), conforme mencionado acima.<br />
A demonstração pelo grupo de Greenberg, de que a degradação<br />
regulada da proteína Arc e Efexina-5 depende de<br />
UBE3A, reforça o conceito emergente de que a síndrome de<br />
Angelman é uma síndrome de disfunção no desenvolvimento<br />
sináptico. O grupo de Philpot demonstrou que a UBE3A<br />
é necessária para a plasticidade neocortical e a plasticidade<br />
dependente de experiências in vivo, indicando que os déficits<br />
de aprendizado apresentados pelos indivíduos com a AS<br />
provavelmente se devem a uma rigidez sináptica severa 53 .<br />
O mesmo grupo, estudando o cérebro de camundongos<br />
que não expressam Ube3a materno, verificou que há uma<br />
severa diminuição de sinapses excitatórias no 21º dia do<br />
desenvolvimento pós-natal e que mais tarde no desenvolvimento<br />
também são encontradas diminuições severas no<br />
desenvolvimento de sinapses inibitórias, sendo que a ausência<br />
destas talvez explique a suscetibilidade a convulsões<br />
apresentadas pelos afetados pela síndrome 51 .<br />
Síndrome de Angelman, síndrome do X-frágil e a<br />
síndrome de Rett: três síndromes com alterações<br />
nas espinhas dendríticas<br />
Além da AS, ao menos duas outras patologias relacionadas<br />
com retardo mental são causadas por mutações que alteram<br />
a formação, morfologia ou densidade de espinhas dendríticas.<br />
Uma delas, a síndrome do X-frágil, é causada por mutações<br />
que abolem a expressão da proteína FMR1, envolvida<br />
no transporte e tradução local de mRNAs específicos junto<br />
a espinhas dendríticas 54-56 , e um dos mRNAs cuja tradução é<br />
regulada pela proteína FMR1 é o da proteína ARC 51 , considerada<br />
um dos alvos mais relevantes de UBE3A. A ausência de<br />
FMR1 causa aumento na densidade de espinhas dendríticas,<br />
porém a morfologia destas é anormal, sendo mais alongadas<br />
e sem o formato de cogumelo característico 57-59 . Na síndrome<br />
de Rett, cujo gene mutado é MECP2, que codifica para uma<br />
proteína ligadora a metil-CpG, que em neurônios age como<br />
repressor de transcrição na ausência de estímulo sináptico,<br />
há uma diminuição na densidade de espinhas dendríticas<br />
que também se apresentam imaturas (alongadas e sem o<br />
formato de cogumelo característico). Porém, a ausência de<br />
Mecp2 (camundongo), além da alteração na função sináptica,<br />
também afeta a orientação dos axônios de certos grupos<br />
celulares, resultando em sua desorganização 60 . Realmente, o<br />
efeito de mutações de perda de função em MECP2 tem efeito<br />
devastador; como esse gene se localiza no cromossomo X, a<br />
ausência de sua função tende a apresentar letalidade in utero<br />
para meninos, e meninas heterozigotas apresentam déficits<br />
variados dependendo da gravidade da mutação e do padrão<br />
de inativação do X. Ao contrário do que ocorre para as síndromes<br />
de Angelman e X-frágil, em que os afetados têm seu<br />
desenvolvimento prejudicado, porém não tendem a perder<br />
habilidades adquiridas, maior parte dos afetados pela síndrome<br />
de Rett, após desenvolvimento aparentemente normal<br />
durante os primeiros 6-18 meses de vida, apresenta graves<br />
sintomas de regressão cognitiva e funcional 61 .<br />
MÉTODO<br />
Figura 3. Morfologia alterada e densidade reduzida de<br />
espinhas dendríticas em neurônios Purkinje do cerebelo<br />
e em neurônios piramidais do hipocampo e do córtex de<br />
camundongos com deficiência materna para Ube3a, apesar<br />
de a arquitetura celular e de a quantidade de ramificações<br />
dendríticas aparentemente serem normais. Outras alterações<br />
verificadas se referem a ramificações dendríticas secundárias<br />
aparentemente mais finas com alguns nódulos mais largos<br />
(indicado pela ponta de seta) em neurônios piramidais.<br />
AS: camundongos com deficiência materna para Ube3a; WT:<br />
camundongos tipo selvagem; PC: células de Purkinje; HP:<br />
neurônios piramidais do hipocampo; CT: neurônios piramidais<br />
do córtex. Fonte: Imagem de Dindot et al., 2008 52 .<br />
Este trabalho é uma revisão bibliográfica que utilizou como<br />
fonte de pesquisa as bases de dados do PubMed e Medline,<br />
tendo como critérios de busca os termos “síndrome de Angelman”,<br />
de forma isolada e em combinações variadas com<br />
“UBE3A”, “genetics”, “clinic”, “molecular” e “review” no título dos<br />
artigos, com ênfase nos últimos dez anos. Dentre os artigos<br />
encontrados, foram selecionados, a critério dos autores, artigos<br />
de revisão para rever a parte clínica e comportamental<br />
da síndrome, assim como para rever os mecanismos genéticos<br />
que levam à alteração da função de UBE3A. Já para entender<br />
a parte da fisiopatologia molecular e celular, foram<br />
selecionados artigos originais, com ênfase nas descobertas<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
evisão de literatura<br />
A patogênese da síndrome de Angelman<br />
329<br />
dos últimos dez anos. Além desses, alguns outros trabalhos<br />
foram citados, por sua relevância para a discussão do tema.<br />
RESULTADOS<br />
Utilizando “Angelman syndrome” na busca, apareceram cerca<br />
de 1.100 artigos, incluindo 240 de revisão. Nos últimos dez<br />
anos, são mais de 600 artigos, aproximadamente 120 de revisão,<br />
50% dos quais publicados nos últimos cinco anos. Na<br />
base de dados SciELO, são apenas nove artigos sobre a síndrome,<br />
dos quais três em português e nenhum artigo atual<br />
de revisão. Conforme explicado em métodos, a escolha dos<br />
artigos utilizados nesta revisão foi feita pelos autores. A presente<br />
revisão não é exaustiva quanto a todas as mutações<br />
encontradas no gene UBE3A e nem quanto a todos os substratos<br />
encontrados para UBE3A. Foram incluídos e discutidos<br />
os substratos para os quais pode haver uma correlação<br />
com a fisiopatologia dos afetados, um destaque que não é<br />
exclusividade dos presentes autores. As figuras foram incluídas<br />
pelo seu poder de ilustrar e tornar mais compreensível<br />
a parte genética do artigo. A fotografia dos dendritos com<br />
suas espículas sinápticas explica o que palavras são pobres<br />
para explicar. Nos últimos dois anos, a disfunção de algumas<br />
condições clínicas de deficiência intelectual está sendo traçada<br />
para a sinapse e está servindo para esclarecer muitos<br />
pontos desconhecidos da formação, modulação e manutenção<br />
delas.<br />
CONCLUSÃO<br />
Após ter sido uma das principais causas para o estudo mais<br />
aprofundado dos mecanismos do imprinting genômico, a<br />
síndrome de Angelman está se revelando como uma patologia<br />
das sinapses. A utilização de modelos animais para a<br />
síndrome de Angelman e a possibilidade de cultivar células<br />
deficientes na expressão materna de UBE3A estão levando<br />
ao reconhecimento de proteínas cuja degradação é comprometida<br />
nessas células, permitindo estudar sua expressão,<br />
localização e função, assim como as alterações micromorfológicas<br />
apresentadas pelos neurônios afetados. Apesar de<br />
o conhecimento da fisiopatologia molecular da síndrome<br />
de Angelman ser muito recente, e seu entendimento estar<br />
apenas começando a ser desvendado, seu estudo está fornecendo<br />
uma visão extraordinária sobre os mecanismos que<br />
regem a plasticidade sináptica.<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):321-30.
evisão de literatura<br />
Revisão dos métodos empregados na<br />
avaliação da dimensão corporal em<br />
pacientes com transtornos alimentares<br />
Review of methods employed in the assessment of<br />
body size in patients with eating disorders<br />
Bianca Elisabeth Thurm 1 , Maria Luiza de Jesus Miranda 2 , Fabio Tapia Salzano 3 , Raphael Cangelli Filho 3,4 ,<br />
Táki Athanássios Cordás 3 , Eliane Florêncio Gama 1<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Imagem corporal, distorção<br />
da percepção, percepção<br />
de tamanho, transtorno<br />
alimentar.<br />
Objetivo: O presente artigo analisou os métodos de avaliação da percepção da dimensão<br />
corporal abordados na literatura científica. Método: Foram utilizadas a palavra-chave “body<br />
image” e a combinação desta com os termos “size perception” e “size estimation”, nas bases de<br />
dados Medline, Bireme, EBSCO e SCOPUS, para o levantamento científico. O período considerado<br />
para essas buscas foi de 1975 a 2010. Resultados: Foram encontrados quatro métodos<br />
que avaliam e quantificam a percepção dimensional do corpo, aplicando-se um índice de<br />
percepção da dimensão corporal. Os métodos diferem em sua forma de execução, utilização<br />
de instrumentos, uso ou não de feedback visual por parte do avaliado, utilização de estímulo<br />
tátil ou não para gerar a resposta do avaliado. Conclusão: O Image Marking Procedure (IMP)<br />
mostrou-se apropriado para a avaliação da dimensão corporal nos distúrbios alimentares,<br />
pela possibilidade de avaliar o grau de distorção corporal e dos segmentos corporais específicos<br />
sem a interferência visual, cognitiva e qualquer referencial externo comparado aos<br />
outros testes que mostraram limitações quanto a esses aspectos. Sugere-se que ele seja utilizado<br />
em futuras pesquisas que avaliem o aspecto dimensional da percepção corporal.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Body image, perceptual<br />
distortion, size perception,<br />
eating disorders.<br />
Recebido em<br />
25/7/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
25/10/<strong>2011</strong><br />
Objective: This paper analyzed the methods of assessing the perception of body size discussed in<br />
scientific literature. Method: The information search was bases on computerized databases from<br />
1975 to 2010 (Medline, Bireme, EBSCO and Scopus). We used the keyword “body image” and the<br />
combination of the terms “size perception” and “size estimation” for the scientific survey. Results:<br />
There were four methods found to evaluate and quantify the dimensional perception of the body<br />
by applying a body perception index. The methods differ in their form of execution, use tools, whether<br />
or not visual feedback from the evaluation, use of tactile stimulation or not to generate the<br />
response evaluated. Conclusion: The Image Marking Procedure (IMP) was appropriate for the<br />
evaluation of body size on eating disorders by the possibility of evaluating the degree of distortion<br />
of the body and specific body segments without visual and cognitive interference and any external<br />
referent compared to other tests that showed limitations on these aspects. We suggest that the IMP<br />
test could be used in future researches to assess the dimensional aspect of body perception.<br />
1 Universidade São Judas Tadeu (USJT), Departamento de Fisioterapia, Laboratório de Percepção Corporal e Movimento Humano da USJT.<br />
2 USJT, Laboratório de Percepção Corporal e Movimento Humano.<br />
3 Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina, Hospital das Clínicas (HC-FMUSP), Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares<br />
do Instituto de Psiquiatria (Ambulim-IPq-HC).<br />
4 USJT, Departamento de Psicologia.<br />
Endereço para correspondência: Bianca Elisabeth Thurm<br />
Universidade São Judas Tadeu, Departamento de Fisioterapia<br />
Rua Taquari, 546, Mooca – 03166-000 – São Paulo, SP, Brasil<br />
Tel.: (11) 8182-9426/Fax: (11) 3271-8487<br />
E-mail: biancathurm@uol.com.br
332 Thurm BE et al.<br />
revisão de literatura<br />
INTRODUÇÃO<br />
Os transtornos alimentares caracterizam-se por alterações<br />
de comportamento alimentar e com etiopatogenia multifatorial,<br />
incluindo fatores biológicos, psicológicos, culturais,<br />
familiares e genéticos que interagem entre si de modo complexo<br />
1 .<br />
Os principais transtornos alimentares são a bulimia nervosa<br />
e a anorexia nervosa, e uma característica comum<br />
nesses transtornos é a grande importância que a pessoa<br />
dá à imagem corporal. Nos dois casos, uma imprecisão na<br />
percepção do tamanho real do corpo é evidente, fazendo<br />
com que pacientes com anorexia nervosa e bulimia nervosa<br />
apresentem uma distorção da percepção de sua dimensão<br />
corporal no sentido de se perceberam maiores do que realmente<br />
são (hiperesquematia) 2-4 .<br />
A percepção do corpo pode ser conceituada a partir de<br />
dois componentes distintos: a imagem corporal e o esquema<br />
corporal. A imagem corporal corresponde ao componente<br />
atitudinal e se refere aos aspectos cognitivos, atribuições,<br />
crenças e expectativas do sujeito em relação ao seu corpo<br />
e ao estado emocional proveniente dele. Já o esquema corporal<br />
refere-se ao componente perceptual que diz respeito<br />
à percepção da dimensão do corpo relacionada especificamente<br />
ao tamanho e à forma corporal, somado à representação<br />
dinâmica da posição dos segmentos corporais e sua<br />
relação com o espaço ao seu redor. Depende das múltiplas<br />
informações sensório-motoras e de sua integração para o<br />
planejamento e execução das ações 5-8 . A região cortical responsável<br />
por esse mecanismo é a área temporoparietal 9-12 .<br />
Estudos que avaliam a percepção corporal sugerem que a<br />
separação desses componentes é considerada como o princípio<br />
básico para a compreensão das distorções da percepção<br />
corporal em pacientes com transtornos alimentares 13-15 .<br />
Quando se avalia a imagem corporal, o objetivo é identificar<br />
a diferença de como o sujeito se vê e como ele gostaria<br />
de se ver ou de ser visto pelo outro. Essa avaliação mostrará<br />
o nível de satisfação corporal do sujeito 16 utilizando testes<br />
de escala de silhueta, técnicas de distorção de imagem e<br />
desenhos. Nesses testes, avalia-se o corpo inteiro 6,7,14 . Outras<br />
formas de avaliar a imagem corporal são por meio de questionários<br />
e escalas 16-18 .<br />
O objetivo de avaliar a percepção da dimensão corporal<br />
é analisar a diferença entre a medida percebida do próprio<br />
corpo e a medida real do sujeito; neste caso, avaliam-se as<br />
partes do corpo. A diferença entre as medidas torna-se um<br />
indicador do grau de distorção da percepção da dimensão<br />
corporal 16 .<br />
A avaliação da imagem corporal é largamente utilizada<br />
nos estudos clínicos dos transtornos alimentares; já a avaliação<br />
clínica do esquema corporal, ou seja, o nível da distorção<br />
da percepção corporal, é muito pouco citada ou mesmo<br />
utilizada, apesar de os estudos darem ênfase à separação da<br />
avaliação dos componentes atitudinal da dimensional. Percebe-se<br />
que a sugestão de avaliar o esquema corporal é mais<br />
evidente no âmbito teórico. Segundo Hundleby e Borgoin 8 e<br />
Gardner 14 , existem problemas metodológicos e falta de consenso<br />
entre as pesquisas em relação aos métodos usados<br />
para avaliação do esquema corporal.<br />
Portanto, o objetivo foi analisar os métodos de avaliação<br />
da percepção da dimensão corporal abordados na literatura<br />
científica.<br />
MÉTODO<br />
A busca de artigos científicos para este trabalho de revisão<br />
foi realizada a partir da base de dados Medline, Bireme,<br />
EBSCO e SCOPUS.<br />
A busca foi conduzida por meio de descritor do DeCs/<br />
MeSH. O descritor utilizado foi “body image”, refinado com os<br />
termos “size perception” e “size estimation”.<br />
Foram incluídos na análise os estudos que utilizaram<br />
testes para avaliar o esquema corporal e que faziam uso da<br />
aplicação de um índice de percepção corporal (IPC). Desses,<br />
foram analisados apenas os estudos experimentais realizados<br />
em população adulta, nas línguas inglesa, portuguesa e<br />
alemã e que apresentassem transtorno alimentar. O período<br />
considerado para essas buscas foi de 1975 a 2010. Foram excluídos<br />
os artigos de revisão e metanálise e aqueles relacionados<br />
com avaliações do aspecto atitudinal em relação ao<br />
corpo, dentre eles os que incluem as técnicas de distorção<br />
da imagem por vídeo e computador, distorção do espelho e<br />
fotografia, teste do desenho da figura humana, método de<br />
avaliação por meio de silhuetas e questionários.<br />
RESULTADOS<br />
Verificou-se que o descritor “esquema corporal” não constava<br />
na listagem do DeCs/MeSH e, dessa forma, optou-se por um<br />
descritor mais próximo a este conceito que foi “imagem corporal”<br />
(“body image”).<br />
A partir do descritor “imagem corporal”, foi encontrado<br />
um total de 9.022 artigos até a data determinada pelo<br />
levantamento bibliográfico (10/10/2010). Para filtrar essa<br />
busca, utilizou-se a combinação dos termos “body image”<br />
+ “size perception”, totalizando 399 artigos, e “body image” +<br />
“size estimation”, totalizando 126 artigos. Desse total, foram<br />
selecionados inicialmente 141 artigos referentes à primeira<br />
combinação de unitermos e 65 artigos relacionados à segunda.<br />
Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão<br />
delimitados por este estudo, chegou-se a 7 e 9 artigos, respectivamente<br />
(Tabela 1). Desses, 8 tratavam de anorexia, 1<br />
de bulimia, 2 de anorexia e bulimia e 5 sem patologia e no<br />
sexo feminino (Tabela 2).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):331-6.
evisão de literatura<br />
Dimensão corporal nos transtornos alimentares<br />
333<br />
Em relação aos descritores encontrados, pôde-se observar<br />
que o termo “imagem corporal” é utilizado em todos os<br />
artigos revisados, e em segundo lugar aparece o termo “distorção<br />
da percepção”. Os outros termos encontrados e sua<br />
ocorrência estão descritos na tabela 3.<br />
Tabela 1. Resultado do levantamento bibliográfico utilizando<br />
descritores e unitermos<br />
Descritor<br />
Nº artigos<br />
encontrados<br />
Esquema corporal 0<br />
Imagem corporal 9.022<br />
Imagem corporal +<br />
percepção de tamanho<br />
Body image + size<br />
perception<br />
Body image + size<br />
estimation<br />
Nº artigos que<br />
abordam dimensão<br />
corporal<br />
Nº artigos<br />
selecionados a<br />
partir dos critérios<br />
estabelecidos<br />
14 0 0<br />
399 141 7<br />
126 65 9<br />
Com relação aos métodos empregados, foram encontrados<br />
16 artigos, dentre eles 12 aplicaram o índice de percepção<br />
corporal (IPC), que é utilizado para classificar a percepção<br />
corporal usando a fórmula tamanho percebido/tamanho<br />
real x 100. Nesse caso, os sujeitos que se percebem acima<br />
de 100% são classificados como hiperesquemáticos; os que<br />
se percebem abaixo de 100% são considerados hipoesquemáticos;<br />
e os que se percebem 100%, adequados. Foram<br />
encontrados quatro procedimentos que avaliam o esquema<br />
corporal, sendo eles: 1. Movable caliper procedure (5 artigos),<br />
que utiliza uma barra horizontal com dois pontos luminosos<br />
montados num carreto. É solicitado ao sujeito que aproxime<br />
ou afaste os pontos luminosos para identificar a largura da<br />
parte corporal solicitada (cabeça, ombros, cintura, quadril e<br />
perna). A barra é mantida na altura dos olhos; 2. Visual size<br />
estimation procedure (1 artigo), que se utiliza de uma barra<br />
com duas lâmpadas acopladas e, a partir da projeção da luz<br />
na parede, o sujeito orienta o avaliador a parar de mover os<br />
pontos luminosos quando estes corresponderem à largura<br />
do segmento corporal solicitado (largura entre os ossos zigomáticos,<br />
entre os dois ombros, abdome, cintura e quadril).<br />
Tabela 2. Características dos artigos consultados quanto à utilização de testes para a avaliação da dimensão corporal<br />
Autor Ano País N Teste utilizado IPC Tipo análise<br />
Askevold 1975 Noruega 15 AN<br />
IMP Não Quanti<br />
22 diversos<br />
pierloot et al. 1976 Inglaterra 31 AN<br />
IMP<br />
Sim<br />
Quanti<br />
20 NL<br />
MCP<br />
whitehouse et al. 1986 Inglaterra 22 BN IMP Sim Quanti<br />
fichter et al. 1986 Inglaterra 21AN MCP<br />
Não<br />
Quanti<br />
IMP<br />
whitehouse et al. 1988 Inglaterra 12 AN<br />
IMP Sim Quanti<br />
20 NL<br />
thompson et al. 1989 Estados Unidos 32 NL fem MCP Sim Quanti<br />
Bowden et al. 1989 Inglaterra 12 AN<br />
12 BN<br />
24 NL<br />
fonagy et al. 1990 Inglaterra 20 NL masc<br />
20 NL fem<br />
IMP<br />
VSEP<br />
Não<br />
Quanti<br />
MCP Sim Quanti<br />
Thomas et al. 1991 Estados Unidos 200 NL fem IMP Não Quanti<br />
lautenbacher et al. 1992 Inglaterra 21 AN<br />
IMP<br />
Sim<br />
Quanti<br />
20 NL<br />
KSEA<br />
lautenbacher et al. 1993 Inglaterra 42 NL IMP<br />
Sim<br />
Quanti<br />
KSEA<br />
Hundleby et al. 1993 Canadá 100 NL fem MCP Não Quanti<br />
molinari 1995 Italia 20 AN<br />
IMP Sim Quanti<br />
20 NL<br />
deter et al. 1997 Alemanha 50 AN fem<br />
IMP Sim Quanti<br />
05 AN masc<br />
Lautenbacher et al. 1997 Inglaterra 57 AN IMP<br />
Sim<br />
Quanti<br />
KSEA<br />
Aranda et al. 1999 Espanha 25 BN<br />
IMP Sim Quanti<br />
19 AN<br />
AN: anorexia nervosa; BN: bulimia nervosa; fem: sexo feminino; masc: sexo masculino; NL: normal; esquizo: esquizofrenia; OB: obeso; IMP: image marking procedure; KSEA: kinesthetic size estimation apparatus; MCP: movable caliper<br />
procedure; VSEP: visual size estimation procedure; quanti: análise quantitaviva; IPC: quanto ao uso ou não do cálculo.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):331-6.
334 Thurm BE et al.<br />
revisão de literatura<br />
Tabela 3. Descritores utilizados pela base de dados dos artigos<br />
selecionados<br />
Descritor utilizado<br />
Ocorrência<br />
Imagem corporal 16<br />
Distorção da percepção 9<br />
Constituição corporal 4<br />
Resultado de tamanho 3<br />
A barra é mantida na altura dos olhos durante o teste; 3.<br />
Kinesthetic size estimation apparatus – KSEA (3 artigos), uma<br />
barra com dois puxadores é colocada à altura dos ombros do<br />
sujeito com os olhos vendados e ele deve posicioná-los na<br />
largura dos pontos corporais correspondentes tocados pelo<br />
avaliador (ombros, cintura, quadril e coxa). 4. Image marking<br />
procedure – IMP (13 artigos), na qual os sujeitos, com os olhos<br />
vendados, projetam numa folha de papel pendurada na parede<br />
à sua frente a percepção da dimensão de segmentos<br />
corporais determinados, estimulados de forma tátil (alto da<br />
cabeça, ombros, cintura, quadril, coxa) (Tabela 2).<br />
DISCUSSÃO<br />
A busca da literatura científica na base de dados mostrou<br />
que não existe uma padronização dos descritores e palavras-<br />
-chave em relação ao conteúdo dos artigos no que diz respeito<br />
à percepção da dimensão corporal e/ou avaliação do<br />
esquema corporal. Essa variedade de descritores dificulta a<br />
busca específica dos artigos.<br />
O termo imagem corporal sempre foi usado englobando<br />
tanto o aspecto atitudinal quanto o dimensional da percepção<br />
corporal. Somente por volta de 1990 alguns estudos<br />
como os de Thompson e Dolce 19 e outros 14,20 começaram a<br />
abordar a questão de utilizar avaliações diferentes para cada<br />
aspecto da percepção do corpo. Esses estudos foram classificados<br />
em dois tipos: as avaliações de corpo inteiro, que<br />
estão relacionadas com o componente atitudinal, e as avaliações<br />
de partes do corpo, que analisam o componente perceptual<br />
da dimensão corporal. As pesquisas sobre avaliação<br />
do esquema corporal foram conduzidas principalmente no<br />
período entre 1975 e 1989.<br />
Desse período até 2010, a avaliação da dimensão corporal<br />
foi utilizada cada vez menos e observou-se que houve<br />
uma tendência de as pesquisas relacionadas aos transtornos<br />
alimentares focarem mais no aspecto psicológico da doença,<br />
mesmo nos estudos utilizando a ressonância magnética<br />
para avaliar a ativação e lesões das áreas corticais nesse grupo<br />
de sujeitos 14-16,18,21 . Pelo fato de os sujeitos com transtornos<br />
alimentares serem assistidos principalmente por uma<br />
equipe de psiquiatras e psicólogos, parece natural que os<br />
pesquisadores foquem no aspecto atitudinal da percepção<br />
da dimensão corporal utilizando instrumentos que estão relacionados<br />
à sua área de atuação profissional, como é o caso<br />
dos questionários e avaliação da satisfação corporal.<br />
Em relação à falta de padronização dos testes que avaliam<br />
a percepção dimensional do corpo, é necessário discutir<br />
algumas questões.<br />
Considerando os segmentos corporais utilizados nos artigos<br />
para avaliar a dimensão corporal, foi observado que não<br />
existe uma padronização. Alguns segmentos como cabeça,<br />
ombros, cintura e quadril são avaliados em todos os estudos,<br />
porém alguns deles utilizam também a avaliação da percepção<br />
das larguras das coxas, pernas e abdome 2,9,19,20 . Em nenhum<br />
dos artigos foi mencionado que esses testes que avaliam<br />
a percepção da dimensão corporal são validados, dessa<br />
forma acredita-se que a falta de padronização da escolha dos<br />
segmentos corporais se deva a esse fato, fazendo com que<br />
cada pesquisador opte pelos segmentos de acordo com o<br />
delineamento de sua pesquisa.<br />
O mesmo ocorre para calcular o tamanho real dos segmentos<br />
corporais, ou seja, não há uma uniformização para<br />
essa medida. Alguns usam um antropômetro, que é uma régua<br />
com hastes deslizantes que avalia grandes segmentos<br />
corporais 3,4,13,22-24 , um empregou um compasso de ponta 25 ,<br />
outros utilizaram um caliper (uma barra) 19 , diversos marcam<br />
em uma folha de papel pendurado na parede as medidas<br />
reais do sujeito 2,9,20,26,27,29,30 . Os instrumentos utilizados nesses<br />
estudos se propõem a medir o tamanho real de forma diferente,<br />
podendo gerar diferentes medidas e, desse modo,<br />
dificultando a comparação entre os diferentes estudos.<br />
Analisando os testes encontrados, foi observado que todos<br />
visam mensurar a capacidade do sujeito em perceber a<br />
sua dimensão corporal, e pareceu viável separá-los em: 1. Os<br />
que usam uma barra como ferramenta para a avaliação da<br />
dimensão corporal; 2. Os que usam o membro superior livre.<br />
Diferenças na forma de execução entre os testes serão<br />
apontadas: o uso de uma barra pode ser um diferencial na<br />
forma de realização dos testes, pois a barra pode ser um referencial<br />
externo que talvez sirva como um guia. Outro ponto<br />
importante é que nos testes movable caliper procedure e no<br />
visual size estimation procedure, apesar de não informarem<br />
claramente nos artigos quanto ao feedback visual, infere-se<br />
que os sujeitos permaneceram de olhos abertos. Nesse caso,<br />
a visão forneceria informações, possibilitando ao indivíduo<br />
fazer ajustes no sentido de comparar a largura real dos segmentos<br />
corporais avaliados e a estimativa da percepção da<br />
dimensão corporal. Já no IMP, o sujeito marca no papel à sua<br />
frente a percepção dos pontos corporais tocados por um<br />
avaliador com o membro superior livre. Dessa forma, o teste<br />
usa apenas a capacidade do indivíduo de perceber o segmento<br />
corporal tocado e, a partir daí, projetá-lo no espaço<br />
sem o auxílio da visão. Além disso, não é utilizado nenhum<br />
referencial externo, como uma barra, usando somente estí-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):331-6.
evisão de literatura<br />
Dimensão corporal nos transtornos alimentares<br />
335<br />
mulos exteroceptivos e proprioceptivos. Desse modo, parece<br />
mais adequada a utilização de um teste que não propicie<br />
ajustes a partir de referenciais externos (visão ou barra), visto<br />
que nos transtornos alimentares a comparação visual com<br />
relação ao próprio corpo ou o corpo de outros é distorcida<br />
pela própria natureza da doença.<br />
O teste do IMP vem de encontro aos conceitos do esquema<br />
corporal, um sistema neurológico que depende de<br />
informações exteroceptivas e proprioceptivas para fornecer<br />
a capacidade ao sujeito de perceber e reconhecer o corpo<br />
sem a utilização da visão 9,10,31 . A utilização de recursos como<br />
uma barra e a visão, que ocorre nos demais testes encontrados,<br />
acaba favorecendo o ajuste voluntário e automático da<br />
percepção da dimensão corporal pelo sujeito.<br />
Nesse sentido, alguns autores sugerem que o IMP é o<br />
único método que acessa a percepção da dimensão corporal<br />
baseado no estímulo tátil direto, pois o toque sobre a pele<br />
promove a base para a percepção dos limites do corpo 32 . As<br />
regiões tocadas no IMP correspondem às estruturas anatômicas<br />
localizadas nas extremidades corporais como o alto da<br />
cabeça, os acrômios na região dos ombros, a cintura e os trocanteres<br />
na região do quadril. Somados, estes pontos representam<br />
os limites da dimensão corporal. Uma vez que nos<br />
transtornos alimentares ocorre uma distorção da percepção<br />
dos limites corporais, o IMP consegue identificar o grau da<br />
distorção da dimensão corporal a partir do cálculo do IPC.<br />
É possível analisar, ainda, qual é a região corporal mais afetada<br />
pelo transtorno, já que o teste também avalia partes do<br />
corpo que comumente são as maiores queixas dessa população,<br />
como as regiões da cintura e do quadril. De acordo<br />
com as pesquisas, uma característica importante do teste<br />
IMP é que ele permite uma comparação direta da largura<br />
percebida e da real e permite calcular valores estatísticos 33,34 .<br />
Apesar de todos os testes encontrados se proporem a<br />
avaliar a percepção da dimensão corporal, não se sabe se os<br />
instrumentos utilizados levam a um resultado final igual. Um<br />
estudo que avaliou a percepção da dimensão corporal em<br />
atletas de alto rendimento utilizando dois instrumentos – o<br />
KSEA e o IMP – mostrou, a partir da análise estatística de equivalência,<br />
correlação negativa entre eles, ou seja, os resultados<br />
obtidos são diferentes 35 . Fichter et al. 23 usaram três métodos<br />
para avaliar o distúrbio da percepção corporal em um grupo<br />
de anoréxicas, bulímicas e controle: o IMP, o movable caliper<br />
procedure e a distorção da imagem por vídeo. Seus resultados<br />
mostraram que o IMP foi mais eficiente para discriminar<br />
entre pacientes com anorexia nervosa e grupo controle. Os<br />
autores consideram que a vantagem do uso dessa avaliação<br />
está na simplicidade técnica e conceitual do método.<br />
Segundo Valtolina 5 , o IMP é um método não verbal que<br />
envolve a percepção e aspectos da motricidade. A autora<br />
utilizou o IMP para avaliar a dimensão corporal e, a partir dos<br />
seus resultados, considerou o teste como sendo o mais apropriado,<br />
por ser uma forma direta e não verbal de acessar a<br />
percepção da dimensão corporal, o que não ocorre quando<br />
se usam questionários. O teste de percepção de Askevold foi<br />
desenhado para avaliar a percepção das dimensões de diferentes<br />
áreas do corpo, fazendo uso da habilidade do paciente<br />
de se projetar no espaço. O estudo direto é o mais compatível<br />
para esse tipo de investigação, pois tem a vantagem<br />
de não precisar se basear em uma percepção não corporal,<br />
como é o caso do uso de questionário ou de entrevista 23,35 .<br />
O julgamento de valores está muito comprometido nos<br />
transtornos alimentares, desse modo o uso de uma técnica<br />
direta de avaliação da dimensão corporal leva a crer que minimizaria<br />
essa interferência cognitiva.<br />
CONCLUSÃO<br />
Foram encontrados quatro métodos que avaliam e quantificam<br />
a percepção corporal utilizando o índice de percepção<br />
da dimensão corporal. Os métodos diferem em sua forma<br />
de execução, utilização de instrumentos e o uso ou não de<br />
feedback visual por parte do avaliado, uso ou não de estímulo<br />
tátil para gerar a resposta do avaliado. Dentre os métodos<br />
analisados, o Image Marking Procedure (IMP) mostrou-se<br />
apropriado para avaliação da dimensão corporal, particularmente<br />
nos transtornos alimentares, por ele ser capaz de<br />
ativar a capacidade do sujeito de identificar as partes constituintes<br />
do seu corpo e de projetá-lo no espaço sem o auxílio<br />
da visão, o que corresponde às funções neurológicas do<br />
esquema corporal.<br />
Acreditamos que o teste do IMP possa contribuir para a<br />
avaliação do componente perceptual (esquema corporal) e<br />
se somar à avaliação do componente atitudinal da percepção<br />
corporal tanto na bulimia nervosa quanto na anorexia<br />
nervosa, para ampliar a compreensão desse mecanismo<br />
complexo que leva à distorção da dimensão do corpo e à<br />
busca de abordagem terapêutica direcionada para cada<br />
componente.<br />
Levando em conta o aspecto proprioceptivo, a possibilidade<br />
de avaliar o grau de distorção corporal e dos segmentos<br />
corporais específicos, parece que o IMP é o teste mais<br />
adequado para a avaliação do esquema corporal nos transtornos<br />
alimentares, por abarcar os aspectos sensoriais da<br />
percepção corporal, além da possibilidade de projetar livremente<br />
a percepção dos limites corporais sem a interferência<br />
visual, cognitiva e qualquer referencial externo comparado<br />
aos outros testes que mostraram limitações quanto a esses<br />
aspectos.<br />
Sendo a distorção da percepção corporal o sintoma central<br />
nos pacientes com transtornos alimentares, não só as<br />
estratégias terapêuticas devem ser aprofundadas e desenvolvidas,<br />
mas também os métodos de avaliação, de modo a<br />
aquilatar os benefícios das terapias empregadas.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):331-6.
336 Thurm BE et al.<br />
revisão de literatura<br />
Levando em conta a praticidade, a exequibilidade e o<br />
baixo custo do teste de percepção da dimensão corporal<br />
(IMP), sugerimos que ele seja utilizado em futuras pesquisas<br />
que avaliem o aspecto dimensional da percepção corporal,<br />
seja em pacientes com transtornos alimentares ou com síndromes<br />
que levam ao distúrbio do esquema corporal.<br />
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São Judas Tadeu; 2007.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):331-6.
comunicação breve<br />
Formas deficitária e não deficitária da esquizofrenia<br />
não diferem quanto à sazonalidade de<br />
nascimentos nas regiões Sul e Sudeste do Brasil<br />
Deficit and non-deficit schizophrenia do not differ regarding<br />
season of birth in Brazilian Southern and Southeast regions<br />
Victor M. V. Lopes 1 , Cláudio E. M. Banzato 1 , Clarissa R. Dantas 1<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Esquizofrenia, estações<br />
do ano, psicopatologia,<br />
epidemiologia.<br />
Objetivos: Entre os pacientes com esquizofrenia originários do hemisfério norte, observa-<br />
-se um excesso de 5%-10% de nascimentos no inverno e na primavera. Entretanto, entre os<br />
pacientes com a forma deficitária da doença, há uma pequena sobrerrepresentação de nascimentos<br />
no verão. Neste estudo, buscou-se verificar se tais associações se repetem entre os<br />
pacientes com esquizofrenia nascidos nas regiões Sudeste e Sul do Brasil. Métodos: Setenta<br />
e seis pacientes com esquizofrenia foram avaliados quanto a características sociodemográficas<br />
e psicopatológicas e categorizados quanto à presença da síndrome deficitária. Pacientes<br />
com e sem síndrome deficitária foram comparados quanto à estação de nascimento.<br />
Adicionalmente, compararam-se características psicopatológicas entre pacientes nascidos<br />
nas quatro estações do ano. Resultados: A distribuição de nascimentos de acordo com as<br />
estações não apresentou diferenças significativas. Entre pacientes com síndrome deficitária,<br />
dois terços nasceram no verão e outono, mas essa diferença não alcançou significância estatística.<br />
Não foram encontradas diferenças psicopatológicas relacionadas à estação do ano de<br />
nascimento. Conclusão: Nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, não foi observado o excesso de<br />
nascimentos no verão entre pacientes esquizofrênicos com síndrome deficitária, bem como<br />
não foi constatado excesso de nascimentos no inverno e primavera no grupo geral de pacientes<br />
com esquizofrenia.<br />
ABSTRACT<br />
Objectives: There is a 5%-10% excess of births in winter and spring among the patients with<br />
schizophrenia born in the northern hemisphere. However, in patients with the deficit syndrome of<br />
schizophrenia, there is a slight over-representation of births in summer. In this study, we aimed at<br />
verifying whether the same patterns are found in patients with schizophrenia born in the Brazilian<br />
South and Southeast regions. Methods: Seventy-six patients with schizophrenia were assessed<br />
for demographics and psychopathology and also categorized for the presence of deficit syndrome.<br />
Patients with deficit and non-deficit schizophrenia were compared for the season of birth.<br />
1 Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas (Unicamp/FCM), Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria.<br />
Recebido em<br />
24/10/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
01/12/<strong>2011</strong><br />
Endereço para correspondência: Clarissa R. Dantas<br />
Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)<br />
Rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Cidade Universitária Zeferino Vaz, Barão Geraldo – 13083-887 – Campinas, SP, Brasil<br />
Telefax: (19) 3521-7206<br />
E-mail: dantascr@gmail.com
338 Lopes VMV et al.<br />
comunicação breve<br />
Keywords<br />
Schizophrenia, seasons,<br />
psychopathology,<br />
epidemiology.<br />
In addition, we compared psychopathological variables between patients born in all four seasons.<br />
Results: There was no significant difference in the distribution of births according to the seasons.<br />
Although two thirds of the patients with deficit syndrome were born in the summer and autumn,<br />
this over-representation did not reach statistical significance. We found no differences regarding<br />
psychopathology between patients born in all four seasons. Conclusion: In the South and<br />
Southeast regions of Brazil, there was no significant excess of births in the summer between schizophrenic<br />
patients with deficit syndrome, neither was an excess of births in winter and spring in the<br />
overall sample of patients with schizophrenia.<br />
INTRODUÇÃO<br />
Uma grande variedade de fatores ambientais, tanto biológicos<br />
quanto psicossociais, incidindo sobre diversas fases do<br />
desenvolvimento, desde o período pré-natal até o início da<br />
vida adulta, tem sido implicada na etiologia da esquizofrenia<br />
1 . Ainda que o aumento no risco de desenvolvimento da<br />
doença representado pela exposição isolada a cada um de<br />
tais fatores seja de pequena magnitude, chama a atenção a<br />
consistência com que se reproduzem achados epidemiológicos<br />
ligando a esquizofrenia a, por exemplo, infecção e má<br />
nutrição pré-natais, complicações obstétricas, urbanicidade,<br />
migração e nascimento nos meses de inverno e primavera 1 .<br />
O efeito da estação de nascimento sobre o risco para a<br />
esquizofrenia tem sido relatado desde a década de 1920 2 . Entre<br />
os pacientes com esquizofrenia originários do hemisfério<br />
norte, verifica-se um excesso de 5%-10% de nascimentos no<br />
inverno e na primavera 3 . Encontrou-se uma razão de chances<br />
estimada de 1,07 (intervalo de confiabilidade de 95%: 1,05-<br />
1,08) para nascimentos no inverno/primavera e um risco populacional<br />
atribuível de 3,3% em uma grande metanálise de<br />
estudos conduzidos naquele hemisfério 3 . Essa associação entre<br />
esquizofrenia e nascimento no inverno/primavera parece<br />
fortalecer-se com o aumento da latitude (estações mais bem<br />
definidas) e com a maior severidade do inverno 1 .<br />
Estudos sobre sazonalidade de nascimentos na esquizofrenia<br />
realizados no hemisfério sul apresentam resultados<br />
menos consistentes. Em uma metanálise incluindo dados<br />
publicados e não publicados, encontrou-se um excesso de<br />
nascimentos nos meses de inverno e primavera, entretanto,<br />
apesar de um tamanho amostral de mais de 20.000, tal excesso<br />
não alcançou significância estatística 4 . Por outro lado,<br />
dois estudos conduzidos no Nordeste brasileiro, onde se observa<br />
pouca variação de temperatura ao longo do ano, mas<br />
períodos de chuva e de estiagem bem definidos, encontraram<br />
associação entre nascimento três a quatro meses após<br />
o período de chuvas e risco de desenvolver esquizofrenia 5,6 .<br />
As hipóteses explicativas para a distribuição desproporcional<br />
de nascimentos de esquizofrênicos ao longo do ano<br />
têm em comum a ideia de que a estação de nascimento atue<br />
como um marcador para fatores não genéticos sazonais que<br />
modificariam o riso para esquizofrenia 4 . Dentre os vários fatores<br />
candidatos propostos, destacam-se as infecções virais,<br />
especialmente pelo vírus influenza, e a deficiência de vitamina<br />
D 4 .<br />
A síndrome deficitária da esquizofrenia – definida pela<br />
presença de sintomas negativos primários, proeminentes e<br />
persistentes – tem sido associada a um padrão sazonal de<br />
nascimentos, inverso ao descrito para a esquizofrenia em geral,<br />
isto é, um excesso de nascimentos no verão 7-9 . É possível<br />
que a exposição diferencial aos supostos fatores modificadores<br />
do risco para a esquizofrenia subjacentes à sazonalidade<br />
de nascimento contribua também, em algum grau, para diferenças<br />
psicopatológicas, de curso da doença, ou ainda de<br />
outra natureza, entre esquizofrênicos nascidos no inverno/<br />
primavera e aqueles nascidos no verão/outono 10,11 .<br />
Neste estudo, buscou-se verificar se o excesso de nascimentos<br />
nos meses de inverno/primavera entre esquizofrênicos<br />
em geral, observado no hemisfério norte, pode ser<br />
encontrado também entre pacientes com esquizofrenia nascidos<br />
nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, com estações do<br />
ano melhor definidas e maiores latitudes que a região Nordeste<br />
do país, onde estudos sobre a sazonalidade de nascimentos<br />
na esquizofrenia foram anteriormente conduzidos.<br />
Investigou-se ainda a associação entre estação de nascimento<br />
e presença da síndrome deficitária da esquizofrenia e/ou<br />
de outras diferenças psicopatológicas.<br />
MÉTODOS<br />
Este estudo foi realizado no contexto do desenvolvimento<br />
de um projeto de pesquisa mais amplo intitulado “Psicopatologia<br />
dos sintomas negativos da esquizofrenia”, que incluiu<br />
a tradução para o português e a validação das versões brasileiras<br />
da Scale for the Assessment of Positive Symptoms (SAPS),<br />
da Scale for the Assessment of Negative Symptoms (SANS) e do<br />
Schedule for the Deficit Syndrome (SDS) (resultados ainda não<br />
publicados), além de uma extensa avaliação cognitiva de pacientes<br />
esquizofrênicos 12 .<br />
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comunicação breve<br />
Sazonalidade de nascimentos na esquizofrenia<br />
339<br />
O projeto recebeu a aprovação do Comitê de Ética em<br />
Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e<br />
todos os pacientes incluídos no estudo assinaram um Termo<br />
de Consentimento Livre e Esclarecido.<br />
A amostra total do projeto amplo consistiu de 85 pacientes<br />
esquizofrênicos acompanhados no Ambulatório de<br />
Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC) da Universidade<br />
Estadual de Campinas (Unicamp) e em dois dos Centros de<br />
Atenção Psicossocial (CAPS) de Campinas. Houve uma busca<br />
ativa de pacientes com características deficitárias, portanto<br />
trata-se de uma amostra de conveniência, e não representativa.<br />
Critérios de inclusão e exclusão, bem como a caracterização<br />
da amostra, já foram descritos em outra publicação 12 .<br />
Os pacientes foram avaliados quanto à presença da síndrome<br />
deficitária (SD) com a utilização da versão brasileira<br />
do Schedule for the Deficit Syndrome (SDS) 13 . Para a caracterização<br />
psicopatológica, foram adotadas as versões brasileiras<br />
da Scale for the Assessment of Positive Symptoms (SAPS) e da<br />
Scale for the Assessment of Negative Symptoms (SANS) e a Escala<br />
Breve de Avaliação Psiquiátrica (BPRS).<br />
Selecionando aqueles nascidos nas regiões Sul e Sudeste<br />
do Brasil, foram encontrados 76 pacientes, que foram divididos<br />
em grupos de acordo com a estação do ano ao nascimento,<br />
considerando que no hemisfério sul o verão tem<br />
início no dia 22 de <strong>dezembro</strong>; o outono, dia 21 de março; o<br />
inverno, dia 21 de junho; e a primavera, em 23 de setembro.<br />
Para comparação de proporções, foi utilizado o teste<br />
qui-quadrado ou teste exato de Fisher; para comparação de<br />
variáveis contínuas entre os quatro grupos, foi utilizado o<br />
teste de Kruskal-Wallis; para comparação entre dois grupos<br />
(inverno/primavera versus verão/outono), foi utilizado o teste<br />
de Mann-Whitney. O nível de significância adotado para os<br />
testes estatísticos foi 5%.<br />
RESULTADOS<br />
A distribuição dos pacientes de acordo com a estação em<br />
que nasceram não apresentou variações estatisticamente<br />
significativas, tendo 20 nascidos no verão, 20 no outono, 14<br />
no inverno e 22 na primavera (teste qui-quadrado para igualdade<br />
de proporções, p = 0,5945). Considerando-se os gêneros<br />
(18 mulheres e 58 homens), tampouco foram observadas<br />
diferenças com valor estatístico: 5 mulheres haviam nascido<br />
no verão, 5 no outono, 2 no inverno e 6 na primavera; entre<br />
os homens, 15 haviam nascido no verão, 15 no outono, 12<br />
no inverno e 16 na primavera (p = 0,8607).<br />
Entre os pacientes com síndrome deficitária, observou-se<br />
que dois terços haviam nascido no verão ou no outono, mas<br />
tal excesso não alcançou significância estatística, como pode<br />
ser observado na tabela 1.<br />
A comparação entre os pacientes nascidos em cada uma<br />
das estações não revelou diferenças significativas quanto à<br />
severidade de sintomas positivos, de sintomas negativos e<br />
de psicopatologia geral (Tabela 2).<br />
Tabela 1. Distribuição dos nascimentos por estação do ano entre pacientes com e sem a síndrome deficitária da esquizofrenia<br />
Estação de nascimento<br />
Pacientes com esquizofrenia<br />
Verão Outono Inverno Primavera p<br />
Forma deficitária 9 (33,3%) 9 (33,3%) 3 (11,1%) 6 (22,2%)<br />
0,343<br />
Forma não deficitária 11 (22,4%) 11 (22,4%) 11 (22,4%) 16 (32,7%)<br />
* Teste exato de Fisher, nível de significância 5%.<br />
Tabela 2. Características dos pacientes com esquizofrenia segundo a estação de nascimento<br />
Estação de nascimento<br />
Verão Outono Inverno Primavera p<br />
Características média (± dp) média (± dp) média (± dp) média (± dp)<br />
Idade (anos) 33,2 (± 9,4) 34,5 (± 7,0) 34,1 (± 9,2) 29,1 (± 8,0) 0,219<br />
Idade ao início dos sintomas (anos) 20,3 (± 6,9) 18,5 (± 3,3) 19,4 (± 3,8) 19,3 (± 5,5) 0,963<br />
Psicopatologia geral (escore total da BPRS) 9,6 (± 5,9) 11,7 (±5,2) 9,9 (± 8,7) 8,5 (± 5,4) 0,338<br />
Sintomas positivos (escore total da SAPS) 4,4 (± 4,4) 6,2 (± 3,2) 5,3 (± 4,4) 4,5 (± 3,7) 0,246<br />
Sintomas negativos (escore total da escore SANS) 11,0 (± 7,4) 12,0 (± 6,0) 10,3 (± 7,5) 9,0 (±6,7) 0,495<br />
* Teste Kruskal-Wallis, nível de significância 5%.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):337-40.
340 Lopes VMV et al.<br />
comunicação breve<br />
DISCUSSÃO<br />
Tal como relatado na literatura 7 , encontrou-se uma sobrerrepresentação<br />
de pacientes nascidos nos meses de verão<br />
e outono entre esquizofrênicos com síndrome deficitária<br />
nascidos nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, entretanto tal<br />
excesso não alcançou significância estatística. É possível<br />
que o tamanho amostral, definido em função da avaliação<br />
cognitiva que integrou o estudo abrangente original, tenha<br />
sido insuficiente estatisticamente para detectar diferenças<br />
na sazonalidade. Por outro lado, os estudos que identificaram<br />
associação entre esquizofrenia deficitária e nascimento<br />
nos meses de verão e outono foram realizados no hemisfério<br />
norte 7 e é possível que, assim como ocorre para a associação<br />
entre a esquizofrenia em geral e nascimento nos meses de<br />
inverno e primavera, o efeito da estação de nascimento não<br />
seja o mesmo nos dois hemisférios e em diferentes latitudes.<br />
Diferentemente do relatado nos estudos conduzidos no<br />
Nordeste brasileiro 5,6 , não se encontrou um padrão sazonal<br />
para o nascimento no grupo geral de pacientes esquizofrênicos.<br />
Em latitudes comparáveis às das regiões Sul e Sudeste<br />
brasileiras, na Austrália 14 , foi encontrada uma tendência similiar<br />
à do hemisfério norte, porém sem significância estatística.<br />
Talvez diferenças de latitude e climáticas expliquem os achados<br />
discrepantes quanto à sazonalidade de nascimentos na<br />
esquizofrenia, ainda que não possamos desconsiderar as limitações<br />
impostas ao nosso estudo pelo tamanho amostral.<br />
Tomados em conjunto, os dados de nosso estudo e os de<br />
outras pesquisas sobre o efeito da estação de nascimento sobre<br />
o risco para a esquizofrenia reforçam a noção de que múltiplos<br />
fatores de risco de pequena magnitude devem interagir de forma<br />
complexa para determinar a manifestação da doença 1 .<br />
CONCLUSÃO<br />
Nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, não foi observado excesso<br />
de nascimentos no verão entre pacientes esquizofrênicos<br />
com síndrome deficitária, bem como não foi constatado<br />
excesso de nascimentos no inverno e primavera no grupo<br />
geral de pacientes com esquizofrenia.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Os autores agradecem a Cleide Aparecida Moreira Silva e<br />
Helymar da Costa Machado, pela ajuda com as análises estatísticas,<br />
e aos revisores anônimos pelas contribuições. Este<br />
estudo recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa<br />
do Estado de São Paulo (Fapesp) (08/09488-8) e do Programa<br />
Institucional de Bolsas de Iniciação Científica do Conselho Nacional<br />
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Pibic-<br />
-CNPq) (108807/2010-0).<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):337-40.
comunicação breve<br />
Escolha de alimentos durante a abstinência<br />
alcoólica: influência na fissura e no peso corporal<br />
Food choice during alcohol abstinence: influence in craving and body weight<br />
Mayla Cardoso Fernandes Toffolo 1 , Izabelle de Sousa Pereira 2 , Karine Aparecida Louvera Silva 2 ,<br />
Cláudia Aparecida Marliére 3 , Aline Silva de Aguiar Nemer 4<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Síndrome de abstinência,<br />
craving, carboidratos, peso<br />
corporal.<br />
Objetivo: Avaliar a influência da fissura na escolha de alimentos doces e alteração do peso<br />
corporal em pacientes alcoolistas. Métodos: Vinte e um pacientes alcoolistas em tratamento<br />
no Centro de Atenção Psicossocial de álcool e drogas (CAPSad), Ouro Preto/MG, foram<br />
selecionados para participar deste estudo (14 homens e 7 mulheres, com idade entre 25<br />
e 64 anos). Foi aplicado questionário para avaliar a fissura (craving) e o consumo alimentar.<br />
A alteração do peso corporal e do índice de massa corporal (IMC) foi estimada por métodos<br />
antropométricos para avaliar o estado nutricional. As avaliações foram realizadas no momento<br />
inicial e final, contemplando até três meses de tratamento. Resultados: As mulheres apresentaram<br />
ganho de peso (1,9 ± 1,86 kg) e os homens, perda de peso corporal (-0,13 ± 2,09 kg)<br />
(p = 0,04). Não houve diferença estatística quando essa variação de peso foi comparada entre<br />
os abstinentes (AB) e não abstinentes (NA) (Homens: AB = 0,39 ± 2,19 kg; NA: -1,06 ± 1,75 kg/<br />
Mulheres: AB: 2,73 ± 1,95 kg; NA: 1,42 ± 1,85 kg). A presença de fissura inicial e final foi semelhante<br />
entre os que recaíram e os abstinentes. Os abstinentes mantiveram menor fissura e<br />
maior sensação de bem-estar com o consumo de alimentos fontes de carboidratos simples<br />
ou complexos. Conclusão: Os alcoolistas que conseguiram se abster tiveram menor grau<br />
de fissura com maior bem-estar com o consumo de alimentos fontes de carboidratos. Houve<br />
mudanças do peso corporal ao longo do tempo de acompanhamento dos alcoolistas em<br />
tratamento para a abstinência.<br />
ABSTRACT<br />
Objective: To assess the craving influence in the choice of simple carbohydrate and changing in<br />
body weight in alcoholics patients. Methods: Twenty one patients alcoholics in treatment in a<br />
specialized center for alcohol and drugs (CAPSad), Ouro Preto/MG were selected to participate in<br />
the study (14 men and 7 women), with aged between 25 and 64 years. A questionnaire was applied<br />
to assess craving, and food consumption. The change in body weight and body mass index (BMI)<br />
were estimated by anthropometrical methods to assess the nutritional status. Evaluations were performed<br />
at baseline and end up covering three months of treatment. Results: It was observed in<br />
women the average increase in weight (1.9 ± 1.86 kg), and in men the average loss of weight (-0.13<br />
Recebido em<br />
27/7/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
29/11/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Escola de Nutrição (ENUT), Programa de Pós-Graduação em Saúde e Nutrição.<br />
2 ENUT/UFOP.<br />
3 ENUT/UFOP, Departamento de Nutrição Clínica e Social.<br />
4 Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Instituto de Ciências Biológicas (ICB), Departamento de Nutrição; UFOP, Programa de Pós-<br />
-Graduação em Saúde e Nutrição.<br />
Endereço para correspondência: Aline Silva de Aguiar Nemer<br />
Universidade Federal de Juiz de Fora/Instituto de Ciências Biológicas – Departamento de Nutrição<br />
Cidade Universitária – 36036-900 – Juiz de Fora, MG<br />
Tels.: (32) 2102-3234/(32) 8888-0193<br />
E-mails: aline.nemer@ufjf.edu.br; alinesaguiar@yahoo.com.br
342 Toffolo MCF et al.<br />
comunicação breve<br />
Keywords<br />
Withdrawal syndrome,<br />
craving, carbohydrate, body<br />
weight.<br />
± 2.09 kg) (p = 0.04). The statistical analysis showed no difference in the weight change when compared<br />
abstinent (A) and non-abstinent (NA) Men: AB = 0.39 ± 2.19 kg; NA: -1,06 ± 1,75 kg/Women:<br />
AB: 2.73 ± 1.95 kg; NA: 1.42 ± 1.85 kg. The initial and final craving was similar between those who<br />
relapsed and the abstinents. Abstainers maintained lower craving and greater sense of well-being<br />
with food sources of simple and complex carbohydrates consumption. Conclusion: There were<br />
changes in body weight over time of follow-up treatment for alcoholics in abstinence.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O álcool é a única substância psicoativa que fornece calorias<br />
consideradas “vazias” (7,1 kcal/g), por não fornecer outros<br />
nutrientes como proteínas, minerais, oligoelementos<br />
ou vitaminas 1 . O consumo extra das calorias do álcool pode<br />
favorecer o excesso de peso e o aumento da gordura corporal<br />
entre consumidores moderados de álcool 2 . Porém, seu<br />
consumo crônico e pesado está relacionado à desnutrição,<br />
tanto primária (por interferir no consumo de alimentos fontes<br />
de macro e micronutrientes) quanto secundária (por ser<br />
responsável pela má absorção e agressão celular decorrentes<br />
de sua citotoxicidade direta) 3 .<br />
Quando dependentes de álcool diminuem o seu consumo<br />
ou se abstêm, podem apresentar um conjunto de sinais<br />
e sintomas denominados síndrome de abstinência do álcool<br />
(SAA) 4 . Devido às amplas alterações orgânicas e neuroquímicas<br />
causadas pela dependência alcoólica, sintomas como<br />
tremores, insônia, agitação e inquietação psicomotora são<br />
comuns na síndrome de abstinência 5 .<br />
A síndrome de abstinência aguda do álcool geralmente<br />
é superada até o final dos primeiros sete dias de tratamento 6 .<br />
É nessa fase que o craving ou “fissura” (desejo intenso em<br />
usar a substância) está mais intenso. Entretanto, os três primeiros<br />
meses são críticos para a manutenção da abstinência,<br />
mesmo após uma interrupção mais prolongada, e o craving<br />
pode estar presente, levando a um lapso ou recaída 7 .<br />
Alterações dos padrões alimentares e sobrepeso têm<br />
sido observados durante tratamento para dependência química<br />
8,9 . Wurtman e Wurtman 8 observaram o aumento da<br />
vontade de comer alimentos ricos em carboidratos, como<br />
doces, durante a abstinência, por causa de sua influência na<br />
melhora do humor e alívio da irritabilidade. Esses alimentos<br />
contribuem para o aumento dos níveis de triptofano cerebral<br />
e, consequentemente, para a síntese e liberação do neurotransmissor<br />
serotonina, aliviando potencialmente a sua<br />
deficiência pela interrupção do uso do álcool na abstinência.<br />
O aumento do consumo alimentar a fim de aliviar os sintomas<br />
de abstinência pode levar ao ganho de peso corporal.<br />
Cowan e Devine 9 observaram aumento do consumo de alimentos<br />
ricos em gorduras e açúcares e excessivo ganho de<br />
peso entre homens durante a recuperação da dependência<br />
alcoólica, o que pode favorecer o desenvolvimento de doenças<br />
crônicas 9 .<br />
Entretanto, ainda há poucos estudos na literatura avaliando<br />
a escolha de alimentos durante a abstinência entre<br />
homens e mulheres e de como esses alimentos podem favorecer<br />
a manutenção da abstinência e levar ao ganho de<br />
peso corporal.<br />
Uma vez que o início da abstinência é marcado por intensa<br />
fissura, nossa hipótese é de que os pacientes abstinentes<br />
consomem mais alimentos ricos em carboidratos para controlar<br />
a fissura, levando ao ganho de peso. Assim, o objetivo<br />
deste estudo foi avaliar a influência da fissura na escolha de<br />
alimentos e alteração do peso corporal em pacientes alcoolistas<br />
em tratamento.<br />
MATERIAL E MÉTODOS<br />
Trata-se de um estudo longitudinal, realizado no período de<br />
junho a <strong>dezembro</strong> de 2010. A avaliação inicial foi realizada de<br />
junho a setembro de 2010 e a avaliação final, ao completar<br />
três meses de tratamento, até <strong>dezembro</strong> de 2010. Participaram<br />
da pesquisa 21 pacientes alcoolistas de ambos os sexos<br />
(14 homens), com idade de 25 a 64 anos e frequentadores do<br />
Centro de Atenção Psicossocial de álcool e drogas (CAPSad),<br />
Ouro Preto/MG, Brasil. Foram incluídos todos os pacientes<br />
diagnosticados como dependentes de álcool, conforme critérios<br />
da Classificação Internacional das Doenças (CID-10).<br />
Não participaram da pesquisa os usuários de drogas ilícitas,<br />
mulheres grávidas, menores de 18 anos, pacientes<br />
que não apresentaram condições cognitivas adequadas e<br />
os que não completaram três meses de acompanhamento<br />
no CAPSad. Para avaliar o estado cognitivo dos participantes,<br />
utilizou-se o Miniexame do Estado Mental (Mini-Mental<br />
State Examination – MMSE) 10 . A pontuação do MMSE pode<br />
variar de 0 (maior grau de comprometimento cognitivo) a<br />
30 pontos (melhor capacidade cognitiva). Considera-se que<br />
haja comprometimento cognitivo no caso de: alfabetizados<br />
que obtêm menos de 24 pontos; indivíduos com escolaridade<br />
entre o 5º e o 9º ano que obtêm menos de 18 pontos;<br />
e analfabetos que obtêm pontuação menor que 14 pontos.<br />
Todos que concordaram em participar do estudo assinaram<br />
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.<br />
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da<br />
Universidade Federal de Ouro Preto, MG, Brasil (CEP/UFOP –<br />
CAAE: 0031.0.238.000-09).<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):341-6.
comunicação breve<br />
Fissura, alimentos e peso corporal em alcoolistas<br />
343<br />
No início do tratamento, os participantes responderam<br />
a um questionário com informações sociodemográficas. Em<br />
seguida, responderam a um questionário semiestruturado<br />
para obter informações sobre os alimentos consumidos para<br />
controlar a fissura ou craving pelo uso de álcool. Para cada<br />
alimento relatado, atribuiu-se uma nota, numa escala analógica<br />
de 0 a 10 pontos, para sensação de bem-estar e alívio da<br />
fissura após consumir tal alimento. A nota 0 foi atribuída para<br />
nenhuma sensação de bem-estar; a nota 1 ou 2, para pouca<br />
sensação de bem-estar; as notas 3 a 6, para média sensação<br />
de bem-estar; as notas 6 a 8, para forte sensação de bem-<br />
-estar; a nota 9 ou 10, para ótima sensação de bem-estar.<br />
Nesse questionário inclui-se a terceira questão adaptada do<br />
questionário para avaliação do craving, proposto por Araújo<br />
et al. 6 para avaliar a nota atribuída à fissura sentida na semana<br />
da avaliação, a saber: não teve fissura (nota 0), fissura fraca<br />
(nota 1 ou 2), fissura média/fraca (nota 3 ou 4), fissura média/<br />
forte (nota 5 ou 6), fissura forte (nota 8) e fissura muito forte<br />
(nota 9 ou 10).<br />
A avaliação nutricional foi baseada nas medidas de peso<br />
corporal e altura, para cálculo do índice de massa corporal<br />
(IMC). As medidas foram coletadas seguindo normas propostas<br />
por Lohman 11 .<br />
Após três meses de tratamento, foi repetida a aplicação<br />
do questionário sobre o consumo de alimentos durante a<br />
fissura pelo álcool e realizada a avaliação antropométrica.<br />
Utilizou-se o software PASW versão 17.0 para a análise<br />
dos dados. Variáveis categóricas foram analisadas pelo teste<br />
exato de Fischer. Para comparações das variáveis contínuas<br />
iniciais e finais de peso corporal e IMC, utilizou-se o teste não<br />
paramétrico de Wilcoxon para amostras pareadas. Para comparação<br />
da diferença de peso (peso final/peso inicial) entre<br />
homens e mulheres, utilizou-se o teste U Mann-Whitney. As<br />
variáveis classificadas em inicial e final referem-se à primeira<br />
e à última semana de acompanhamento, respectivamente. O<br />
nível de significância foi fixado em menor que 5% (p < 0,05).<br />
RESULTADOS<br />
Trinta e seis pacientes foram convidados para participar da<br />
pesquisa. Foram excluídos usuários de drogas ilícitas (n = 10),<br />
menores de 18 anos (n = 1), paciente com estado cognitivo<br />
não adequado (n = 1), pacientes que não completaram três<br />
meses de acompanhamento (n = 3). Nenhum paciente convidado<br />
se recusou a participar. Vinte um participantes foram<br />
incluídos no estudo; 12 mantiveram a abstinência e 9 não<br />
se abstiveram ao final dos três meses de acompanhamento.<br />
Homens e mulheres apresentaram média de idade em torno<br />
de 45,57 ± 9,97 anos e 39,14 ± 7,13 anos, respectivamente.<br />
A amostra estudada apresentou perfil sociodemográfico<br />
semelhante (p > 0,05) entre abstinentes e não abstinentes<br />
(Tabela 1).<br />
Tabela 1. Descrição sociodemográfica e do início do uso do<br />
álcool entre mulheres e homens abstinentes e não abstinentes do<br />
CAPSad de Ouro Preto, MG *<br />
Variáveis<br />
Estado civil<br />
Abstinentes<br />
(n = 9)<br />
Homem<br />
Não<br />
abstinentes<br />
(n = 5)<br />
Abstinentes<br />
(n = 3)<br />
Mulher<br />
Não<br />
abstinentes<br />
(n = 4)<br />
Solteiro 6 1 1 1<br />
Casado 2 2 2 2<br />
Separado/divorciado 0 2 0 1<br />
Viúvo 1 0 0 0<br />
Escolaridade<br />
≤ 4ª série 6 1 0 1<br />
> 4ª série 2 4 3 3<br />
Raça*<br />
Branco 4 4 2 4<br />
Não branco 5 1 1 0<br />
Mora atualmente<br />
Sozinho 3 0 0 1<br />
Com a família 6 5 3 3<br />
Renda<br />
≤ 1 salário-mínimo 7 4 3 3<br />
> 1 salário-mínimo 2 1 0 1<br />
Responsável pela renda<br />
Próprio paciente 5 2 1 1<br />
Outros 4 3 2 3<br />
Situação trabalhista<br />
Atividade regular c/ direitos<br />
trabalhistas<br />
Atividade regular s/ direitos<br />
trabalhistas<br />
2 0 0 0<br />
1 1 0 1<br />
Afastado a mais de 15 dias 1 0 0 1<br />
Aposentado 3 1 0 0<br />
Desempregado 2 3 3 2<br />
Início do uso do álcool<br />
≤ 15 anos 3 1 1 3<br />
16 a 20 anos 3 4 2 1<br />
≥ 21 3 0 0 0<br />
* p > 0,05 para todas as variáveis analisadas – teste exato de Fisher.<br />
As mulheres apresentaram ganho de peso e os homens,<br />
perda de peso corporal (Mulheres: 1,98 ± 1,86 kg/Homens:<br />
-0,13 ± 2,09; p = 0,04). Entretanto, não houve diferença estatística<br />
quando a variação de peso corporal foi comparada,<br />
separadamente, entre homens e mulheres abstinentes e não<br />
abstinentes (Tabela 2). Embora não significativo, as mulheres<br />
abstinentes e não abstinentes ganharam mais peso do que<br />
os homens.<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):341-6.
344 Toffolo MCF et al.<br />
comunicação breve<br />
A classificação da fissura inicial e final foi semelhante entre<br />
os que recaíram (não abstinentes) e os abstinentes. Porém,<br />
após consumir o alimento escolhido para controlar a vontade<br />
de usar o álcool, a maioria dos abstinentes (n = 9,75%) que<br />
apresentaram fissura fraca ou não sentiram fissura relatou<br />
maior sensação de bem-estar em comparação aos que não<br />
conseguiram se abster (p = 0,04 – teste exato de Fischer).<br />
Houve diferença estatística quanto ao grau de fissura entre<br />
as mulheres abstinentes e não abstinentes no início do<br />
tratamento. Entre as abstinentes, não houve relato de fissura<br />
no início do tratamento. Porém, para as que não conseguiram<br />
se abster, o início do tratamento foi enfrentado com<br />
relato de fissura moderada a fraca (n = 3) e fissura muito<br />
forte (n = 1) (p = 0,04 – teste exato de Fischer). Não houve<br />
diferença para a pontuação de fissura final, porém a maioria<br />
das não abstinentes apresentou fissura média (n = 3). Entre<br />
os homens, a abstinência foi marcada pela presença de fissura<br />
forte a muito forte (n = 5). A pontuação ≥ 5 para a sensação<br />
inicial e final de bem-estar após o consumo de doce<br />
(numa escala de 0 a 10) foi atribuída por 65% dos homens e<br />
86% das mulheres.<br />
Os alimentos relatados para controlar a fissura eram fontes<br />
de carboidratos simples e complexos, tanto doces quanto<br />
salgados. Entre os 21 participantes, 19 (90%) relataram<br />
consumir doces para controlar a vontade de usar droga (Figura<br />
1). Dentre os alimentos consumidos, os mais relatados<br />
entre os usuários foram: doces, balas, refrigerantes, frutas e<br />
sucos, massas, pães e salgadinhos.<br />
Tabela 2. Média e desvio-padrão de peso corporal, IMC e diferença de peso corporal (peso final – peso inicial) entre mulheres e homens<br />
abstinentes e não abstinentes do CAPSad de Ouro Preto, MG<br />
Variáveis antropométricas<br />
Homem<br />
Mulher<br />
Abstinente Não abstinentes Abstinente Não abstinentes<br />
Média ± DP<br />
Média ± DP<br />
n (%) 9 (42,85) 5 (23,80) 3 (14,30) 4 (19,05)<br />
Peso inicial (kg) 72,63 ± 13,94 55,3 ± 5,28 67,80 ± 10,46 53,15 ± 9,26<br />
Peso final (kg) 73,02 ± 13,33 54,24 ± 6,77 70,53 ± 11,28 54,57 ± 10,03<br />
p** 0,59 0,34 0,11 0,14<br />
IMC inicial (kg/m 2 ) 24,01 ± 3,61 19,65 ± 0,59 25,68 ± 3,50 21,92 ± 2,87<br />
IMC final (kg/m 2) 24,15 ± 3,37 19,22 ± 0,56 26,72 ± 3,90 22,47 ± 2,89<br />
p** 0,59 0,34 0,11 0,14<br />
Diferença peso (kg) a 0,39 ± 2,19 -1,06 ± 1,75 2,73 ± 1,95 1,42 ± 1,85<br />
* (-) perda de peso; ** Test Wilcoxon.<br />
Tabela 3. Relato da fissura inicial e final e sensação de bem-estar após ingerir o alimento escolhido para controlar a vontade de consumir<br />
o álcool<br />
Fissura inicial<br />
Nota de 0 a 4<br />
n (%)<br />
Sensação de bem-estar após consumir o alimento para controlar a vontade de usar a droga<br />
Abstinente (n = 12) Não abstinentes (n = 9)<br />
Nota 5 a 10<br />
n (%)<br />
Nota de 0 a 4<br />
n (%)<br />
Não teve fissura a fissura média/fraca 5 (41,7) 6 (50,0) 2 (22,2) 5 (55,6)<br />
Fissura média/forte a muito forte 1 (8,3) 0 (0) 1 (11,1) 1 (11,1)<br />
Fissura final<br />
Não teve fissura média/fraca 1 (8,3) 9 (75,0) * 2 (22,2) 6 (66,7)<br />
Fissura média/forte a muito forte 2 (16,7) 0 (0) 0 1 (11,1)<br />
* Teste exato de Fisher, p = 0,04.<br />
Nota 5 a 10<br />
n (%)<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):341-6.
comunicação breve<br />
Fissura, alimentos e peso corporal em alcoolistas<br />
345<br />
8<br />
7<br />
HOMENS MULHERES TODOS<br />
Abstinente<br />
Não abstinente<br />
Número de participantes<br />
6<br />
5<br />
4<br />
3<br />
2<br />
1<br />
0<br />
Não buscou<br />
Alimentos doces<br />
Doces e salgados<br />
Não buscou<br />
Alimentos doces<br />
Doces e salgados<br />
Não buscou<br />
Alimentos doces<br />
Doces e salgados<br />
Figura 1. Alcoolistas abstinentes e não abstinentes que buscaram ou não alimentos doces e salgados para controle da vontade<br />
de usar a droga. p > 0,05 – teste exato Fisher.<br />
DISCUSSÃO<br />
Os resultados deste estudo indicam que alcoolistas que conseguiram<br />
se abster, durante o período de acompanhamento,<br />
mantiveram menor grau de fissura e maior sensação de<br />
bem-estar com o consumo de alimentos fontes de carboidratos<br />
simples ou complexos para controlar a vontade de<br />
usar o álcool.<br />
No presente estudo, observou-se que mulheres abstinentes<br />
e não abstinentes ganharam peso no período de<br />
acompanhamento. Já os homens abstinentes apresentaram<br />
pequeno ganho de peso corporal (390 g) e os não abstinentes<br />
perderam peso.<br />
O mecanismo de ganho de peso durante a abstinência<br />
não foi ainda bem compreendido de acordo com o estudo<br />
que avaliou o ganho de peso em pacientes alcoolistas durante<br />
a abstinência 12 . Por outro lado, diferenças encontradas<br />
nas alterações de peso entre homens e mulheres podem ser<br />
atribuídas a outros fatores não avaliados neste estudo, como<br />
hábito alimentar diferenciado entre os sexos, estados motivacionais,<br />
processos metabólicos e fisiológicos.<br />
A redução do IMC e da gordura corporal em homens alcoolistas<br />
em abstinência foi encontrada por Addolorato et<br />
al. 12 , os quais foram normalizados após o tempo mínimo de<br />
três meses de abstinência, enfatizando a melhora do estado<br />
nutricional com a abstinência.<br />
O relato de menor sensação de fissura ou até mesmo de<br />
não senti-la no início entre os que mantiveram a abstinência,<br />
neste estudo, pode estar associado à frequência de maior<br />
sensação de bem-estar com o consumo de alimentos fontes<br />
de carboidratos para controlar o uso do álcool.<br />
Em contrapartida, Wurtman e Wurtman 8 relataram que<br />
alterações neuroquímicas em áreas cerebrais envolvidas na<br />
recompensa podem ser induzidas pelo consumo de açúcares.<br />
A maioria dos alcoolistas e dependentes de outras drogas<br />
apresenta preferência por alimentos com alta concentração<br />
de carboidratos simples, indicando que o consumo<br />
de alimentos doces promove a liberação de endorfinas e dopamina<br />
no cérebro, simulando o efeito da droga de abuso 13 .<br />
Entretanto, ainda são poucos os estudos que relacionam<br />
o abuso de álcool e sua abstinência com o consumo de açúcares<br />
e a recompensa. Krahn et al. 14 mostraram que alcoolistas<br />
têm preferência por alimentos com sacarose e que a<br />
busca por doces, no primeiro mês de abstinência, é grande e<br />
tende a diminuir ao longo de seis meses sem consumo alcoólico.<br />
Entretanto, essa preferência alimentar por doces seria<br />
um dos motivos que contribuem para o ganho de peso na<br />
abstinência.<br />
Recentemente, Cowan e Devine 9 observaram presença<br />
de compulsão alimentar e uso de alimentos como substitutos<br />
das drogas para satisfazer a fissura entre homens alcoolistas<br />
em tratamento para a abstinência. Os autores também<br />
relataram que a privação alimentar durante a adicção<br />
e as interações entre o estágio de recuperação e convívio<br />
ambiental podem contribuir para mudanças na escolha de<br />
alimentos e para o ganho de peso excessivo na abstinência,<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):341-6.
346 Toffolo MCF et al.<br />
comunicação breve<br />
que excede o peso perdido durante a adicção. Não foram<br />
encontrados estudos comparando esses fatores entre homens<br />
e mulheres em tratamento para o alcoolismo, apenas<br />
estudo avaliando o perfil nutricional e o padrão alimentar de<br />
25 adolescentes frequentadores do CAPSad, encontrando-se<br />
eutrofia em 84% dos participantes eutróficos e bom padrão<br />
de consumo alimentar diário 15 .<br />
Durante o acompanhamento nutricional de pacientes alcoolistas<br />
em tratamento, é prudente considerar a mudança<br />
de hábitos alimentares com maior consumo de alimentos<br />
fonte de carboidratos, justificado pela sensação de bem-<br />
-estar para controlar a fissura entre os abstinentes, além do<br />
desenvolvimento de maior risco de doenças crônicas não<br />
transmissíveis, como o diabetes 10 .<br />
Neste estudo, foi pequeno o número de alcoolistas avaliados,<br />
assim como a participação do sexo feminino. Isso se<br />
justifica pela característica do serviço prestado pelo CAPSad,<br />
onde a procura em sua grande maioria é espontânea, e neste<br />
caso poucos pacientes, especificamente as mulheres, procuraram<br />
tratamento.<br />
Como outros métodos para avaliação do consumo alimentar,<br />
o levantamento de consumo de alimentos a posteriori<br />
apresenta viés de memória. Para minimizar esse tipo de<br />
erro e obter resultados mais fidedignos, obedeceu-se a todo<br />
o protocolo previamente estabelecido, no qual as entrevistas<br />
foram individualizadas, o que o torna mais sensível para<br />
detectar diferenças culturais mediante a coleta livre de informação,<br />
não forçando um nível de padronização.<br />
Este estudo inicial indica alterações antropométricas durante<br />
o tratamento e comportamentos diferentes para a fissura<br />
e a manutenção da abstinência entre homens e mulheres,<br />
sugerindo a necessidade de abordagens multidisciplinares<br />
nos CAPSad. Porém, é necessário mais estudos com número<br />
maior de participantes para melhor caracterizar a diferença<br />
entre os sexos quanto ao consumo de alimentos e à alteração<br />
da composição corporal durante o processo de abstinência.<br />
CONCLUSÃO<br />
Houve alteração de peso corporal ao longo do tempo de<br />
acompanhamento e maior fissura inicial entre as mulheres<br />
que não conseguiram se abster. O relato de consumo de<br />
alimentos fonte de carboidratos simples e complexos foi<br />
semelhante entre alcoolistas abstinentes e não abstinentes.<br />
Porém, a sensação de bem-estar com o consumo desses alimentos,<br />
para evitar o uso do álcool, foi maior entre os abstinentes<br />
que também relataram não ter ou ter fissura fraca.<br />
É importante a orientação para as escolhas alimentares<br />
entre alcoolistas em tratamento, a fim de controlar a fissura<br />
e manter o estado nutricional adequado, estabelecendo<br />
metas de peso saudável e evitando o aumento de peso corporal,<br />
compatível com aumento de riscos cardiovasculares.<br />
AGRADECIMENTOS<br />
Os autores agradecem à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação/UFOP,<br />
à Escola de Nutrição/UFOP, a Paulo Francisco<br />
e a todos os funcionários e usuários do CAPSad e à Késia<br />
Diego Quintaes, por contribuírem para a realização deste<br />
trabalho.<br />
REFERÊNCIAS<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):341-6.
elato de caso<br />
Considerações sobre a clínica e o tratamento de uma<br />
manifestação incomum do transtorno dismórfico<br />
corporal: a síndrome de referência olfatória<br />
Considerations on the clinical picture and treatment<br />
of an unusual manifestation of body dysmorphic<br />
disorder: the olfactory reference syndrome<br />
Cristiane Maluhy Gebara 1 , Tito Paes de Barros Neto 1<br />
RESUMO<br />
Palavras-chave<br />
Exposição, síndrome de<br />
referência olfatória, terapia<br />
cognitivo-comportamental,<br />
transtornos somatoformes.<br />
Neste relato, descreve-se o caso de um rapaz de 23 anos que apresentava a crença de exalar<br />
um odor desagradável proveniente da transpiração e acreditava que incomodava as outras<br />
pessoas. O paciente foi medicado com amissulprida associada a técnicas de terapia cognitivo-comportamental<br />
(TCC), tendo havido acentuada melhora do quadro clínico. Foram abordados<br />
aspectos relativos à nosologia e às manifestações clínicas da síndrome de referência<br />
olfatória (SRO), e o seu tratamento foi discutido. Observou-se que experimentos comportamentais<br />
envolvendo exposição com desafio às crenças delirantes podem ser úteis no tratamento<br />
desse transtorno e que os antipsicóticos, particularmente a amissulprida, podem ser<br />
uma boa alternativa aos inibidores de recaptação da serotonina (IRSs) no tratamento da SRO.<br />
ABSTRACT<br />
Keywords<br />
Exposure, olfactory<br />
reference syndrome,<br />
cognitive behavior therapy,<br />
somatoform disorders.<br />
We report the case of a 23 year old man who believed he emitted an unpleasant odor from perspiration<br />
which he’s believed bothered other people. He was treated with amisulpride in combination<br />
with cognitive-behavioral therapy (CBT), and there was marked improvement in the clinical status.<br />
Aspects related to the clinical manifestations and nosology of olfactory reference syndrome (ORS)<br />
and treatment were discussed. It was noted that behavioral experiments involving exposure with<br />
challenge to the delusional beliefs may be useful in the treatment of this disorder, and antipsychotics,<br />
particularly amisulpride may be a good alternative to the serotonin reuptake inhibitors (SRIs)<br />
in the treatment of ORS.<br />
Recebido em<br />
27/10/<strong>2011</strong><br />
Aprovado em<br />
16/11/<strong>2011</strong><br />
1 Universidade de São Paulo (USP), Hospital das Clínicas, Instituto de Psiquiatria, Departamento de Psiquiatria, Programa de Ansiedade<br />
(AMBAN).<br />
Endereço para correspondência: Cristiane Maluhy Gebara<br />
Rua Ovidio Pires de Campos, 785, 3º andar, Jardim Paulista – 04503-010 – São Paulo, SP, Brasil<br />
E-mail: crisgebara@gmail.com
348 Gebara CM, Barros Neto TP<br />
relato de caso<br />
INTRODUÇÃO<br />
A síndrome de referência olfatória (SRO) foi descrita há mais<br />
de um século 1 e se caracteriza pela preocupação com uma<br />
crença falsa de emitir um odor desagradável ou mesmo<br />
ofensivo, que não é percebido pelos outros. Poucos estudos<br />
foram realizados até o momento abordando esse tema. Pryse-Phillips<br />
2 introduziu o termo síndrome de referência olfatória<br />
para diferenciá-la dos sintomas olfatórios presentes na<br />
esquizofrenia, na depressão e na epilepsia do lobo temporal.<br />
O transtorno é grave e o sofrimento é intenso, podendo levar<br />
à incapacitação. O DSM-IV 3 , apesar de não classificar a SRO<br />
em uma categoria diagnóstica específica, a considera um<br />
transtorno delirante de tipo somático. Em um recente artigo<br />
de revisão sistemática, em que foram encontrados 84 relatos<br />
de casos de SRO, os autores desses relatos expressaram ceticismo<br />
quanto à natureza delirante da crença em boa parte<br />
dos casos 4 . Outro estudo, realizado no Brasil por Prazeres et<br />
al. 5 , observou que apenas 21% dos pacientes apresentavam<br />
crenças delirantes. No entanto, um estudo mais recente observou<br />
que as crenças em relação ao odor corporal eram delirantes<br />
em 85% dos casos 6 .<br />
Para alguns autores, a SRO estaria dentro do espectro da<br />
ansiedade social, incluindo-se a fobia social, Taijin Kyofusho<br />
e transtorno dismórfico corporal (TDC) 7 . Há ainda autores<br />
que acreditam que a SRO faça parte do espectro obsessivo-<br />
-compulsivo 8 .<br />
Para Begum e McKenna 4 , a SRO é um transtorno psiquiátrico<br />
primário que não se encaixa na classificação do DSM-IV<br />
como um subtipo de transtorno delirante. Feusner et al. 9 ,<br />
a exemplo de Lochner e Stein 7 , propuseram a inclusão de<br />
critérios específicos para o diagnóstico da SRO e recomendaram<br />
que esta venha a fazer parte do apêndice do DSM-V.<br />
Prazeres et al. 5 entendem que a SRO seja um subtipo de<br />
transtorno dismórfico corporal.<br />
O fato é que o status nosológico da SRO é uma questão<br />
controversa e ainda existem dúvidas sobre quais tratamentos<br />
são eficazes. Os estudos em que os pacientes foram submetidos<br />
à psicoterapia são escassos.<br />
Em relação ao tratamento, as drogas mais utilizadas<br />
são os antidepressivos, sobretudo os inibidores de recaptação<br />
da serotonina (IRSs) 9 , embora os antipsicóticos<br />
também sejam citados 4 . Há relatos de casos que sugerem<br />
que a combinação de ambos seja eficaz 5 . Note-se que as<br />
crenças presentes nos casos de SRO frequentemente são<br />
delirantes. A terapia comportamental também aparece<br />
como uma boa alternativa de tratamento 4 . Ao se fazer um<br />
levantamento sobre esses aspectos, pode-se afirmar que<br />
os estudos que abordam o tratamento da SRO são bastante<br />
limitados 6 .<br />
O objetivo deste relato de caso é propor que um antipsicótico<br />
associado à terapia cognitivo-comportamental possa<br />
ser eficaz no tratamento da SRO.<br />
DESCRIÇÃO DO CASO<br />
O paciente, um homem de 23 anos, chegou ao consultório<br />
e relatou com dificuldade o problema: acreditava exalar um<br />
odor desagradável pela transpiração e que isso incomodava<br />
as pessoas. Ele afirmava saber disso, pois notava que as pessoas<br />
se afastavam dele. O paciente terminou com dificuldade<br />
o ensino médio, mas, por causa de sua forte convicção<br />
de que exalava um odor desagradável, desistiu de estudar,<br />
abandonando os planos de ingressar na faculdade, evitando<br />
até sair de casa. Permanecia o dia todo no computador, principalmente<br />
na internet. Esse paciente encontrava-se confinado<br />
à sua casa havia seis anos.<br />
Relatou que aos 16 anos, quando voltava da escola, num<br />
dia quente, sua mãe pediu para que tomasse banho. A partir<br />
desse fato, passou a se preocupar com o suor e o odor que<br />
exalava, embora negasse sudorese excessiva. Chegava a tomar<br />
quatro banhos por dia. Procurou vários dermatologistas<br />
e experimentou diversas marcas de desodorantes para tentar<br />
resolver o problema. Foi atendido por um terapeuta de<br />
orientação psicodinâmica durante cinco anos.<br />
Ele relatou ter um bom relacionamento com os pais e<br />
o irmão mais velho. Disse ter sido uma criança muito ativa.<br />
Jogava futebol, tinha vários amigos, mas preferia conversar<br />
com adultos.<br />
O paciente apresentava diversas cognições: “pareço não<br />
pertencer a nenhum grupo”, “me sinto com cem anos, sou<br />
velho para várias coisas”, “nunca mais vou alcançar meus colegas”,<br />
tudo está no lugar errado, tudo é uma escuridão”.<br />
Ao exame psíquico, apresentava esquiva de contato interpessoal,<br />
ideias delirantes, autorreferência e autoestima<br />
diminuída.<br />
Foi feita a hipótese diagnóstica de SRO. O paciente foi medicado<br />
com paroxetina, mas teve muitos efeitos colaterais e<br />
nenhum ganho terapêutico. Seu grau de convicção em relação<br />
a exalar o odor desagradável chegava a 95%. Foi suspensa<br />
a paroxetina e introduzida a sertralina até 100 mg ao dia,<br />
sem que houvesse qualquer melhora do quadro, com diversos<br />
efeitos colaterais, como insônia, inquietação e tremor. Foi<br />
então, associada a risperidona, 1 mg ao dia, mas o paciente<br />
parou a medicação por conta própria, alegando sonolência<br />
excessiva e sentimentos de estranheza. Foi introduzida a<br />
amissulprida na dose de 50 mg ao dia e foi encaminhado para<br />
terapia cognitivo-comportamental. O paciente referiu alguma<br />
melhora com a nova medicação. Sentiu-se mais tranquilo,<br />
mas mantinha a convicção de exalar o odor desagradável.<br />
Na abordagem cognitivo-comportamental, foram feitas<br />
algumas sessões de exposição ao vivo, que caracterizavam<br />
experimentos comportamentais, e de reestruturação cognitiva.<br />
A primeira sessão de exposição foi feita na rua e consistia<br />
em, após o paciente fazer uso de uma marca de desodorante,<br />
cujo rótulo foi coberto, perguntar para os transeuntes se<br />
percebiam algum odor desagradável no paciente. A ideia era<br />
configurar uma pretensa pesquisa para uma marca de deso-<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):347-9.
elato de caso<br />
Clínica e tratamento da síndrome de referência olfatória<br />
349<br />
dorante que não poderia ser identificada. Mais de 20 pessoas<br />
responderam às perguntas e não houve nenhuma resposta<br />
de que o odor que o paciente exalava era desagradável. A<br />
convicção de que exalava tal odor passou de 95% para 75%.<br />
As suas cognições passaram a ser mais funcionais. (“agora<br />
penso em fazer algo”, “quero estar com pessoas”). A dose de<br />
amissulprida foi ajustada para 100 mg ao dia, com o paciente<br />
estando mais ativo; ele fez uma trilha e viajou para a praia.<br />
O paciente prosseguiu com suas sessões de exposição.<br />
A terapeuta sugeriu um lugar público fechado. O elevador<br />
de um shopping center foi escolhido para esse outro experimento<br />
comportamental. No elevador, a terapeuta perguntava<br />
às pessoas se sentiam algum odor estranho. Foram feitas<br />
diversas viagens de elevador e só uma pessoa respondeu<br />
que percebia um odor diferente, mas não desagradável. Sua<br />
convicção em relação a exalar o odor passou para 50%.<br />
Atualmente, o paciente encontra-se matriculado em um<br />
curso pré-vestibular. Ele tem saído com os amigos, o que não<br />
fazia antes, e fez um trabalho em um blog para um familiar. Em<br />
relação ao odor corporal, o paciente diz que este não incomoda<br />
todas as pessoas. Relata tomar um ou dois banhos por dia.<br />
Nas aulas, escolhe uma cadeira em que fique perto das pessoas<br />
que já conhece, mas ainda evita pegar elevador lotado.<br />
Após algumas sessões de reestruturação cognitiva, sua convicção<br />
em relação a exalar o odor desagradável caiu para 25%.<br />
Um comentário sobre o diagnóstico da SRO nos parece oportuno,<br />
uma vez que em alguns artigos ela aparece dentro dos<br />
espectros da ansiedade social 7 e do transtorno obsessivo-<br />
-compulsivo (TOC) 8 e guarda semelhanças com o TDC. Sobre<br />
essa questão, é importante lembrar que a esquiva e o medo<br />
de situações sociais que ocorre na SRO são secundários à<br />
crença de exalar o odor. O mesmo se pode dizer em relação<br />
ao TOC, por exemplo, em rituais de lavagem na tentativa de<br />
eliminar o odor. Em relação ao TDC, há uma preocupação<br />
em relação a um defeito imaginário. E, neste caso, pode-se<br />
especular se uma crença a respeito de um funcionamento<br />
defectivo do corpo estaria se manifestando.<br />
Técnicas específicas de TCC podem ser úteis no tratamento<br />
de sintomas psicóticos positivos como alucinações<br />
e delírios, sobretudo quando causam sofrimento 10 . No caso<br />
desse paciente, a exposição com o desafio à crença, associada<br />
à amissulprida, levou à melhora do quadro. Vale ressaltar<br />
que apenas um artigo foi localizado, em que a amissulprida<br />
foi usada no tratamento da SRO: um relato de caso 11 . Segundo<br />
Phillips e Menard 6 , os IRSs são as drogas de primeira escolha,<br />
associados ou não a antipsicóticos. Estes últimos, usados<br />
isoladamente, também podem ser uma boa alternativa. No<br />
caso do paciente em questão, não foi isso que ocorreu. Ele<br />
não respondeu a IRSs, mas a sua resposta ao antipsicótico<br />
foi bastante favorável, contrariando o que existe na literatura<br />
e denotando que antipsicóticos, particularmente a amissulprida,<br />
são uma boa alternativa no tratamento da SRO. No<br />
entanto, é importante realçar que este artigo é um relato de<br />
caso, o que dificulta a generalização do resultado.<br />
O uso de experimentos comportamentais que desafiam<br />
os delírios é encontrado na literatura e leva à redução da convicção<br />
nas crenças 10,12 . Isso pode ser observado no paciente,<br />
que, após ter se submetido às sessões de TCC, estimou ter<br />
havido uma redução de 75% na sua convicção de exalar o<br />
odor. Remanesce a questão de as crenças da SRO serem ou<br />
não delirantes. Poderiam ser ideias deliroides? Ou mesmo<br />
prevalentes? Essa é uma questão controversa que parece estar<br />
longe de se resolver. A esse respeito, Feusner et al. 9 , em<br />
sua sugestão de haver critérios específicos para o diagnóstico<br />
da SRO no DSM-V, propõem discriminar se as crenças são: 1)<br />
provavelmente não verdadeiras, 2) provavelmente verdadeiras<br />
ou 3) indubitavelmente verdadeiras. Desse ponto de vista,<br />
pode-se fazer um paralelo entre essa especificação e a questão<br />
de serem ideias prevalentes, deliroides ou delirantes.<br />
Em relação às cognições relatadas pelo paciente, também<br />
houve progresso, com o abandono parcial do discurso<br />
repetitivo em relação aos anos que ficou sem fazer nada, voltando-se<br />
para o presente e também para o futuro próximo.<br />
São necessários mais estudos controlados que evidenciem<br />
quais são os tratamentos mais eficazes da SRO.<br />
DISCUSSÃO<br />
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J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):347-9.
índice artigo remissivo original por autor<br />
A<br />
Adriana Alves Nery 294<br />
Adriana C. A. Guimarães 164<br />
Adriana Cardoso de Oliveira e Silva 99, 158,<br />
176, 301<br />
Adriana Trejger Kachani 57<br />
Adriane Bueno Marangoni 198<br />
Aihancreson Vaz Kirchoff de Oliveira 210<br />
Albina R. Torres 123<br />
Alessandra Bertinatto Pinto Fonseca 216<br />
Alexandre Dido Balbinot 205<br />
Alexandre Martins Valença 144, 301<br />
Alexandre Rafael de Mello Schier 99<br />
Alexandro Andrade 216<br />
Alexis Trott 321<br />
Aline Sardinha 227<br />
Aline Silva de Aguiar Nemer 210, 341<br />
Alpheu Ferreira do Amaral Junior 205<br />
Amanda Bertolini de Jesus Silva 210<br />
Amaury Cantilino da Silva Junior 171<br />
Ana Carolina Soares Amaral 309<br />
Ana Cecilia Petta Roselli Marques 233<br />
Andre J. Xavier 164<br />
André Soares Rebello 7<br />
Angelica Francesca Maris 321<br />
Anna Lucia Spear King 301<br />
Antonio Carlos de Farias 240<br />
Antônio de Pádua Serafim 11<br />
Antonio Egidio Nardi 99, 144, 158, 227, 247, 301<br />
Antonio Lucio Teixeira 131, 141, 271<br />
Antonio Roma-Torres 182<br />
Arthur Kummer 131<br />
B<br />
Barbie P. do Rosario 164<br />
Bernard Pimentel Range 176<br />
Bernardo Rangel Tura 158<br />
Bianca Elisabeth Thurm 331<br />
Bruno Copio Fabregas 141<br />
C<br />
Carla Fonseca Zambaldi 171<br />
Carlos Alberto Buchpiguel 1<br />
Carlos Eduardo Paula Leite 123<br />
Carlos Francisco Almeida de Oliveira 46<br />
Cassia Roberta Benko 240<br />
César de Moraes 40<br />
Cezar Augusto Casotti 294<br />
Cintia Villela Kirchmeyer 266<br />
Clareci Silva Cardoso 221<br />
Clarissa R. Dantas 135, ,337<br />
Claudia Aparecida Marliere 341<br />
Claudio E. M. Banzato 341<br />
Claudio Gil Soares de Araujo 227<br />
Cleucimara Aparecida Camilo 284<br />
Cristiane Cauduro de Souza 73<br />
Cristiane Maluhy Gebara 347<br />
Cynthia Mara Felício 284<br />
D<br />
Daianny Macedo de Sousa Rego 46<br />
Daniel Martins de Barros 11<br />
Debora Cristiane Silva Flores Lino 294<br />
Denise Brasil 50<br />
Domingos Sávio da Costa 23<br />
E<br />
Edgar Nunes de Moraes 253<br />
Eduardo Jardel Portela 131<br />
Eleni de Araújo Sales 34<br />
Eliana Zandonade 151<br />
Eliane Florencio Gama 331<br />
Euclides Timóteo da Rocha 1<br />
Euripedes Constantino Miguel 1<br />
Everto Botelho Sougey 171<br />
F<br />
Fabiana Saffi 11<br />
Fabio Lopes Rocha 253, 271<br />
Fabio Tapia Salzano 331<br />
Felipe Filardi da Rocha 148<br />
Felipe Jose Nascimento Barreto 277<br />
Fernanda Monte 164<br />
Filipa Vieira 182<br />
Flavia Domingues Vitorino 141<br />
Frederico D. Garcia 71<br />
G<br />
Gabriel Soares Ledur Alves 205<br />
Geraldo Busatto Filho 1<br />
Gerardo Maria de Araujo Filho 131<br />
Gilson de Vasconcelos Torres 86<br />
Giovanni Marcos Lovisi 91<br />
Guilherme Nogueira M. de Oliveira 131<br />
Guilherme Rubino de Azevedo Focchi 259<br />
H<br />
Hannia Roberta Rodrigues Paiva da Rocha 34<br />
Heloísa Karmelina Carvalho de Sousa 34<br />
Héloïse Delavenne 71<br />
Helymar da Costa Machado 198<br />
Henrique Claudio Vicentini 123<br />
I<br />
Isa de Pádua Cintra 198<br />
Isabel Brandão 182<br />
Isabella Nascimento 144<br />
Ismael Dale Cotrim Guerreiro da Silva 259<br />
Izabela Guimarães Barbosa 271<br />
Izabelle de Sousa Pereira 341<br />
J<br />
Jair Sindra Virtuoso Junior 80<br />
Janiara David Silva 210<br />
Jaqueline Garcia da Silva 73<br />
Jesus Landeira-Fernandez 266<br />
João C. Villares 111<br />
João Carlos Alchieri 34, 86<br />
João Carlos Nascimento de Alencar 34<br />
João Domingos Scalon 221, 271<br />
João Vinicius Salgado 131<br />
Jonas Jardim de Paula 253<br />
José Carlos Souza 23<br />
José Luis G. Pinho Costa 111<br />
Joyce dos Santos Neves 123<br />
Juliana Kelly Pinto Moreira 221<br />
K<br />
Karine Aparecida Louvera Silva 341<br />
Karine Porpino Viana 171<br />
Késia Diego Quintaes 210<br />
L<br />
Laila da Camara Lima Kurtinaitis 171<br />
Lays Guimaraes Amorim de Oliveira 216<br />
Leandro Fernandes Malloy-Diniz 253<br />
Leonardo de Sousa Fortes 309<br />
Leonardo F. Fontenelle 64<br />
Leonor Lencastre 182<br />
Letícia Leite 233<br />
Lívia Angeli Silva 294<br />
Lucas F. B. Mella<br />
Lucas O. Maia 111<br />
Lucia Abelha 91<br />
Luciana Araújo dos Reis 86<br />
Luciene Bolzam Macente 151<br />
M<br />
Maick da Silveira Viana 216<br />
Manoel Antônio dos Santos 16<br />
Manuel A. Fernandez Esteves 111<br />
Mara L. Cordeiro 240<br />
Marcele Regine de Carvalho 247<br />
Marcelo Rossoni da Rocha 233<br />
Marcia Dourado 50<br />
Márcia Freitas 64<br />
Marco Aurelio Negreiros 266<br />
Marcos Rogério Capello Sousa 40<br />
Margareth da Silva Oliveira 73<br />
Maria Aparecida Camargos Bicalho 253<br />
Maria Aparecida Conti 190<br />
Maria Aparecida Zanetti Passos 198<br />
Maria da Glória da Costa Carvalho 7<br />
Maria da Graça Tanori de Castro 233<br />
Maria Elisa Caputo Ferreira 190, 309<br />
Maria F. Laus 315<br />
Maria Fernanda Barroso de Sousa 50<br />
Maria Fernanda Faria Achá 11<br />
Maria Luiza de Jesus Miranda 331<br />
Maria Tavares Cavalcanti 91<br />
Mariana Fonseca Cotta 253<br />
Marilia Suzi Pereira dos Santos 171<br />
Marina Bandeira 221, 284<br />
Marina Prista Guerra 182<br />
Maura Maria Guimarães de Almeida 80<br />
Mauro Fisberg 198<br />
Mauro V. Mendlowicz 67<br />
Mauro Vitor Mendlowicz 144<br />
Mayla Cardoso Fernandes Toffolo 341<br />
Mônia Aparecida da Silva 284<br />
Murilo da Silva Alves 294<br />
N<br />
Naira Vassalo Lage 148<br />
Natalia Pinho de Oliveira Ribeiro 99<br />
O<br />
Orlandi-Mattos P. 111<br />
P<br />
Paola Lucena dos Santos 233<br />
Paulo Mattos 266<br />
Priscilla Lourenço Leite 176<br />
R<br />
Rafael Thomaz da Costa 247<br />
Raimundo Félix dos Santos Júnior 46<br />
Raphael Cangelli Filho 331<br />
Raquel Luiza Santos 50<br />
Regina Alvarenga 266<br />
Regina Ponce da Silva 158<br />
Renata Alves Paes 266<br />
Renata Brasil Araujo 28, 205, 233<br />
Ricardo Brandt 216<br />
Ricardo de Azevedo Klumb Steffens 216<br />
Rodolfo de Castro Ribas Junior 176<br />
Rodrigo Barreto Huguet 271<br />
Rodrigo de Almeida Ferreira 271<br />
Rodrigo Moura-Neto 7<br />
Rodrigo Nicolato 253<br />
Ronaldo Bastos 190<br />
Rosana Cipolotti 277<br />
Rosemeri Siqueira Pedroso 233<br />
S<br />
Samuel Robson Moreira Rego 46<br />
Sandra Scivoletto 259<br />
Sandra Torres 182<br />
Saulo Vasconcelos Rocha 80<br />
Sebastião S. Almeida 315<br />
Sérgio Paulo Rigonatti 11<br />
Silvia Parcias 164<br />
Silvio Roberto Sousa-Pereira 131<br />
Stela Verzinhase Peres 1<br />
T<br />
Taís Cardoso de Zeni 28<br />
Táki Athanássios Cordás 57<br />
Talvane Marins de Moraes 144<br />
Tânia Maria Araújo 80<br />
Tarcísio Gomes Dutra 171<br />
Tatiana Fernandes Carpinteiro da Silva 91<br />
Tatiana Zambrano Filomensky 176<br />
Telma M. Braga Costa 315<br />
Thaiza Teixeira Xavier Nobre 86<br />
Thiago Sakae 164<br />
Tito Paes de Barros Neto 347<br />
V<br />
Valter Paulo Neves Miranda 190, 309<br />
Vanessa Machado 16<br />
Vanessa Mason 91<br />
Victor M. V. Lopes 337<br />
Vilma Aparecida da Silva Fonseca 210<br />
Vitor Brito da Silva 46<br />
Viviane dos Santos Souza 294<br />
W<br />
Walmor J. Piccinini 231<br />
William Berger 67<br />
Z<br />
Zanon Passos 64
índice artigo remissivo original por assunto<br />
A<br />
Abstinência 28, 29, 30, 32, 73, 74, 76, 77, 118,<br />
206, 207, 234, 236, 237, 259, 263, 341,<br />
342, 343, 344, 345<br />
Adaptação transcultural 99, 164, 176, 177, 247,<br />
249, 251, 252<br />
Adesão 17, 30, 41, 46, 47, 48, 49, 53, 73, 74,<br />
77, 78, 136, 137, 138, 139, 158, 159,<br />
162, 278, 285<br />
Adolescência 40, 41, 60, 61, 62, 63, 190, 191,<br />
192, 193, 194, 196, 197, 278, 310, 313<br />
Adolescente 23, 40, 41, 42, 43, 44, 58, 74, 78,<br />
126, 127, 190, 191, 192, 193, 194, 195,<br />
196, 198, 199, 200, 201, 202, 203, 217,<br />
238, 241, 254, 277, 278, 279, 280, 281,<br />
282, 309, 310, 311, 312, 313, 315, 346<br />
Adultos 23, 35, 36, 41, 43, 57, 59, 61, 65,<br />
159, 195, 196, 199, 202, 203, 211, 217,<br />
238, 249, 252, 254, 267, 278, 295, 298,<br />
323, 348<br />
AIDS 46, 47, 48, 49<br />
Álcool 7, 30, 31, 35, 36, 37, 38, 41, 46, 47, 48,<br />
49, 76, 77, 78, 82, 91, 126, 145, 156, 158,<br />
160, 161, 184, 207, 210, 211, 212, 213,<br />
214, 215, 235, 237<br />
Álcool desidrogenase 7, 214<br />
Alcoolismo 7, 78, 210, 346<br />
Análise individual 1<br />
Anemia falciforme 277, 278, 279, 280, 281,<br />
283, 283<br />
Anorexia nervosa 57, 58, 59, 61, 123, 124, 127,<br />
182, 183, 186, 332, 333, 335<br />
Anosognosia 50, 51, 52, 53, 54<br />
Ansiedade 28, 29, 30, 31, 32, 35, 37, 38, 41,<br />
43, 69, 76, 81, 84, 87, 90, 124, 125, 126,<br />
127, 128, 129, 133, 158, 160, 161, 162,<br />
219, 227, 228, 229, 230, 233, 235, 236,<br />
237, 238, 241, 248, 271, 273, 274, 275,<br />
301, 348, 349<br />
Antropometria 205<br />
Apoio social 16, 156<br />
Atenção primária à saúde 221, 222<br />
Atividade física 26, 44, 56, 59, 61, 80, 81, 82, 83,<br />
84, 214, 228, 275, 310, 313, 315<br />
Atletas 217, 309, 310, 311, 312, 313, 335<br />
Autoconhecimento 135, 136<br />
Avaliação de resultados (cuidados de saúde)<br />
129, 284<br />
Avaliação nutricional 210, 343<br />
C<br />
Carboidratos 214, 341, 342, 344, 345, 346<br />
CCQ-B 233, 234, 235, 236, 237, 238<br />
Cirurgia cardíaca 86, 87, 88, 89, 90<br />
Cocaína (crack) 28, 29, 205, 206, 233, 234, 237<br />
Cognição 52, 118, 138, 139, 254, 266, 267,<br />
269, 270<br />
Comorbidades 32, 88, 102, 125, 160, 260, 264,<br />
271, 272, 273, 274, 275<br />
Comportamento aditivo 205<br />
Comportamento compulsivo 171, 176, 178<br />
Comportamento obsessivo 171<br />
Composição corporal 81, 205, 206, 209, 210,<br />
211, 310, 346<br />
Consciência do déficit 50, 51, 52, 53<br />
Crack/cocaina (ver cocaina/crack<br />
Craving 28, 29, 30, 31, 32, 120, 205, 206, 233,<br />
234, 235, 237, 238, 341, 342, 343<br />
Crianças 23, 40, 41, 42, 44, 65, 124, 125, 126,<br />
159, 172, 174, 195, 241, 277, 278, 279,<br />
280, 281, 282, 322, 323, 348<br />
Criminoso sexual 11<br />
Cybersickness 247, 248, 249, 251<br />
D<br />
Declaração de óbito 294, 297<br />
Deficiência mental 58, 61, 321<br />
Demência 50, 51, 52, 53, 54, 55, 84, 132, 143,<br />
254, 255, 257, 267, 269, 270<br />
Depressão 35, 37, 38, 41, 43, 44, 47, 51, 53,<br />
54, 58, 60, 76, 81, 84, 87, 116, 117, 125,<br />
131, 132, 133, 134, 141, 142, 143, 156,<br />
157, 158, 159, 160, 161, 162, 163, 164,<br />
165, 166, 167, 168, 169, 170, 216, 217,<br />
218, 219, 220, 233, 235, 236, 237, 238,<br />
241, 249, 253, 255, 256, 260, 272, 275,<br />
277, 278, 282, 295, 348<br />
Disfunção sináptica 321<br />
Distorção da percepção 331, 332, 333, 334, 335<br />
Doença crônica 83, 84, 85, 99, 139, 278<br />
Doença de Alzheimer 253, 254, 255, 256,<br />
257, 258<br />
E<br />
Educador físico 23<br />
Emetofobia 123, 124, 125, 256, 127, 128, 129<br />
Endocanabinoide 111, 112, 113, 114, 116, 117,<br />
118, 119, 120, 121<br />
Envelhecimento 52, 54, 81, 253, 254, 255<br />
Epilepsia 60, 131, 132, 133, 134, 145, 260, 348<br />
Equivalência semântica 166, 247, 249, 251, 252<br />
Escala de Avaliação de Depressão de Hamilton<br />
131, 165<br />
Escalas de graduação psiquiátrica 176<br />
Esclerose múltipla 266, 267, 268, 269, 270<br />
Esquizofrenia 11, 38, 91, 135, 136, 137, 138,<br />
139, 140, 285, 287, 288, 290, 295, 333,<br />
337, 338, 339, 340, 348<br />
Estações do ano 337, 338<br />
Estado nutricional, 190, 191, 192, 193, 194,<br />
195, 196, 197, 198, 199, 201, 202, 211,<br />
214, 341, 345, 346<br />
Estágios de mudança 73, 75<br />
Estatura 42, 67, 68, 190, 192, 193, 198, 199,<br />
200, 201, 202, 203, 205, 206, 207, 211,<br />
309, 311, 326<br />
Estilos de personalidade 36, 86, 87, 88, 89, 90<br />
Estudo longitudinal 50, 342<br />
F<br />
Febre reumática 158, 159, 161, 231<br />
Fibromialgia 143, 216, 217, 219<br />
Fobia de vômito(ar) 123, 124, 125, 126, 128<br />
(ver também medo de vomitar)<br />
H<br />
HAART 46, 47, 49<br />
Hábitos alimentares 44, 58, 62, 142, 211, 240,<br />
241, 346<br />
Humor 29, 58, 60, 61, 117, 134, 142, 143, 160,<br />
162, 164, 165, 166, 216, 217, 218, 219,<br />
220, 272, 273, 274, 275, 279, 280, 281,<br />
282, 288, 290<br />
I<br />
Idoso 75, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 168, 170, 253,<br />
254, 255, 257, 258<br />
Imagem corporal 57, 59, 60, 61, 62, 127, 190,<br />
191, 194, 195, 196, 197, 198, 199, 201,<br />
202, 203, 279, 309, 310, 312, 313, 315,<br />
331, 332, 333, 334<br />
Imprinting genômico 321, 324, 325, 329<br />
Índice de massa corporal 40, 42, 61, 182, 184,<br />
186, 190, 192, 193, 194, 198, 199, 200,<br />
201, 205, 207, 208, 210, 211, 212, 213,<br />
273, 309, 310, 311, 315, 341, 343<br />
Infância 40, 41, 59, 61, 62, 65, 125, 126, 132,<br />
191, 231, 278, 295, 323, 326<br />
Insight 50, 51, 52, 53, 135, 136, 138, 139,<br />
140, 146<br />
Internação compulsória de doente mental 144<br />
Inventário de Depressão de Beck 131, 132, 278<br />
J<br />
Jogo patológico 73, 74, 75, 78<br />
M<br />
Mania 43, 271, 272, 275<br />
Medição da dor 86<br />
Medo de vomitar (ver também fobia de<br />
vomitar) 123, 124, 125, 127, 128<br />
Memória 29, 32, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 65, 81,<br />
113, 120, 138, 219, 253, 254, 255, 256,<br />
257, 266, 267, 268, 269, 270, 326, 346<br />
Motivação para mudança 73, 74, 75, 76, 77<br />
N<br />
Neurobiologia 111, 112, 148<br />
Neuroplasticidade 111, 112, 116, 117, 119,<br />
120, 274<br />
Nicotina 29, 30, 32, 207, 214, 234, 235, 259,<br />
260, 261, 263, 264<br />
O<br />
Obesidade 40, 41, 42, 43, 44, 60, 81, 82, 83, 88,<br />
190, 192, 193, 194, 195, 196, 199, 201,<br />
202, 203, 214, 323, 326<br />
P<br />
Pânico 43, 123, 124, 125, 126, 127, 128,<br />
129, 158, 160, 161, 162, 227, 228,<br />
273,274, 301<br />
Percepção de tamanho 331, 333<br />
Peso corporal 58, 59, 62, 127, 196, 198, 201,<br />
207, 214, 228, 310, 312, 313, 341, 342,<br />
343, 344, 345, 346<br />
Polimorfismo 7, 148, 259, 260, 261, 262,<br />
263, 264<br />
Pós-operatório 86, 87, 88, 89, 90<br />
Pós-parto 171, 172, 175<br />
Programa Saúde da Família 221, 222<br />
Próteses valvulares cardíacas 158<br />
Psicometria 99, 100, 176<br />
Psicopatologia 34, 36, 42, 57, 59, 62, 64, 124,<br />
135, 136, 139, 140, 144, 147, 240, 241,<br />
337, 338, 339<br />
Psiquiatria forense 144, 147<br />
Q<br />
Qualidade de vida 23, 55, 58, 82, 84, 85, 90, 91,<br />
99, 100, 209, 219, 228, 252, 278<br />
R<br />
RAVLT 253, 254, 255, 256, 257, 258, 267,<br />
268, 269, 270<br />
Readmissão 16<br />
Realidade virtual 247, 248, 249, 251, 252<br />
Refratariedade 141, 142, 143<br />
Retardo mental 11, 29, 35, 57, 58, 59, 60, 144,<br />
145, 146, 147, 321, 322, 328<br />
Reumatologia 99, 100, 101, 102<br />
S<br />
Satisfação do usuário 284<br />
Saúde mental 11, 16, 17, 20, 21, 23, 25, 26, 35,<br />
36, 37, 42, 44, 61, 68, 70, 80, 81, 82, 84,<br />
91, 99, 100, 101, 102, 113, 145, 158, 159,<br />
162, 165, 169, 171, 172, 175, 177, 216,<br />
217, 218, 219, 222, 225, 241, 282, 284,<br />
285, 286, 287, 289, 291, 292, 295, 299<br />
Serviços de saúde mental 21, 36, 42, 91, 222,<br />
284, 285, 286, 287, 291, 292<br />
Sexo 23, 25, 125,<br />
SF-36 23, 24, 25, 252<br />
Síndrome de abstinência 234, 341, 342,<br />
Síndrome de Angelman 321, 322, 323, 324,<br />
326, 327, 328, 329<br />
Síndrome de referência olfatória 347, 348<br />
Sintomas afetivos 182<br />
Sintomas depressivos 32, 44, 53, 54, 65, 81,<br />
84, 132, 133, 134, 136, 139, 141, 142,<br />
148, 165<br />
Sintomas psíquicos 44, 91<br />
Sistema Básico de Saúde 221<br />
Sistemas de informação 151<br />
SPECT cerebral 1<br />
SPM 1, 2, 3, 4, 5<br />
Suicídio 52, 60, 75, 136, 151, 152, 153, 154,<br />
155, 156, 157, 158, 160, 161, 162, 163,<br />
271, 272, 273, 274, 275, 294, 295, 296,<br />
297, 298, 299, 300<br />
Suicídio/tendências 151<br />
T<br />
Tabaco 28, 29, 30, 31, 32, 76, 207, 237, 238,<br />
239, 273, 274<br />
Taxa de permanência 16, 17, 18, 19, 20, 21<br />
Tentativa de suicídio 60, 152, 271, 273, 274,<br />
294, 295, 296, 298<br />
Terapia cognitivo-comportamental 62, 74,<br />
128, 227, 228, 248, 260, 261, 263, 301,<br />
347, 348,<br />
Testes neuropsicológicos 51, 266, 267, 268, 269<br />
TOC (ver Transtorno obsessivo-compulsivo)<br />
Transtorno alimentar 58, 60, 127, 183, 331, 332<br />
Transtorno bipolar 35, 271, 272, 273, 274, 275<br />
Transtorno de comportamento 40
352 índice remissivo por assunto<br />
Transtorno de estresse pós-traumático 64,<br />
67, 69<br />
Transtornos de personalidade 34, 35, 37, 38<br />
Transtornos do humor 58, 143, 164, 288, 290<br />
Transtornos mentais comuns 80, 81, 82, 83, 84,<br />
85, 221, 222, 224<br />
Transtornos mentais 11, 35, 36, 80, 81, 82, 83,<br />
84, 85, 124, 125, 134, 140, 145, 160, 161,<br />
163, 165, 166, 221, 222, 223, 224, 225,<br />
Transtorno obsessivo-compulsivo 1, 59, 123,<br />
125, 127, 148, 158, 160, 161, 172, 178,<br />
231, 273, 274<br />
Transtornos por uso de Cannabis 111, 112,<br />
120, 121<br />
Transtornos psiquiátricos 43, 58, 59, 62, 84,<br />
101, 129, 132, 144, 148, 149, 158, 159,<br />
160, 161, 163, 173, 228, 231, 255, 272,<br />
281, 285, 286, 299<br />
U<br />
UBE3A 321, 322, 323, 324, 325, 326, 327,<br />
328, 329<br />
URICA 73, 74, 75, 77<br />
Usuários de droga 74, 78, 205, 342, 343<br />
V<br />
Validação 30, 35, 36, 52, 55, 82, 133, 164, 165,<br />
166, 167, 169, 170, 177, 178, 217, 233,<br />
234, 235, 236, 237, 252, 286, 338<br />
Violência 11, 144, 146, 147, 157, 172, 174,<br />
208, 225, 295<br />
Vitamina B12 141, 142, 143<br />
J Bras Psiquiatr. <strong>2011</strong>;60(4):350-2.
instruções aos autores<br />
Informações Gerais<br />
Missão – O Jornal Brasileiro de Psiquiatria (JBP), órgão oficial do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro,<br />
é publicado regularmente há mais de 70 anos e o periódico de psiquiatria mais tradicional do Brasil. A missão do JBP é contribuir para<br />
o avanço no entendimento e na assistência de indivíduos com transtornos mentais por meio da publicação de artigos que abordam as<br />
relações da psiquiatria com diferentes áreas do conhecimento científico, incluindo a medicina clínica, a psicologia e a sociologia.<br />
O Jornal Brasileiro de Psiquiatria aceita artigos escritos em português, inglês ou espanhol nas seguintes categorias:<br />
(a) artigos originais;<br />
(b) comunicações breves;<br />
(c) revisões;<br />
(d) atualizações;<br />
(e) casos clínicos;<br />
(f) cartas ao editor;<br />
(g) resenha de livros<br />
Os manuscritos devem ser enviados para Leonardo Fontenelle, editor, para o seguinte e-mail: editora@ipub.ufrj.br. Os manuscritos<br />
devem estar acompanhados de uma carta de autorização, assinada por todos os autores, seguindo o modelo abaixo, que deve ser enviada<br />
por correio para o endereço do jornal. Uma vez aceito para publicação, torna-se o trabalho propriedade permanente do Jornal Brasileiro de<br />
Psiquiatria, que reserva todos os direitos autorais no Brasil e no exterior.<br />
Carta de Autorização – Modelo<br />
“Os autores abaixo assinados transferem ao Jornal Brasileiro de Psiquiatria, com exclusividade, todos os direitos de publicação, em<br />
qualquer meio, do artigo..., garantem que é inédito, não está sendo avaliado por outro periódico e que o estudo foi conduzido conforme<br />
os princípios da Declaração de Helsinki e de suas emendas, com o consentimento informado aprovado por Comitê de Ética devidamente<br />
credenciado” (incluir nome completo, endereço postal, telefone, fax, e-mail e assinatura de todos os autores).<br />
Avaliação por Pareceristas (Peer Review)<br />
O(s) autor(es) receberá(ão) uma confirmação (por e-mail ou por carta) informando sobre a chegada do manuscrito e seu número de<br />
protocolo, o qual será usado durante toda a comunicação posterior. Os artigos submetidos ao Jornal Brasileiro de Psiquiatria são inicialmente<br />
avaliados quanto à sua adequação ao formato (estrutura do manuscrito) e ao escopo editorial do periódico. Os editores se reservam ao<br />
direito de recusar artigos sem uma revisão externa se julgarem que o artigo não se encaixa nos objetivos do JBP, seja por falta de qualidade<br />
ou por inadequação ao escopo do periódico. Artigos qualitativos que não representem um estudo inovador serão recusados. Após passar<br />
pelo crivo dos editores, os artigos são enviados, de forma anônima, a pelo menos dois pareceristas anônimos e independentes. A decisão<br />
final dos editores, com as cópias dos pareceres, é encaminhada aos autores. No caso de manuscritos que caiam em exigências, o(s) autor(es)<br />
deve(m) retornar uma versão final do texto incorporando as modificações solicitadas e uma carta com respostas específicas a cada ponto<br />
levantado pelos revisores. Não serão reavaliados artigos que não sejam acompanhados por uma carta resposta detalhada ou cuja carta<br />
resposta contenha apenas comentários gerais.<br />
Conflitos de Interesse<br />
Solicitamos aos autores para declarar todas as possíveis formas de conflitos de interesse, incluindo relações financeiras, entre outras.<br />
A não existência de conflito de interesse também deve ser declarada. O autor pode consultar o editorial sobre esse assunto no British Medical<br />
Journal intitulado “Beyond conflict of interest” (além dos conflitos de interesse) (http://www.bmj.com/cgi/content/full/317/7154/291).<br />
Artigos sem declarações acerca de conflitos de interesse serão enviados de volta aos autores.<br />
As fontes de financiamento devem ser declaradas na seção de agradecimentos.<br />
Permissão para Reproduzir Material Publicado Previamente<br />
Solicitamos que nos envie cópias de permissão para reproduzir materiais (como ilustrações e tabelas) do proprietário do copyright.<br />
Não poderemos publicar o material sem essas permissões.<br />
Termos de Consentimento<br />
Os artigos devem citar que os pacientes incluídos nos estudos assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme a<br />
regulamentação de pesquisa clínica no País.<br />
Aprovação Ética das Pesquisas<br />
Deve ser declarado claramente, na seção de Métodos, que estudo com seres humanos somente foi conduzido após a aprovação de um<br />
Comitê de Ética em Pesquisa. De forma similar, deve-se confirmar que experimentos envolvendo animais estão de acordo com os padrões<br />
éticos de cuidados com os animais envolvidos.<br />
Estrutura Geral do Manuscrito<br />
O arquivo deve ser produzido em Word, em Arial, tamanho 12. As abreviações deverão ser evitadas, entretanto abreviações oficiais<br />
poderão ser utilizadas, com a primeira menção no texto completa, seguida da sua forma abreviada entre parênteses. Os nomes de<br />
medicamentos deverão ser mencionados pela sua denominação química. Todas as páginas devem estar numeradas, indicando-se na<br />
primeira a contagem do número total de palavras presentes no corpo do texto (excluindo-se resumo e palavras-chave, abstract, referências,<br />
figuras e ilustrações).<br />
A primeira página (folha de rosto) deve conter o título em português e em inglês e o título resumido com até 50 caracteres incluindo<br />
letras, espaços e pontuações.<br />
A segunda página deve conter o RESUMO do trabalho em português. O resumo deve ser informativo, dando uma descrição clara e<br />
concisa do conteúdo do artigo, e não deve exceder o limite de 200 palavras. Nos artigos originais, nas comunicações breves e nas revisões,
instruções aos autores<br />
os resumos devem ser estruturados contendo quatro tópicos: Objetivo(s), Métodos<br />
(e não metodologia), Resultados e Conclusões. As palavras-chave deverão estar logo<br />
após o resumo, devendo ter um número máximo de 4, e refletir o conteúdo do assunto.<br />
Recomenda-se o uso de termos da lista denominada Medical Subject Headings, do Index<br />
Medicus, ou da lista de Descritores de Ciências da Saúde, publicada pela BIREME, para<br />
trabalhos em português.<br />
A terceira página deve conter o título, o resumo do trabalho (Abstract) e as palavraschave<br />
em inglês (keywords), que devem ser idênticos às suas versões em português. Os<br />
editores recomendam atenção especial à linguagem no abstract. Artigos poderão ser<br />
recusados com base na qualidade do inglês.<br />
A partir da quarta página, deve-se iniciar o corpo do texto que, nos artigos originais<br />
e nas comunicações breves, deve conter as seguintes seções: Introdução, Métodos,<br />
Resultados, Discussão e Conclusões. Os autores não devem incluir Resultados e Discussão<br />
em uma mesma sessão.<br />
Introdução – Deve conter uma revisão sucinta da literatura diretamente relacionada<br />
com o tema, assim como o objetivo do estudo.<br />
Métodos – Devem descrever o modelo do estudo e os detalhes dos métodos que<br />
permitam sua replicação por outros autores.<br />
Resultados – Devem ser descritos de forma lógica, sequencial e concisa, com o<br />
eventual auxílio de tabelas e ilustrações.<br />
Discussão – Deve se limitar a ressaltar os achados obtidos, destacar as semelhanças<br />
ou diferenças com os achados obtidos por outros autores, ressaltar as implicações dos<br />
achados, suas limitações e perspectivas futuras.<br />
Conclusões – Devem especificar, preferencialmente em um parágrafo curto, apenas<br />
as conclusões que os dados do estudo permitem sustentar, com seu significado clínico<br />
(evitando generalizações excessivas).<br />
As tabelas e os gráficos devem ser numerados em algarismos arábicos e preparados<br />
em folhas separadas, com as respectivas legendas. Cada tabela deve conter um título<br />
descritivo e uma legenda (se necessário). As tabelas devem ser autoexplicativas e não<br />
repetir as informações já contidas no texto. Não serão aceitos gráficos do tipo histograma<br />
em estudos meramente descritivos. Os locais sugeridos para a inserção deverão ser<br />
indicados no texto, com destaque.<br />
Ilustrações e fotografias devem ser enviadas em arquivos de alta resolução, em<br />
formato tif ou.jpg. A impressão de fotos em cores será cobrada do autor. Os Agradecimentos<br />
deverão incluir nomes de participantes que contribuíram intelectual ou tecnicamente em<br />
alguma fase do estudo, mas que não são classificados como autores: agradecimentos por<br />
apoio financeiro, auxílio técnico etc. devem aparecer antes das Referências.<br />
Referências<br />
As referências devem seguir o padrão estilo de Vancouver (consultar: “Uniform<br />
Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals: Writing and Editing for<br />
Medical Publication”<br />
[http://www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html]), ser numeradas no<br />
manuscrito e listadas no final na mesma ordem em que foi utilizada. Todas as citações do<br />
texto devem constar, de forma correta, na bibliografia.<br />
Artigos<br />
• Versiani M. A review of 19 double-blind placebo-controlled studies in social anxiety<br />
disorder (social phobia). World J Biol Psychiatry. 2000;1(1):27-33.<br />
• Appolinario JC, McElroy SL. Pharmacological approaches in the treatment of binge<br />
eating disorder. Curr Drug Targets. 2004;5(3):301-7.<br />
• Dekker J, Wijdenes W, Koning Y A, Gardien R, Hermandes-Willenborg L, Nusselder<br />
H, et al. Assertive community treatment in Amsterdam. Community Ment Health J.<br />
2002;38:425-34.<br />
Livro<br />
• Goodwin FK, Jamison KR. Manic-Depressive Illness. New York: Oxford University<br />
Press; 1990.<br />
Capítulo de Livro<br />
• Heimberg RG, Juster HR. Cognitive-behavioral treatments: literature review. In:<br />
Heimberg RG, Liebowitz MR, Hope DA, Scneier FR, editors. Social phobia – Diagnosis<br />
Assessment and Treatment. New York: The Guilford Press; 1995. p. 261-309.<br />
Artigos aceitos para publicação (in press) podem ser incluídos na bibliografia, mas<br />
o nome do periódico deve aparecer e, se possível, o volume e o ano devem ser indicados.<br />
Referências a materiais não publicados devem ser citadas entre parênteses no texto, mas<br />
não na bibliografia. Resumos (Abstracts) podem ser citados somente quando contiverem<br />
informações substanciais e não publicadas em outras fontes. Sua natureza deve ser citada<br />
na bibliografia, com o termo adicional (Resumo) no final da referência.<br />
Referências a páginas na Web devem ser listadas como a seguir. Por exemplo:<br />
Associação Brasileira de Psiquiatria – Diretrizes para a Indústria da Moda. Recomendações<br />
da Comissão Técnica Brasileira de Grupos Especializados no Estudo e Tratamento de<br />
Transtornos Alimentares. http://www.abpbrasil.org.br/newsletter/comissao_ta/<br />
diretrizes_moda.pdf. Acessado em: 12 de abril de 2007.<br />
Tipos de Artigos<br />
1. Artigos originais – São trabalhos destinados a comunicar resultados de<br />
pesquisa, experiências clínicas ou outras contribuições originais. Tipicamente, os artigos<br />
originais apresentam dados novos derivados de uma investigação com um número<br />
representativo de indivíduos. Os artigos originais não devem exceder 4.000 palavras nem<br />
30 referências bibliográficas.<br />
2. Comunicação breve – Caracteriza-se por trabalhos contendo pequenas<br />
experiências ou comunicações preliminares, que tenham caráter de originalidade, não<br />
ultrapassando 2.000 palavras nem 15 referências bibliográficas.<br />
3. Artigos de revisão − São revisões sistemáticas da literatura que buscam<br />
responder a uma pergunta bem delimitada. Devem conter até 6.000 palavras e 80<br />
referências bibliográficas. Deverão apresentar: folha de rosto, resumo estruturado,<br />
introdução, métodos e discussão, conclusões e referências bibliográficas.<br />
4. Artigos de atualização − São trabalhos descritivos e interpretativos baseados na<br />
literatura recente sobre a situação global em que se encontra determinado assunto. Devem<br />
conter até 3.000 palavras e 40 referências bibliográficas, devendo também ser mais breves<br />
que os artigos de revisão. Deverão apresentar: folha de rosto, resumo não necessariamente<br />
estruturado, introdução, métodos e discussão, conclusões e referências bibliográficas.<br />
5. Artigos de apresentação de casos clínicos – Trabalhos contendo casos<br />
clínicos interessantes e originais. Deverão apresentar: folha de rosto, resumo, abstract,<br />
introdução, descrição do caso clínico, sua relevância e/ou originalidade, discussão,<br />
conclusão e a bibliografia consultada sobre o tema. Não deverão ultrapassar 1.500 palavras<br />
nem 15 referências. O relato do caso deve ser sucinto, apresentando uma breve revisão<br />
da literatura sobre os aspectos clínico e terapêutico, evitando-se dados redundantes ou<br />
que não contribuam para o esclarecimento do caso. A discussão deve apresentar os dados<br />
contrapondo-os (semelhanças e diferenças) com os casos semelhantes da literatura.<br />
6. Cartas – Comunicações que visam a discutir artigos recentes publicados na revista<br />
ou a relatar pesquisas originais ou achados científicos significativos. Cartas breves com, no<br />
máximo, 500 palavras e até 5 referências serão consideradas, se estiver explícita a frase<br />
“para publicação”.<br />
7. Resenhas de livros – Resenhas breves sobre livros recentes de interesse para<br />
a área da psiquiatria. O texto deve incluir uma breve descrição da obra seguida de um<br />
conjunto de comentários críticos que forneçam uma visão geral do livro. Não devem<br />
ultrapassar 900 palavras.<br />
Envio de manuscritos<br />
Os manuscritos devem ser enviados para os editores Leonardo Fontenelle ou Antônio<br />
Egídio Nardi para o seguinte e-mail: editora@ipub.ufrj.br<br />
Jornal Brasileiro de Psiquiatria<br />
Av. Venceslau Brás, 71 − Fundos<br />
22290-140 −Rio de Janeiro, RJ<br />
Tel.: (5521) 2295-2549 Fax: (5521) 2543-3101<br />
Os manuscritos devem estar acompanhados de uma carta de autorização, assinada<br />
por todos os autores, seguindo o modelo abaixo, e que deve ser enviada por correio para<br />
o endereço do jornal (mesmo para os artigos enviados por e-mail). Uma vez aceito para<br />
publicação, torna-se o trabalho propriedade permanente do Jornal Brasileiro de Psiquiatria,<br />
que reserva todos os direitos autorais no Brasil e no exterior.<br />
Carta de Autorização − Modelo<br />
“Os autores abaixo assinados transferem ao Jornal Brasileiro de Psiquiatria, com<br />
exclusividade, todos os direitos de publicação, em qualquer meio, do artigo ..., garantem<br />
que o artigo é inédito e não está sendo avaliado por outro periódico e que o estudo foi<br />
conduzido conforme os princípios da Declaração de Helsinki e de suas emendas, com o<br />
consentimento informado aprovado por comitê de ética devidamente credenciado.” (Incluir<br />
nome completo, endereço postal, telefone, fax, e-mail e assinatura de todos os autores.)
Instructions for authors<br />
Background<br />
Mission – The Brazilian Journal of Psychiatry (BJP), the official journal of Institute of Psychiatry of the Federal University of Rio de<br />
Janeiro, is published regularly for more than 70 years and the most traditional psychiatric journal in Brazil. The mission of BJP is to advance<br />
the understanding and care of individuals with mental disorders through the publication of articles that discuss the relationship of psychiatry<br />
with different scientific fields, including clinical medicine, psychology, and sociology.<br />
The Jornal Brasileiro de Psiquiatria accepts articles written in Portuguese, English or in Spanish, within the following categories:<br />
a) original articles;<br />
b) brief communications;<br />
c) reviews;<br />
d) updates;<br />
e) case reports;<br />
f) letters to the editor;<br />
g) book reviews;<br />
The original must be sent to editor Leonardo Fontenelle by the following e-mail: editora@ipub.urfr.br. The original must bring an<br />
authorization letter signed by all of the authors, according to the model below, and it must be sent by mail to the journal address. Once<br />
accepted for publication, the paper becomes permanent ownership to Jornal Brasileiro de Psiquiatria and all rights are reserved in Brazil and<br />
abroad.<br />
Permission Letter<br />
“The undersigned authors transfer to the Jornal Brasileiro de Psiquiatria, with exclusivity, all the publishing rights, under any means,<br />
of the article..., here the authors guarantee that the article is neither published nor being evaluated by other periodicals, moreover that<br />
the study was conducted in accordance to the principles of the Declaration of Helsinki and its amendments, including informed consent<br />
approved by a properly qualified ethics committee.” (Include complete name, address for postage, telephone, fax, e-mail and signature of<br />
all the authors).<br />
Peer Review<br />
Authors will receive, through e-mail or letter, a confirmation note and a protocol number upon the manuscript’s arrival. The number<br />
shall be used throughout the following correspondence. Articles submitted to the Jornal Brasileiro de Psiquiatria are primarily evaluated<br />
for its structure and the publishing scope of the journal. The editors reserve the right to reject articles without an external review if they<br />
believe that the work does not fit the goals of BJP, either because of poor quality or inadequate content. Qualitative studies that do not<br />
pose a groundbreaking hypothesis will be refused. After being evaluated by the editors, articles are submitted anonymously to at least two<br />
anonymous and independent reviewers. Authors will receive the editors’ final decision, along with copies of the reviewer’s comments. In case<br />
of manuscripts that fall on demand, authors must return the final text with necessary changes, according to the editor’s instructions, and a<br />
letter describing the specific answers to each point raised by the reviewers. Articles that are not accompanied by a detailed response letter or<br />
whose response letter contains only general comments will not be sent to re-review.<br />
Disclosures<br />
The authors are requested to disclose all possible kinds of conflict of interest, including sources of funding and any other relationship.<br />
If you are sure you do not have any disclosure, please state “none” under “Disclosures”. You can read an editorial about the subject, entitled<br />
Beyond conflict of interest, in the British Medical Journal available at: http://www.bmj.com/cgi/content/full/317/7154/281. Do not forget<br />
sources of funding must be disclosed under “Acknowledgments”. Articles that contain no statement regarding disclosure will be sent back<br />
to authors.<br />
Permission to Reproduce Materials Previously Published<br />
The authors are requested to send us permission copies to reproduce materials (i.e., illustrations and tables) from copyright owner. Your<br />
reports will not be published unless we have got that permission.<br />
Consent Terms<br />
The reports must mention that patients included in studies gave a Written Informed Consent, according to clinical research regulation<br />
in the country.<br />
Research Ethical Approval<br />
The authors are requested to state clearly under “Methods” that any study of humans has been conducted only after approval by a<br />
Research Ethical Board. Also, they must confirm animal trials are in accordance with ethical care standards to animals involved.<br />
Overall Structure of the Manuscript<br />
Abbreviations should be avoided; official abbreviations, however, may be used, keeping in mind that the first mention of a term in the<br />
text must be complete, followed by its abbreviation between brackets. Medicines must be referred to under their chemical name.<br />
• All pages must be numbered, with total words count indicated at the first page (except for abstracts, in Portuguese and English,<br />
references, pictures and illustrations).<br />
The first page (cover page) should contain both Title and Short Title in English and in Portuguese. The Short Title should contain a total<br />
of up to 50 characters (with spaces).<br />
The second page must contain an abstract in Portuguese. Non-Portuguese speakers may request help from the editorial board regarding<br />
Portuguese language in the abstract. The abstract must be informative, giving a clear and concise description of the article’s content, never<br />
exceeding the limit of 200 words. In original articles, brief communications and reviews, summaries must be structured containing four
instructions for authors<br />
topics: objective(s), methods, results and conclusions. Keywords in Portuguese should<br />
follow the summary and be limited to four words reflecting the content of the article’s<br />
subject. We recommend the terms presented at the list entitled Medical Subject Headings<br />
from the Index Medicus or, for articles in Portuguese, at Descritores de Ciências da Saúde,<br />
published by BIREME.<br />
The third page must contain an abstract and keywords, in English, which must be<br />
both identical to their versions in Portuguese.<br />
From the fourth page on begin the body of text which in original articles and brief<br />
communications, must contain the following sections: Introduction, Methods, Results,<br />
Discussion and Conclusions. The authors should not mix Results and Discussion in the same<br />
session.<br />
Introduction – Must contain a concise review of any literature directly related to the<br />
theme, as well as the aim of the study.<br />
Methods – Must describe the model of study and a detailed account of methods that<br />
permit its replication by other authors.<br />
Results – Must be described logically, sequentially and concisely, with the occasional<br />
help of tables and illustrations.<br />
Discussion – The discussion must be limited to highlighting the conclusions of the<br />
study, consider any similarities or differences with the results of other authors, implications<br />
of the findings, limitations and future perspectives.<br />
Conclusions – One must specify, preferentially in a short paragraph, solely the<br />
conclusions the study data allow to support, together with their clinical significance<br />
(avoiding excessive generalizations).<br />
Tables and illustrations must be numbered in Arabic numerals, and prepared in<br />
separate paper sheets, with the respective captions. They should be in a digital format and<br />
independent file, proper for reproduction. Each table must be self-explanatory, and must<br />
not repeat the information already present in the text. Places for table’s insertion must be<br />
clearly indicated in the text. Histograms describing results from descriptive studies will not<br />
be accepted.<br />
Illustrations and photographs must be sent in high resolution files, format.tif or.jpg.<br />
Printing will be charged on the authors.<br />
Acknowledgements must be mentioned before references.<br />
References<br />
References must be presented in Vancouver stile (“Uniform Requirements for<br />
Manuscripts Submitted to Biomedical Journals: Writing and Editing for Medical Publication”<br />
[http://www.nlm.nih.gov/bsd/uniform_requirements.html]), in the same order to quoted<br />
in the text, as in the example.<br />
Article<br />
• Versiani M. A review of 19 double-blind placebo-controlled studies in social anxiety<br />
disorder (social phobia). World J Biol Psychiatry. 2000;1(1):27-33.<br />
• Appolinario JC, McElroy SL. Pharmacological approaches in the treatment of binge<br />
eating disorder. Curr Drug Targets. 2004;5(3):301-7.<br />
• Dekker J, Wijdenes W, Koning Y A, Gardien R, Hermandes-Willenborg L, Nusselder<br />
H, et al. Assertive community treatment in Amsterdam. Community Ment Health J.<br />
2002;38:425-34.<br />
Book<br />
• Goodwin FFK, Jamison KR. Manic-Depressive Illness. New York: Oxford University<br />
Press; 1990.<br />
Book chapter<br />
• Heimberg RG, Juster HR. Cognitive-behavioral treatments: literature review. In:<br />
Heimberg RG, Liebowitz MR, Hope DA, Scneier FR, editors. Social Phobia – Diagnosis<br />
Assessment and Treatment. New York: The Guilford Press, 1995.<br />
In press articles may be included in the bibliography, but they must show the periodical<br />
name, with volume and year indicated. Unpublished material may be cited in parentheses<br />
in the text, but should not be listed in the bibliography. Abstracts may be cited only when<br />
they contain substantial information that is not published elsewhere. Their nature must be<br />
cited in the bibliography by adding the term (Abstract) at the end of the reference.<br />
References to web pages must be listed as followed: Associação Brasileira de<br />
Psiquiatria – Diretrizes para a Indústria da moda. Recomendações da Comissão Técnica<br />
Brasileira de Grupos Especializados no Estudo e Tratamento de Transtornos Alimentares.<br />
http://www.abpbrasil.org.br/newsletter/comissao_ta/diretrizes_moda.pdf. Accessed on:<br />
April 12, 2007.<br />
Types of Articles<br />
1. Original articles – Manuscripts communicating results of research, clinical<br />
experiences or other original contributions. Typically, the original articles present new<br />
data derived from an investigation done with a representative number of individuals. The<br />
original articles must not exceed 4,000 words and 30 bibliographic references.<br />
2. Brief communications – Characterized by manuscripts containing small<br />
experiences or preliminary communications with original character, never longer than<br />
2,000 words and with 15 bibliographic references.<br />
3. Review articles − Systematic reviews of the literature that attempt to answer<br />
a well-defined question. They should contain a maximum of 6,000 words and 80<br />
bibliographic references. They should have front page, structured abstract, introduction,<br />
methods and discussion, conclusions and bibliographic references.<br />
4. Updating articles − Descriptive and interpretative works based on recent<br />
literature about the current status of a given subject. They should contain no more than<br />
3,000 words and 40 bibliographic references and must be briefer than review articles. They<br />
should have front page, abstract (not necessarily structured), introduction, methods and<br />
discussion, conclusions and bibliographic references.<br />
5. Case reports – Manuscripts containing interesting and original clinical cases.<br />
They should contain: front page, summaries, introduction, description of the case, its<br />
relevance and/or originality, discussion, conclusion and bibliography on the theme. They<br />
should not exceed 1,500 words and 15 references. The description of the case must be brief,<br />
with a review of the literature about clinic and therapeutic aspects, avoiding redundant<br />
or unimportant data. The discussion must have the data in comparison and contrast with<br />
similar cases present in literature.<br />
6. Letters – Communications aiming at discussing articles recently published in the<br />
journal or describing original researches or meaningful scientific discoveries. Brief letters<br />
with a maximum of 500 words and five references will be considered, as long as the<br />
sentence for publishing is explicit.<br />
7. Book reviews – Brief reviews about recently published books that may interest<br />
the psychiatric milieu.<br />
Sending of Manuscripts<br />
The originals must be sent to the editor Leonardo Fontenelle or Antônio Egídio Nardi<br />
by e-mail: editora@ipub.ufrj.br.<br />
Jornal Brasileiro de Psiquiatria<br />
Av. Venceslau Brás, 71 − Fundos<br />
22290-140 −Rio de Janeiro, RJ<br />
Tel: (55-21) 2295-2549 Fax: (55-21) 2543-3101<br />
In addition, the authors must send an authorization letter signed by all of the authors,<br />
according to the model below.<br />
Once accepted for publication, the paper becomes permanent ownership to Jornal<br />
Brasileiro de Psiquiatria and all rights are reserved in Brasil and abroad.<br />
Permission Letter<br />
“The undersigned authors transfer to the Jornal Brasileiro de Psiquiatria, with<br />
exclusivity, all the publishing copyrights, under any means, of the article ..., here the authors<br />
guarantee that the article is neither published nor being evaluated by other periodicals,<br />
moreover that the study was conducted in accordance to the principles of the Declaration of<br />
Helsinki and its amendments, including informed consent approved by a properly qualified<br />
ethics committee.” (Include complete name, address for postage, telephone, fax, e-mail<br />
and signature of all the authors).