CARENCIA DE AÇÃO E NATUREZA - ABDPC
CARENCIA DE AÇÃO E NATUREZA - ABDPC
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RESUMO<br />
<strong>CARENCIA</strong> <strong>DE</strong> AÇÃO E <strong>NATUREZA</strong> DO PROVIMENTO QUE A<br />
RECONHECER<br />
Paula Fernandes Benedet<br />
Pós-graduada em Direito Processual Civil pela <strong>ABDPC</strong> -<br />
Academia Brasileira de Direito Processual Civil.<br />
Advogada.<br />
O artigo propõe a analise do conceito e natureza do direito de ação e sua evolução,<br />
fazendo um breve estudo sobre as teorias que foram desenvolvidas ao longo dos anos<br />
e a influência que exerceram sobre o processo civil brasileiro. A pesquisa objetiva<br />
ainda, aprofundar o estudo sobre as condições da ação, qual sua importância no<br />
processo civil brasileiro, além de demonstrar a diferença doutrinária de entendimento<br />
existente entre os processualistas sobre a natureza do provimento jurisdicional que<br />
reconhece a carência de ação.<br />
INTRODUÇÃO<br />
O assunto estudado no presente artigo constitui-se abstrato e<br />
teórico, mas de suma importância para o desenvolvimento da ciência do direito<br />
processual civil. Muito já se discutiu sobre isso, e várias polemicas já foram travadas.<br />
Contudo, até os dias de hoje, não se chegou a um consenso sobre qual é a natureza da<br />
decisão do juiz ao perquirir sobre as condições da ação.<br />
Dessa forma, é importante a análise da matéria, pois o Código de<br />
Processo Civil as impôs como requisitos para a atividade jurisdicional. E, conforme a<br />
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posição adotada, se de mérito ou não, a decisão do juiz que reconhece a carência de<br />
ação, diferentes conseqüências práticas decorrerão, como se haverá ou não coisa<br />
julgada material.<br />
Cabe, portanto, um estudo detalhado sobre a matéria para que se<br />
verifique se as condições da ação existem e, ainda, se são relativas ao mérito ou não.<br />
1. AÇÃO: CONCEITO E <strong>NATUREZA</strong><br />
Com a organização do Estado e o estabelecimento de normas de<br />
conduta para a sociedade, passou a ser vedada a autotutela por intermédio da qual o<br />
cidadão buscava, por seus próprios meios, a realização de seus direitos ou a solução<br />
de seus conflitos. Conseqüentemente, o Estado avocou o poder-dever de prestar<br />
jurisdição, ou seja, de solucionar os conflitos surgidos na sociedade.<br />
Todavia, a jurisdição é inerte e só pode agir quando provocada<br />
pelos interessados. O titular do direito deve, portanto, submeter seu conflito à solução<br />
pelo Estado para que este possa atuar diante do caso concreto. Pelo principio da<br />
inércia da jurisdição, esta aguarda passivamente a iniciativa da parte para iniciar a<br />
demanda. E é através da ação que o indivíduo solicita uma atuação jurisdicional frente<br />
ao seu conflito.<br />
Para DINAMARCO, CINTRA e GRINOVER, “ação é o direito ao<br />
exercício da atividade jurisdicional (ou o poder de exigir esse exercício)”. 1<br />
Mediante o<br />
exercício da ação, provoca-se a jurisdição que é exercida por meio de um complexo de<br />
atos que é o processo.<br />
1<br />
Cândido Rangel Dinamarco; Antonio Carlos de Araújo Cintra; Ada Pelegrini Grinover. Teoria Geral do Processo.<br />
1996, p. 249.
A doutrina tem entendido a ação como um direito público<br />
subjetivo, ou seja, direito de ter uma tutela jurisdicional pelo estado.<br />
Inúmeras foram as teorias que tentaram explicar o conceito de<br />
ação até se chegar à concepção moderna, as quais devem ser analisadas para uma<br />
melhor compreensão da matéria em estudo.<br />
1.1 Teoria Civilista<br />
Também chamada de Imanentista, foi a primeira teoria que tentou<br />
explicar o conceito de ação. Foi desenvolvida por Savigny partindo de conceitos<br />
elaborados pelos romanos e da conceituação de Celso. O autor não distinguia ação do<br />
direito material. A ação seria uma qualidade do direito material posto em movimento,<br />
reagindo a uma ameaça ou violação.<br />
De acordo com CELSO "nill aliud est actio quam ius, quod sibi<br />
debeatur, in iudicio persequendi”, ou seja, “a ação nada mais é do que o direito de pedir<br />
em juízo o que nos é devido”. 2<br />
Na Itália e na França a doutrina acolhia o ditado de Celso,<br />
todavia, criticava apenas a expressão o que lhe é devido, complementando-a com ou o<br />
que é seu (vel quod suum est). E assim fizeram para explicar que a ação não é apenas<br />
o direito de alguém perseguir em juízo o que lhe é devido, mas também o que é seu, de<br />
modo que a definição também abrangia os direitos reais e não apenas os obrigacionais<br />
ou os direitos a prestações.<br />
TESHEINER define que, por esta teoria,<br />
(...) o fundamento jurídico da ação é o próprio direito violado, e o<br />
seu momento funcional a mesma violação por parte de pessoa<br />
2 Celso apud Ovídio A. Baptista da Silva. Curso de Processo Civil. 1998, p. 95.<br />
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determinada. Esta violação cria um vínculo de direito idêntico a<br />
uma obrigação, da qual é sujeito ativo o titular da relação de<br />
direito, e sujeito passivo, o seu violador. 3<br />
Assim, como explica GOMES, em análise a referida teoria: “não<br />
há ação sem direito; não há direito sem ação; a ação segue a natureza do direito”<br />
5<br />
WINSCHEID e MUTTER<br />
passaram a criticar a teoria<br />
desenvolvida por Savigny, sustentando ambos, apesar da divergência que travaram<br />
haver dois direitos distintos coexistentes: um exercido contra o Estado à uma tutela<br />
jurisdicional, e o outro, perante o co-obrigado, sujeito da relação substancial.<br />
Um dos equívocos desta teoria, apontado GOMES,<br />
Segundo o professor SILVA,<br />
6<br />
4<br />
foi o de<br />
desenvolver o conceito de ação com base na actio romana, sem perceber que a esta<br />
não interessava o fenômeno da ação improcedente.<br />
8<br />
GOMES aponta ainda, como equívoco, terem Savigny e seus<br />
seguidores, trazido para dentro do processo civil, o conceito de ação de direito material,<br />
como se correspondente ao moderno direito de ação enquanto pedido a uma tutela<br />
jurídica processual (abstrato e indeterminado). E, conforme o professor SILVA, 9<br />
isso<br />
consistiu em trazer para dentro do Direito Processual Civil a categoria da actio,<br />
7<br />
essa teoria confundiu a pretensão a<br />
uma tutela jurídica estatal com a ação de direito material, que é o agir do titular do<br />
direito. Não conseguiu explicar, assim, os casos de ação improcedente em que se age<br />
sem ter direito.<br />
equivalente esta à pretensão de direito material.<br />
3<br />
José Maria Tesheiner. Elementos para uma teoria geral do processo. 1998, p. 86.<br />
4<br />
Fábio Gomes. Carência de Ação: doutrina, comentários ao CPC, análise da jurisprudência. 1999, p. 21.<br />
5<br />
Winscheid; Mutter apud Ovídio A. Baptista da Silva. Op. cit. p. 92.<br />
6<br />
Fabio Gomes. Loc. Cit. p. 25.<br />
7<br />
Ovídio A. Baptista da Silva. Loc. Cit. p. 92.<br />
8<br />
Idem. Ibídem. p. 26<br />
9<br />
Fabio Gomes. Loc. Cit. p. 80.
1.2 Polêmica Windscheid x Muther<br />
WINDSCHEID, 10<br />
em sua obra publicada em 1856 (Die Actio dês<br />
römischen Civilrechts, vom Standpunkte dês heutigen Rechts – A actio do Direito Civil<br />
Romano do ponto de vista do Direito Moderno – traduzida para o espanhol por Tomás<br />
Banzaf) fez críticas às idéias de Savigny.<br />
Na Alemanha, ao contrário do que ocorria na Itália e França, não<br />
importava apenas a actio romana, mas também a Klage ou Klagerecht. Esta era<br />
compreendida como um direito de queixa ou de ação voltado contra o Estado, enquanto<br />
que aquela era voltada contra o obrigado.<br />
11<br />
SAVIGNY, que não separava o direito de ação do direito<br />
material, via a Klagerecht como o direito à tutela judicial nascido da lesão de um direito<br />
material, compreendendo-o como o direito no qual o direito material se transforma ao<br />
ser lesado. Dessa forma, o direito de ação resultava da transformação pela qual o<br />
direito material passaria após ser lesado.<br />
12<br />
WINDSCHEID dizia que a actio romana não era um novo<br />
direito que surgia pela violação de um direito material e, tão pouco, um direito de agir ou<br />
de se queixar dirigido contra o Estado. A actio, para, o autor era a faculdade de realizar<br />
a própria vontade por meio de uma perseguição em juízo. Já a Klagerecht seria um<br />
conceito criado pelos juristas sem qualquer consistência no direito romano e moderno.<br />
10<br />
Bernhard Windscheid. La actio del derecho civil romano, desde el punto de vista del derecho actual. Polemica<br />
sobre la actio. 1974, p. 7.<br />
11<br />
Friendrich C. Savigny apud Luiz Guilherme Marinoni. Teoria Geral do Processo: curso de Processo Civil. 2008, p.<br />
161.<br />
12 Windscheid apud idem. Ibidem p. 161.<br />
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Para o jurista, a actio romana era, portanto, o exercício do próprio<br />
direito, uma vez que o cidadão não possuía direito contra alguém, mas sim um poder de<br />
agir contra outrem, o qual não derivava de um direito, mas sim era concedido pelo<br />
pretor.<br />
WINDCHEID, 13<br />
dessa forma, denominou Anspruch a pretensão<br />
que brota do direito. Ou seja, quem tem direito pode pretender, tenha sido o direito<br />
violado ou não. A pretensão é imanente em todo o direito e se torna mais visível com<br />
sua violação. A actio para ele era, assim, diferente da pretensão, pois aquela não<br />
continha o elemento da perseqüibilidade judicial. A ação seria o primeiro ato processual<br />
para se exercer uma pretensão.<br />
Considerou, por fim, o autor alemão, que pretensão é o<br />
equivalente da actio, definindo-a como uma situação jurídica substancial, diferente,<br />
tanto do direito de se queixar, quanto do próprio direito subjetivo, do qual deriva, pois é<br />
do próprio direito material que justifica a possibilidade de o autor exigir a realização<br />
deste.<br />
14<br />
MUTHER, ao publicar sua obra, fez severas críticas à<br />
Windcheid, sustentando que a actio romana era desvinculada do direito subjetivo<br />
material. Com o comparecimento diante do pretor, iniciava-se o processo que era<br />
encerrado com a concessão da fórmula, que não podia ser negada. Actio era usada no<br />
sentido de aspirar concessão a uma fórmula.<br />
Afirmou o autor referenciado que, além da independência do<br />
direito de ação ao direito material, existirem dois direitos distintos, um, dirigido contra o<br />
Estado, a uma tutela jurídica de natureza pública, e outro, contra o particular, que lesou<br />
o direito substancial de natureza privada. A fórmula, para ele, nascia de um direito<br />
13 Windscheid apud Fabio Gomes Op. Cit. P. 23.<br />
14 Theodor Muther apud idem. ibidem. p. 23
originário, de forma que o obrigado perante este era o particular, e, perante àquela, o<br />
Estado. O direito de agir, embora diverso do direito material, o teria como pressuposto.<br />
Conforme relata MARINONI, 15<br />
Windscheid acabou aceitando a<br />
tese de Muther e concordou haver dois direitos de naturezas diferentes: um contra o<br />
Estado e outro contra o particular.<br />
1.3 Teoria do Direito Concreto de Ação<br />
Adolf Wach foi o percursor de tal teoria, analisada em sua obra,<br />
Der Feststellungsanspruch, escrita em 1888. Ela foi posterior à Teoria do Direito<br />
Concreto de Ação, todavia, será primeiro analisado em decorrência de ser aquela mais<br />
16<br />
avançada a esta.<br />
17<br />
WACH defende a autonomia do direito de ação, o qual não se<br />
confunde com o direito material subjetivo e nem com a pretensão de direito civil.<br />
Prossegue afirmando que o direito de ação é público e dirigido contra o Estado (direito<br />
a uma tutela jurídica) e contra o adversário (à sujeição).<br />
Contudo, para o autor referenciado, o direito de ação só existirá<br />
em caso de sentença favorável, ou seja, só é titular de direito de ação aquele que<br />
possui um interesse real. O direito de ação decorre da violação efetiva ou ameaça de<br />
violação do direito material, exceto a ação declaratória negativa.<br />
WACH<br />
15<br />
Luiz Guilherme Marinoni. Op. Cit. p. 164<br />
16<br />
Adolf Wach apud Fabio Gomes. Op. Cit. p. 29<br />
17<br />
Idem. ibidem. p. 30<br />
18<br />
Idem. ibidem. p. 31.<br />
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18<br />
impôs três condições para a ação: a) interesse, que<br />
seria a ameaça ou a efetiva violação do direito; b) legitimação, correspondente à
titularidade do direito; e por fim, c) possibilidade jurídica do pedido, ou seja, adequação<br />
do direito ao ordenamento jurídico.<br />
GOMES 19<br />
expõe critica a essa teoria afirmando que por ela só<br />
seria possível o exercício de ação quando resultasse em sentença favorável, restando<br />
sem explicação a sentença improcedente. Outra crítica a ser deduzida é a de que<br />
sendo a ação ligada ao direito a uma sentença procedente, ter-se-ia que concedê-la<br />
também ao réu, o qual não age, mas apenas reage.<br />
1.4 Ação como Direito Potestativo<br />
CHIOVENDA<br />
20<br />
foi um dos seguidores de Wach, todavia criou<br />
uma teoria que, na essência, era concretista, mas com algumas particularidades que<br />
merecem destaque.<br />
O ilustre processualista italiano entendeu a ação como um direito<br />
autônomo, independente do direito material, que nasce da transgressão da norma por<br />
quem deveria conformar-se com ela. Sustenta que a ação é o poder jurídico de dar vida<br />
à condição para atuação da vontade da lei.<br />
A ação, na concepção do autor citado, é um direito potestativo,<br />
concreto e atual, existente antes do processo, que lhe dá o poder de obter um resultado<br />
favorável contra o adversário, o qual deve se sujeitar à vontade da lei. Como um direito<br />
potestativo, a ação pode sofrer prescrição, ou seja, o interessado pode perder o direito<br />
de reclamar a atuação da lei.<br />
Apesar de concordar com a teoria concreta da ação, o autor em<br />
referência divergiu de Wach quanto ao sujeito passivo da relação processual e quanto à<br />
19 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 32<br />
20 Giuseppe Chiovenda apud idem. ibidem. p. 32
natureza do direito de ação. Wach entendia que a ação era de natureza pública, mas<br />
CHIOVENDA, 21<br />
afirma que tanto poderia ser pública quanto privada, assumindo a ação<br />
a natureza do interesse tutelado.<br />
Quanto ao sujeito passivo da relação processual, discordou de<br />
Wach, para quem a ação era um direito que se dirigia contra o Estado e contra o<br />
particular. Afirmou que a relação com o Estado era apenas um meio de obter certos<br />
efeitos contra o adversário.<br />
1.5 Teoria do Direito Abstrato de Ação<br />
Esta teoria foi desenvolvida em 1877 por Dagenkolb e por Ploz,<br />
os quais concluíram que o direito de ação é um direito abstrato.<br />
Defenderam os citados processualistas, que ação era um direito<br />
autônomo, desvinculado do direito material. Teria, portanto, um fundamento diverso do<br />
direito subjetivo posto sob apreciação jurisdicional. Por isso foi denominado como<br />
direito abstrato, pois era concebido com abstração de qualquer outro direito.<br />
Seria, portanto, um direito público, exercido contra o Estado e, em<br />
razão do qual, se tornaria possível obrigar o réu a comparecer em juízo. Definiram o<br />
direito de ação como um direito a uma prestação jurisdicional, de ter sua lide decidida.<br />
Caberia a qualquer cidadão que postulasse acreditando na existência do direito privado.<br />
1.6 Teoria Eclética<br />
A Teoria Eclética foi criada por LIEBMAN<br />
influência sobre os processualistas brasileiros.<br />
21 Giuseppe Chiovenda apud Fabio Gomes. Op. Cit. p. 33.<br />
22 EnricoTulio Liebman. Manual de Direito Processual Civil. 1985. p. 150.<br />
www.abdpc.org.br<br />
22<br />
e exerceu grande
O jurista referenciado analisando as teorias até então existentes,<br />
propôs uma nova síntese sobre o direito de ação, conciliando as duas principais<br />
correntes. Observou que as duas teorias então existentes em torno da ação distribuemse<br />
em duas diretrizes fundamentais: uma que a estuda do ponto de vista do autor, qual<br />
seja a teoria do direito concreto, equivocada por só concedê-la ao autor que tiver razão,<br />
além de outros inconvenientes; a outra (do direito abstrato), que é analisada sob o<br />
prisma do juiz e não identifica ainda a ação, mas sua base, ou pressuposto de Direito<br />
Constitucional.<br />
A ação, para o processualista italiano, seria o direito de provocar<br />
a atividade jurisdicional, ou seja, de provocar o julgamento do pedido, de ter a lide<br />
decidida. Segue afirmando que, apesar de ser abstrata, por ter por conteúdo o<br />
julgamento do pedido, engloba as hipóteses em que ação for julgada procedente e<br />
improcedente.<br />
Assim, para que o mérito seja julgado, são necessários certos<br />
requisitos que precisam estar presentes para a existência da ação, o qual denominou<br />
de condições da ação, as quais seriam: 23<br />
a) Possibilidade Jurídica do Pedido: o pedido formulado deve<br />
obter correspondência no ordenamento jurídico. Possibilidade de juiz poder pronunciar<br />
a espécie de decisão pedida pelo autor, ou seja, que o pedido não seja inviável, seja<br />
por estar expressamente proibido por uma norma, seja por estar obstaculizado pelo<br />
sistema jurídico. Cabe salientar que, posteriormente, ao escrever uma nova edição do<br />
seu Manuale, Liebman deixou de lado essa categoria, incluindo-a como interesse se<br />
agir.<br />
23 EnricoTulio Liebman Op. Cit. p. 150
) Interesse de Agir: o autor tem necessidade e utilidade da tutela<br />
jurisdicional para poder satisfazer seu interesse material; necessita da jurisdição para<br />
ter o seu direito material protegido, e que modelo procedimental escolhido seja apto<br />
para protegê-lo.<br />
c) Legitimidade: autor e réu são pessoas que tem a faculdade, de<br />
acordo com a ordem jurídica, de pedir e contestar a providência judicial. Em geral, são<br />
os titulares do direito em conflito.<br />
Define-se, portanto, jurisdição como o ato do Poder Judiciário que<br />
efetivamente aplica o ordenamento jurídico às relações humanas por meio de um<br />
processo. Para o ilustre processualista, apenas a sentença que decide o mérito tem<br />
natureza de ato jurisdicional. Nas demais decisões, inclusive as sobre condições da<br />
ação, não haveria jurisdição, seriam apenas preparatórias e auxiliares.<br />
Dessa forma, para esta Teoria, ao perquirir sobre as condições da<br />
ação, o processo funcionaria como um filtro, não havendo exercício jurisdicional.<br />
A Teoria Eclética se difundiu largamente entre os doutrinadores<br />
brasileiros e foi adotada por sua maioria, tendo sido consagrada em nosso Código de<br />
Processo Civil.<br />
24 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 45<br />
GOMES 24<br />
elenca três vícios da teoria eclética. O primeiro seria o<br />
de tentar a conciliação entre a doutrina eclética e abstrata, criando uma zona comum<br />
entre ambas, o que fez com que a aferição da presença ou da ausência das condições<br />
da ação deva ser feita mercê de juízos hipotéticos.<br />
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O segundo consistiu em confundir ação com pretensão e, por via<br />
de conseqüência, conferir o direito de ação também ao réu. E o terceiro foi a redução<br />
do campo da atividade jurisdicional.<br />
Assim, ter-se-ia que criar uma atividade estatal de natureza<br />
diversa das três existentes (executiva, legislativa, judiciária), para enquadrar aquela<br />
exercida pelo juiz ao decidir sobre as condições da ação.<br />
Segundo MARINONI,<br />
2. DIREITO SUBJETIVO, PRETENSÃO E AÇÃO<br />
Portanto, mesmo quando verificada a ausência de uma das<br />
chamadas “condições da ação”, é inegável que a jurisdição atuou<br />
e a ação foi exercida. Aliás, a jurisdição atuou porque a ação foi<br />
proposta, o que se dá no momento em que a petição inicial é<br />
despachada pelo juiz ou distribuída (quando há mais de uma vara),<br />
conforme afirma o próprio CPC. Isso significa dizer que não é<br />
correto dizer que só existe ação e jurisdição quando estão<br />
presentes as chamadas “condições da ação. 25<br />
O estudo de alguns conceitos é de grande relevância para a<br />
compreensão da presente matéria. Há dois planos distintos, o de direito material, que<br />
ficou de certa forma esquecida pelos processualistas, e o plano do direito processual.<br />
25 Luiz Guilherme Marinoni. Op. Cit. p. 181<br />
26 Ovídio A. Baptista da Silva. op. cit. p. 66.<br />
Há no plano do direito material: 26<br />
a) Direito subjetivo: é o direito que uma pessoa tem em relação a<br />
outra, concedido pelo ordenamento jurídico em decorrência de uma relação entre elas.
O direito objetivo é posterior ao subjetivo, pois este é decorrência<br />
daquele, é concedido pelas normas. “A regra jurídica é prius, ainda que tenha nascido<br />
no momento de se formar o primeiro direito subjetivo.” 27<br />
GOMES<br />
distinções quanto aos conceitos:<br />
28<br />
cita o exemplo de um credor de valor em dinheiro<br />
representado em uma nota promissória ainda não vencida, o qual é titular de um direito<br />
de crédito, mas ainda não pode exigir o pagamento.<br />
b) Pretensão: é a possibilidade que surge ao titular do direito<br />
violado de exigir do devedor seu cumprimento. No momento em que o direito não é<br />
cumprido por aquele que tem obrigação frente ao credor, este passa a ter a faculdade<br />
de exigir de seu devedor o cumprimento positivo ou negativo do que lhe é devido.<br />
A partir do vencimento do crédito, o direito ganha uma<br />
potencialidade chamada pretensão, não havendo ainda o agir efetivamente para a<br />
satisfação do direito.<br />
c) Ação: é o ato de agir concretamente contra o devedor<br />
excutindo-lhe os bens para a satisfação do crédito. Ela nasce no momento em que a<br />
satisfação voluntária da pretensão restou frustrada. É chamada ação de direito material,<br />
na qual o cidadão age por sua conta para obrigar o devedor ao cumprimento de seu<br />
direito.<br />
No plano do direito processual há que se fazer as mesmas<br />
27<br />
Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda. Tratado das Ações. tomo I. p. 55<br />
28<br />
Fábio Gomes. Op. Cit. p. 56<br />
29<br />
Ovídio A. Baptista da Silva. op. cit. p. 71.<br />
29<br />
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a) Direito subjetivo público é aquele do qual é titular todo e<br />
qualquer cidadão frente ao Estado; é o direito a uma tutela jurídica, nascido com a<br />
proibição da autotutela.<br />
b) Pretensão processual, “que é o estágio intermediário entre o<br />
direito subjetivo, enquanto estado inerme, e o efetivo exercício do mesmo perante o<br />
Estado.” 30<br />
, ou seja, é uma faculdade do titular do direito de buscar a jurisdição ou não.<br />
De acordo com PONTES <strong>DE</strong> MIRANDA,<br />
c) Ação: é, nos ensinamentos de GOMES, “a atitude tomada<br />
perante o Estado por Fábio Gomes. aquele que antes pretendeu, mas agora se torna<br />
autor, justamente por ter agido.”<br />
31<br />
a pretensão à tutela<br />
jurídica é irrenunciável, embora possa ser renunciável o direito, a pretensão e a ação.<br />
ao Estado que lhe conceda jurisdição.<br />
32<br />
O titular do direito age concretamente, requisitando<br />
Para PONTES <strong>DE</strong> MIRANDA,<br />
33<br />
a ação de direito material se<br />
exerce através da ação processual, ou seja, exercendo a pretensão à tutela jurídica que<br />
o Estado criou.<br />
Com a proibição da autotutela, o particular não pode mais exercer<br />
a ação de direito material, sendo esta substituída pala ação processual. Assim, passouse<br />
a agir contra o Estado para que este, por meio de uma tutela jurídica, lhe conceda<br />
seu direito violado.<br />
GOMES destaca que “o titular do direito subjetivo material não se<br />
confunde ou ao menos não se confundir com o titular do direito subjetivo público de<br />
30 Ovídio A. Baptista da Silva. Op. Cit. p. 57<br />
31 Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda. Op. Cit. p. 110<br />
32 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 58<br />
33 Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda. loc. cit. p. 110
ação frente ao Estado. As duas relações têm sujeitos, causa e objeto diversos” 34<br />
. E<br />
discordando do professor Galeno Lacerda, para quem a causa da relação processual<br />
são as condições das ações, afirma que sua causa é o monopólio do exercício da<br />
jurisdição pelo Estado.<br />
FABRÍCIO faz a distinção entre direito de ação e ação<br />
processual. Aquela é uma faculdade de agir em abstrato, que nas palavras do autor<br />
“flutua nos altos páramos do direito constitucional, como inespecífico ‘direito de todos’<br />
”<br />
35<br />
. Esta e o próprio agir concretamente, operando-se modificação no mundo dos fatos.<br />
Salienta o autor que:<br />
3. AS CONDIÇÕES DA AÇÃO<br />
da ação.<br />
O problema, não é como pareceu a Galeno Lacerda, tanto o de<br />
distinguir entre “direito constitucional de ação” e “direito<br />
processual de ação”. A distinção vital, relevada a insistência, é a<br />
que tem de ser feito entre direito de ação (poder de agir in genere,<br />
abstrato em último grau), e a própria “ação” (de direito<br />
processual!), que é ato, agir, movimento físico, modificação<br />
36<br />
introduzida no mundo exterior – necessariamente concreta.<br />
Merece ser estudado detalhadamente o conceito das condições<br />
Segundo a teoria eclética, as condições da ação são requisitos<br />
para a própria existência da ação. Não estando estes presentes, sequer há ação, e o<br />
juiz extingue o processo sem julgamento do mérito. Não há, portanto, atividade<br />
jurisdicional.<br />
34<br />
Fábio Gomes. op. Cit. p. 59<br />
35<br />
Adroaldo Furtado Fabrício. Ensaios de Direito Processual. 2003. p. 390.<br />
36<br />
Idem. ibidem. p. 390.<br />
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No mesmo sentido entende DINAMARCO, 37<br />
para quem o sujeito<br />
só terá direito de ação quando presentes todos os requisitos indispensáveis a sua<br />
existência.<br />
THEODORO JÚNIOR,<br />
38<br />
concordando que não já julgamento de<br />
mérito ao se perquirir acerca da ausência das condições da ação, inova afirmando que<br />
estas seriam condições de exercício da ação e não de existência. E, ainda, que devem<br />
estar presentes no momento do julgamento e não do seu ajuizamento.<br />
Em sua obra Despacho Saneador, LACERDA<br />
GOMES expôs crítica às idéias do processualista gaúcho,<br />
explicando que o professor Lacerda “admite até uma sentença de mérito embora<br />
inexistente a própria ação; em outras palavras, é possível que se tenha uma sentença<br />
40<br />
de “carência de ação”, com julgamento de mérito.<br />
39<br />
defende que as<br />
condições da ação são a causa da relação processual. Sustenta que a presença<br />
desses requisitos (legitimidade, possibilidade jurídica do pedido e interesse de agir)<br />
constitui o título de agir, gerando no autor o direito de ação, e no Estado, a obrigação<br />
de resolver o conflito.<br />
Segue o autor citado, afirmando que devem estar presentes para<br />
que haja julgamento do mérito e que devem ser verificadas pelos juízos hipotéticos.<br />
Contudo, ao reconhecer a sua ausência, afirma que haveria julgamento de mérito, pois<br />
a decisão seria decisória da lide.<br />
As condições da ação são possibilidade jurídica do pedido,<br />
interesse processual e legitimação para causa. Importante se faz analisar o conceito de<br />
cada uma delas.<br />
37<br />
Cândido Rangel Dinamarco. Instituições do Direito Processual Civil. 2004, p. 299.<br />
38<br />
Humberto Theodoro Junior. Curso de Processo Civil. 2003, p. 48.<br />
39<br />
Galeno Lacerda. Despacho Saneador. 1985, p. 77.<br />
40<br />
Fábio Gomes. Op. cit. p. 52.
3.1 Possibilidade Jurídica do Pedido<br />
“A demanda é juridicamente impossível quando, de algum modo,<br />
colide com regras superiores do direito nacional e, por isso, sequer comporta<br />
apreciação mediante exame de seus elementos concretos.” 41<br />
O pedido do autor deve ser compatível com o ordenamento<br />
jurídico vigente. Estará ausente quando o sistema o veda explicitamente ou não deixa<br />
lugar para um provimento jurisdicional a seu respeito.<br />
42<br />
O professor SILVA cita como exemplo o caso de alguém que,<br />
possuindo a posse de imóvel urbano por 8 anos, requeira o usucapião, quando na<br />
verdade seu pedido é impossível pois não é possível adquirir a propriedade enquanto<br />
não implementado o tempo necessário.<br />
3.2 Interesse Processual<br />
O interesse processual consiste em que a prestação jurisdicional<br />
seja necessária e útil.<br />
Não se trata de interesse econômico ou moral, mas sim de um<br />
interesse a uma tutela jurisdicional que seja o único caminho para se tentar obter o bem<br />
da vida e que seja capaz de concedê-lo a quem o pretende.<br />
Como explica DINAMARCO, deve haver necessidade e<br />
adequação da medida. Será necessária, quando o processo for o único meio de obter o<br />
direito desejado. E adequado, quando o procedimento adotado for capaz e destinado a<br />
solucionar o conflito submetido à apreciação.<br />
41 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 301.<br />
42 Ovídio A. Baptista da Silva. Op. Cit. p. 90.<br />
43 Candido Rangel Dinamardo. Op. cit. p. 305<br />
www.abdpc.org.br<br />
43
Assim, faltará interesse se a providência pleiteada não for capaz<br />
de tutelar o direito substancial, uma vez que será inútil.<br />
3.3 Legitimidade Ad Causam<br />
“É a qualidade para estar em juízo como demandante ou<br />
demandado, em relação a determinado conflito trazido do exame do juiz.” 44<br />
Esta legitimação refere-se ao autor (ativa) e ao réu (passiva).<br />
Via de regra, são legitimados para a causa os titulares dos<br />
interesses em conflito. Autor será aquele titular de um direito, e réu, titular do interesse<br />
que se opõe à pretensão do autor. Poderá ocorrer, todavia, legitimidade extraordinária,<br />
concedida por lei, em que se permite que terceiro pleiteie em juízo interesse de outrem.<br />
Trata-se do substituto processual, que atua como parte principal no processo, apesar<br />
de não figurar na relação jurídico-material. É outorgado por lei em caráter excepcional<br />
nos casos dos direitos coletivos.<br />
4. CONDIÇÕES DA AÇÃO: <strong>NATUREZA</strong> DO PROVIMENTO DO JUIZ<br />
O Código de Processo Civil, em seu artigo 267, VI, contemplou as<br />
condições da ação e a carência da ação no artigo 301, X. Adotou, portanto, a teoria<br />
eclética.<br />
Não há, de acordo com o ordenamento pátrio, julgamento de<br />
mérito ao se perquirir sobre as condições da ação. De acordo com Liebmann, como<br />
anteriormente citado, não haveria sequer atividade jurisdicional.<br />
44 Candido Rangel Dinamardo. Op. cit. p. 306.
Criticando tal posição, GOMES 45<br />
indefinida a atividade do juiz ao decidir sobre as condições da ação.<br />
45<br />
Fábio Gomes. Op. cit. p. 45<br />
46<br />
Jose Maria Rosa Tesheiner. op. cit. p. 110.<br />
47<br />
Kazuo Watanabi. Da Cognição no Processo Civil. 1987, p. 68<br />
www.abdpc.org.br<br />
afirma que Liebmann deixou<br />
Os doutrinadores brasileiros, em sua maioria, concordam que a<br />
sentença que reconhece a carência de ação é terminativa, pois, não estando presentes<br />
os requisitos necessários, não se pode analisar o mérito.<br />
O professor TESHEINER defendendo tal posição afirma:<br />
Afirmar-se, pois, que o exame das condições da ação envolve o<br />
mérito é um absurdo (autor carecedor de ação e com ação;<br />
entrega de uma sentença de mérito a quem não tem direito a<br />
prestação jurisdicional de mérito). Contudo, com freqüência se<br />
encontra a afirmação de que o exame de tal ou qual condição da<br />
ação envolve o mérito. E que se pensa, então, num conceito de<br />
mérito que não é o do Código de Processo Civil, nem o de<br />
Liebman, pois nem um nem outro elaboraram sistema com tal<br />
46<br />
contradição interna.<br />
Há, contudo, alguns processualistas que divergem quanto à<br />
natureza da decisão que reconhece a carência de ação.<br />
47<br />
WATANABI defende a idéia de que as condições da ação<br />
devem ser analisadas do ponto de vista da cognição. São condições para o julgamento<br />
do mérito que devem ser analisadas in statu assertions, ou seja, à vista do que se<br />
afirmou pelo autor na petição inicial. Assim, se o juiz, analisando as alegações do autor,<br />
verificar que este é carecedor da ação, poderá julgá-la antecipadamente, impedindo<br />
que sejam realizados atos inúteis ao deslinde do conflito.<br />
Desse modo, ao se reconhecer a ausência das condições da<br />
ação in statu assertinos, não haverá julgamento de mérito, pois este se tornou
impossível. Mas, segue o autor, essa verificação for feita após uma cognição plena, à<br />
vista das provas apresentadas, seria caso de improcedência.<br />
FABRÍCIO sustenta que o exame das condições da ação são<br />
referentes ao mérito da causa. Afirma o autor que “pelo menos as decisões envolvendo<br />
a possibilidade jurídica do pedido e legitimatio ad causam são sentenças de mérito.” 48<br />
49<br />
No mesmo sentindo entende LACERDA, que, apesar de<br />
defender que as condições da ação constituem o título de agir do autor, afirma que, se<br />
julgar inexistente a possibilidade jurídica do pedido e a legitimação, o juiz proferirá<br />
julgamento de mérito, porque decisória da lide.<br />
Até mesmo LIEBMAN, a partir da terceira edição de seu<br />
manual, passou a entender que a possibilidade jurídica do pedido era referente ao<br />
mérito.<br />
51<br />
GOMES, em seu livro Carência de Ação, teceu severas críticas<br />
à teoria eclética e às condições da ação. O autor defende que as condições da ação se<br />
referem à relação de direito material e não ao plano processual, como afirma a maioria<br />
da doutrina. Por isso, sua análise e julgamento seriam referentes ao mérito. E rebate,<br />
ainda, a tese dos que defendem a Teoria Eclética, de que a análise das condições da<br />
ação deva ser feita por juízos hipotéticos, afirmando que bastaria ao autor mentir para<br />
adquirir o direito à jurisdição.<br />
Segundo o professor SILVA, quando o juiz declara inexistentes<br />
as condições da ação, está declarando inexistente uma pretensão acionável contra o<br />
48 Adroaldo Furtado Fabrício. op. cit. p. 390.<br />
49 Galeno Lacerda. Op. Cit. p. 391.<br />
50 EnricoTulio Liebman. Op. Cit. p. 82.<br />
51 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 68.<br />
52 Ovidio A. Baptista da Silva. Op. Cit. p. 107<br />
50<br />
52
éu. Desta forma, está julgando a respeito da pretensão do autor posta em causa,<br />
decidindo que o agir do autor contra o réu é improcedente.<br />
O que querem dizer os ilustres processualistas citados, e que<br />
parece coerente, é que as condições da ação, em verdade, são relativas à relação de<br />
direito material e não à relação processual como defende a maioria da doutrina. E,<br />
portanto, sua análise implicaria decisão de mérito.<br />
(grifo não original)<br />
Seria, de acordo com FABRÍCIO, uma “preliminar de mérito”. 53<br />
5. CONDIÇÕES DA AÇÃO: COISA JULGADA<br />
De acordo com o atual sistema do Código de Processo Civil,<br />
sendo o autor carecedor da ação, o processo é extinto sem julgamento do mérito, não<br />
havendo coisa julgada material, mas apenas formal. A ação pode ser novamente<br />
proposta.<br />
Os que defendem que a sentença de carência de ação não é<br />
atingida pela res iudacta alegam que, por não decidir o mérito, ela poderá ser<br />
novamente proposta implementando-se o requisito faltante.<br />
Contudo, não há que se falar em identidade de ações, uma vez<br />
que, havendo qualquer modificação, a ação não será mais a mesma.<br />
Cita-se como exemplo, GOMES, 54<br />
uma ação de despejo movida<br />
por aquele não é locatário do imóvel, tendo sido extinto o processo por ilegitimidade da<br />
parte. Segue o autor, que o que o código não estaria autorizando é que o mesmo autor<br />
53 Adroaldo Furtado Fabrício. Op. Cit. p. 390<br />
54 Fábio Gomes. Op. Cit. p. 68.<br />
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ilegítimo propusesse a mesma ação, mas sim na possibilidade de propor aquela ação<br />
não proposta.<br />
Afirma o autor em referência, que a “ação que será novamente<br />
proposta não se identificará com aquela para qual o autor foi julgado parte ilegítima,<br />
pois que os sujeitos de ambas são diferentes”. 55<br />
56<br />
No mesmo sentindo entende FABRÍCIO, para que a nova ação<br />
não se identifique com a anterior, pois não possuiu, no caso de ilegitimidade, as<br />
mesmas partes. Salienta, ainda, que uma sentença proferida num processo entre A e B,<br />
em que A fosse parte ilegítima por ser a relação de direito material entre B e C, não<br />
poderia alcançar a C, pois ele não integra o processo. Ou seja, a força de coisa julgada<br />
não poderia alcançar outra lide que não foi proposta.<br />
Se for instaurado novo processo entre C e B, por possuir partes<br />
diversas, não será a mesma ação.<br />
Assim, de acordo com o artigo 268 do CPC, a sentença que<br />
reconhece a carência de ação não faz coisa julgada material. Todavia, se assim for<br />
entendido, o mesmo autor poderá propor novamente contra o mesmo réu idêntica ação<br />
quantas vezes entender, mesmo faltando as condições que levaram a extinção do<br />
processo. Seria necessário apenas pagar os encargos sucumbências do processo<br />
anterior para que estivesse autorizada a repetir a demanda fadada a extinção. E o juiz<br />
teria que repetir inúmeras vezes o mesmo julgamento.<br />
CONCLUSÃO<br />
55 Idem. Ibidem. p. 68.<br />
56 Adroaldo Furtado Fabrício. Op. Cit. p. 392.
No presente trabalho, são apresentadas as teorias que surgiram<br />
para explicar a natureza jurídica do direito de ação, bem como sua evolução no<br />
decorrer dos anos.<br />
Inicialmente, não era feita a diferença entre o direito de ação e o<br />
material, de modo que era entendido como uma qualidade deste. Posteriormente, os<br />
processualistas começaram a percebê-lo como um direito autônomo, desvinculado do<br />
direito material, até surgir a teoria criada por Liebman, segundo a qual, para a<br />
existência do direito de ação, seriam necessárias algumas condições mínimas.<br />
Esta teoria se difundiu no direito brasileiro e foi adotada pelo CPC<br />
em seu artigo 267, VI, de acordo com o qual haverá extinção do processo sem<br />
resolução do mérito quando não concorrer qualquer das condições da ação, não<br />
havendo formação de coisa julgada material.<br />
Ocorre que, pelos fundamentos expostos no presente trabalho,<br />
conclui-se que esta teoria é passível de críticas, especialmente quando afirma que não<br />
há atividade jurisdicional na decisão que reconhece a carência da ação, pois ter-se-ia<br />
que criar uma atividade jurisdicional diversa das já existentes. Em segundo lugar, por se<br />
defender que, ao perquirir sobre as condições da ação, o juiz estaria, na verdade,<br />
fazendo uma analise do próprio mérito.<br />
Outrossim, quando o juiz extingue o processo por carência de<br />
ação, há apenas coisa julgada formal, pois é possível que se ingresse novamente com<br />
a mesma ação, implementado-se a condição antes faltante. Todavia, não se trata de<br />
repetição da mesma ação, e sim de uma nova, diferente da anterior. Assim, quando o<br />
juiz julga o autor carecedor de ação, está afirmando que umas das partes não é<br />
legítima para a demanda, que não há interesse para agir ou que o pedido não<br />
juridicamente possível, de modo que, uma ação idêntica a primeira jamais poderá ser<br />
repetida, pois que sobre ela, já se operou a coisa julgada material.<br />
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Portanto, a analise das condições da ação referem-se ao próprio<br />
mérito da causa submetida ao Poder Judiciário, uma vez que dizem respeito a relação<br />
de direito material e não de direito processual, havendo, isso posto, decisão mérito e,<br />
consequentemente coisa julgada material.<br />
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