Projecto + Escola Projecto + Escola - FEC
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Abril 2008 ANGOLA GUINÉ-BISSAU CABO VERDE S. TOMÉ E PRÍNCIPE MOÇAMBIQUE TIMOR-LESTE BRASIL PORTUGAL Projecto + Escola Por uma Educação Para Todos Nuno Macedo - FEC
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- Page 16: Abril 2008 Nº20 FICHA TÉCNICA EDI
Abril 2008<br />
ANGOLA GUINÉ-BISSAU CABO VERDE S. TOMÉ E PRÍNCIPE MOÇAMBIQUE TIMOR-LESTE BRASIL PORTUGAL<br />
<strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong><br />
Por uma Educação Para Todos<br />
Nuno Macedo - <strong>FEC</strong>
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
2<br />
NESTA<br />
EDIÇÃO<br />
DESTAQUE<br />
+ <strong>Escola</strong>, + Educação,<br />
+ Guiné-Bissau<br />
Nuno Gonçalves Macedo<br />
Gestor do <strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong><br />
Representante da <strong>FEC</strong> na Guiné-Bissau<br />
O apoio à educação na<br />
estratégia da Cooperação<br />
portuguesa na Guiné-Bissau<br />
Ana Correia<br />
Coordenadora de <strong>Projecto</strong>s<br />
de Cooperação da Embaixada<br />
de Portugal em Bissau<br />
Educação<br />
D. Pedro Carlos Zilli<br />
Bispo de Bafatá, Guiné-Bissau<br />
Bafatá inova na Educação<br />
Sara Poças<br />
Técnica Formadora da <strong>FEC</strong>, Guiné-Bissau<br />
Educação Básica<br />
de qualidade para Todos<br />
Diva Biai<br />
Plan Guiné-Bissau<br />
Como e Porquê surgiu<br />
a Associação dos Filhos<br />
e Amigos de Canhobe<br />
António Sufia da Costa<br />
Presidente da Associação dos Filhos<br />
e Amigos de Canhobe, Guiné-Bissau<br />
Reconhecimento do empenho<br />
de uma Comunidade<br />
Yofân Sambú<br />
Director da <strong>Escola</strong> do Ensino Básico<br />
Unificado Prof. Henrique Bamba Ferreira<br />
em Canhobe, Guiné-Bissau<br />
O Ensino da Língua<br />
Portuguesa na Guiné-Bissau<br />
Ana Paula Roblés<br />
Formadora do Instituto Camões<br />
Responsável pelo Centro de Língua<br />
Portuguesa em Bissau<br />
Participação da sociedade<br />
civil na Educação<br />
na Guiné-Bissau<br />
Catarina Lopes<br />
Fundação Evangelização e Culturas<br />
Fórum de Educação<br />
na Guiné-Bissau<br />
Apoio à Educação<br />
O desafio da Guiné-Bissau<br />
Jorge Líbano Monteiro<br />
Administrador da <strong>FEC</strong><br />
Foi com enorme honra que desenvolvemos e promovemos juntamente<br />
com a INDE (Instituto Nacional para o Desenvolvimento da Educação) o Fórum sobre<br />
Educação na Guiné-Bissau. Considerámos que era ideal encontrar espaços de diálogo e reflexão<br />
que sejam capazes de criar propostas concretas de melhoria para o ensino da educação<br />
na Guiné-Bissau. Este foi um corolário do trabalho que temos vindo a fazer nos últimos<br />
anos, realizado com grande emoção, com grande vontade e com grande paixão pelo próprio<br />
destino da Guiné-Bissau.<br />
Um trabalho desenvolvido em duas linhas diferentes de actuação. Por um lado a tentativa<br />
de ter os melhores profissionais envolvidos nos projectos, quer a nível dos técnicos voluntários,<br />
quer também na procura das escolas e dos parceiros que possibilitassem desenvolver o projecto<br />
da melhor forma. Por outro, um projecto que nasce com a certeza de que é essencial desenvolver<br />
a parceria com a Guiné-Bissau, e nesse sentido, o trabalho desde a primeira hora<br />
com a Igreja no interior deste país, na certeza de que é preciso alavancar as estruturas existentes<br />
nas escolas, nos sistemas e nas organizações. De facto, a <strong>FEC</strong> tem procurado desde o<br />
início o desenvolvimento de parcerias sólidas (também com outras entidades locais, ONG<br />
locais e internacionais), que aproveitem as mais-valias de cada instituição. Parcerias que possibilitem<br />
que o nosso trabalho seja cada vez mais amplo, cada vez mais profundo e cada vez<br />
mais de acordo com os objectivos dos professores e com as necessidades dos alunos, os nossos<br />
destinatários finais.<br />
Foi por isso que este Fórum se revelou de uma enorme importância para a <strong>FEC</strong> e esperamos<br />
também que para o próprio ensino na Guiné-Bissau. Um momento privilegiado para se ouvir<br />
experiências diferentes, e com humildade, aprender com as experiências de outros, perceber<br />
erros que tenhamos cometido, perceber caminhos, desafios e reptos que se põem a cada instituição<br />
num objectivo comum, que é apoiar a educação na Guiné-Bissau.<br />
Por isso, deixamos aqui uma forte palavra de agradecimento ao INDE e a todas as entidades<br />
estatais associadas a este projecto, sem as quais não teria sido possível desenvolver este Fórum.<br />
Por outro lado, um agradecimento muito forte também ao Instituto Camões, que acolheu<br />
esta iniciativa desde o primeiro momento em que lhe foi apresentada, compreendeu o<br />
seu alcance e apoiou-o financeiramente. Não queríamos deixar de referir o IPAD, que, apoiando<br />
todo o trabalho que temos vindo a desenvolver na Guiné-Bissau desde o início deste caminho,<br />
possibilitou também a realização deste evento.<br />
O projecto + <strong>Escola</strong><br />
é co-financiado por:<br />
Campanha de 2007<br />
duplicou números de 2006<br />
Ricardo Perna<br />
Fundação Evangelização e Culturas<br />
Missão e Transformação Social<br />
D. José Alves<br />
Arcebispo de Évora
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
+ <strong>Escola</strong>, + Educação, + Guiné-Bissau<br />
Nuno Gonçalves Macedo<br />
Gestor do <strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong><br />
Representante da <strong>FEC</strong> na Guiné-Bissau<br />
Nuno Macedo - <strong>FEC</strong><br />
Ana Fonseca - <strong>FEC</strong><br />
À pergunta do jornalista: “A Michelle pode vir a<br />
ser uma grande campeã?” O director da escola respondeu: “Nunca<br />
ninguém pode prever o aparecimento de um grande campeão.” Michelle<br />
é uma tenista portuguesa que, com apenas 15 anos, treina na<br />
melhor escola de ténis dos Estados Unidos, onde se formaram campeões<br />
famosos como André Agassi ou Mónica Selles... Ficou-me no<br />
ouvido aquela frase: “Nunca ninguém pode prever o aparecimento<br />
de um grande campeão...” Talvez as dores musculares que guardo<br />
ainda do treino de ontem à noite me tornem mais sensível ao tema…<br />
A verdade é que comecei a treinar no ginásio do Estádio 24 de Setembro,<br />
aqui em Bissau, não para ser campeão, mas para aliviar um pouco<br />
o stress, no final dos dias de trabalho. A ideia foi-me dada por um<br />
amigo que me dizia: “Uma hora por dia vai fazer-te bem. Até te esqueces<br />
do projecto!”<br />
O “projecto” é a maneira familiar que temos de nos referirmos à intervenção<br />
da Fundação Evangelização e Culturas (<strong>FEC</strong>) na Guiné-<br />
Apresentação do <strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong> aos grupos-alvo das escolas públicas<br />
com intervenção comunitária de Cachungo em Outubro de 2007<br />
Sessão de formação em Língua Portuguesa<br />
de professores das escolas comunitárias de Bafatá (<strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong>)<br />
Bissau, cujo título é “<strong>Projecto</strong> + <strong>Escola</strong>: capacitação de professores,<br />
directores e comunidades”. Este projecto surge ao cabo de 7 anos<br />
de trabalho da <strong>FEC</strong> no país, no seguimento de um outro: o “<strong>Projecto</strong><br />
de Apoio à Educação no Interior da Guiné-Bissau” (PAEIGB).<br />
Durante o PAEIGB, a <strong>FEC</strong>, com o suporte do Instituto Português<br />
de Apoio ao Desenvolvimento (IPAD) e da Fundação Calouste Gulbenkian<br />
e em colaboração com o Ministério da Educação (ME) Guineense<br />
e a Comissão Interdiocesana de Educação e Ensino (CIEE)<br />
da Igreja Católica, formou centenas de professores, directores de escola,<br />
bibliotecários, formadores, inspectores e outros técnicos dos<br />
organismos estatais de apoio à educação. Contribuiu igualmente para<br />
a criação de bibliotecas e Centros de Desenvolvimento Educativo<br />
nas regiões interiores do país. Inicialmente, o trabalho incidiu nos vários<br />
níveis de ensino, desde o pré-escolar até ao secundário. Pouco<br />
a pouco, a Fundação especializou-se no ensino básico elementar e,<br />
muito particularmente, nos sistemas de gestão escolar em que há participação<br />
da comunidade: estas são escolas em que há mais garantias<br />
dos professores não fazerem greve, uma vez que a comunidade participa<br />
no pagamento dos mesmos.<br />
O projecto actual, o + <strong>Escola</strong>, procura capitalizar as aprendizagens<br />
do projecto anterior, tendo como enfoque uma das prioridades definidas<br />
no Plano Nacional de Acção – Educação Para Todos do Governo<br />
da Guiné-Bissau: formar professores para satisfazer as necessidades<br />
de uma educação de base de qualidade para todos. O objectivo do<br />
+ <strong>Escola</strong> é o de desenvolver uma metodologia de formação em serviço<br />
para professores que, na sua larga maioria, são professores sem<br />
diploma, passível de ser acreditada oficialmente, e que os habilite para<br />
uma carreira digna ao serviço da formação integral dos filhos da sua<br />
terra. Num horizonte temporal de dois anos, o projecto propõe a<br />
cerca de 70 professores uma formação em Língua Portuguesa, Matemática<br />
e Ciências Integradas, a partir dos conteúdos dos manuais escolares<br />
oficiais, com sessões de formação mensais e intensivas nos<br />
períodos das pausas escolares e com acompanhamentos individuais<br />
periódicos ao longo do ano lectivo. Para tal, a <strong>FEC</strong> conta com o<br />
apoio do IPAD, da Plan Guiné-Bissau e da Action Aid e a colaboração<br />
da CIEE e o ME.<br />
Na realidade, o tal director da escola de ténis disse mais do que eu citei<br />
ao início. Ele disse que “Nunca ninguém pode prever o aparecimento<br />
de um grande campeão... Mas a Michelle tem boas possibilidades”.<br />
Nós na <strong>FEC</strong> também não conseguimos prever o aparecimento de um<br />
grande campeão, mas toda a nossa intervenção na área da educação<br />
assenta na crença de que, com a melhoria da qualidade dos professores<br />
sem diploma e das escolas em que trabalham, todos os dias aumentamos<br />
as possibilidades daqueles que se sentam nos bancos das escolas da<br />
Guiné-Bissau de virem a ser ainda maiores pequenos campeões.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
O apoio à educação na estratégia da<br />
Cooperação portuguesa na Guiné-Bissau<br />
Ana Correia<br />
Coordenadora de <strong>Projecto</strong>s de Cooperação<br />
da Embaixada de Portugal em Bissau<br />
Nuno Macedo - <strong>FEC</strong><br />
A Educação ocupa um lugar central entre os direitos humanos<br />
e é um elemento-chave do exercício de outros direitos inerentes à<br />
pessoa humana e ao desenvolvimento. Conforme referido no Documento<br />
de Estratégia Sectorial para a Educação da Cooperação Portuguesa, a educação<br />
possibilita ao ser humano adquirir conhecimentos, valores e<br />
competências que lhe permitem valorizar-se e adaptar-se à evolução<br />
social e cultural, melhor dialogar e compreender as necessidades dos<br />
outros, participar activamente nas estratégias de desenvolvimento e<br />
reforçar a dimensão da cidadania. Isto contribui para a construção<br />
de sociedades mais abertas e democráticas, mais justas e equitativas,<br />
sendo um dos instrumentos mais poderosos na redução da pobreza<br />
e da desigualdade.<br />
As orientações estratégicas definidas no documento Uma Visão Estratégica<br />
para a Cooperação Portuguesa reafirmam o papel central da educação,<br />
enquanto sector-chave no apoio ao desenvolvimento sustentável dos<br />
países parceiros. Igualmente, dois dos ODM (Objectivos de Desenvolvimento<br />
do Milénio) são dedicados à Educação: alcançar a educação<br />
primária universal (ODM 2) e eliminar a disparidade de género em<br />
todos os níveis de ensino (ODM 3) até 2015.<br />
A Educação é um dos sectores de intervenção prioritária do Governo<br />
Guineense que, de acordo com o seu Programa de Investimentos<br />
Públicos 2006-2008, o reconhece como um sector fundamental com<br />
vista ao desenvolvimento humano durável e à redução da pobreza<br />
no País. Os objectivos prioritários para o sector da educação centram-<br />
-se, deste modo, à volta da realização da escolarização universal de<br />
qualidade ao nível do ensino elementar, até 2010.<br />
Considerada bilateralmente como uma das áreas prioritárias de intervenção,<br />
o apoio à Educação traduz um esforço significativo da Cooperação<br />
portuguesa na Guiné-Bissau, cobrindo todos os níveis de ensino.<br />
Reconhecendo a importância do ensino pré-primário, a Cooperação<br />
Portuguesa tem apoiado, desde 2003, através da Fundação Educação<br />
e Desenvolvimento, em parceria com a Universidade de Aveiro, um<br />
projecto de apoio à infância em Bissau, centrado na formação de recursos<br />
humanos/educadores infância, na dotação de espaços – jardins<br />
de infância – com recursos materiais, pedagógicos e lúdicos e na concepção<br />
de orientações curriculares para a educação pré-escolar.<br />
No apoio à educação primária, desde 2000, destaca-se o apoio financeiro<br />
à reabilitação física e apetrechamento das escolas no interior da<br />
Guiné-Bissau. Neste âmbito, o trabalho desenvolvido pela ONG<br />
portuguesa Fundação Evangelização e Culturas (<strong>FEC</strong>) tem sido fundamental<br />
na formação de formadores, na formação de Directores<br />
de <strong>Escola</strong>s, no apoio aos Centros de Desenvolvimento Educativo,<br />
bem como no apoio técnico à Rádio Sol Mansi, privilegiando as regiões<br />
de Bafatá, Cacheu e Oio.<br />
No ensino secundário, o PASEG – Programa de Apoio ao Sistema<br />
Educativo da Guiné-Bissau tem absorvido, desde 2001, grande parte<br />
dos recursos e, no que respeita ao ensino<br />
superior, a Cooperação portuguesa<br />
mantém o apoio à Faculdade de Direito<br />
de Bissau, através da Faculdade de Direito<br />
de Lisboa, apoiando a promoção da<br />
qualidade e criação de respostas locais,<br />
essencialmente na área do Direito e<br />
Administração Pública, elementos essenciais<br />
ao reforço do Estado de Direito<br />
da Guiné-Bissau.<br />
política de bolsas, a Cooperação<br />
portuguesa tem vindo a privilegiar o<br />
apoio ao programa de bolsas internas<br />
destinadas ao ensino secundário e<br />
superior, sendo que as bolsas externas<br />
destinar-se-ão maiori-tariamente à<br />
frequência de licenciatu-ras, pósgraduações,<br />
mestrados e doutoramentos<br />
em Portugal, na perspectiva<br />
de ir ao encontro das necessidades<br />
da política guineense de capacitação,<br />
formação e valorização dos recursos<br />
humanos.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
Educação<br />
O Papel do Estado, da Sociedade Civil e da Religião<br />
D. Pedro Carlos Zilli<br />
Bispo de Bafatá, Guiné-Bissau<br />
DR<br />
Dom Pedro Zilli considera que a Sociedade Civil tem o dever de promover a Educação<br />
Proponho-me a dizer algo daquilo que é o papel do Estado, da Sociedade<br />
Civil e da Religião no âmbito da Educação na Guiné Bissau. O tema proposto é grande:<br />
mesmo assim, aceitei, de bom grado, escrever umas palavras para o “Boletim Igrejas Lusófonas”.<br />
Começo dizendo que é uma alegria poder constatar que há muita gente e muitas instituições<br />
na luta em favor da Educação: o Governo, as Igreja Cristãs, os Muçulmanos, as ONG, as<br />
Associações, etc. Há instituições que se preocupam não somente em possibilitar o acesso<br />
aos bancos escolares. Visam também contribuir para a melhoria da qualidade da educação.<br />
Na educação escolar, o Estado é o seu primeiro responsável. Educação e Saúde são seus<br />
deveres primários. Entretanto, não se lhe deve atribuir tudo. O Estado guineense não<br />
pode continuar a ir buscar dinheiro ao exterior para manter as escolas a funcionar e a<br />
população local, enquanto a população fica passivamente à espera dessas ajudas.<br />
A Sociedade Civil é chamada a aprofundar a sua compreensão de que a Educação é um<br />
seu direito. Isto já não seria pouco. É direito, mas é também dever. À Sociedade Civil<br />
cabe o dever de promover a Educação.<br />
A Religião, especialmente numa situação como a da Guiné-Bissau, não pode ficar tranquila<br />
diante do analfabetismo ainda reinante. Muitos que já frequentaram a escola continuam,<br />
de algum modo, analfabetos. Há aqueles que, após concluírem alguns estudos, nunca<br />
mais pegaram num texto de leitura. Isto porque na escola talvez nunca tenham sido suficientemente<br />
estimulado o cultivo do estudo. Talvez tenham visto a escola como algo<br />
maçador e pouco atraente.<br />
O momento que estamos a viver não é o mais animador do nosso País. As pessoas andam<br />
cansadas e sem muitas perspectivas. Também as lideranças políticas, sociais e religiosas<br />
arriscam-se a não escapar ao sentimento de que pouco ou nada consegue ir para a<br />
frente. Talvez as dificuldades do dia-a-dia tenham provocado a perda do idealismo, do<br />
optimismo que tem o dever de animar, propor, orientar, corrigir, provocar. É possível<br />
que os educadores não tenham ainda compreendido<br />
o sentido da palavra “educação”: “e-ducere” quer<br />
dizer extrair das pessoas o melhor de si mesmas.<br />
O Secretario de Estado do Vaticano, Cardeal Tarcisio<br />
Bertone, a este propósito diz: “‘E-ducere’, ou<br />
seja, ajudar os jovens a exprimir as coisas que podem<br />
fazer. Dom Bosco dizia que, em cada jovem,<br />
mesmo no mais delinquente, existe sempre um<br />
ponto sensível ao bem, que cabe aos educadores,<br />
aos formadores reconhecer e valorizar”(Revista<br />
“30 Giorni”, Anno XXVI-N.1-2008).<br />
No nosso País, todas as instituições acima são<br />
chamadas a se envolverem, através da Educação,<br />
na transformação do sistema de subsistência em<br />
sistema de produção para o mercado. Esta atitude<br />
deveria ajudar as populações, especialmente as rurais,<br />
a livrarem-se da pobreza.<br />
A fé diz-nos que Deus nunca esteve tão perto de<br />
nós: Ele convoca-nos à esperança, à perseverança,<br />
à coragem, à busca de novas possibilidades que<br />
visem o bem da nossa gente sedenta de algo novo.<br />
E a Educação é uma grande ocasião para a concretização<br />
deste algo novo.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
Bafatá inova na Educação<br />
Uma diocese sempre alerta<br />
Sara Poças<br />
Técnica Formadora da <strong>FEC</strong>, Guiné-Bissau<br />
Sara Poças - <strong>FEC</strong><br />
Jornadas de lançamento do projecto + <strong>Escola</strong> com os<br />
directores e missionários das escolas da Diocese de Bafatá<br />
I Encontro sobre Educação da Diocese de Bafatá<br />
( Junho 2007)<br />
Visita exploratória à <strong>Escola</strong> Primária<br />
MBana Na Ndungue em Catió (Fevereiro 2007)<br />
Seminário de formação em gestão e administração<br />
escolar em Bafatá (Janeiro 2008)<br />
A Guiné-Bissau é constituída por duas dioceses: a de Bissau e a de Bafatá.<br />
Esta última abrange as zonas leste e sul do país, numa diversidade cultural muito singular,<br />
onde interagem várias etnias.<br />
A caminho do sul o isolamento aumenta, as estradas tornam-se cada vez mais difíceis,<br />
tornando longos os pequenos trajectos. São zonas isoladas e de rara beleza, para quem<br />
vai de visita, mas um pouco duras para quem tem que lá viver o seu dia-a-dia.<br />
Existem missões que se encontram em sítios que estão de tal forma isolados que nem<br />
os transportes públicos transitam, como é o caso de Bedanda, Caboxanque, São Francisco<br />
e Cafal, estas duas últimas em plena floresta de Cantanhez.<br />
O mesmo se passa em Bolama, a ilha que foi capital da Guiné-Bissau, candidata a património<br />
da humanidade, onde ainda se reconhece o estilo arquitectónico português do<br />
tempo colonial.<br />
Nestas regiões, o acesso a uma educação e saúde básicas é muito precário e assim a Igreja<br />
tem um papel importante nestas áreas.<br />
As escolas públicas ao longo dos anos foram vendo empobrecer os seus recursos materiais<br />
e humanos devido ao isolamento, à falta de controlo por parte da Direcção Regional da<br />
Educação e à falta de pagamento dos professores.<br />
É neste cenário que surgem na diocese de Bafatá as escolas ligadas às Missões Católicas:<br />
escolas privadas e de autogestão.<br />
As escolas de autogestão são explicadas pela metáfora do fogão que assenta em três pedras<br />
que são a Missão Católica, a Comunidade e o Ministério da Educação.<br />
O isolamento tem impedido estas escolas de partilharem experiências e procurarem juntas<br />
um caminho para o sucesso educativo.<br />
No entanto, D. Pedro Zilli, bispo de Bafatá, atento às necessidades das suas missões, pediu<br />
à Fundação Evangelização e Culturas (<strong>FEC</strong>) que promovesse o encontro de todos<br />
e os conduzisse a traçarem um caminho comum.<br />
Deste encontro nasceu a vontade e criação de um Manual de Procedimentos para as<br />
escolas da diocese, ideia inovadora e ainda em construção.<br />
O Manual de Procedimentos pretende reunir as boas práticas e as dificuldades sentidas<br />
por cada missão num documento de reflexão conjunta. De facto, as escolas católicas<br />
têm uma estrutura e autonomia na sua gestão pedagógica e administrativa, embora tenham<br />
algumas dificuldades em articular os seus programas e documentos com as realidades<br />
do país e ministeriais existentes. Neste sentido, ao trabalhar em rede, potencia-<br />
-se um maior envolvimento de todos os responsáveis e directores das escolas da diocese.<br />
Com o arranque do projecto + <strong>Escola</strong>, foi criada uma actividade de formação em administração<br />
e gestão escolar para directores e missionários responsáveis das escolas da<br />
Diocese de Bafatá.<br />
Assim, a <strong>FEC</strong>, em parceria com a Diocese e com a Comissão Interdiocesana da Educação<br />
e Ensino da Guiné-Bissau, conta com um programa formativo orientado por uma técnica<br />
de educação ao longo do ano lectivo 2007/2008. O trabalho realiza-se através de duas<br />
visitas exploratórias e dois seminários por zonas geográficas, culminando com o II Encontro<br />
Diocesano da Educação onde se reflectirá sobre a escola católica que temos e a que<br />
queremos ter, para chegar a um só objectivo: uma escola de qualidade para a Guiné-Bissau.<br />
Este objectivo só pode ser conseguido com o empenho de todos: “I ka un pe son ku pui<br />
kaminhu limpu!” ( Não se abre um caminho com um só pé).
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
Educação Básica de qualidade para Todos<br />
Os Desafios da Plan Guiné-Bissau em Bafatá<br />
Diva Biai<br />
Plan Guiné-Bissau<br />
Foto Plan Guiné-Bissau<br />
Quando em 1995 a Plan iniciou as suas actividades em<br />
Bafatá, o sector educativo desta região do leste da Guiné-Bissau caracterizava-se<br />
por ter as mais baixas taxas de escolarização e conclusão<br />
do ensino básico nacional (com particular incidência nas raparigas).<br />
Questões relacionadas com o acesso, a qualidade e a própria gestão<br />
da oferta educativa têm constituindo desde então os principais desafios<br />
ao cumprimento da política de “Educação Para Todos”, da qual o<br />
país é signatário (Fórum Mundial de Educação, Dakar/2000).<br />
A expansão da rede escolar regional através da construção de escolas<br />
e reabilitação de outras, inicialmente barracas (erguidas por comunidades<br />
desejosas de garantir uma educação aos seus filhos) representa um<br />
dos maiores êxitos da Plan. Com efeito, a taxa bruta de escolarização<br />
passou em Bafatá de 20% (ano lectivo 1999/2000) para 94,1% (ano<br />
lectivo 2005/06) e actualmente as escolas comunitárias excedem numericamente<br />
as escolas públicas na região. Ademais, os efectivos das<br />
escolas comunitárias de Bafatá representam 38,1% do total de efectivos<br />
das escolas comunitárias do país.<br />
Outro aspecto positivo aliado ao alargamento da rede é o equilíbrio<br />
que as escolas comunitárias têm vindo a proporcionar na questão do<br />
género, permitindo um aumento significativo do número de raparigas<br />
no ensino básico (particularmente nas primeiras classes). A proximidade<br />
da escola, o equipamento adequado das suas salas de aula, a existência<br />
A Plan é uma organização de desenvolvimento comunitário centrado<br />
na criança. Fundada há mais de 70 anos, trabalha em 49 países em<br />
desenvolvimento da Ásia, África e América Latina. Acredita num<br />
mundo em que todas as crianças realizam o seu pleno potencial em<br />
sociedades que respeitam os direitos e a dignidade das pessoas. A Plan<br />
trabalha directamente com as comunidades, as crianças e os seus pais,<br />
a fim de alcançar um desenvolvimento durável a longo termo.<br />
de blocos de latrinas separadas e de ponto de água, a realização de<br />
campanhas de sensibilização radiofónicas, complementado com a refeição<br />
escolar e o incentivo alimentar às raparigas (no âmbito da parceria<br />
com o Programa Alimentar Mundial) parecem ser importantes<br />
factores de promoção da escolarização feminina.<br />
Paralelamente à significante melhoria no acesso à educação básica, permanecem<br />
dificuldades no que toca à conclusão do ensino básico, apesar<br />
dos aumentos registados nos indicadores ao longo dos últimos anos. As<br />
elevadas taxas de repetição (que se verificam sobretudo na primeira e segunda<br />
classe) e de abandono espelham o problema da retenção dos alunos<br />
no sector educativo e particularmente nas escolas comunitárias. Outro<br />
aspecto constrangedor é a falta de oferta dos níveis da 5ª e 6ª classe a nível<br />
das escolas comunitárias, que obriga muitas crianças a deslocarem-<br />
-se para outras escolas (geralmente públicas) ou então a abandonarem<br />
o sistema. A criação destes níveis de ensino a nível da tabanca ou pelo<br />
menos da secção representa actualmente para a Plan um novo desafio<br />
que apresenta contornos mais “humanos” do que estruturais e como tal<br />
o apoio do Ministério da Educação Nacional é imprescindível.<br />
Outra das grandes fragilidades do sector educativo na região de Bafatá<br />
é a insuficiência de professores qualificados, área onde a Plan tem<br />
trabalhado com a Direcção Geral de Educação. No caso das escolas<br />
comunitárias a situação é ainda mais problemática. Os professores,<br />
embora escolhidos entre os “melhores filhos” da tabanca, têm menos<br />
habilitações literárias e menor qualificação profissional.<br />
No entanto, a falta de qualificação não se limita aos professores estendendo-se<br />
ao corpo directivo, com agravante para as escolas comunitárias.<br />
O não conhecimento das funções e das responsabilidades por parte<br />
dos elementos que organizam e gerem a escola (director, comité de<br />
gestão, associação de pais, professores) é responsável por inúmeros<br />
estrangulamentos que afectam a educação (não pagamento atempado<br />
e rotatividade do professor, fraca manutenção das infra-estruturas e<br />
equipamentos escolares). Nesse sentido, a criação das Equipas de<br />
Gestão e das APEEA (Associação de Pais e Encarregados de Educação)<br />
tem sido enquadrada por capacitação e seguimento dos elementos<br />
que constituem estas equipas.<br />
É neste contexto que se inscreve a nova parceria celebrada com a<br />
<strong>FEC</strong> no âmbito do <strong>Projecto</strong> “+ <strong>Escola</strong>”. Melhorar a capacidade didáctico-pedagógica<br />
de 24 professores de 14 escolas comunitárias do<br />
ensino básico elementar de Bafatá nos programas de línguas portuguesa<br />
e matemática e assim contribuir para a aquisição de conhecimentos<br />
e desenvolvimento de competências dos alunos nas escolas-alvo e<br />
para a redução do abandono escolar. A formação dos directores neste<br />
projecto dá ênfase ao domínio da gestão financeira, dos recursos<br />
humanos e da relação com a comunidade no sentido de promover<br />
a menor rotatividade de professores e garantir uma maior assiduidade<br />
nas suas tarefas lectivas e extralectivas.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
Como e Porquê surgiu<br />
a Associação dos Filhos<br />
e Amigos de Canhobe<br />
António Sufia da Costa<br />
Presidente da Associação dos Filhos e Amigos de Canhobe<br />
Canhobe, Guiné-Bissau<br />
Reconhecimento<br />
do empenho<br />
de uma Comunidade<br />
Yofân Sambú<br />
Director da <strong>Escola</strong> do Ensino Básico Unificado<br />
Prof. Henrique Bamba Ferreira em Canhobe, Guiné-Bissau<br />
Canhobe, outrora<br />
baptizada pela Autoridade<br />
Colonial por Vila de Carenque,<br />
terra que nos viu nascer,<br />
fica situada a apenas a 15 km<br />
da cidade de Canchungo e,<br />
segundo os dados estatísticos,<br />
conta com uma população<br />
acima de 9 mil habitantes.<br />
Actualmente grande parte<br />
dos seus habitantes estão espalhados<br />
por todo este mundo<br />
fora na imigração quer internamente,<br />
quer nos outros<br />
países africanos como: Senegal,<br />
Gâmbia, Guiné-Conakri e Mauritânia, e ultimamente na Europa,<br />
particularmente Portugal, Espanha, França e Suiça, todos em busca<br />
de melhores condições de vida.<br />
Infelizmente, esta secção, que tem 5 distritos eleitorais, caiu em esquecimento<br />
por parte de sucessivos governantes do país. No mês de Novembro<br />
do ano 2000, num simples encontro de djuambai, que, por<br />
coincidência, juntou 8 pessoas, falou-se e chegou-se à conclusão de se<br />
juntar mais pessoas e criar uma associação, cujo objectivo único é ajudar<br />
na minimização dos graves problemas sociais com que as comunidades<br />
de Canhobe e Tame se deparam. Assim sendo, no bairro de Hafia em<br />
Bissau, realizou-se a primeira reunião informativa. A reunião surtiu os<br />
efeitos positivos e os filhos das duas comunidades referidas, na diáspora,<br />
receberam as notícias e prontificaram-se com um projecto de reabilitação<br />
da estrada de terra batida que serve as duas povoações. Este projecto<br />
custou um pouco mais de 100.000.000 Fcfa. Em 2001 foi criada a Associação<br />
dos Filhos de Tame (ASSOFITA) e um ano depois, em 2002,<br />
os filhos de Canhobe juntaram-se e criaram a Associação dos Filhos<br />
e Amigos de Canhobe (ASSOFAC).<br />
A ASSOFAC depressa definiu as prioridades das prioridades, onde<br />
a Educação esteve em alta como sendo base fundamental para qualquer<br />
projecto de desenvolvimento. Para essa área a ASSOFAC já investiu<br />
cerca de 50.000.000 Fcfa, desde infra-estruturas, equipamentos<br />
e até subsídios de incentivo aos professores.<br />
Como perspectiva, a ASSOFAC tem para breve um projecto de construção<br />
de um hospital que poderá aliviar e de que maneira o grande<br />
sofrimento com o qual aquele povo tem vindo a deparar-se. Fazendo<br />
isto, a ASSOFAC não quer nem pode pensar em substituir o Estado<br />
ou o Governo na sua responsabilidade política, mas sim apenas colaborar<br />
e agir como parceiro do Governo nas áreas em que intervimos.<br />
Sinto-me muito feliz<br />
enquanto professor e director<br />
da <strong>Escola</strong> do Ensino<br />
Básico Unificado Professor<br />
Henrique Bamba Ferreira em<br />
Canhobe. Satisfeito por estar<br />
a trabalhar com uma Comunidade<br />
organizada e cheia de<br />
ambição de ver a sua aldeia<br />
Canhobe noutro patamar do<br />
desenvolvimento. Claro que<br />
hoje acho que não é crime<br />
nenhum confessar que, ao<br />
receber as ordens da Direcção<br />
Regional de Educação<br />
de que devia ir para Canhobe, torci o nariz em gesto pouco amigo,<br />
achando uma tarefa difícil ir reabrir o processo educativo que havia<br />
sido interrompido há 23 anos, isto é, de 1979 a 2002.<br />
Sou director desta escola já há 6 anos, e a Comunidade, através<br />
da ASSOFAC, recebeu-nos com carinho e o respeito que o professor<br />
enquanto educador merece perante a sociedade, oferecendo-<br />
-nos subsídios e incentivos, residências gratuitas, camas e respectivas<br />
espumas para cada professor, e ainda uma cozinheira à disposição<br />
dos professores, para além de bicicletas para os professores da<br />
escola anexa que fica a 3 km do centro. Gesto esse que demonstra<br />
a grande diferença dessa nossa escola em comparação com as outras<br />
escolas públicas do país. Em contrapartida, nós, todos os professores<br />
desta escola, estamos a tentar no máximo dar o melhor<br />
ensino possível. Por isso, nesta escola, não se fala de greve; mesmo<br />
que seja decretada pelo Sindicato Nacional dos Professores, para<br />
nós fica apenas manifesto de solidariedade.<br />
Para este ano lectivo de 2007/2008, a <strong>Escola</strong> do EBU Professor<br />
Henrique Bamba Ferreira tem um total de 603 (seiscentos e três)<br />
alunos, da 1ª Classe à 6ª Classe.<br />
Assim gostaria que as outras comunidades sigam o grande exemplo<br />
de Canhobe. Talvez assim poderemos passar a comparar o ensino<br />
guineense com o de outros países.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
DESTAQUE<br />
O Ensino da Língua Portuguesa na Guiné-Bissau<br />
Ana Paula Roblés<br />
Formadora do Instituto Camões<br />
Responsável pelo Centro de Língua Portuguesa em Bissau<br />
<strong>FEC</strong><br />
A situação actual da Língua Portuguesa na Guiné-Bissau é deveras preocupante.<br />
Sabemos que, por razões históricas, o Português nunca foi efectivamente implementado no<br />
interior da Guiné-Bissau, onde predominam, até hoje, as línguas étnicas e o crioulo. Há números<br />
que apontam para 5% da população que fala Português, no recenseamento de 1979,<br />
e outros para 10%, no recenseamento de 1991 (Scantamburlo, 1999:62). Não há, infelizmente,<br />
estudos mais recentes sobre este assunto, mas penso que é por demasiado evidente que a<br />
situação da Língua Portuguesa na Guiné-Bissau em nada se compara com os restantes países<br />
lusófonos africanos: é, sem dúvida, o PALOP onde menos se fala a língua lusa. Basta<br />
circular pelas ruas de Bissau para nos apercebermos desta dura realidade.<br />
Sendo língua oficial, o Português é a língua do ensino. É também a língua da produção<br />
literária, da imprensa escrita, da legislação e administração. Deparamo-nos, então, com este<br />
paradoxo: tudo está escrito em Português, mas uma parte esmagadora da população não<br />
domina a língua. As crianças são alfabetizadas numa língua que não ouvem, nem em casa<br />
nem na rua, e só quando comunicamos com a elite política e intelectual guineense conseguimos<br />
estabelecer comunicação em Português. O grande problema da Língua Portuguesa neste<br />
país é, a meu ver, não passar da escrita para a oralidade.<br />
Os inúmeros problemas do ensino do Português nas escolas primárias e secundárias são<br />
consequência imediata deste panorama; saliento aqui apenas os mais sérios:<br />
- Um corpo docente com fraco domínio da Língua Portuguesa e sem qualquer formação<br />
para leccionar;<br />
- Inadequação dos programas à especificidade da Língua Portuguesa na Guiné-Bissau;<br />
- Inexistência de manuais concebidos para o real estatuto do Português neste país: o de<br />
Português Língua Segunda e não o de Português Língua Materna.<br />
Sejamos realistas e admitamos que a situação da língua de Camões é periclitante, pois um<br />
prognóstico realista é meio caminho andado para sarar a ferida. E, não pretendendo adoptar<br />
uma visão pessimista, considero que a formação<br />
de todos os professores de Língua Portuguesa<br />
deve ser a grande prioridade, porque<br />
o professor deve ser proficiente na língua e<br />
competente na metodologia, sobretudo em<br />
estratégias de ensino-aprendizagem do Português<br />
como língua segunda.<br />
Tendo em conta esta situação, e tal como dei<br />
conta na intervenção do Instituto Camões<br />
no Fórum sobre Educação na Guiné-Bissau,<br />
promovido pela <strong>FEC</strong> em Fevereiro<br />
deste ano, foi criada a Licenciatura em Língua<br />
Portuguesa, apoiada pelo Instituto Camões e<br />
a funcionar na <strong>Escola</strong> Normal Superior Tchico<br />
Té desde 2002. Fazem parte do currículo desta<br />
Licenciatura disciplinas determinantes para<br />
os futuros professores de Português, nomeadamente,<br />
Didáctica do Português Língua Segunda<br />
e Prática Pedagógica, entre outras. Dado que<br />
esta última disciplina funciona numa escola<br />
secundária de Bissau, os alunos entram em<br />
contacto com a realidade escolar e põem em<br />
prática os conhecimentos adquiridos durante<br />
a Licenciatura.<br />
O <strong>Projecto</strong> Unidades de Apoio Pedagógico/Pólos de<br />
Língua Portuguesa pode ser outro forte contributo<br />
para a formação dos professores que leccionam<br />
Português. Para além do Centro de Língua Portuguesa<br />
em Bissau, o Instituto Camões está<br />
presente em Quinhamel, Ingoré, Mansoa, Bafatá,<br />
Gabú, Buba, Catió, Bolama, Bubaque e Canchungo.<br />
Estes Pólos estão vocacionados para<br />
o apoio e formação dos professores de Português<br />
a leccionar na Guiné-Bissau, de forma a<br />
assegurar um bom desempenho das suas funções<br />
docentes. Cada Responsável pelo Pólo organiza,<br />
na sua região, várias acções de formação.<br />
O material que serve de suporte a este Plano<br />
de Formação é distribuído pelos onze formadores<br />
e é constituído por 10 Módulos Didácticos<br />
para a Aprendizagem da Língua Portuguesa<br />
(Níveis I, II e III). No ano lectivo de 2006/2007,<br />
636 professores de Língua Portuguesa terminaram<br />
o Nível I; no ano lectivo em curso, a formação<br />
abrange 1.100 docentes de todo o país<br />
(Níveis I e II).
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
10<br />
DESTAQUE<br />
Participação da sociedade civil<br />
na Educação na Guiné-Bissau<br />
Catarina Lopes<br />
Fundação Evangelização e Culturas<br />
Fórum sobre Educação na Guiné-Bissau. Bissau, 25 de Fevereiro de 2008<br />
António Alves - <strong>FEC</strong><br />
Catarina Lopes, da <strong>FEC</strong>, sustenta que os xxxxxxxxxxxxxxx<br />
novos modelos de escolas comunitárias permitem o maior acesso à educação por parte dos guineenses.<br />
Nuco Macedo - <strong>FEC</strong><br />
A participação das populações no<br />
sector da educação, nomeadamente em África,<br />
tem crescido significativamente. O esforço de<br />
cidadãos organizados em associações, comités<br />
de escola ou de aldeia, Organizações Não Governamentais<br />
(ONG), missões religiosas constitui<br />
uma resposta às necessidades manifestadas<br />
localmente e não supridas pelo Estado. O surgimento<br />
de escolas de base participativa corresponde<br />
a: i) uma resposta social das populações,<br />
em particular no período pós-independente<br />
dos países africanos; ii) ineficácia do Estado<br />
em suprir as dificuldades educativas em espaços<br />
não urbanos; iii) consciência crescente das populações<br />
de que a educação pode ser um motor<br />
de desenvolvimento local; iv) partilha de casos<br />
de sucesso em escolas de base participativa.<br />
A designação destes estabelecimentos varia<br />
de país para país. No Mali, as escolas comunitárias<br />
são criadas por iniciativa da população do bairro<br />
ou da aldeia; na Tanzânia, as community school<br />
surgem no âmbito da política descentralizada<br />
da administração comunal com participação<br />
das comunidades na escola; nos Camarões, as<br />
escolas são designadas pelo Estado de clandestinas<br />
de forma a distingui-las das escolas reconhecidas<br />
oficialmente; no Chade, as escolas espontâneas,<br />
no Senegal as escolas comunitárias ou<br />
escolas de base e no Togo, as escolas de iniciativa<br />
local surgem como resposta a uma oferta pública<br />
deficiente em zonas rurais.<br />
Na Guiné-Bissau, a intervenção da sociedade civil apresenta-se como uma resposta à crise<br />
da escola pública. O Estado apresenta dificuldades em responder ao fluxo crescente de alunos<br />
provocado pela Política Educativa de Educação Para Todos. As infraestruturas são escassas<br />
e de construção precária para os efectivos que ingressaram no sistema de ensino. A um<br />
outro, o Estado tem-se confrontado com dificuldades no recrutamento de professores estatais<br />
para escolas fora das cidades capitais do país, em parte devido aos atrasos salariais e ao<br />
isolamento de algumas das escolas do interior.<br />
As populações têm-se reagrupado para construir escolas, salas de aula, apoiando os professores<br />
através de subsídios, da construção da sua casa, com alimentação e/ou transporte. Nos bairros<br />
de Bissau, desenvolve-se o modelo de escolas populares; as escolas de autogestão encontram<br />
mais expressão na região de Oio; as escolas públicas com o apoio de associações manjacas<br />
na região de Cacheu; o das escolas comunitárias na região de Bafatá. Nestes diversos modelos<br />
participam, para além da população do bairro ou da aldeia, actores como ONG, associações,<br />
missões católicas. Apesar da autonomia destas iniciativas, todos estes modelos seguem<br />
os programas, os curricula e os manuais adoptados e definidos pelo Ministério da Educação<br />
(ME) guineense.<br />
Estas escolas proporcionam globalmente um clima de estabilidade, cumprindo um número<br />
de dias lectivos superior aos dos estabelecimentos públicos. Apesar destes modelos educativos<br />
terem uma performance distinta entre si, apontam-se alguns dados gerais que merecem uma<br />
atenção, em particular no quadro da qualidade de educação: i) existência de escolas sem o<br />
primeiro ciclo do ensino básico completo; ii) formação académica insuficiente e deficiente<br />
de docentes; iii) taxa de abandono elevada antes da conclusão da 4ª classe; iv) irregularidade<br />
no pagamento do subsídio ao professor.<br />
Estes modelos participativos permitem a um número crescente de guineenses aceder à educação,<br />
em particular as raparigas. No entanto, o investimento só é válido se os alunos aprenderem<br />
novos conhecimentos e desenvolverem novas competências capazes de darem respostas<br />
aos desafios que a sociedade guineense se defronta no diálogo e na relação com outros países.<br />
Para tal, o estabelecimento de redes entre instituições estatais e não governamentais afigurase<br />
fundamental para uma redução dos custos e uma partilha de responsabilidades e competências.<br />
Para tal, estas iniciativas participativas devem fazer parte do Plano de Acção do Ministério<br />
da Educação, configurando-lhes um enquadramento legal específico e reconhecendo a sua<br />
importância no mapa educativo guineense.
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
11<br />
DESTAQUE<br />
Fórum de Educação na Guiné-Bissau<br />
Nos dias 25 e 26 de Fevereiro realizou-se, no Centro Cultural Português em Bissau, o fórum sobre Educação na<br />
Guiné-Bissau. O evento, promovido pela <strong>FEC</strong> e pelo INDE (Instituto para o Desenvolvimento na Educação), juntou<br />
organizações não governamentais nacionais e internacionais, assim como entidades estatais ligadas à educação,<br />
numa reflexão conjunta sobre o estado da educação neste país e os caminhos que podem levar a melhorias neste sector.<br />
Sara Poças e Rosário Rodrigues, técnicas da <strong>FEC</strong><br />
Fernando Delfim Silva, antigo<br />
ministro da Educação da Guiné-Bissau<br />
Pedro Almeida, técnico formador da <strong>FEC</strong><br />
Vista da sala do Centro Cultural Português,<br />
sempre cheia, onde decorreu o Fórum<br />
Iancub a N’Djai, conselheiro do<br />
primeiro-ministro xxxxxxxxxxxxxxx para os assuntos sociais<br />
Guilherme Zeferino, Adido da cooperação<br />
da Embaixada de Portugal na Guiné-Bissau<br />
O Fórum despertou muita atenção nos participantes<br />
Samba Buaró,<br />
Director Regional de Educação de Bafatá<br />
Rámon Hernandez, representante para<br />
a área da Eucação da Embaixada de Cuba<br />
Madalena Arroja, Instituto Camões
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
12<br />
Campanha de 2007 duplicou números de 2006<br />
3.071 Presentes Solidários Oferecidos<br />
Ricardo Perna<br />
Fundação Evangelização e Culturas<br />
Testemunhos...<br />
... de quem ofereceu Presentes Solidários<br />
“Ouvi na TSF pela 1ª vez acerca dos Presentes Solidários e adoptei logo a ideia. Talvez por ter<br />
trabalhado durante dois anos em Timor-Leste, saiba avaliar o valor real nas vidas das famílias,<br />
que recebem bens tão singelos, mas tão úteis e necessários. Decidi, assim, envolver 22 pessoas<br />
da minha família na compra destes presentes e a reacção unânime foi de surpresa, emoção e<br />
agradecimento. Acrescento que me entristece o furor consumista que se apossou da quadra<br />
natalícia. Prefiro encará-la como um momento de união, afecto e solidariedade e, é claro!, de<br />
maravilhamento para os pequeninos. Julgo que os Presentes Solidários foram um veículo para<br />
estreitar estes sentimentos entre aqueles que me são mais queridos. E, passado o Natal, ao falar<br />
desta ideia a colegas meus de redacção, vários manifestaram pena de não a ter conhecido com<br />
antecedência. E declararam-se sérios candidatos a oferecer Presentes Solidários no Natal de<br />
2008!... Com os meus agradecimentos pelos esforços solidários e com os desejos de muito êxito.”<br />
António Perez Metelo,<br />
Jornalista e comentador na TSF e no Jornal Nacional da TVI<br />
... de quem recebeu Presentes Solidários<br />
“O Natal significa muito mais que entregar presentes. O corropio das compras que nos afecta<br />
a todos nesta altura do ano faz-nos esquecer o seu verdadeiro significado. É claro que também<br />
é uma época onde manifestamos o nosso carinho para com pessoas que são importantes para<br />
nós através de uma oferta. Nesse sentido, o presente solidário traz 2 benefícios. O primeiro,<br />
onde mantemos a intenção de presentear alguém especial para nós; e outro, de sermos solidários.<br />
Ao invés de comprar algo que provavelmente até nem terá grande significado ou utilidade,<br />
presenteamos essa pessoa com um gesto em favor de outros que necessitam da nossa atenção<br />
e solidariedade. Assim, fazemos também dessas pessoas especiais para nós, pessoas solidárias.<br />
Ao receber o meu presente solidário não fiquei triste ou desiludido, fiquei ainda contente por ser<br />
presenteado por um amigo meu e por ter ajudado alguém mesmo sem o conhecer. Mesmo que<br />
não seja algo que revolucione a vida dessa pessoa, é de pequenos gestos que se cria algo grande.”<br />
Pedro Ramos, 28 anos<br />
Director de Serviço de um Health Club<br />
Terminou a primeira fase da campanha<br />
de Natal Presentes Solidários – presentes<br />
que se focam no essencial e não-comercial –,<br />
uma iniciativa da Fundação Evangelização<br />
e Culturas (<strong>FEC</strong>). A campanha pretendia<br />
ajudar as famílias mais carenciadas dos países<br />
lusófonos e, ao mesmo tempo, incutir na sociedade<br />
civil portuguesa uma noção de Natal<br />
solidário, mais virado para a ajuda a populações<br />
que vivem em situações mais difíceis.<br />
A avaliação que fazemos da campanha é extremamente<br />
positiva. De 19 de Novembro a 6<br />
de Janeiro, quase 600 pessoas aderiram e deram<br />
o seu contributo para um Natal mais solidário,<br />
comprando 3.071 presentes, mais do dobro<br />
que o ano passado, quando se tinham vendido<br />
1.394. O número de compradores triplicou<br />
em relação a 2006. É uma prova clara de que<br />
a solidariedade e o altruísmo são valores presentes<br />
no povo português.<br />
Jorge Líbano Monteiro, administrador da <strong>FEC</strong>,<br />
faz um balanço positivo desta primeira fase:<br />
“Conseguimos atingir o nosso objectivo principal,<br />
duplicar o número de presentes. O facto de termos<br />
triplicado o número de compradores é um sinal claro<br />
de que cada vez mais pessoas se importam com a<br />
temática da solidariedade e querem acabar com esta<br />
noção de Natal consumista e pouco solidário no qual<br />
infelizmente todos nos deixamos envolver e que não<br />
nos satisfaz totalmente. Esta é uma campanha que<br />
tem muitas potencialidades e que irá manter-se para<br />
o próximo ano, pois temos a certeza da importância<br />
da mesma para os povos dos países lusófonos que com<br />
ela vão beneficiar”.<br />
Presentes<br />
Oferecidos<br />
O presente mais<br />
comprado foi o<br />
conjunto de 3<br />
Livros <strong>Escola</strong>res<br />
para Cabo Verde,<br />
com 740<br />
compras, seguido<br />
por todos os<br />
outros, conforme<br />
apresentado:<br />
· Cabo Verde<br />
740 conjuntos de<br />
3 Livros <strong>Escola</strong>res<br />
· Moçambique<br />
538 jogos de panelas<br />
· Timor-Leste<br />
301 Kits de Higiene<br />
· Brasil<br />
187 Depósitos de água
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
13<br />
Distribuição dos presentes por país<br />
Em 2006 o presentes mais comprado foi a rede Mosquiteira, para Moçambique.<br />
Em 2007, os Livros <strong>Escola</strong>res para Cabo Verde foram os mais vendidos.<br />
País 2006 P. Unitário Quant.<br />
São Tomé e Príncipe 1 Chapa de Zinco 15 € 130<br />
Angola 1 Kit Sementes + Enxada 20 € 190<br />
Brasil 1 Dúzia de Galinhas 12 € 187<br />
Timor-Leste 1 Kit de Higiene 18 € 158<br />
Cabo Verde 1 Rádio 18 € 83<br />
Moçambique 1 Rede Mosquiteira 7 € 426<br />
Guiné-Bissau 1 Saco de Cimento 10 € 220<br />
Total 1.394<br />
País 2007 P. Unitário Quant.<br />
São Tomé e Príncipe 1 Bata <strong>Escola</strong>r 8 € 518<br />
Angola 1 Caixa de Costura 22 € 293<br />
Brasil 1 Depósito de Água 24€ 184<br />
Timor-Leste 1 Kit de Higiene 16 € 298<br />
Cabo Verde 3 Livros <strong>Escola</strong>res 6 € 736<br />
Moçambique 1 Jogo de Panelas 9 € 563<br />
Guiné-Bissau 24 Tijolos 18 € 479<br />
Total 3.071<br />
800<br />
700<br />
600<br />
500<br />
400<br />
300<br />
200<br />
100<br />
130<br />
518<br />
São Tomé<br />
e Príncipe<br />
190<br />
293<br />
187<br />
184<br />
158<br />
298<br />
Angola Brasil Timor<br />
Leste<br />
83<br />
736<br />
Cabo<br />
Verde<br />
426<br />
563<br />
Moçambique<br />
220<br />
479<br />
Guiné<br />
Bissau<br />
A segunda fase da campanha consiste na compra<br />
e entrega dos presentes no terreno,<br />
processo que será liderado pelos missionários<br />
que actuam como parceiros da <strong>FEC</strong><br />
nesta iniciativa. É de referir também que os<br />
presentes serão adquiridos localmente,<br />
promovendo assim também o desenvolvimento<br />
do comércio local. Quando os presentes<br />
forem comprados e distribuídos teremos a<br />
terceira e última fase da campanha: o retorno<br />
da informação sobre a entrega dos presentes<br />
aos compradores e aos presenteados, feita sob<br />
a forma de testemunhos e fotos das entregas.<br />
Desde já, a Fundação Evangelização e Culturas<br />
e todos os seus parceiros no terreno gostariam<br />
de agradecer a todos quantos contribuíram,<br />
de forma directa ou indirecta, para esta<br />
campanha. Estamos certos de que, juntos, podemos<br />
lutar por um mundo mais justo, um<br />
mundo menos pobre, um mundo melhor.<br />
Total de presentes<br />
e compradores<br />
O número total de compradores<br />
evoluiu de 207 para 592, enquanto<br />
que os presentes vendidos passaram<br />
de 1.394 para 3.071.<br />
2006 2007<br />
3.500<br />
3.000<br />
2.500<br />
2.000<br />
1.500<br />
1.000<br />
500<br />
207<br />
592<br />
1.394<br />
3.071<br />
Compradores<br />
Presentes<br />
2006 2007<br />
· Guiné-Bissau<br />
241 conjuntos de 24 Tijolos<br />
· S. Tomé e Príncipe<br />
504 Batas <strong>Escola</strong>res<br />
· Angola:<br />
282 Caixas de Costura
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
14<br />
Missão e Transformação Social<br />
D. José Alves<br />
Arcebispo de Évora<br />
A missão da Igreja é de ordem religiosa e não de ordem política,<br />
económica ou social (GS, 42; RM, 58). A promoção social compete<br />
primariamente ao poder civil. Porém, o anúncio evangélico não pode<br />
ser feito à margem da situação concreta em que vivem os destinatários.<br />
Com efeito, a Boa Nova não se dirige apenas ao intelecto ou ao espírito.<br />
Dirige-se antes à totalidade da pessoa, ser uno e indivisível, e tem<br />
como finalidade última conduzir a pessoa à salvação integral,<br />
enquanto ser constituído de matéria e espírito, de alma e de corpo.<br />
O anúncio evangélico, para ser perfeito e eficaz, deve implicar a totalidade<br />
de quem o proclama e de quem o acolhe, a exemplo de Jesus<br />
Cristo que começou a fazer e a ensinar, curava o corpo, sarava a alma<br />
e era caminho de salvação para quantos O acolhiam na fé.<br />
A Igreja está consciente da natureza da sua missão no mundo. Por<br />
isso, ao propor a Boa Nova da Evangelho, pretende, antes de mais,<br />
transformar o interior das pessoas e, através delas, transformar a sociedade,<br />
sem limites de espaço nem de tempo. E para alcançar esse<br />
objectivo, a Igreja tenta implantar-se em todas as dimensões geográficas.<br />
Estabelece relações de vivo intercâmbio (GS, 44) com as diferentes<br />
culturas, onde actua, como forma de enriquecimento mútuo. Actua<br />
à maneira de fermento (GS, 40; AG, 8), em ordem a transformar e<br />
promover o sector sócio-económico dos países mais carenciados,<br />
pondo assim em prática aquilo a que antes se convencionou chamar<br />
apostolado indirecto.<br />
DR
FUNDAÇÃO EVANGELIZAÇÃO E CULTURAS 15<br />
ABRIL 2008 | nº 20<br />
Porém, após a publicação da encíclica Populorum Progressio de Paulo<br />
VI (1967), onde se afirma que o desenvolvimento é o novo nome<br />
da paz, houve quem quisesse sobrepor a importância do<br />
compromisso social à do anúncio evangélico. São conhecidas as<br />
tomadas de posição dos que enveredaram até pelo caminho reducionista<br />
da revolução social. Felizmente o próprio papa Paulo VI<br />
esclareceu mais tarde (1970) que a evangelização e o desenvolvimento<br />
são objectivos distintos e complementares da actividade<br />
missionária. Esta deve permanecer fiel ao seu fim prioritário de<br />
ordem espiritual, sem contudo se mostrar insensível às necessidades<br />
e aspirações dos povos em vias de desenvolvimento.<br />
Sendo assim, a verdadeira atitude da Igreja, ao por em prática a missionaridade<br />
própria da sua natureza, deve traduzir-se na procura incessante<br />
da salvação integral do ser humano, a partir da situação concreta em que<br />
ele se encontra, em cada momento da sua vida. Ora, para quem vive<br />
em situação de subdesenvolvimento, a salvação integral implica promoção<br />
humana, desenvolvimento, justiça, paz e solidariedade. E basta uma<br />
análise sumária da sociedade em que vivemos para nos darmos conta<br />
das graves situações de injustiça que afectam a grande maioria da humanidade,<br />
inclusive até nas sociedades ditas desenvolvidas. A distância entre<br />
ricos e pobres é cada vez maior. O número de ricos diminui e o de<br />
... a transformação social<br />
gera-se e fermenta no coração<br />
dos indivíduos.<br />
Só depois se alarga ao<br />
ambiente social. Por isso,<br />
quando houver um analfabeto<br />
a menos e um pobre a menos;<br />
quando houver um espírito<br />
esclarecido a mais e um<br />
cristão verdadeiro a mais,<br />
estaremos mais perto da<br />
civilização do amor.<br />
pobres aumenta assustadoramente. Num mundo que produz mais do<br />
que o suficiente para alimentar toda a população mundial, há milhões<br />
de crianças e de adultos a morrer de fome. Esta é, sem dúvida, uma<br />
situação ética gravíssima que urge denunciar e resolver. Pois, como é<br />
sabido, a miséria fecha o coração e o espírito às necessidades espirituais.<br />
Logo o trabalho de desenvolvimento deve ser considerado como uma<br />
exigência missionária a favor tanto dos pagãos como dos irmãos na fé<br />
(Gal6,10), mas como deixou escrito João Paulo II, afastando para longe<br />
utopias ideológicas falaciosas e servilismos políticos.<br />
É certo que a Igreja não possui meios para alterar directamente as situações<br />
de injustiça. Mas compete-lhe anunciar o Evangelho, esclarecer<br />
a consciência dos que ouvem a sua voz, desenvolver o nível cultural,<br />
ajudar as populações a criar estruturas de apoio à educação, à cultura<br />
e à promoção social; formar elites que sejam verdadeiro fermento<br />
de transformação social aos mais variados níveis da actividade humana.<br />
No dizer de Bento XVI, a Igreja deve inserir-se na luta pela justiça pela<br />
via da argumentação racional e pelo despertar das forças espirituais, promovendo<br />
sem cessar a abertura da inteligência e da vontade às exigências do bem (DCE,28).<br />
Perante os casos de necessidade material, a Igreja não pode ficar de<br />
mãos cruzadas. É chamada a intervir. E, quando se trata de agir directamente<br />
em favor dos necessitados, não pode ficar limitada à assistência.<br />
A promoção humana só<br />
acontecerá quando as estruturas<br />
de pecado forem substituídas<br />
pelas estruturas de solidariedade<br />
e de justiça social. Enquanto uma<br />
das mãos socorre, a outra deve<br />
estar empenhada no combate<br />
às estruturas de pecado. No dizer<br />
de alguém, necessitamos de<br />
missionários da caridade política.<br />
Pois está mais que provado que o assistencialismo resolve momentaneamente<br />
os problemas mas eterniza a dependência e não combate as<br />
estruturas de pecado (SRS,36), que estão na origem da miséria. A<br />
promoção humana só acontecerá quando as estruturas de pecado forem<br />
substituídas pelas estruturas de solidariedade e de justiça social.<br />
Enquanto uma das mãos socorre, a outra deve estar empenhada no<br />
combate às estruturas de pecado. No dizer de alguém, necessitamos<br />
de missionários da caridade política.<br />
Como ficou dito, a transformação social gera-se e fermenta no coração<br />
dos indivíduos. Só depois se alarga ao ambiente social. Por isso, quando<br />
houver um analfabeto a menos e um pobre a menos; quando houver<br />
um espírito esclarecido a mais e um cristão verdadeiro a mais, estaremos<br />
mais perto da civilização do amor. A semente da Palavra<br />
produziu frutos e aproximamo-nos da era da harmonia e da paz. Não<br />
podemos esquecer que entre anúncio evangélico e promoção humana existe<br />
uma estreita conexão (RM, 59) que poderá ser mantida com vantagem<br />
se atentarmos nos dois envios de Jesus. Um feito aos seus discípulos:<br />
ide e ensinai (Mt28,18). E outro feito aos discípulos de João Baptista<br />
que o interrogavam se era Ele o messias: ide contar a João o que vistes e<br />
ouvistes (Mt 11,14). A missão concretiza-se no ensino e na realização<br />
das obras da libertação dos males que afectam a humanidade. São estes<br />
os dois pilares da evangelização e da transformação social. Tem<br />
havido quem pretenda levar a cabo a transformação social sem a<br />
evangelização. Por sua vez, a evangelização só será verdadeiramente<br />
digna desse nome se conduzir à transformação social no sentido da<br />
justiça e da fraternidade propostas pelo Evangelho.
Abril 2008<br />
Nº20<br />
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