António Fonseca Ferreira POR Lisboa mais ... - CCDR-LVT
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Feliz ou infelizmente, as decisões de escolha de habitação não<br />
serão assim tão unívocas como o vulgo das análises sobre fluxos<br />
cidade-periferia as prefiguram. Segundo estas análises, as pessoas<br />
teriam saído de <strong>Lisboa</strong> aos magotes por motivos de ausência de<br />
oferta imobiliária (para venda e arrendamento) dentro da cidade<br />
e/ou por razões económicas – a oferta existente estaria acima das<br />
suas possibilidades. Ou seja: havia poucas casas disponíveis e as<br />
disponíveis eram caras. Esta análise, que parece certeira para avaliar<br />
o que se passou por exemplo nos anos sessenta, setenta e talvez<br />
até oitenta, falha a partir daí. Quando os juros do crédito à habitação<br />
começam a descer, torna-se razoavelmente acessível comprar<br />
e mesmo, decorrentemente, alugar casa no centro de <strong>Lisboa</strong>.<br />
Casas velhas, antigas, bem entendido: sem elevador na sua maioria,<br />
sem garagem, sem jacuzzi nem aquecimento central e com necessidade<br />
de obras, grandes ou pequenas. Sucede, porém, e este é um<br />
dos factores que as análises sobre a «fuga» para a periferia sistematicamente<br />
elidem, que muita gente recusa, à partida, a ideia<br />
de «casas velhas». Não apenas por serem velhas ou precisarem<br />
de obras, mas pela ideia de usado, de gasto, de segunda mão,<br />
e mesmo porque a estética das casas velhas lhes desagrada. Chão<br />
de madeira, janelas de madeira, até tectos altos: há pessoas, muitas<br />
pessoas, que não querem nada disto. Custa a perceber a quem<br />
gosta e quer exactamente isso? Pois custa. Mas é capaz de haver<br />
poucas compras em que os factores estéticos e de história de vida<br />
(sociológicos, sentimentais, psicológicos) pesem tanto. Ao comprar<br />
uma casa, as pessoas projectam-se: querem algo que corresponda<br />
ao seu sonho, à sua opção de vida, muitas vezes àquilo que permite<br />
sentir que se avançou em relação à geração anterior. E para muita<br />
gente o sonho é «uma casa nova a estrear», uma espécie de começo<br />
do zero, de espaço virgem – frequentemente uma casa num sítio<br />
muito diferente daquele onde cresceram. E se cresceram no centro,<br />
num bairro popular, com casas pequenas e antigas com vista para<br />
a janela do vizinho, provavelmente arrendadas a um preço muito<br />
baixo e por isso mal conservadas, querem algo de muito diferente,<br />
mesmo que a quilómetros do emprego e das escolas, mesmo que<br />
longe de tudo e com horas de carro ou transportes pelo meio,<br />
mesmo com os encargos económicos adicionais que isso implica,<br />
mesmo que depois se arrependam e mesmo que essa opção<br />
multiplicada por milhões altere estruturalmente a paisagem e as<br />
vivências, com consequências muito negativas a nível quer<br />
ambiental quer económico, com altos dispêndios energéticos<br />
e de tempo que empobrecem o país.<br />
Um inquérito realizado em 2009 pela Câmara e pelo Instituto<br />
Superior Técnico, intitulado Viver <strong>Lisboa</strong> e cujas principais conclusões<br />
foram divulgadas em Agosto, confirma a importância<br />
das opções individuais e das ideias feitas na conformação das<br />
cidades. Só 13% dos inquiridos que habitam em <strong>Lisboa</strong> e admitiriam<br />
mudar para zona da cidade distinta daquela onde vivem<br />
escolheriam as «zonas históricas» e os restantes prefeririam,<br />
de acordo com uma notícia da Lusa que cita as conclusões do dito<br />
estudo (que por qualquer razão não se encontra disponível na<br />
net) «as da Coroa Norte (Ameixoeira, Lumiar, Charneca e Carnide),<br />
seguidas das da área central consolidada (Campo Grande, S. João<br />
de Brito, Nossa Senhora de Fátima e Alvalade).»<br />
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