António Fonseca Ferreira POR Lisboa mais ... - CCDR-LVT
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de jovens e idosos e hotéis. O Plano Local de Habitação, coordenado<br />
por Helena Roseta, parece ir no mesmo caminho. Num<br />
debate organizado no início de 2009 no âmbito do dito, a maioria<br />
das intervenções apontava, <strong>mais</strong> uma vez, para a ideia de um centro<br />
envelhecido e desabitado pela acção conjugada (cúmplice?) dos<br />
tubarões da especulação e das más políticas de urbanismo e ordenamento<br />
(nas quais a catastrófica lei das rendas não foi, estranhamente,<br />
incluída), um centro onde o preço altíssimo das casas e a<br />
exiguidade da oferta teriam «expulsado» a população de <strong>Lisboa</strong><br />
para os arrabaldes, um centro de onde «os jovens» estariam excluídos<br />
por razões económicas e onde os prédios apodreceriam<br />
.à espera da derrocada e do lucro dos seus proprietários.<br />
A possibilidade de que esta repetição de estereótipos negativos<br />
sobre o centro tenha algum tipo de efeito na realidade, reforçando<br />
tudo aquilo que supostamente se visa combater, parece ja<strong>mais</strong><br />
ocorrer a quem nela insiste. Como não ocorre, pelos vistos, a hipótese<br />
de que as situações possam mudar não por decisões superestruturais,<br />
políticas e legais, de cima para baixo, mas por deliberação<br />
de indivíduos. Que o centro possa repovoar-se porque há quem<br />
procure aí casa, e que se tenha despovoado, na descrita saída para<br />
as periferias, também por escolha e não mero recurso. Preside<br />
a esta atitude, a esta incapacidade de ver, uma mistura de má<br />
informação, preguiça e preconceito.<br />
Má informação porque as alterações sensíveis no centro da cidade,<br />
tanto no que respeita a negócios como a residentes (e na própria<br />
atitude dos autarcas, de que é exemplo o já citado responsável por<br />
São Nicolau, que conseguiu negociar a cobertura wireless gratuita<br />
da sua zona), têm sido ignoradas quer pelos «especialistas» quer<br />
pelos decisores. Esta alteração, que corresponde a uma recomposição<br />
sociológica e demográfica, com um afluxo de jovens adultos<br />
diferenciados que procuram aí habitação não apenas pela localização<br />
privilegiada mas também pelas características do edificado<br />
«de época», procurando especificamente o que fez sair outros, ou<br />
seja, «casas velhas», passa completamente despercebida à maioria<br />
dos que falam sobre esta temática por um motivo simples:<br />
não se dão ao trabalho de saber até porque não lhes passa pela<br />
cabeça que tal seja possível e, na verdade, nem dá muito jeito: que<br />
fariam então aos discursos catastrofistas e salvíficos, do género<br />
«fizeram tudo mal mas eu tenho a solução»?<br />
E eis-nos na preguiça: é certamente muito <strong>mais</strong> fácil perorar<br />
sobre o assunto com base nas análises hiper-repetidas que decretaram<br />
a morte dos centros e culpar sempre os mesmos maus, que<br />
ainda por cima são bons de culpar, enquanto se anunciam intenções,<br />
planos, medidas e opções miríficas que terão o condão de<br />
corrigir as tais decisões e orientações anteriores que lidar com<br />
uma realidade bem <strong>mais</strong> complexa, que inclui a variável responsabilidade<br />
individual e não se limita a «linhas macro».<br />
É a vez do preconceito: perante periferias desqualificadas e a abarrotar<br />
em contraste com centros abandonados nunca ocorre a possibilidade<br />
de que haja quem saia dos centros por deliberação,<br />
por gosto, quando podia ter escolhido ficar, como há quem para<br />
eles se desloque porque assim bem entende.<br />
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