António Fonseca Ferreira POR Lisboa mais ... - CCDR-LVT
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Recentrar a discussão O discurso repetido há décadas sobre as cidades e a necessidade de lhes repovoar os centros reiterou a ideia desses mesmos centros como lugares desertos, inóspitos e degradados, abandonados por falta de oferta de habitações aprazíveis a preços suportáveis. Será surpresa, então, que tão pouca gente se mostre interessada em lá viver? Opinião | Fernanda Câncio Fotografia | ca, produções fotográficas Fotografias realizadas em Lisboa, na Baixa-Chiado (exteriores). e no atelier do CMDias Arquitectos (interiores). Quantas vezes, nos últimos anos, vimos o centro das cidades portuguesas retratado como um lugar agradável para habitar? Quantas vezes vimos, em reportagens televisivas ou de imprensa, o interior de casas antigas desses centros sem ser para mostrar derrocadas, rachas, buracos, bolores, infiltrações, inundações e outras maleitas? Quantas vezes ouvimos outra narrativa sobre os centros que não a lamúria fúnebre que os descreve como inabitados, a cair, inseguros, «sem condições», «sem vida»? Que outras justificações ouvimos para isso que não «a especulação imobiliária», a inexistência de fogos «decentes» para arrendar a preços acessíveis e o alto preço do metro quadrado dos disponíveis para venda? O que genericamente se sabe sobre os centros – ou seja, o que quem lá não vive e não os frequenta sabe sobre eles – é que aí as habitações ou estão degradadas ou são demasiado caras (e que por esses motivos «ninguém lá vive» a não ser idosos na miséria ou gente rica), que as ruas «não têm ninguém» e «falta animação». Chama-se a isto propaganda negativa. E o mais curioso é que muita dessa propaganda negativa é efectuada por quem mais diz lamentar aquilo que tão entusiasticamente propala e declara querer, com todas as forças, «inverter» a situação: autarcas, candidatos a autarcas, urbanistas, arquitectos, sociólogos, activistas sortidos. Veja-se por exemplo o diagnóstico implícito e explícito nos famosos planos que nos últimos anos têm sido apresentados para a reabilitação da Baixa pombalina: descrevem-na como um lugar desertificado (apesar dos largos milhares de pessoas que todos os dias lhe enchem as ruas e do facto de estas serem disputadas como espaço comercial) que perdeu a capacidade de atrair habitantes (embora seja notório um fluxo de novos residentes, facto de que o presidente da Junta de Freguesia de São Nicolau, a maior da Baixa, se faz eco e é exemplo, sendo ele próprio um morador recente) e onde a tipologia das casas não permite ter filhos (o plano diz mesmo que a zona só serve para pessoas «em princípio e em fim de vida», apesar de a generalidade dos fogos ter pelo menos 90 metros quadrados) e cuja reabilitação deveria ser, em consequência, sobretudo direccionada para residências | 11
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