Versao em Pdf (3,14 mb) - Ministério Público de Santa Catarina
Versao em Pdf (3,14 mb) - Ministério Público de Santa Catarina
Versao em Pdf (3,14 mb) - Ministério Público de Santa Catarina
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
101<br />
diálogo entre auctoritas e liberda<strong>de</strong> foi travado <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo pelos ingleses,<br />
numa primeira etapa através da elite formada por nobres, formulando<br />
na Magna Charta as noções <strong>de</strong> rule of law e law of land, que se prestam a<br />
conce<strong>de</strong>r segurança jurídica e garantia à liberda<strong>de</strong> física e, numa segunda<br />
fase, já com o Parlamento funcionando nos mol<strong>de</strong>s que até hoje se<br />
conhec<strong>em</strong>, escrevendo no § 9º do Bill of Rights (1689) “Que a liberda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> expressão e os <strong>de</strong>bates ou ativida<strong>de</strong>s no parlamento não <strong>de</strong>v<strong>em</strong> ser<br />
objeto <strong>de</strong> acusação n<strong>em</strong> <strong>de</strong> impedimento n<strong>em</strong> <strong>de</strong> questionamento por<br />
nenhuma jurisdição ou instituição alheia ao mesmo”, enquanto que no<br />
§ 1º, reservou-se a prerrogativa <strong>de</strong> fiscalização <strong>de</strong> certos atos do rei, dispondo<br />
“Que o pretendido po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> suspen<strong>de</strong>r as leis ou sua execução<br />
por autorida<strong>de</strong> real s<strong>em</strong> consentimento do parlamento, é contrário ao<br />
direito”, com isso a um só t<strong>em</strong>po abrindo caminho para a d<strong>em</strong>ocracia<br />
representativa e liberda<strong>de</strong>s políticas e para o controle do po<strong>de</strong>r político,<br />
pelo impedimento <strong>de</strong> atos típicos <strong>de</strong> governo autocrático.<br />
Ao analisar a circunstância política da Inglaterra, Grimm aponta<br />
outros dois aspectos <strong>de</strong> relevo (que ao fim e ao cabo conflu<strong>em</strong> para<br />
aqueles acima mencionados) para sua experiência constitucional. Em<br />
primeiro lugar, o fato <strong>de</strong> ter-se <strong>de</strong>senvolvido uma burguesia, liberta do<br />
sist<strong>em</strong>a feudal, que não se opôs ferozmente ao regime monárquico, mas,<br />
pelo contrário, tornou-se seu arrimo na medida <strong>em</strong> que <strong>de</strong>sfrutava <strong>de</strong><br />
mobilida<strong>de</strong> social, ascen<strong>de</strong>ndo a categorias nobiliárquicas. Em segundo<br />
lugar, o constitucionalista al<strong>em</strong>ão menciona que a Reforma, <strong>em</strong> vez <strong>de</strong> ter<br />
fortalecido o po<strong>de</strong>r monárquico, atribuiu maior valor ao Parlamento 64 ,<br />
que passa a ocupar as funções do legislativo e executivo. De fato, o Bill<br />
of Rights estabelecerá um programa <strong>de</strong> monarquia parlamentar sobre o<br />
qual Hume refere, não s<strong>em</strong> uma dose <strong>de</strong> ufanismo, que “[...] <strong>em</strong>bora o<br />
rei tenha direito <strong>de</strong> veto na elaboração das leis, este direito é na prática<br />
consi<strong>de</strong>rado tão pouco importante que tudo o que é votado pelas duas<br />
Câmaras é com certeza transformado <strong>em</strong> lei, sendo o consentimento<br />
real pouco mais do que uma formalida<strong>de</strong>.” 65<br />
Esses dois aspectos intervêm diretamente na consolidação das<br />
liberda<strong>de</strong>s civis dos ingleses que, muito antes <strong>de</strong> quaisquer outros<br />
povos do continente, esten<strong>de</strong>ram as regras <strong>de</strong> direito <strong>de</strong>stinados aos<br />
64 GRIMM, Dieter. Constitucionalismo y <strong>de</strong>rechos fundamentales, cit., p. 63.<br />
65 HUME, David. Ensaios morais, políticos & literários. Tradução <strong>de</strong> Luciano Trigo.<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro: Topbooks, 2004, p. <strong>14</strong>3.