CecÃlia Meireles - Outorga.com.br
CecÃlia Meireles - Outorga.com.br
CecÃlia Meireles - Outorga.com.br
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Cecília <strong>Meireles</strong><<strong>br</strong> />
Houve um tempo em que minha janela se a<strong>br</strong>ia<<strong>br</strong> />
so<strong>br</strong>e uma cidade que parecia ser feita de giz.<<strong>br</strong> />
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.<<strong>br</strong> />
Era uma época de estiagem, de terra esfarelada,<<strong>br</strong> />
e o jardim parecia morto.<<strong>br</strong> />
Mas todas as manhãs vinha um po<strong>br</strong>e <strong>com</strong> um balde,<<strong>br</strong> />
e, em silêncio, ia atirando <strong>com</strong> a mão umas gotas de água so<strong>br</strong>e as plantas.<<strong>br</strong> />
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.<<strong>br</strong> />
E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e<<strong>br</strong> />
meu coração ficava <strong>com</strong>pletamente feliz.<<strong>br</strong> />
Às vezes a<strong>br</strong>o a janela e encontro o jasmineiro em flor.<<strong>br</strong> />
Outras vezes encontro nuvens espessas.<<strong>br</strong> />
Avisto crianças que vão para a escola.<<strong>br</strong> />
Pardais que pulam pelo muro.<<strong>br</strong> />
Gatos que a<strong>br</strong>em e fecham os olhos, sonhando <strong>com</strong> pardais.<<strong>br</strong> />
Borboletas <strong>br</strong>ancas, duas a duas, <strong>com</strong>o refletidas no espelho do ar.<<strong>br</strong> />
Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.<<strong>br</strong> />
Ás vezes, um galo canta.<<strong>br</strong> />
Às vezes, um avião passa.<<strong>br</strong> />
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.<<strong>br</strong> />
E eu me sinto <strong>com</strong>pletamente feliz.<<strong>br</strong> />
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,<<strong>br</strong> />
que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,<<strong>br</strong> />
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros,<<strong>br</strong> />
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.<<strong>br</strong> />
Pesquisa: Luiz Antonio Batista da Rocha – Academia Barretense de Cultura - ABC Página 25<<strong>br</strong> />
www.outorga.<strong>com</strong>.<strong>br</strong> rocha@outorga.<strong>com</strong>.<strong>br</strong>