22.03.2015 Views

Cecília Meireles - Outorga.com.br

Cecília Meireles - Outorga.com.br

Cecília Meireles - Outorga.com.br

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Cecília <strong>Meireles</strong><<strong>br</strong> />

05 Cavalo Morto<<strong>br</strong> />

Cecília <strong>Meireles</strong><<strong>br</strong> />

O cavalo morto<<strong>br</strong> />

Vi a névoa da madrugada<<strong>br</strong> />

deslizar seus gestos de prata,<<strong>br</strong> />

mover densidades de opala<<strong>br</strong> />

naquele pórtico de sono.<<strong>br</strong> />

Na fronteira havia um cavalo morto.<<strong>br</strong> />

Grãos de cristal rolavam pelo<<strong>br</strong> />

seu flanco nítido; e algum vento<<strong>br</strong> />

torcia-lhes as crinas, pequeno,<<strong>br</strong> />

leve arabesco, triste adorno,<<strong>br</strong> />

- e movia a cauda ao cavalo morto.<<strong>br</strong> />

As estrelas ainda viviam<<strong>br</strong> />

e ainda não eram nascidas<<strong>br</strong> />

ah ! as flores daquele dia ...<<strong>br</strong> />

- mas era um canteiro o seu corpo:<<strong>br</strong> />

Um jardim de lírios, o cavalo morto.<<strong>br</strong> />

Muitos viajantes contemplaram<<strong>br</strong> />

a fluida música, a orvalhada<<strong>br</strong> />

das grandes moscas de esmeralda<<strong>br</strong> />

chegando em rumoroso jorro.<<strong>br</strong> />

Adernava triste, o cavalo morto.<<strong>br</strong> />

E viam-se uns cavalos vivos,<<strong>br</strong> />

altos <strong>com</strong>o esbeltos navios,<<strong>br</strong> />

galopando nos ares finos,<<strong>br</strong> />

<strong>com</strong> felizes perfis de sonho.<<strong>br</strong> />

Branco e verde via-se o cavalo morto,<<strong>br</strong> />

no campo enorme e sem recurso,<<strong>br</strong> />

- e devagar girava o mundo<<strong>br</strong> />

entre as suas pestanas, turvo<<strong>br</strong> />

<strong>com</strong>o em luas de espelho roxo.<<strong>br</strong> />

Dava sol nos dentes do cavalo morto.<<strong>br</strong> />

Mas todos tinham muita pressa,<<strong>br</strong> />

e não sentiram <strong>com</strong>o a terra<<strong>br</strong> />

procurava, de légua em légua,<<strong>br</strong> />

o ágil, o imenso, o etéreo sopro<<strong>br</strong> />

que faltava àquele arcabouço.<<strong>br</strong> />

Tão pesado, o peito do cavalo morto !<<strong>br</strong> />

Pesquisa: Luiz Antonio Batista da Rocha – Academia Barretense de Cultura - ABC Página 12<<strong>br</strong> />

www.outorga.<strong>com</strong>.<strong>br</strong> rocha@outorga.<strong>com</strong>.<strong>br</strong>

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!