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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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pagar, e muito caro, pela sua própria transferência para o Brasil 169 . Ou seja, a se adotar o<br />

raciocínio de Marx, eles teriam que pagar um duplo resgate: o dele próprio e o do seu<br />

substituto.<br />

Diante <strong>da</strong> situação exposta acima, parece que esses fatos, muito mais do que a<br />

presença do escravismo no Brasil, podem permitir a compreensão do porque o projeto<br />

de colonização brasileiro fracassou retumbantemente; do porque, muitos imigrantes<br />

vindos ao Brasil, aqui apenas transitavam rumo a outros países, sobretudo <strong>da</strong> Bacia do<br />

Prata. Explica, igualmente, porque a economia agrária brasileira permaneceu entreva<strong>da</strong><br />

na improdutivi<strong>da</strong>de, assim como as dificul<strong>da</strong>des, por ela, enfrenta<strong>da</strong>s, para transitar ao<br />

trabalho livre e à economia de escala.<br />

Pode-se dizer que a colonização dirigi<strong>da</strong> pelo latifúndio é a pré-história, de uma<br />

história inacaba<strong>da</strong>: a história <strong>da</strong>s diversas formas, sobretudo arcaicas e anacrônicas, de<br />

subordinação indireta do trabalho ao capital no campo. E, por outro lado, que a negativa<br />

dirigi<strong>da</strong> pelo latifúndio, aos processos de legitimação <strong>da</strong>s terras brasileiras, neste<br />

período é, “mutatis mutandis”, a pré-história <strong>da</strong> história inacaba<strong>da</strong> <strong>da</strong> reforma agrária<br />

brasileira, que em 1964, cento de dez anos depois, é novamente reposta para ser<br />

novamente, escamotea<strong>da</strong>, como se pretende evidenciar na segun<strong>da</strong> parte deste trabalho.<br />

5. Considerações Finais: Heranças <strong>da</strong> Política de Terras do Império<br />

De julho de 1822 à promulgação <strong>da</strong> Lei 601, em 1850, consoli<strong>da</strong>ra-se<br />

definitivamente, no Brasil, o latifúndio fun<strong>da</strong>do na posse. Através do expediente de<br />

incorporar, pura e simplesmente, vastas áreas de terras, por suposto, devolutas, porém<br />

raramente desocupa<strong>da</strong>s, os grandes detentores de terras e, com eles, outros<br />

especuladores imobiliários 170 , expandem de forma célere seus domínios e seu controle<br />

sobre as terras devolutas, esmagando, afugentando, ou assimilando, índios, posseiros<br />

pobres ou pequenos agricultores de “subsistência”, que sempre encontraram em seu<br />

caminho.<br />

Se o antigo instituto sesmarial foi um instrumento que permitiu a concessão e<br />

acesso privilegiados à proprie<strong>da</strong>de territorial no Brasil, o “império <strong>da</strong> posse”, como é<br />

conhecido esse período, foi ain<strong>da</strong> mais, porque reforçado pelas novas garantias<br />

constitucionais 171 , permitiu a ampliação, ao nível concreto, de tais privilégios. Esse<br />

período significou a transferência, de fato, do controle sobre as terras devolutas, que,<br />

169 Caso em que, de fato, pode-se falar de resgate.<br />

170 Octávio Ianni, referindo-se a situação de Sertãozinho, que em certo sentido pode-se considerar semelhante ao que<br />

vinha acontecendo em outras áreas <strong>da</strong> expansão <strong>da</strong>s apropriações de terras rurais no período, afirma que “a área fora<br />

ocupa<strong>da</strong>, desde meados do século XIX, por criadores, agricultores e comerciantes de terras vindos do<br />

Oeste Paulista, <strong>da</strong>s vizinhanças de Minas Gerais e de outras partes. (...) Na déca<strong>da</strong> de oitenta, o café<br />

tomou conta <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> econômica <strong>da</strong> área que passou a fazer parte do município de Sertãozinho; <strong>da</strong><br />

mesma forma que estava tomando conta, <strong>da</strong>s terras devolutas, fazen<strong>da</strong>s e sítios em to<strong>da</strong> a região<br />

que circun<strong>da</strong> Ribeirão Preto.” IANNI (op. cit., p.11. Grifos nossos)<br />

171 Trata-se <strong>da</strong> Constituição de 1824, que assegurou o pleno direito de proprie<strong>da</strong>de (art. 179; XXII).<br />

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