19.03.2015 Views

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

explora<strong>da</strong>s, ou não demarca<strong>da</strong>s de antigas sesmarias ou de terras públicas, o que dá a<br />

dimensão exata do atendimento, por parte do Estado, <strong>da</strong>s reivindicações dos posseiros.<br />

O parágrafo segundo, contrariamente, deixa claro o respeito, por parte do<br />

Estado, aos direitos <strong>da</strong>s sesmarias legítimas e revali<strong>da</strong><strong>da</strong>s pela Lei 601, assegurando<br />

aos posseiros apenas o direito a idenização de benfeitorias 149 e ressalvando os casos em<br />

que teriam priori<strong>da</strong>de as posses: ter sentença favorável, transita<strong>da</strong> em julgado; ter sido<br />

processa<strong>da</strong> antes <strong>da</strong> medição e não perturba<strong>da</strong> por cinco anos; ou, finalmente, no caso<br />

de ter sido efetiva<strong>da</strong> antes <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> medição, não haver sido perturba<strong>da</strong> por dez anos.<br />

Os dois últimos casos caracterizam situações típicas de usucapião.<br />

O relevante a ser registrado nesse conjunto de regulações, é o fato de estar<br />

implícita a necessi<strong>da</strong>de de se acionar o poder público 150 , especialmente, o judiciário,<br />

para fazer valer tais direitos. Isso, efetivamente, excluía os pequenos posseiros e mesmo<br />

dos muitos médios posseiros, aliás, como observa Faoro (op. cit., p. 410), posto que<br />

estes não dispunham de recursos e, menos ain<strong>da</strong>, de condições materiais, para<br />

contratarem advogados e mesmo se deslocarem ou manterem-se nas capitais <strong>da</strong>s<br />

Províncias ou do Império. Nem prestígio na Corte, para garantir privilégios.<br />

É nesse contexto do funcionamento do poder judiciário que sempre residirão os<br />

entraves efetivos à materialização dos direitos de proprie<strong>da</strong>de pelos pequenos e médios<br />

posseiros, por mais que tais direitos estejam amplamente assegurados em Legislação. É<br />

neste sentido que as normas jurídicas, embora possam <strong>da</strong>r uma boa indicação de<br />

determinados avanços sociais, na ver<strong>da</strong>de tratam-se de avanços formais, de simples<br />

indicadores de avanços reais, cuja materialização estão em “devir”: exige outras<br />

mediações que, em última instância, podem levar a resultados profun<strong>da</strong>mente<br />

contraditórios. Neste caso, <strong>da</strong><strong>da</strong> a necessária generali<strong>da</strong>de que a norma teria de<br />

apresentar para assegurar as posses, necessariamente referia-se à to<strong>da</strong>s as elas (grandes<br />

e pequenas). Na prática, apenas as grandes posses, e só excepcionalmente, as pequenas,<br />

terão a possibili<strong>da</strong>de efetiva de realizar esse direito “legalmente assegurado.” 151<br />

Finalmente, o parágrafo terceiro, <strong>da</strong> Lei 601/1850, deixa clara a posição<br />

assumi<strong>da</strong> pelo Estado frente ao conflito entre posseiros e os demais sesmeiros e<br />

concessionários em processo de revali<strong>da</strong>ção. A estes sesmeiros caberia apenas as terras<br />

que restassem após o rateio entre as posses legitimáveis. Essa posição contrária a esse<br />

conjunto de sesmeiros é tão evidente, que chega a sugerir a que esses sesmeiros ou<br />

concessionários podem “considera-se posseiros para entrar no rateio igual<br />

149 Observe-se que, neste caso, o confronto não era entre posseiros e sesmeiros em comisso; mas entre aqueles e<br />

sesmeiros legítimos.<br />

150 Para uma discussão detalha<strong>da</strong> desta questão ver o capítulo 3 deste trabalho.<br />

151 Essa especifici<strong>da</strong>de do formalismo jurídico e suas contradições com sua aplicabili<strong>da</strong>de prática, será explora<strong>da</strong><br />

sistematicamente por todos os latifundiários de todos os tempos no Brasil, para fazerem valer seus direitos. Para<br />

tanto, dependendo <strong>da</strong> conjuntura, armar-se-ão de ver<strong>da</strong>deiros exército de assessores jurídicos, advogados(...) e<br />

jagunços. Esse fenômeno adquirirá grande relevância no período do regime militar, assumindo a forma acaba<strong>da</strong> de<br />

“grilagem especializa<strong>da</strong>”, como se verá nos capítulos 4 e 5 deste estudo. De qualquer maneira, no caso específico <strong>da</strong><br />

luta pela terra, além <strong>da</strong> batalha judicial, os latifundiários e seus prepostos, utilizarão vastamente de muitos outros<br />

recursos, como a violência direta, a morosi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> justiça, a coação, o suborno e o assassinato.<br />

91

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!