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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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Na déca<strong>da</strong> de 1840, quando o Estado toma a iniciativa de propor uma Lei de<br />

Terras, será a questão <strong>da</strong> legitimação dessas posses, e o controle do seu avanço sobre as<br />

terras livres (estatais), sobretudo pelos latifúndios, e, certamente em menor escala,<br />

também por pequenos posseiros, a que se colocará no centro do debate e, depois, no<br />

ponto mais relevante <strong>da</strong> Lei 601 de 1850. É assim que, inclusive, o problema <strong>da</strong>s terras<br />

devolutas do Império, nesse contexto, é colocado como uma via ao bloqueio do avanço<br />

<strong>da</strong>s posses sobre essas terras. E, com certeza, o Governo não estava preocupado com as<br />

“pequenas posses” ao estabelecer as restrições ao acesso às terras devolutas do Estado,<br />

determinando que este apenas poderia ocorrer mediante à compra. Estava, sim,<br />

preocupado com o avanço especulativo <strong>da</strong>s grandes posses, posto que, apenas estas<br />

teriam, como de fato tiveram, a possibili<strong>da</strong>de de inviabilizar a política de terras, de<br />

desenvolvimento e de colonização do Estado.<br />

É nesse contexto <strong>da</strong> consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s grandes posses, que o Estado aprova uma<br />

Lei de Terras, assegurando amplamente a legitimação <strong>da</strong>s posses mansas e pacíficas. É<br />

relevante registrar que são dois, os pontos fun<strong>da</strong>mentais, pacificamente estabelecidos na<br />

Lei 601 de 1850: 1. Reconhecer como legítimas as sesmarias confirma<strong>da</strong>s e 2.<br />

Assegurar todos os meios para a legitimação <strong>da</strong>s posses. As restrições recairão, apenas,<br />

nas sesmarias e grandes concessões inexplora<strong>da</strong>s e não confirma<strong>da</strong>s ou em comisso,<br />

como já foi explicitado acima. Em relação às terras devolutas, a legislação é rigorosa,<br />

mas inócua 148 do ponto de vista prático. Foi quase que imediatamente inviabiliza<strong>da</strong>,<br />

sobretudo pelos potentados locais, qualquer possibili<strong>da</strong>de de sua demarcação e<br />

arreca<strong>da</strong>ção para o patrimônio <strong>da</strong>s terras livres do Estado, assim permanecendo, a sua<br />

maior parte, até os dias atuais, sempre sujeitas ao avanço <strong>da</strong>s posses e disponíveis para<br />

a incorporação ao patrimônio latifundiário.<br />

Em princípio, pode-se dizer que na Lei 601 de 1850 os legisladores seguiram a<br />

mesma lógica <strong>da</strong> tradição reguladora portuguesa, assegurando o reconhecimento <strong>da</strong>s<br />

situações anteriormente consoli<strong>da</strong><strong>da</strong>s. Assim é que se estabelece o critério de<br />

reconhecimento <strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s sesmarias confirma<strong>da</strong>s, como se registrou acima e,<br />

por exclusão destas e <strong>da</strong>s demais terras legitimáveis do patrimônio privado e <strong>da</strong>s terras<br />

públicas, define-se o âmbito do estatuto <strong>da</strong>s terras devolutas do Império. Entretanto,<br />

com relação às demais terras em poder privado (posses e sesmarias passíveis de<br />

revali<strong>da</strong>ção), a postura é de sujeitá-las, não apenas às condições anteriores de<br />

exploração e mora<strong>da</strong> efetiva, mas de colocar boa parte delas disponíveis para um<br />

determinado Projeto de exploração econômica. Antes de tudo tratava-se, do ponto de<br />

vista do Estado, de assegurar um fundo de terras livres estatais capaz de sustentar uma<br />

determina<strong>da</strong> política de transição para uma agricultura fun<strong>da</strong><strong>da</strong> no trabalho livre,<br />

provavelmente, com base nas formulações <strong>da</strong> colonização sistemática. Em segundo<br />

lugar, tratava-se, ain<strong>da</strong> do ponto de vista do Estado, de assegurar a proprie<strong>da</strong>de para os<br />

148 Como é largamente registrado por muitos pesquisadores aqui citados. Veja-se, por exemplo, o excelente trabalho<br />

de José Murilo de Carvalho (op. cit.).<br />

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