19.03.2015 Views

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Parece portanto, muito claro o sentido atribuído às terras devolutas: assegurar<br />

para o Estado um fundo de terras livres, capaz se sustentar uma política fundiária<br />

ajusta<strong>da</strong> às novas exigências econômicas que se colocavam ao país. Nesse sentido<br />

parece igualmente clara a influência <strong>da</strong>s teses wakefildeanas, sobretudo no que refere à<br />

manutenção de determinado equilíbrio entre a "oferta de terras com bom título" e a<br />

população, enquanto condição necessária ao desenvolvimento de uma agricultura<br />

mercantil e capitalista.<br />

Na ver<strong>da</strong>de, a colonização sistemática baseava-se na disponibili<strong>da</strong>de de terras<br />

públicas e livres, que pudessem ser privatiza<strong>da</strong>s e, assim, atrair colonos ricos,<br />

investidores, por um lado, e pobres, por outro, que não podendo pagar, estes últimos,<br />

pelas terras "livres estatais" teriam que trabalhar para aqueles, até poderem adquirir sua<br />

própria terra. Assim seria formado um fundo de terras, por um lado, e de trabalhadores<br />

pobres, por outro: os pressupostos e ingredientes fun<strong>da</strong>mentais e básicos aos<br />

empreendimentos capitalistas na agricultura. Esta era, em síntese, a argumentação<br />

básica e justificadora <strong>da</strong> colonização sistemática de Walkefield que, ain<strong>da</strong> assim, no<br />

Brasil, foi completamente escamotea<strong>da</strong> pela vigorosa oposição do latifúndio.<br />

Por um lado, a arreca<strong>da</strong>ção de terras devolutas, públicas, que deveriam formar o<br />

fundo de terras para a dinamização <strong>da</strong> agricultura foi bloquea<strong>da</strong> na prática: os<br />

latifundiários não providenciaram efetivamente a legalização e registro de suas terras e,<br />

associados às burocracias locais, geralmente a eles atrela<strong>da</strong>s, bloquearam qualquer<br />

alternativa à demarcação e, sobretudo, a arreca<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s terras devolutas. Por outro<br />

lado, a colonização foi reduzi<strong>da</strong> à importação de colonos pobres para servirem de mãode-obra<br />

barata nos latifúndios ou para colonizarem zonas de risco, como as áreas de<br />

fronteira do Império. Assim, fracassou, na origem, qualquer possibili<strong>da</strong>de de<br />

desenvolvimento deste Projeto agro-fundiário para o Brasil, com as consequências hoje<br />

amplamente conheci<strong>da</strong>s e que aqui estão sendo analisa<strong>da</strong>s.<br />

Desde essa época, a legalização <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de rural no Brasil foi impedi<strong>da</strong> ou,<br />

na melhor <strong>da</strong>s hipóteses, profun<strong>da</strong>mente dificulta<strong>da</strong>, pelos latifundiários, que<br />

deslocaram a solução do problema fundiário, jogando-o para o campo amorfo <strong>da</strong><br />

colonização, afastando-o do âmbito <strong>da</strong> separação legal entre as terras públicas e<br />

particulares. Assim engendraram-se as condições para a perpetuação <strong>da</strong> situação caótica<br />

<strong>da</strong> estrutura agrária e, junto a esta, as possibili<strong>da</strong>des ao apossamento desenfreado e<br />

ilegal <strong>da</strong>s terras do país. Daí por diante jamais se falará em legalização <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de,<br />

mas em colonização, por suposto, sempre pensa<strong>da</strong> em terras distantes dos domínios<br />

latifundiários. Por essa razão, fracassou, até mesmo, o processo de importação de<br />

colonos, fossem pobres ou, sobretudo, ricos, para a agricultura. Colonização em terras<br />

afasta<strong>da</strong>s e não reforma agrária torna-se, desde então, o lema básico defendido pelo<br />

latifúndio e pelos Governos.<br />

O desvirtuamento, no debate Parlamentar <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1840, e o esvaziamento,<br />

depois de 1850, dessa alternativa ao fundo de terras livres estatais, pelo deslocamento<br />

do problema para a migração de estrangeiros pobres, e <strong>da</strong> colonização como<br />

80

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!