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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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proprie<strong>da</strong>de estatal (as destina<strong>da</strong>s a algum uso público nacional, provincial ou<br />

municipal).<br />

É provável que o detalhamento <strong>da</strong>do ao problema <strong>da</strong>s terras devolutas revelasse<br />

a intenção de um projeto inspirado nas teses de Wakefield 134 . Ou como registra Roberto<br />

Smith, considerando que essas idéias vinham sendo defendi<strong>da</strong>s desde 1821, por José<br />

Bonifácio, portanto, antes <strong>da</strong> publicação dos trabalhos de Wakefield, pode-se arguir,<br />

igualmente, que essas teses tenham sido produto <strong>da</strong> própria experiência de diversas<br />

colônias, ulteriormente sistematiza<strong>da</strong>s por aquela estudioso. Difícil definir essa questão.<br />

Entretanto, mais importante é o fato de que a problemática <strong>da</strong> arreca<strong>da</strong>ção de<br />

terras, pelo Estado, era condição fun<strong>da</strong>mental para a implementação de uma política de<br />

terras, capaz de servir de suporte ao desenvolvimento <strong>da</strong> agricultura, por suposto mais<br />

produtiva e eficiente, fun<strong>da</strong><strong>da</strong> no trabalho livre, e parece ter sido esse o sentido<br />

econômico fun<strong>da</strong>mental que subjazia a essa decisão. Além, é claro, de tentar impor um<br />

termo, pela via <strong>da</strong> regulamentação, à situação caótica e conflitiva que vinha grassando,<br />

no Brasil, desde os últimos anos do período colonial, em termos de invasão ilegal e<br />

especulativa <strong>da</strong>s terras públicas e livres, deixando o Estado quase sem nenhuma<br />

alternativa à implementação de uma economia política e de uma política de terras<br />

capazes de criar as condições necessárias ao desenvolvimento econômico e social do<br />

país.<br />

Assim, fica claramente delimitado o objetivo central do Estado no que se referia<br />

à situação desse conjunto importante <strong>da</strong>s terras do país: as terras livres estatais, que são<br />

definitiva e legalmente separa<strong>da</strong>s do domínio privado, ao mesmo tempo em que se<br />

distiguem <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de estatal. São assim, de fato, delimita<strong>da</strong>s como terras públicas<br />

estatais, no sentido definido por Wakefield: logo condição e pré-requisito fun<strong>da</strong>mental à<br />

colonização sistemática (vide Smith, op. cit.). Não se tratando de terras "aplica<strong>da</strong>s a<br />

algum uso público nacional, provincial ou municipal" nem de terras inclusas no<br />

domínio privado por título legítimo (sesmarias confirma<strong>da</strong>s ou revalidáveis pela Lei 601<br />

e as posses mansas e pacíficas, legitimáveis pela mesma Lei), to<strong>da</strong>s as demais terras são<br />

incluí<strong>da</strong>s no rol de terras devolutas do Império o que, em termos jurídicos, significa que<br />

integram o conjunto <strong>da</strong>s terras públicas. Com isso, do ponto de vista <strong>da</strong> legali<strong>da</strong>de, do<br />

Estado de Direito, deixa de existir, no Brasil, terras "sem dono", "adéspotas" 135 .<br />

134 Sobretudo as teses de Wakefield em relação ao equilíbrio necessário entre disponibili<strong>da</strong>de de terras e população,<br />

que aquele autor coloca claramente em diversos momentos de sua obra, e que fica especialmente claro na seguinte<br />

passagem: "Eles não podem alterar a proporção entre população e terra(...); mas a proporção entre<br />

população e terra com bom título está dentro do seu controle (...) o governo, assim, é capaz de<br />

regular a proporção entre o tamanho <strong>da</strong> população e acres de terra apropria<strong>da</strong>" (WAKEFIELD, E. G.<br />

England & América. op. cit. p. 94).Grifos nossos.<br />

135 E como é evidente, to<strong>da</strong>s as terras tendo dono (seja o Estado ou proprietários privados), apenas podem ser<br />

transferi<strong>da</strong>s para terceiros por alguma forma legalmente estabeleci<strong>da</strong>. Qualquer outra forma de apossamento ou<br />

apropriação, que não as ajusta<strong>da</strong>s às exigências estritamente estabeleci<strong>da</strong>s e reconheci<strong>da</strong>s pelo Direito, são formas<br />

ilegítimas e ilegais, independentemente de se tratarem de terras públicas ou particulares. É neste sentido que aqui se<br />

faz referência ao fato de que a proprie<strong>da</strong>de territorial no Brasil, em sua maior parte, é juridicamente questionável: ou<br />

porque nunca foi legaliza<strong>da</strong>, ou porque o foi de forma incorreta ou fraudulenta.<br />

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