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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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dos domínios latifundiários - inicialmente nas fronteiras do Império ou em áreas de<br />

risco pelo interior do país. Esta era uma proposta absolutamente distinta <strong>da</strong><br />

“colonização sistemática” de Wakefield: na ver<strong>da</strong>de, negava-a. Era, certamente a<br />

“colonização sistemática dos grades detentores de terras”. Nessa perspectiva<br />

residem, primitivamente, as teses que ain<strong>da</strong> hoje são defendi<strong>da</strong>s pelo latifúndio e suas<br />

organizações e representantes parlamentares, ao <strong>da</strong>rem ênfase na colonização 114 no<br />

sentido de desbravamento 115 .<br />

Como se vinha dizendo, a Lei 601 ocupa-se, antes de tudo, <strong>da</strong> delimitação do<br />

direito de proprie<strong>da</strong>de e <strong>da</strong>s formas de acesso legal às terras, no contexto de um país<br />

emergente e no âmbito de uma conjuntura econômica internacional em franco<br />

desenvolvimento e amplamente competitiva. Neste sentido, a Lei 601 representa uma<br />

espécie de marco zero 116 <strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong>de do acesso à proprie<strong>da</strong>de territorial brasileira, e<br />

disso vem, na posição aqui defendi<strong>da</strong>, a sua maior relevância teórica e concreta.<br />

Já no preambulo <strong>da</strong> Lei de Terras é definido, clara e transparentemente, o seu<br />

nível de abrangência - a totali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s terras do Brasil, excluindo-se as sesmarias<br />

confirma<strong>da</strong>s e que não se achavam em comisso que, por suposto, eram aceitas como<br />

proprie<strong>da</strong>des priva<strong>da</strong>s legítimas e como tais reconheci<strong>da</strong>s pelo Estado. É assim que a<br />

Lei 601,<br />

"Dispõe sobre as terras devolutas no Império, e acerca <strong>da</strong>s que<br />

são possuí<strong>da</strong>s por título de sesmarias sem preenchimento <strong>da</strong>s<br />

condições legais, bem como por simples títulos de posse mansa e<br />

pacífica: e determina que, medi<strong>da</strong>s e demarca<strong>da</strong>s as primeiras<br />

(devolutas), sejam elas cedi<strong>da</strong>s a título oneroso, assim para<br />

empresas particulares, como para o estabelecimento de colônias<br />

de nacionais e estrangeiros, autorizando o Governo a promover a<br />

colonização estrangeira na forma que se declara." 117<br />

A situação fundiária ficava, desta forma, claramente delimita<strong>da</strong>: 1. As sesmarias<br />

que se encontravam legalmente assegura<strong>da</strong>s, isto é, que preenchiam as clausulas de<br />

114 E mesmo no âmbito deste processo de imigração, na medi<strong>da</strong> em que passa a adquirir alguma importância o<br />

mercado de terras, começará a ser defendi<strong>da</strong> a tese de que o processo de colonização deveria ser entregue à iniciativa<br />

priva<strong>da</strong> e não ao Estado. Tentava-se, dessa forma, manter e ampliar o domínio <strong>da</strong>s cama<strong>da</strong>s privilegia<strong>da</strong>s sobre o<br />

mercado de terras em todos os níveis. A articulação dessas teses, que se gestam historicamente desde esse período, é<br />

um capítulo importante <strong>da</strong> subordinação <strong>da</strong> terra e <strong>da</strong> ampliação dos privilégios no trato dos negócios agro-fundiários.<br />

A análise específica desta estratégia de controle <strong>da</strong>s terras públicas merece pesquisas mais detalha<strong>da</strong>s, que fogem aos<br />

objetivos deste trabalho. Fica aqui essa sugestão.<br />

115 Ver adiante, os capítulos 4 e 5 onde este tema é discutido detalha<strong>da</strong>mente.<br />

116 Como é evidenciado no decorrer deste capítulo e com base na análise cui<strong>da</strong>dosa e objetiva dos termos <strong>da</strong> Lei 601,<br />

ela de fato e de direito, estabelece um marco zero em relação à proprie<strong>da</strong>de territorial no Brasil Independente. Isso<br />

não significa que ela revogue a situação de fato existente na estrutura agrária brasileira naquele <strong>da</strong>do momento. Pelo<br />

contrário, a Lei 601 toma como referência exatamente a diversi<strong>da</strong>de de situações concretamente existentes e, realiza<br />

duas distinções fun<strong>da</strong>mentais: 1. separa claramente o que sejam terras públicas (devolutas e do Estado) <strong>da</strong>s terras que<br />

se encontravam no domínio privado (sesmarias ou concessões anteriores ou meras posses); 2. estabelece dois critérios<br />

e âmbitos distintos de reconhecimento, pelo Estado, <strong>da</strong>s terras que se encontravam no domínio privado (Revali<strong>da</strong>ção,<br />

para as terras que advinham de concessões ou sesmarias; e Legitimação para as demais terras que apenas se<br />

fun<strong>da</strong>vam nas posses). Finalmente, estabelece que a única forma de acesso às terras devolutas, <strong>da</strong>li para adiante seria<br />

a ven<strong>da</strong>.<br />

117 In.: MEAF (op. cit., p. 357).<br />

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