19.03.2015 Views

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

privilegia<strong>da</strong> e legitimação (titulação) questionável, que sempre estiveram presentes na<br />

formação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de territorial brasileira.<br />

O processo de consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de territorial rural no Brasil, assim, na<br />

prática, sempre assumiu a forma de uma violência legitima<strong>da</strong> pelo fato consumado <strong>da</strong><br />

apropriação, fun<strong>da</strong>do na força e no poder local dos latifundiários, processo esse que será<br />

consoli<strong>da</strong>do nos primeiros anos <strong>da</strong> emergência do Brasil como nação independente,<br />

envolvendo um quadro complexo de articulações e cooptações, que sempre estiveram<br />

no íntimo do processo de legitimação política do poder no Estado 95 independente,<br />

sobretudo no período transicional <strong>da</strong>s Regências 96 . Essa situação, provavelmente, está<br />

na base do fenômeno amplamente conhecido no Brasil de que o processo legislativo<br />

territorial sempre é deflagrado a reboque do efetivo processo de ocupação e, quase<br />

sempre, procurando legitimar os privilégios conquistados pela força do latifúndio e dos<br />

potentados locais, tornando, assim, de certa forma, o Estado, como mero legitimador do<br />

"fato consumado".<br />

2. O Império <strong>da</strong>s Posses<br />

Após o período conturbado por que passou entre 1808, com a transmigração, e o<br />

retorno <strong>da</strong> Corte Portuguesa, em 1821, gestou-se, no Brasil, profun<strong>da</strong> incerteza quanto<br />

ao caráter e consoli<strong>da</strong>ção do Poder do Estado e <strong>da</strong> sua própria integri<strong>da</strong>de territorial.<br />

Tratam-se, portanto, de questões que transcendiam, em muito, à problemática<br />

específica <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de rural, embora a ela não fossem indiferentes, sobretudo na<br />

medi<strong>da</strong> em que as condições estruturadoras <strong>da</strong> sociabili<strong>da</strong>de estavam estritamente<br />

articula<strong>da</strong>s ao poder local, numa comuni<strong>da</strong>de de bases institucionais frouxas e dispersas<br />

pela vastidão do território. Nesse contexto, a articulação <strong>da</strong>s condições que pudessem<br />

servir de base à sustentação de um poder emergente, em um país que inevitavelmente<br />

marchava para uma ruptura institucional com sua antiga metrópole, numa conjuntura<br />

internacional em franca ebulição e desenvolvimento, ameaçava o tênue equilíbrio que<br />

poderia assegurar qualquer base segura ao poder de um Estado Unitário.<br />

Havia, de imediato, vários riscos envolvidos nesta transição: o retorno à<br />

condição de colônia, que era uma ameaça presente, embora fortemente rechaça<strong>da</strong><br />

internamente; contrapondo-se a esta ameaça, a alternativa à independência era<br />

francamente ameaça<strong>da</strong> pelo perigo <strong>da</strong> cessessão e <strong>da</strong> república, que alias, assume os<br />

contornos iminentes nos diversos levantes que ocorrerão após a Independência política<br />

do país, sobretudo na fase <strong>da</strong>s Regências. Além <strong>da</strong>s mediações coloca<strong>da</strong>s imediatamente<br />

às opções e alternativas internas ao país, Portugal não seria indiferente a esses<br />

95 Referindo-se a esse contexto, Faoro (op. cit., p.329) afirma que, nesse período de consoli<strong>da</strong>ção do poder no<br />

contexto <strong>da</strong> estruturação e consoli<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> nação independente, "governar, <strong>da</strong><strong>da</strong> a estrutura que os interesses<br />

articulam, consistia em proteger, guiar, orientar a cama<strong>da</strong> que detinha o poder econômico. Para que a<br />

combinação funcione será necessária a concentração do governo, o entendimento com os especuladores,<br />

o alargamento <strong>da</strong> cama<strong>da</strong> dirigente, com muitos funcionários às ordens de um estado-maior."<br />

96 Ver a respeito deste contexto, especialmente, os capítulos VII, VIII e IX do excelente trabalho de Raymundo<br />

Faoro (op. cit).<br />

60

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!