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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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Constituição, evitando, desta forma o conflito direto com os latifundiários; por outro<br />

lado, não promovem a regulamentação infra-constitucional do preceito constitucional<br />

(artigo 179, XXII <strong>da</strong> Constituição de 1824), evitando, desta forma, envolverem-se num<br />

confronto direto com o latifúndio num momento delicado de consoli<strong>da</strong>ção do Poder<br />

Político e do Estado Independente em formação. Só que, com os direitos<br />

constitucionalmente assegurados e sem nenhuma norma reguladora que limitasse a sua<br />

ação, as grandes posses avançaram celeremente, consoli<strong>da</strong>ndo definitivamente sua<br />

posição na estrutura fundiária brasileira. Essa questão só será retoma<strong>da</strong> na déca<strong>da</strong> de<br />

1840, quando se inicia a consoli<strong>da</strong>ção do poder mediante o chamado "Golpe <strong>da</strong><br />

Maiori<strong>da</strong>de", embora na conjuntura de um equilíbrio político eminentemente instável.<br />

É neste sentido e contexto, também, que a certeza do privilégio e <strong>da</strong> impuni<strong>da</strong>de,<br />

fará com que o próprio processo de legalização (titulação) <strong>da</strong>s terras ocupa<strong>da</strong>s, sejam<br />

por posses (que necessitavam ser legitima<strong>da</strong>s) ou se tratassem, simplesmente, de<br />

sesmarias não confirma<strong>da</strong>s ou caí<strong>da</strong>s em comisso mas não arreca<strong>da</strong><strong>da</strong>s pelo Estado (que<br />

exigiam revali<strong>da</strong>ção), nunca tenha preocupado seriamente os grandes proprietários 90 . É<br />

assim que, na sua maioria, os processos de confirmação <strong>da</strong>s sesmarias, durante o<br />

período colonial, e a titulação dos diversos tipos de imóveis rurais, ulterior a Lei 601 de<br />

1850 91 , - permanecendo sempre neste último caso, como não poderia deixar de ser em<br />

um Estado de Direito, a alta exigência de que fossem realizados dentro <strong>da</strong>s formali<strong>da</strong>des<br />

legalmente estabeleci<strong>da</strong>s, inclusive prazos 92 - nunca tenham sido rigorosamente<br />

efetivados. Este fato concreto, real, torna a maioria <strong>da</strong>s terras até então apropria<strong>da</strong>s,<br />

ilegais ou, no mínimo, de legitimi<strong>da</strong>de questionável.<br />

As justificativas para o não cumprimento <strong>da</strong>s cláusulas e exigências legalmente<br />

estabeleci<strong>da</strong>s ou pactua<strong>da</strong>s eram as mais diversas: dificul<strong>da</strong>des naturais, deficiência <strong>da</strong><br />

burocracia agrária, falta de pessoal habilitado, geômetras, topógrafos, etc. Entretanto,<br />

tais alegações não podem revogar exigências legais. Portanto, o fato concreto, no<br />

entendimento aqui proposto, é que as proprie<strong>da</strong>des não legitima<strong>da</strong>s ou legitima<strong>da</strong>s à<br />

revelia <strong>da</strong>s exigências legais, são juridicamente questionáveis: em termos jurídicos esses<br />

títulos são nulos.<br />

Apesar <strong>da</strong>s resistências contra as grandes posses e do debate acirrado que gerou<br />

no que toca a sua limitação ou não-legalização, acabou, a Lei 601, por assegurar, na<br />

prática, to<strong>da</strong>s as posses mansas e pacíficas, que se formaram, sobretudo no período que<br />

vai de julho de 1822 até a <strong>da</strong>ta <strong>da</strong> promulgação <strong>da</strong> referi<strong>da</strong> Lei. A partir desta <strong>da</strong>ta, por<br />

suposto legal, apenas seria permitido o acesso à proprie<strong>da</strong>de pela via <strong>da</strong> compra e<br />

ven<strong>da</strong>, fato este que, entretanto, como se verá, não será efetivamente materializado,<br />

90 Este fato, mais do que qualquer outro, está na base do fracasso na implementação <strong>da</strong> Lei 601 de 1850 e de todos os<br />

fracassos que continuaram acompanhando a luta pela terra no Brasil até os dias atuais, e que ganhou profun<strong>da</strong><br />

radicali<strong>da</strong>de no contexto do regime autoritário, entre 1964-1984, como se verá nos capítulos 4 e 5 deste estudo.<br />

91 É neste sentido que se pode afirmar que no Brasil nunca ocorreu nenhum processo de reforma agrária; ao<br />

contrário, como bem coloca Octavio Ianni para o período do Regime Militar, que será objeto dos dois últimos<br />

capítulos deste trabalho, o que houve, de fato, foi uma "contra-reforma" agrária.<br />

92 Na ver<strong>da</strong>de, essa situação persistirá até os dias atuais, como se pretende por em evidência neste trabalho.<br />

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