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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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abandona<strong>da</strong>s, (a maioria <strong>da</strong>s terras, se é certo que praticamente to<strong>da</strong>s as terras estavam<br />

já distribuí<strong>da</strong>s em sesmarias) e, indiferentemente, por grandes e pequenos posseiros. É<br />

este, sem dúvi<strong>da</strong>s, o raciocínio que está na base <strong>da</strong> afirmação de Maurício Vinhas de<br />

Queiroz, a <strong>da</strong> predominância historicamente possível <strong>da</strong> pequena proprie<strong>da</strong>de, não<br />

fosse a Lei de Terras de 1850.<br />

De qualquer modo, qualquer que fosse o caso, esta situação, concretamente,<br />

indicava a necessi<strong>da</strong>de de redefinição dos critérios jurídicos de legitimação <strong>da</strong>s terras<br />

que se encontravam em poder privado. As inúmeras tentativas realiza<strong>da</strong>s através dos<br />

Alvarás encontraram, sistematicamente, a resistência, tanto dos latifundiários, quanto<br />

<strong>da</strong>s burocracias <strong>da</strong> Colônia, sobretudo ao nível provincial ou local, <strong>da</strong><strong>da</strong> a estreita<br />

dependência entre a burocracia e os potentados locais que se consoli<strong>da</strong>ram<br />

definitivamente no Brasil desde o período <strong>da</strong>s Regências (Faoro).<br />

Essa necessi<strong>da</strong>de de reestruturação do estatuto legal <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de devia-se,<br />

fun<strong>da</strong>mentalmente aos permanentes conflitos que começaram a aparecer entre os<br />

antigos sesmeiros e os novos grandes posseiros, que, por exemplo, assumirá<br />

características de iminente radicali<strong>da</strong>de no contexto <strong>da</strong> expansão do café sobre as<br />

antigas sesmarias, quase abandona<strong>da</strong>s, do vale do Paraíba, entendimento este, comum a<br />

Faoro e a Caio Prado Júnior. Essa problemática dos conflitos entre grandes posseiros e<br />

antigos sesmeriros está no âmago do debate parlamentar <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1840, que<br />

desembocaria na conturba<strong>da</strong> elaboração e aprovação <strong>da</strong> Lei 601 de 1850.<br />

Tal é o caso, por exemplo, do Alvará de 1795, que buscava tornar mais rigorosos<br />

os processos de doação e confirmação de sesmarias, reafirmando a exigência do<br />

cumprimento <strong>da</strong>s cláusulas de resolubili<strong>da</strong>de, pactua<strong>da</strong>s, especialmente exigindo a<br />

medição, registro, residência e exploração efetiva. Esse Alvará foi revogado, por<br />

decreto, pouco mais de um ano depois. Permanece, assim, a situação de ilegali<strong>da</strong>de para<br />

a maioria <strong>da</strong>s terras ocupa<strong>da</strong>s na Colônia, situação essa que se estenderá e agravará, até<br />

a suspensão do instituto de sesmarias, em julho de 1822, pouco antes <strong>da</strong> Independência<br />

do país, recrudescendo-se durante todo o período do "Império <strong>da</strong>s Posses" (1822-1850),<br />

quando o Estado virtualmente se retira, envolvido em problemas políticos mais<br />

emergentes, <strong>da</strong> questão específica <strong>da</strong> legitimação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de, limitando-se, apenas,<br />

ao estabelecimento de um preceito genérico acerca do problema <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de na<br />

Constituição de 1824.<br />

É nesse contexto que se articulam, ou entram em choque, as contradições,<br />

conflitos e conciliações entre o exercício legal <strong>da</strong> violência pelo Estado, por um lado, e<br />

a violência priva<strong>da</strong>, dos latifundiários, por outro, contradições estas, que sempre<br />

estiveram presentes no processo de desenvolvimento e reorganização <strong>da</strong> estrutura agrofundiária<br />

brasileira.<br />

Na ver<strong>da</strong>de o Estado, propriamente, não se retirou <strong>da</strong> questão, mas, face à<br />

conjuntura de instabili<strong>da</strong>de política do período e incapaz de fazer face às oligarquias<br />

latifundiárias <strong>da</strong>s províncias, os governantes optam por uma estratégia jurídico-política<br />

hábil e inteligente: por um lado asseguram o pleno direito de proprie<strong>da</strong>de na<br />

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