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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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expansão latifundiária. Mais uma vez, como se pode observar, a saga do privilégio e <strong>da</strong><br />

violência priva<strong>da</strong> facilitava tanto a expansão pelas grandes posses, quanto as<br />

possibili<strong>da</strong>des de sua legitimação. Havia, igualmente, o problema de grandes posses que<br />

se estabeleceram em sesmarias "abandona<strong>da</strong>s", sobretudo na área de expansão <strong>da</strong><br />

economia cafeeira. Este problema <strong>da</strong> expansão <strong>da</strong>s posses nesta áreas, sobre antigas<br />

sesmarias mais ou menos abandona<strong>da</strong>s após a decadência <strong>da</strong> mineração, estará no cerne<br />

dos conflitos entre posseiros e sesmeiros e será um dos pontos centrais do debate<br />

parlamentar, na déca<strong>da</strong> de 1840, quando se estavam definindo os critérios legais de<br />

regularização ou legitimação <strong>da</strong>s terras no Brasil e que vierem a ser a Lei 601 de 1850.<br />

Mesmo quando se tratavam <strong>da</strong>s concessões legalmente realiza<strong>da</strong>s pela Coroa, na<br />

medi<strong>da</strong> em que estavam sujeitas às clausulas de resolubili<strong>da</strong>de, permaneciam sempre<br />

limita<strong>da</strong>s pelo estatuto jurídico e concreto de proprie<strong>da</strong>des condiciona<strong>da</strong>s, nãoabsolutiza<strong>da</strong>s<br />

ou seja, que poderiam, a qualquer momento, geralmente com fun<strong>da</strong>mento<br />

nas cláusulas claramente estabeleci<strong>da</strong>s nos documentos de doação, ser confisca<strong>da</strong>s e<br />

retornar ao domínio <strong>da</strong> Coroa. Exatamente por isso não poderiam servir para fins<br />

mercantis e, sobretudo, hipotecários.<br />

Entretanto, as contradições entre a legislação e prática <strong>da</strong> apropriação efetiva,<br />

gesta<strong>da</strong>s pelo avanço <strong>da</strong>s posses e pelo não cumprimento <strong>da</strong>s cláusulas de<br />

resolubili<strong>da</strong>de (que legalmente ensejariam a anulação <strong>da</strong>s concessões), aliados à<br />

anarquia e ao privilégio, - que se transformaram em ver<strong>da</strong>deira instituição na Colônia -<br />

gestaram a situação caótica <strong>da</strong> estrutura fundiária brasileira que, já no final do século<br />

XVIII, era insustentável e que se prolongará, apesar <strong>da</strong>s tentativas reguladoras ao nível<br />

jurídico, até ou dias atuais.<br />

Esta caótica situação era claramente exposta no Alvará de 5 de outubro de 1795,<br />

que tratava de tentar regularizar de forma global a questão <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de fundiária na<br />

Colônia, em cujo preambulo referia-se a "(...) abusos e irregulari<strong>da</strong>des e desordens<br />

que têm grassado...em todo o estado do Brasil". O entendimento de Cirne Lima é,<br />

entretanto, diverso deste. De acordo com ele, o sistema de posses não era ilegítimo,<br />

mas, sobretudo, pertencia aos costumes em conformi<strong>da</strong>de com abun<strong>da</strong>nte jurisprudência<br />

que cita. Esta situação impusera-se em Portugal em virtude do despovoamento<br />

resultante <strong>da</strong>s navegações e guerras de conquista e <strong>da</strong> influência crescente do direito<br />

romano. Reporta ain<strong>da</strong> que, na Lei <strong>da</strong>s Sesmarias, incorporou-se, desde então, o<br />

princípio <strong>da</strong> retenção pelo, ocupante, <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de cujo titular se ausentasse e não a<br />

lavrasse. Deste modo manifesta-se a opinião de Cirne Lima:<br />

“Era a ocupação, tomando o lugar <strong>da</strong>s concessões do Poder<br />

Público, e era, igualmente, o triunfo do colono humilde, do rústico<br />

desamparado, sobre o senhor de engenhos ou fazen<strong>da</strong>s.” 89<br />

Deste entendimento poder-se-ia concluir que a expansão inusita<strong>da</strong> <strong>da</strong>s posses a<br />

partir de 1822 estivesse sendo feita em cima <strong>da</strong>s terras de sesmarias incultas e<br />

89 Op. cit., pp. 20-1 e 47.<br />

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