Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...
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Adquirido o domínio, isto é, a confirmação, ou titulação legal <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de, o<br />
sesmeiro poderia fazer <strong>da</strong> terra quase tudo o quanto quisesse, inclusive, incorporar as<br />
terras públicas contíguas. Só lhe era ve<strong>da</strong>do o direito de arren<strong>da</strong>r a terra recebi<strong>da</strong>,<br />
"por não serem <strong>da</strong><strong>da</strong>s as sesmarias senão para os sesmeiros as<br />
cultivarem e não para repartirem e <strong>da</strong>rem a outros, o que só é<br />
permitido aos capitães e donatários." 60<br />
Em suma, a Confirmação Real <strong>da</strong> doação restringia-se ao concessionário que<br />
houvesse cumprido, no prazo definido, as cláusulas resolutivas, em particular no que<br />
referia à ocupação e exploração <strong>da</strong> terra recebi<strong>da</strong>, diretamente, ou por prepostos seus. A<br />
referência, aos “prepostos”, é relevante, posto que se encontra na origem de<br />
determinados processos de sociabili<strong>da</strong>de, através dos quais, os latifundiários começaram<br />
desenvolver a prática de permitir a residência de famílias pobres, geralmente nos limites<br />
e confrontações de suas proprie<strong>da</strong>des, mas sobretudo, <strong>da</strong>s novas áreas a elas<br />
incorpora<strong>da</strong>s, muito especialmente quando se tratavam de grandes posses, ilegítimas,<br />
sob a condição de, eventualmente, fazerem prova ou testemunharem a sua<br />
titulari<strong>da</strong>de, em caso de qualquer dissídio ou contencioso sobre a posse <strong>da</strong> terra. Além, é<br />
claro, de servirem como mão-de-obra eventual, quer fosse para o trabalho na<br />
agricultura, quer fosse para outras tarefas "menos nobres", como servirem na condição<br />
capangas, jagunços, etc.<br />
Esse fenômeno assumirá particular relevância no contexto que se seguiu à<br />
aprovação <strong>da</strong> Lei 601 de 1850, - analisado no próximo capítulo - e está na origem de<br />
determina<strong>da</strong>s relações de sociabili<strong>da</strong>de, tais como as fun<strong>da</strong><strong>da</strong>s no compadrio, nos<br />
chamados “moradores de condição”, e em todo um conjunto de relações sociais de<br />
dependência e subordinação pessoal, como a de agregados e de determinados tipos de<br />
parceria etc., relações essas que sofrerão profun<strong>da</strong>s transformações 61 com o passar do<br />
tempo e, sobretudo, com a incorporação de novas áreas, em face do desenvolvimento <strong>da</strong><br />
economia nacional.<br />
É na conjuntura de meados do século XVIII que se verificam alguma mu<strong>da</strong>nças<br />
relevantes na implementação <strong>da</strong>s exigência conti<strong>da</strong>s no instituto de sesmarias. São<br />
adota<strong>da</strong>s providências legais no sentido de se efetivar a reincorporação <strong>da</strong>s áreas<br />
pertencentes às antigas Capitanias Hereditárias, ao patrimônio do Reino, embora<br />
mediante compensações financeiras ou mobiliárquicas, aos antigos donatários. Ain<strong>da</strong><br />
neste contexto, a Carta Régia de 3 de setembro de 1759, determinava o confisco dos<br />
bens dos jesuítas, incorporando ao patrimônio do Estado, uma vasta área territorrial, que<br />
se encontrava em poder <strong>da</strong> Companhia de Jesus, tornando-a passível de redistribuição<br />
nos termos do Instituto <strong>da</strong>s Terras Devolutas. Junte-se a estas providências, as já<br />
menciona<strong>da</strong>s iniciativas legislativas, no sentido de exigir maior rigor no aproveitamento<br />
60 Determinações estas, constante <strong>da</strong>s diferentes Cartas de Doação e dos Regimentos. Cf. COSTA PORTO (S.d.)<br />
61 A respeito, especificamente, destas transformações nas condições de sociabili<strong>da</strong>de e suas implicações para a<br />
“formação do proletariado brasileiro”, consultar o excelente estudo de José César Gnaccarini, especialmente, a<br />
Introdução e os capítulos 1, 3 e 4. (GNACCARINI, 1980).<br />
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