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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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terras públicas, especialmente pelos grandes posseiros e pela grilagem especializa<strong>da</strong>.<br />

Processos estes, como se viu nos capítulos 2, 3 4 e 5, sobretudo, fun<strong>da</strong>dos no privilégio<br />

e na ilegali<strong>da</strong>de.<br />

De modo geral, como foi discutido no capítulo 2, os estudiosos associam a Lei<br />

de Terras de 1850 às teses <strong>da</strong> colonização sistemática de Wakefield, e o debate<br />

parlamentar <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1840, que a precedeu, parece <strong>da</strong>r-lhes razão. Entretanto, uma<br />

análise mais cui<strong>da</strong>dosa mostra que não é exatamente a proposta <strong>da</strong> colonização<br />

sistemática, tal como teoriza<strong>da</strong> por Wakefield, a que vem a ser implementa<strong>da</strong> após a Lei<br />

601. Na ver<strong>da</strong>de, a colonização sistemática baseava-se na disponibili<strong>da</strong>de de terras<br />

públicas e livres, que pudessem ser privatiza<strong>da</strong>s, servindo, assim, para atrair colonos<br />

ricos, investidores, por um lado e, colonos pobres, por outro, que não podendo pagar<br />

pelas terras "livres estatais" teriam que sujeitar-se ao assalariato, trabalhando para<br />

aqueles, até poderem “poupar” o pecúlio necessário à aquisição de sua própria parcela<br />

de terra. Permanecendo como pressuposta, a possibili<strong>da</strong>de legal de aquisição de<br />

pequenas parcelas de terra por colonos com melhor situação econômica e por<br />

assalariados, após a acumulação de determinado pecúlio.<br />

A idéia subjacente a esta proposta de Wakefield era a criação de um mercado<br />

de trabalho - formalmente livre - permanente, alimentado pelo bloqueio ao acesso livre<br />

e imediato à proprie<strong>da</strong>de <strong>da</strong> terra; acesso este que seria inevitável no caso de se permitir<br />

a “colonização expontânea” e o livre acesso à terra. Daí a expressão “colonização<br />

sistemática” - em oposição a “expontânea”- isto é, promovi<strong>da</strong> e regula<strong>da</strong> pelo Estado.<br />

Entretanto, não foi este o projeto efetivamente implementado no Brasil, após a<br />

aprovação <strong>da</strong> Lei 601, na segun<strong>da</strong> metade do século XIX, onde o colonato e, em<br />

situações críticas, a parceria, e muito poucas vezes o assalariato puro foram as formas<br />

de incorporação do trabalho ao processo produtivo. Ou seja, o mercado de trabalho<br />

(formalmente) livre, suposto pela teoria de Wakefield, foi, na prática, substituído pelo<br />

sistema de colonato; e o acesso à pequena proprie<strong>da</strong>de (familiar) - igualmente suposta<br />

pela teoria <strong>da</strong> colonização sistemática - como rotina do fluxo <strong>da</strong> economia, no Brasil,<br />

apenas se torna uma possibili<strong>da</strong>de nos períodos de crise do setor agro-exportador.<br />

Desta maneira, os pressupostos fun<strong>da</strong>mentais <strong>da</strong> teoria <strong>da</strong> colonização<br />

sistemática, que seriam a formação de um fundo de terras livres e estatais, por um lado,<br />

e de trabalhadores livres e pobres, por outro (os ingredientes básicos à estruturação de<br />

relações capitalistas na agricultura) foram completamente desvirtuados, e efetivamente<br />

subvertidos, no Brasil, senão em sua formulação legislativa, certamente ao nível de sua<br />

implementação: redefinidos em função dos interesses latifundiários. Portanto, <strong>da</strong><br />

persistência <strong>da</strong> apropriação privilegia<strong>da</strong>.<br />

A colonização sistemática foi, como se registrou neste estudo, reduzi<strong>da</strong>, desta<br />

forma e nesta conjuntura, à simples importação de imigrantes pobres para servirem de<br />

mão-de-obra barata para os latifúndios, ou para a colonização - concebi<strong>da</strong> como<br />

desbravamento - em zonas de alto risco, como as fronteiras do Império ou nos sertões.<br />

Em regiões afasta<strong>da</strong>s, portanto, <strong>da</strong>s áreas de interesse imediato dos potentados <strong>da</strong> terra.<br />

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