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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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características, conforme os distintos momentos e conjunturas vivi<strong>da</strong>s e enfrenta<strong>da</strong>s<br />

pelo País.<br />

Iniciando-se com base no instituto português <strong>da</strong>s sesmarias - analisado no<br />

capítulo 1 - a transição <strong>da</strong>s terras públicas brasileiras para o âmbito <strong>da</strong> iniciativa<br />

priva<strong>da</strong>, entretanto, não se configurou nos termos <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong> absoluta <strong>da</strong><br />

terra. Na ver<strong>da</strong>de, como ficou amplamente discutido e demonstrado nos capítulos 1 e 2,<br />

a Coroa Portuguesa, durante todo o período colonial, apenas cedeu a “posse útil” sobre<br />

as terras. Raras foram as sesmarias efetivamente confirma<strong>da</strong>s, sobretudo se se tiver em<br />

consideração o volume <strong>da</strong>s concessões que nunca o foram ou <strong>da</strong>s que caíram em<br />

comisso após terem sido confirma<strong>da</strong>s. Além, é claro, <strong>da</strong>s imensas áreas dos “grandes<br />

sertões” que não foram efetivamente alcançados neste período.<br />

Isso posto, é necessário nunca esquecer que o Governo Português, desde os<br />

primeiros momentos do processo de colonização, sempre teve o cui<strong>da</strong>do de apenas<br />

ceder a “posse útil”, condiciona<strong>da</strong>, sujeita às cláusulas de resolubili<strong>da</strong>de e não do<br />

domínio pleno sobre as terras agrícolas. Isso fez com que a formação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de<br />

fundiária, no Brasil, sempre estivesse marca<strong>da</strong> pela problemática do privilégio, em sua<br />

concessão, e <strong>da</strong> ilegitimi<strong>da</strong>de, na sua confirmação ou titulação.<br />

É neste contexto que o processo de legitimação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong> <strong>da</strong> terra<br />

no Brasil, apenas teve a oportuni<strong>da</strong>de de se constituir, legitimamente, e assim ter a<br />

possibili<strong>da</strong>de de passar a assumir a sua forma jurídica moderna, de proprie<strong>da</strong>de<br />

absoluta, burguesa, com a aprovação <strong>da</strong> Lei 601 de 1850 - a Lei de Terras - e,<br />

sobretudo, após a sua Regulamentação, em 1854, estu<strong>da</strong>dos no capítulo 2. Ain<strong>da</strong> assim,<br />

o processo de reconhecimento legal <strong>da</strong>s terras possuí<strong>da</strong>s, no âmbito <strong>da</strong> Lei de Terras -<br />

exceto para as sesmarias e outras concessões não devolutas, que foram reconheci<strong>da</strong>s<br />

como proprie<strong>da</strong>des priva<strong>da</strong>s legítimas - permaneceu eivado de impedimentos políticos e<br />

sobretudo jurídicos, administrativos e burocráticos.<br />

Apesar disso, como foi sistematicamente estu<strong>da</strong>do no capítulo 2, a Lei de Terras,<br />

de 1850 - por ter sido a primeira legislação fundiária do Brasil Independente que<br />

regulamentou a matéria - constituiu-se numa espécie de marco zero <strong>da</strong> legali<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

proprie<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong> territorial do País: reconheceu como proprie<strong>da</strong>des legitimas as<br />

antigas sesmarias confirma<strong>da</strong>s e regulou sobre as terras devolutas (sem destinação<br />

pública nem priva<strong>da</strong>), as sesmarias irregulares (sujeitas à revali<strong>da</strong>ção) e as posses, que<br />

poderiam ser legitima<strong>da</strong>s, após medi<strong>da</strong>s, demarca<strong>da</strong>s e verifica<strong>da</strong> a sua exploração<br />

efetiva pelos respectivos posseiros.<br />

Desde então, a legalização <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de rural no Brasil foi profun<strong>da</strong>mente<br />

dificulta<strong>da</strong> pelos interesses dos latifundiários, que desviaram a solução do problema<br />

fundiário, jogando-o no campo amorfo <strong>da</strong> colonização, afastando-o do âmbito <strong>da</strong><br />

separação legal entre terras públicas e particulares.<br />

Desta forma, engendraram-se definitivamente as condições fun<strong>da</strong>mentais que<br />

possibilitaram e que são responsáveis, até os dias atuais, pela desorganização e<br />

concentração fundiárias e pelo apossamento e ocupação indiscriminados e ilegais <strong>da</strong>s<br />

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