Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...
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pelas autori<strong>da</strong>des fundiárias para transformar a “injusta” estrutura agrária existente no<br />
País 386 .<br />
Observe-se que nesta classificação operacional dos instrumentos de ação<br />
fundiária ofereci<strong>da</strong> pelo INCRA 387 , não aparece a “Reforma Agrária” como instrumento<br />
de ação fundiária. Esse fato é significativo, posto que deixa evidente que a Reforma<br />
Agrária, tal como pensa<strong>da</strong> pelos dirigentes <strong>da</strong> Política Fundiária, não se constituía,<br />
sequer em um instrumento operacional para a transformação <strong>da</strong> estrutura agrária. A<br />
análise dos diferentes processos, neste sentido, implementados pelo INCRA, indica que<br />
a Reforma Agrária era pensa<strong>da</strong>, apenas, como última instância que, de resto, seria<br />
alcança<strong>da</strong> em resultado <strong>da</strong> ação destes instrumentos, evidentemente, entendidos como<br />
articulados aos demais instrumentos de política agrícola e desenvolvimento rural, como<br />
subsídios, crédito, assistência técnica, etc. Tudo isto é coerente com o Projeto de<br />
Desenvolvimento Rural e Fundiário, tal como arquitetado pelo Governo e claramente<br />
regulamento no Estatuto <strong>da</strong> Terra, como se pode verificar pelas análises aqui<br />
desenvolvi<strong>da</strong>s.<br />
3.2.2.1. Discriminação de Terras Públicas<br />
As ações discriminatórias, que consistem em separar as terras devolutas,<br />
públicas, <strong>da</strong>s que se encontram em domínio particular legítimo, são considera<strong>da</strong>s,<br />
inclusive pelas autori<strong>da</strong>des fundiárias, como o instrumento fun<strong>da</strong>mental <strong>da</strong> ação<br />
fundiária.<br />
Segundo Cláudio Ribeiro, diretor do Departamento de Desenvolvimento Rural<br />
do INCRA, a discriminatória é um criação “genuinamente brasileira” e se deve às<br />
especifici<strong>da</strong>des do processo de desenvolvimento <strong>da</strong> organização fundiária do País, cujas<br />
terras, originalmente públicas, foram ocupa<strong>da</strong>s de forma desordena<strong>da</strong> e, quase sempre,<br />
atropelando as iniciativas legais e administrativas.<br />
Este processo, amplamente analisado nos capítulos anteriores, sempre se fundou<br />
na apropriação privilegia<strong>da</strong>, quer estivesse, ou não, baseado no consentimento do<br />
Estado. O curioso, neste processo de ocupação de terras públicas, e realmente peculiar à<br />
história agrária brasileira - neste caso, efetivamente uma “criação genuinamente<br />
brasileira”, para utilizar aquela expressão de Cláudio Ribeiro - foi o fato de que,<br />
também o processo de legitimação, ter sido privilegiado e juridicamente questionável.<br />
Apenas essa dupla configuração do privilégio pode explicar como e porque, até os dias<br />
atuais, persiste a necessi<strong>da</strong>de prioritária <strong>da</strong>s ações discriminatórias, cujo objetivo é<br />
exatamente separar, legalmente, as terras públicas <strong>da</strong>s particulares.<br />
Tendo em consideração a persistência desta característica dos processos de<br />
ocupação <strong>da</strong>s terras brasileiras e a extensão dos privilégios à própria esfera jurídica, a<br />
questão que persiste junto a ela, refere-se ao fato de se saber se a proposta, tão<br />
386 Vide Estatuto <strong>da</strong> Terra (Lei 4.504/64). Loc. cit.<br />
387 Ver, por exemplo, Cláudio. J. Ribeiro, op. cit., pp. 6-7.<br />
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