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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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num toque de mágica, transitar para a condição de “empresas rurais”. Além,<br />

evidentemente, de ficarem isentos do risco de desapropriação por interesse social, como<br />

explicitamente assegurado no parágrafo 3 o , alínea “c” do artigo 19 do Estatuto <strong>da</strong> Terra,<br />

já comentado.<br />

Outra particulari<strong>da</strong>de, esta, ao juízo analítico aqui desenvolvido, ain<strong>da</strong> mais<br />

problemática, refere-se ao diagnóstico fun<strong>da</strong>mental <strong>da</strong>s causas do problema agrário<br />

brasileiro, tal como formulado na Mensagem 33: a dicotomia “latifúndio-minifúndio”.<br />

Aparentemente, como no caso analisado acima, trata-se de um diagnóstico “perfeito”,<br />

preciso, impecável. Só que ele apresenta dois problemas fun<strong>da</strong>mentais que o anulam:<br />

Primeiro, porque o problema agrário no Brasil, como em qualquer outra latitude,<br />

não depende estritamente <strong>da</strong> referência à terra, enquanto “coisa” ou “bem”, como é <strong>da</strong><br />

sua definição no campo jurídico, mas <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de: ou seja, <strong>da</strong>s relações entre os<br />

homens a respeito do domínio <strong>da</strong>s coisas. Portanto, trata-se de questão mais complexa e<br />

que envolve determinados conjuntos de relações de sociabili<strong>da</strong>de: disso advém a sua<br />

complexi<strong>da</strong>de e o fato de que não basta normatizar para resolvê-la. Se se tratasse de<br />

simples relação entre o homem e a coisa, como é colocado, por exemplo no Código<br />

Civil, bastava a norma, senão para resolvê-lo, pelo menos para reduzí-lo à dimensões<br />

irrelevantes ou pelo menos, aceitáveis do ponto de vista <strong>da</strong> sociabili<strong>da</strong>de e, sobretudo do<br />

Direito.<br />

Segundo, e mais complexo e de difícil reconhecimento à primeira vista, é o fato<br />

deste “diagnóstico” atribuir ao latifúndio e ao minifúndio o mesmo grau de<br />

responsabili<strong>da</strong>de pelas dificul<strong>da</strong>des enfrenta<strong>da</strong>s pela estrutura fundiária brasileira,<br />

estando na raiz <strong>da</strong> injusta distribuição <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de e <strong>da</strong> ren<strong>da</strong>. Observe-se que esta<br />

conceituação só se tronava possível pela condição, anteriormente aponta<strong>da</strong>, de se tratar<br />

a terra como uma coisa e não como uma mercadoria, ou seja, uma relação social: um<br />

imóvel rural. Segundo porque, de forma sutil e aparentemente “técnica”, coloca no<br />

mesmo patamar as grandes e as pequenas proprie<strong>da</strong>des, logo, tanto os especuladores e<br />

os latifundiários quanto os trabalhadores e pequenos produtores. Desta forma, torna<br />

profun<strong>da</strong>mente difícil localizar as causas mais profun<strong>da</strong>s <strong>da</strong> concentração fundiária e de<br />

suas implicações para a economia rural, sua reprodução e desenvolvimento.<br />

Esta construção “teórica”, tal como posta no Estatuto <strong>da</strong> Terra, permite e implica<br />

qualquer interpretação ou diagnóstico: Ou seja, será, por um lado, a concentração, mas<br />

por outro, a dispersão <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de, a causa fun<strong>da</strong>mental dos problemas agrários.<br />

Assim, volta-se, como no caso anterior, à estaca zero.<br />

O agravante, neste diagnóstico desenvolvido na Mensagem 33, é que ele aponta<br />

no sentido <strong>da</strong> reconcentração fundiária. Como o minifúndio é, por definição,<br />

problemático por não possuir, endógena e intrinsecamente, a possibili<strong>da</strong>de de assegurar<br />

o sustento de uma família de trabalhadores, portanto, menos ain<strong>da</strong>, de gerar “excedentes<br />

econômicos”, a única alternativa é excluí-lo <strong>da</strong> solução do problema. Ou seja, o<br />

minifúndio, enquanto tal, é apenas parte do problema, nunca <strong>da</strong> solução.<br />

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