Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...
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objetivi<strong>da</strong>de para se evitar a “legitimação” do “bias” que passou a ser uma característica<br />
<strong>da</strong> tecnoburocracia que se instalara no período, de pretender apresentar todos os seus<br />
projetos e iniciativas - seja no campo legislativo como em qualquer outro - como<br />
construções originais e avança<strong>da</strong>s, geralmente, omitindo as fontes onde beberam<br />
determina<strong>da</strong>s idéias, conceitos e propostas e, mais que isto, tentando fazer “tabula rasa”<br />
<strong>da</strong>s experiências anteriores, quando não, simplesmente, de negar a sua existência.<br />
Com isso não se pretende desqualificar o Estatuto <strong>da</strong> Terra e, menos ain<strong>da</strong>,<br />
desconhecer que o mesmo tenha oferecido a sua contribuição específica ao tratamento<br />
<strong>da</strong> questão fundiária. Mas trata-se de localizar a Lei 4.504, de 1964 no seu lugar<br />
adequado, no conjunto <strong>da</strong> construção histórica do ordenamento jurídico brasileiro.<br />
Acima já se fez referência à sua relevância pelo simples fato de representar a<br />
regulamentação do preceito Constitucional (de 1946), de fazer-se cumprir a função<br />
social <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de e promover a justa distribuição <strong>da</strong> mesma com igual oportuni<strong>da</strong>de<br />
para todos. Sem esta regulamentação este imperativo constitucional era de fato, mas<br />
também de direito, uma proclamação vazia - porque impossível de ser viabilizado e<br />
avaliado legalmente. Assim, a Lei 4.504/64 criava, de direito, a possibili<strong>da</strong>de de o<br />
Executivo poder, efetivamente, implementar o processo de regularização fundiária e de<br />
privatização <strong>da</strong>s terras públicas. Porque se tratava de privatizar as terras públicas para<br />
incorporá-las ao processo produtivo.<br />
As formas como isto seria feito dependiam, efetivamente, <strong>da</strong>s diretrizes de<br />
Política Econômica, ou seja, <strong>da</strong> opção, feita pelo Governo, por um determinado Projeto<br />
ou modelo de Desenvolvimento Econômico e Rural. Por isto mesmo não se pode<br />
separar o Estatuto <strong>da</strong> Terra <strong>da</strong> Mensagem 33, do General Castelo Branco.<br />
Por outro lado, o Estatuto <strong>da</strong> Terra efetivamente realizou alguns avanços no<br />
campo normativo, especialmente ao elaborar alguns construtos, como o de módulo<br />
familiar, empresas rurais, latifúndio e minifúndio, de tal forma que, em certo sentido<br />
possibilitaria a sua avaliação em termos do preceito constitucional. Entretanto, como<br />
será abor<strong>da</strong>do adiante, estes “construtos”, ao se fun<strong>da</strong>rem, como aliás, não poderia ser<br />
de outra forma, em parâmetros arbitrários, necessariamente se prestariam a<br />
interpretações diversas. Neste sentido, poderiam ser utilizados tanto para promover<br />
como para impedir o acesso ou a legitimação a determinados tipos de proprie<strong>da</strong>de rural.<br />
Os critérios, neste contexto, continuavam fortemente vinculados, por um lado, às<br />
priori<strong>da</strong>des defini<strong>da</strong>s no modelo de desenvolvimento; e, ao nível dos casos concretos, às<br />
mediações <strong>da</strong>s burocracias locais, fortemente influenciáveis, ain<strong>da</strong> mais em função do<br />
contexto de radicali<strong>da</strong>de ideológica e repressão que se instituiu, muito especialmente<br />
após 1968. Essa situação seria ain<strong>da</strong> mais agrava<strong>da</strong>, com as sistemáticas exceções<br />
abertas na Lei e, sobretudo nos Decretos e atos do Executivo, como, por exemplo, no<br />
caso <strong>da</strong> definição de latifúndio e, no mesmo artigo, “do que não se considerava<br />
latifúndio”.<br />
3.2. O Estatuto <strong>da</strong> Terra e a Política Fundiária<br />
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