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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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Como a lógica que, sistematicamente, presidiu a esses processos de expansão<br />

dos interesses capitalistas no campo brasileiro, sempre foi a de empurrar para ca<strong>da</strong> vez<br />

mais longe os pequenos posseiros, proprietários e indígenas, - inclusive não<br />

reconhecendo seus direitos efetivos à legitimação <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s terras que<br />

possuíam - foram-se engendrando, nesse contexto, novos confrontos e novos sujeitos 309 ,<br />

<strong>da</strong>ndo novo impulso e caráter à resistência popular nos sertões do País. Tratava-se do<br />

aprofun<strong>da</strong>mento e <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>deira instituição <strong>da</strong>quilo que, neste trabalho, se está<br />

denominado de grilagem especializa<strong>da</strong>, que se tornou em um dos instrumentos mais<br />

importantes <strong>da</strong> legitimação privilegia<strong>da</strong> de “falsas posses” e “proprie<strong>da</strong>des”, sobretudo<br />

após a aprovação do Estatuto <strong>da</strong> Terra.<br />

Os casos de Trombas, em Goiás, e do Oeste do Paraná, em relação,<br />

especificamente, à luta pelo acesso à proprie<strong>da</strong>de <strong>da</strong> terra; e <strong>da</strong>s “Ligas camponesas”,<br />

em relação à defesa <strong>da</strong>s condições de existência e reprodução dos trabalhadores rurais<br />

empregados nos “novos” latifúndios canavieiros, são particularmente esclarecedores do<br />

novo colorido que passou a ser impresso aos movimentos de resistência dos pobres e<br />

excluídos do campo no segundo pós-guerra. Estes movimentos prolongar-se-ão, de<br />

forma sombria e dolorosa, no contexto <strong>da</strong> repressão violenta desencadea<strong>da</strong> 310 após os<br />

acontecimentos de 1964.<br />

No Paraná 311 , para tomar um exemplo particular, a luta pela garantia de posse <strong>da</strong><br />

terra era antiga, e vinha-se desenrolando desde os últimos anos do Império, com a<br />

doação, pela Coroa, de uma faixa de nove quilômetros de ca<strong>da</strong> lado <strong>da</strong> ferrovia que<br />

seria construí<strong>da</strong>, ligando São Paulo ao Rio Grande. Havia, um contencioso entre os<br />

Estados do Paraná e Santa Catarina, acerca dos direitos sobre as terras <strong>da</strong> região<br />

fronteiriça, na divisa destes Estados, “ipso facto”, conheci<strong>da</strong> como “Contestado”.<br />

Nesta região, o Governo havia concedido à companhia Southern Brazil Lumber<br />

and Colonization uma área de 180 mil hectares. Os posseiros, que desde muito se<br />

encontravam instalados na região, foram sumariamente expulsos, e a eles vieram se<br />

juntar, a partir de 1908, a massa de desempregados <strong>da</strong>s obras <strong>da</strong> ferrovia, <strong>da</strong>ndo início a<br />

uma acirra<strong>da</strong> luta, que culminou com o violento confronto, que ficou, historicamente,<br />

conhecido como a “Guerra do Contestado”, cujo ápice ocorreu entre 1912 e 1916,<br />

309 Ver a respeito, MARTINS, J. S. 1994, especialmente o Capítulo II.<br />

310 “Assim, o terror foi desencadeado, na zona do açúcar, diretamente por usineiros e senhores de<br />

engenho. To<strong>da</strong> a ampla organização sindical dos trabalhadores rurais foi destruí<strong>da</strong> e ain<strong>da</strong> hoje não se<br />

tem idéia do número de dirigentes camponeses assassinados nos primeiros dias <strong>da</strong> repressão. (...) Ao<br />

correr dos meses, as prisões permanecem abarrota<strong>da</strong>s. Alguns milhares de camponeses, trabalhadores,<br />

estu<strong>da</strong>ntes, intelectuais encontram-se detidos. As torturas, espancamentos, violações de domicílio,<br />

passam a constituir fatos de rotina. Voltam a dirigir a polícia velhos torturadores do período<br />

estadonovista” . Nesses termos é descrita a conjuntura de terror e repressão que se seguiu imediatamente a toma<strong>da</strong><br />

do Poder pelos Militares, em 1964. (In. ARRAES, M. s. d.). Grifos nossos. Ver também, a este respeito, Carlos<br />

Minc (MINC, op. cit.).<br />

311 A breve reconstituição aqui feita deste, episódio, deve-se, em particular aos trabalhos de Joe Foweraker, Fábio<br />

Alves e José de Souza Martins, entre outros, todos citados (vide Referências Bibliográficas ao final deste estudo).<br />

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