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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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Todos esses fatos são indicadores bastante objetivos de que o Golpe de 1964 não<br />

era um fato isolado, nem muito menos novo, mas que, ao contrário, apenas representou<br />

o momento vitorioso desse conjunto de tentativas frustra<strong>da</strong>s de retoma<strong>da</strong> do poder pelas<br />

elites mais conservadoras do país, amplamente comprometi<strong>da</strong>s com um determinado<br />

projeto, supostamente liberal, de “abertura” e internacionalização <strong>da</strong> economia<br />

brasileira, mas, sobretudo, de alinhamento do Brasil no âmbito <strong>da</strong> aliança Ocidental. Ou<br />

seja, no âmbito do “bloco anti-soviético”.<br />

Neste sentido, é evidente que não se tratava, apenas, de um Golpe,<br />

especificamente voltado contra o Governo de João Goulart 292 , fun<strong>da</strong>do no fato de que o<br />

Presidente ter-se-ia guinado para as esquer<strong>da</strong>s, ou de haver sido deflagrado em<br />

decorrência <strong>da</strong> inabili<strong>da</strong>de política do Presidente para li<strong>da</strong>r com uma crise,<br />

supostamente, conjuntural, como argumenta Skidmore 293 . Este era, certamente, o<br />

pretexto, nunca o motivo <strong>da</strong> conspiração. Tratava-se, como os fatos ulteriores vieram a<br />

deixar evidente, de um golpe contra qualquer aspiração à auto-determinação política do<br />

País, e sobretudo, contra à escolha, que aparentemente estava sendo feita, por uma via<br />

democrática e independente de desenvolvimento <strong>da</strong> economia nacional, e de nãoalinhamento<br />

no campo político. Tudo isto feria os princípios consagrados na “Doutrina<br />

Monroe”, nunca abandona<strong>da</strong>, especialmente tendo-se em consideração a conjuntura <strong>da</strong><br />

“Guerra Fria” e <strong>da</strong> alega<strong>da</strong> “ameaça do comunismo internacional”.<br />

Os motivos 294 e, sobretudo, os objetivos do Golpe, ao que as evidências parecem<br />

indicar, eram outros, e estavam fortemente marcados pelas posições políticas e<br />

ideológicas deriva<strong>da</strong>s <strong>da</strong> “doutrina Monroe” e, em especial, <strong>da</strong> sua concretização na<br />

“política preventiva”, estrutura<strong>da</strong> no início do século, e que lançava as primeiras bases<br />

para o “direito” de intervenção dos Estados Unidos nos assuntos internos dos países<br />

latino-americanos sob o pretexto de combater “a anarquia reinante e as<br />

292 O Senador Auro de Moura Andrade, presidente do Senado e do Congresso Nacional, na oportuni<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

renúncia de Jânio Quadros, assim avalia aquele fato: “Está claro que João Goulart acabaria sendo o<br />

herdeiro dos males advindos <strong>da</strong>quele grande crime praticado por Jânio Quadros (...). Foi ele quem,<br />

com sua fuga aos deveres, desamparou e cassou a própria geração e a geração de nossos filhos, os<br />

direitos, as garantias, as liber<strong>da</strong>des de nosso povo no dia em que praticou o supremo crime <strong>da</strong><br />

infideli<strong>da</strong>de à democracia. Todos os jovens que até hoje não puderam votar num Presidente <strong>da</strong><br />

República saibam que isto se dá pelo ato irresponsável do Sr. Jânio Quadros”. Este depoimento, de<br />

Auro Moura Andrade deixa claro que o Golpe de 1964 ganha vigor nesta conjuntura. O importante, no depoimento,<br />

não é a acusação ao Sr. Jânio Quadros, mas o fato de localizar, na sua renúncia, o terreno fértil, o pretexto, como se<br />

afirma neste trabalho, para a aceleração do movimento conspiratório. Por outro lado, fica sub-explícito, neste mesmo<br />

depoimento, o fato de que João Goulart e o seu Governo não foram a causa nem provocaram o Golpe, mas, sim, que<br />

foram surpreendidos por este.<br />

293 SKIDMORE, T. (1988). Ver, especialmente, os capítulos I e II, onde, apesar de uma vigorosa e sistemática<br />

análise de vasto material empírico e de ampla literatura, Skidmore procura argumentar no sentido de minimizar o<br />

papel dos Estados Unidos nos acontecimentos de 1964, tendendo a argumentar no sentido de que, caso o Presidente<br />

João Goulart fosse um político mais hábil, poderia ter evitado a sua deposição e o Golpe de Estado. Entretanto, outros<br />

trabalhos, especialmente, o excelente estudo-denúncia de Marcos Sá Corrêa (CORRÊA, 1977), fun<strong>da</strong>mentado em<br />

vasta documentação, inclusive do Departamento de Estado Norte Americano e <strong>da</strong> CIA, põe em evidência a hipótese<br />

contrária.<br />

294 Segundo Ianni vários eram os motivos alegados para o Golpe: “A inflação, a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> taxa de inversões, as<br />

greves operárias, a politização crescente <strong>da</strong>s classes assalaria<strong>da</strong>s, na ci<strong>da</strong>de e no campo, a luta pelas<br />

reformas de base (agrária, bancária, habitacional, educacional e outras), vários foram os motivos<br />

alegados pelo imperialismo e seus aliados no País, para justificar e apressar o Golpe de Estado de 31 de<br />

março <strong>da</strong> 1964”. (IANNI, 1979(a), p. 17)<br />

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