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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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<strong>da</strong> terra (proprie<strong>da</strong>de burguesa) a partir <strong>da</strong> promulgação <strong>da</strong> Lei 601 de 1850, sempre<br />

esteve eivado de impedimentos políticos e, sobretudo jurídicos e burocráticos. Como<br />

Registra oportunamente Costa Porto,<br />

"(...)talvez a linguagem <strong>da</strong>s cartas dos donatários por esta<br />

concepção de que el-Rei cedera direitos dominiais sobre o<br />

solo, quando, na ver<strong>da</strong>de, se limitara a outorgar 'poderes<br />

políticos', largos, sim, 'direitos majestáticos quase absolutos'<br />

mas de nenhum modo, direitos sobre o solo. 4 "<br />

Tratavam-se <strong>da</strong>s concessões de posse com cláusulas de resolubili<strong>da</strong>de, ou seja,<br />

que a qualquer momento poderiam ser reverti<strong>da</strong>s ao domínio <strong>da</strong> Coroa. Raymundo<br />

Faoro registra magistralmente o sentido profundo, político e econômico desse instituto<br />

jurídico:<br />

"Os forais - a carta foral - , pacto entre o rei e o povo,<br />

asseguravam o predomínio do soberano, o predomínio já em<br />

caminho para o absolutismo, ao estipularem que a terra não teria<br />

outro senhor senão o rei. 5 "<br />

Não se tratavam, portanto de proprie<strong>da</strong>des priva<strong>da</strong>s no sentido liberal, de<br />

proprie<strong>da</strong>de absoluta, perspectiva esta, que seria aberta, apenas, com a aprovação <strong>da</strong> Lei<br />

de Terras. Donde a sua relevância para a análise dessa problemática.<br />

Esses impedimentos ao processo de reconhecimento real (confirmação de<br />

sesmarias) e, posteriormente, de reconhecimento legal (legalização ou revali<strong>da</strong>ção, nos<br />

termos <strong>da</strong> Lei 601 de 1850, sobretudo), em última análise, apenas serão ultrapassados<br />

em circunstâncias muito especiais e por determinados grupos muito particulares:<br />

geralmente os mais próximos (social, política ou economicamente) aos círculos do<br />

poder 6 . Esta situação sempre facilitou, historicamente, a ação destes grupos em<br />

detrimento <strong>da</strong> maioria <strong>da</strong> população rural. Neste sentido - e esta é uma <strong>da</strong>s<br />

particulari<strong>da</strong>des que se pretende evidenciar neste estudo - e mesmo tendo em estrita<br />

consideração o conceito de "Estado de Direito", no qual o processo de legitimação <strong>da</strong><br />

proprie<strong>da</strong>de territorial não prescinde do atendimento <strong>da</strong>s formali<strong>da</strong>des legais e de<br />

requisitos juridicamente instituídos, tem-se, forçosamente que se concluir, que a<br />

proprie<strong>da</strong>de fundiária, no Brasil, sempre se construiu, historicamente, como proprie<strong>da</strong>de<br />

não-absolutiza<strong>da</strong> (até 1850) e, na melhor <strong>da</strong>s hipóteses, de legitimação privilegia<strong>da</strong>,<br />

desde sempre.<br />

É neste sentido que aqui se entende que a proprie<strong>da</strong>de fundiária no Brasil, do<br />

ponto de vista do Direito, mas, também <strong>da</strong> praxis social, sempre esteve eiva<strong>da</strong> de<br />

privilégio e <strong>da</strong> ilegitimi<strong>da</strong>de. Assim, tratam-se, ain<strong>da</strong> hoje, de proprie<strong>da</strong>des<br />

juridicamente questionáveis<br />

Pode-se afirmar que as Políticas Fundiárias postas em prática no Brasil, por um<br />

lado, e o processo de avanço indiscriminado e extra-legal, <strong>da</strong>s posses, por outro,<br />

geraram uma espécie de "estado hobbesiano" ao nível <strong>da</strong> prática, fenômeno este,<br />

4 COSTA PORTO (S.d., p. 21). Grifos nossos.<br />

5 FAORO (1996, p.7).<br />

6 Esta é, aliás, uma <strong>da</strong>s críticas fun<strong>da</strong>mentais de Wakefield ao processo de concessão de terras nas colônias, contra o<br />

qual ele propunha a ven<strong>da</strong> de terras pelo Estado, como será visto no capítulo 2.<br />

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