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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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questão dos registros, conforme abor<strong>da</strong><strong>da</strong> anteriormente apresentava relevância<br />

fun<strong>da</strong>mental e será quase sempre sobre ela que insistirá o Governo no sentido de<br />

disciplinar a proprie<strong>da</strong>de territorial.<br />

De qualquer maneira, mais uma vez, a questão <strong>da</strong> legitimação e reconhecimento,<br />

pelo Estado, <strong>da</strong> proprie<strong>da</strong>de territorial é apenas genericamente trata<strong>da</strong> na legislação,<br />

permanecendo, portanto, sujeita às flutuações <strong>da</strong>s ações objetivas de apropriação<br />

priva<strong>da</strong>, especialmente por parte dos mais poderosos, posto que apenas estes, como se<br />

tem evidenciado neste estudo, e como foi vastamente documentado por inúmeros<br />

estudiosos - muitos citados neste estudo - tinham, de fato, poder suficiente para<br />

apoderar-se de grandes parcelas de terras públicas (e particulares, no caso em que<br />

incorporavam inúmeras pequenas posses) e legitimar suas pretensões territoriais.<br />

Inclusive pela via <strong>da</strong> subversão do sistema de registros, sobretudo pela alternativa à<br />

fraude, ou aproveitando-se <strong>da</strong> ignorância a respeito <strong>da</strong>s leis e de direitos que estas<br />

asseguravam, por parte de pequenos posseiros e proprietários. Estes, na maioria dos<br />

casos, foram surpreendidos pelos “donos <strong>da</strong>s terras” que ocupavam há muitas<br />

gerações.” 258<br />

A Constituição de 1934, nasci<strong>da</strong> na nova conjuntura <strong>da</strong> derrota, embora parcial,<br />

<strong>da</strong>s oligarquias agrárias, na “Revolução de 1930”, tenta recuperar o terreno cedido pela<br />

Constituição oligárquica e ultra-federativa de 1891.<br />

No seu artigo 20, ao delimitar os bens <strong>da</strong> União, procede a uma ampliação de<br />

sua abrangência, incorporando parte <strong>da</strong>s terras devolutas que até então tinham sido<br />

transferi<strong>da</strong>s ao domínio dos Estados, incorporando-as aos bens <strong>da</strong> União; e no artigo<br />

166 amplia a faixa de fronteira para cem quilômetros, estabelecendo o parágrafo 3 o<br />

deste artigo, a sua subordinação à regulamentação <strong>da</strong> União e sujeição <strong>da</strong> sua alienação<br />

ao Poder Legislativo, o que limitava a autonomia dos Executivos estaduais. Entretanto<br />

tratava-se, ain<strong>da</strong> assim, de uma modesta incursão neste sentido, o que pode ser um<br />

indicador <strong>da</strong> força que ain<strong>da</strong> mantinham as oligarquias estaduais.<br />

Ao assegurar, no “caput” do art. 113, “a inviolabili<strong>da</strong>de dos direitos<br />

concernentes à liber<strong>da</strong>de, a subsistência, à segurança individual e a proprie<strong>da</strong>de” a<br />

Constituição de 1934 parece confirmar o seu caráter “pós-revolucionário”; entretanto, o<br />

negócios entre vivos.” O que não quer dizer que esse direito seja absolutamente assegurado. Por outro lado, o<br />

registro imobiliário pressupõe alguma fonte anterior de direito: seja a posse legitimável, comprova<strong>da</strong> ou qualquer<br />

outra forma legítima de acesso à proprie<strong>da</strong>de, como as concessões pelo Estado. Nesse sentido, a matrícula do imóvel<br />

e seu respectivo registro apenas dão fé pública, no caso do Registro Torrens, ao título de proprie<strong>da</strong>de caracterizando a<br />

oponibili<strong>da</strong>de ‘erga omnes’. Nesse mesmo sentido, o registro comum de imóveis não trás no seu bojo, senão<br />

segurança relativa, porque assegura apenas a presunção de direito, podendo tal presunção ser desfeita quando, por<br />

exemplo, há defeito na cadeia dominial. Trata-se, portanto de uma presunção “juris tantum" (Cf. Paulo Tormin<br />

Borges, “O imóvel rural e seus problemas jurídicos”, Ed. Saraiva, 1981: 102). Também porque “se quem<br />

transmitiu não era dono, a transcrição também não transmite, porque o título não tem vali<strong>da</strong>de<br />

jurídica”, como afirma Nascimento (Id. Ibdem).<br />

258 Edilson Martins dá um excelente exemplo de situações como esta ao citar o seguinte depoimento de um posseiro<br />

<strong>da</strong> Região do Araguaia: “(...) Quando aqui cheguei tinha minha terra. E quem não tinha? Terra nessas<br />

ban<strong>da</strong>s nunca teve dono, os donos chegaram depois, havia roça, criava umas cabeças de gado e até<br />

bode.(...) Um dia apareceu os donos <strong>da</strong> minha terra, e não é que tentei resistir? E não é que me dei<br />

mal? Não é que tive de fugir depois de estrepar um filho <strong>da</strong> puta, o primeiro na minha vi<strong>da</strong>, na ponta de<br />

um punhal? Uma desgraça !”. (MARTINS, E. op. cit., p. 142. Grifos nossos).<br />

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