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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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março de 1913 e 10.320 de 7 de julho do mesmo ano; revoga<strong>da</strong>s<br />

as disposições em contrário.”<br />

É, no mínimo curiosa, a coincidência dos termos deste decreto de 1915, com a<br />

“Resolução 249 de Consulta <strong>da</strong> Mesa do Desembargo do Paço”, de 17 de julho de 1822,<br />

que suspendia a concessão de sesmarias até a convocação <strong>da</strong> Assembléia Geral<br />

Constituinte. No caso <strong>da</strong> Resolução n o 76/1822 abriu-se, como foi visto no capítulo 2,<br />

vinte e oito anos de “império <strong>da</strong>s posses”, período no qual o latifúndio avançou de<br />

forma célere, incorporando as terras devolutas do Império, consoli<strong>da</strong>ndo-se<br />

definitivamente na estrutura agrária brasileira 250 , para nunca mais perder este espaço e a<br />

posição política e econômica a ele inerentes.<br />

O Decreto de 1915, de forma semelhante à Resolução de 1822, reporta-se à<br />

“nova lei de terras” que seria submeti<strong>da</strong> ao voto do Congresso Nacional. Esta lei, apenas<br />

será vota<strong>da</strong> em 1946, portanto, trinta e um anos depois 251 , constituindo-se no Decretolei<br />

9.760, de 5 de setembro <strong>da</strong>quele ano. Neste período, como nos 28 anos do “império<br />

<strong>da</strong>s posses”, o Governo Federal virtualmente retira-se <strong>da</strong>s disputas pelas terras<br />

devolutas, deixando-as, neste novo “novo império do latifúndio”, sob a guar<strong>da</strong> <strong>da</strong>s<br />

oligarquias regionais arraiga<strong>da</strong>s fortemente nos Estados; com a agravante de que, neste<br />

caso, os direitos de gestão sobre as terras devolutas do País estavam, juridicamente,<br />

assegurados e nas mãos <strong>da</strong>s oligarquias estaduais. Este fato facilitou o avanço <strong>da</strong><br />

legitimação formal <strong>da</strong> ação privilegia<strong>da</strong> sobre a apropriação e alienação de terras<br />

devolutas, especialmente no que se referia ao acesso às terras no âmbito dos Estados <strong>da</strong><br />

Federação.<br />

A esse respeito, assim se pronunciou Ol<strong>da</strong>ir Zanatta em Depoimento à<br />

Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a Política de Incentivos Fiscais <strong>da</strong> Amazônia:<br />

“A experiência no trato <strong>da</strong>s terras públicas tem demonstrado que<br />

uma significativa parte dos Estados, não soube <strong>da</strong>r a devi<strong>da</strong><br />

destinação às terras devolutas incorpora<strong>da</strong>s ao seu patrimônio.<br />

Alguns conduziram-nas com próprios federais, com próprios<br />

estaduais e até com terrenos de marinha. Outros titularam a<br />

mesma área mais de uma vez, havendo também diversos casos<br />

de alienação por um Estado de terras devolutas pertencentes a<br />

outro.(...) Mudou também de modo substancial, a sistemática de<br />

alienações de terras públicas: o que antes era para ser<br />

regularizado em função de mora<strong>da</strong> habitual e exploração<br />

efetiva, deu lugar aos processos de aquisição de terras<br />

mediante requerimento.” 252<br />

249 Ver, Resolução 76 de Consulta <strong>da</strong> Mesa do Desembargo do Paço de 17.07.1822 (In.: MEAF, Op. cit., p. 356).<br />

250 Ver capítulos 1 e 2 deste estudo.<br />

251 Apenas à guisa de curiosi<strong>da</strong>de, entre 1850 (ou 1854) e 1964, portanto, aproxima<strong>da</strong>mente 100 a 110 anos de<br />

história agrária do Brasil, somando-se os 28 anos do “império <strong>da</strong>s posses” (1822-1850) aos 31 anos do “novo império<br />

do latifúndio” (1915 a 1946), tem-se que, neste período de 110 anos, durante 60 anos as terras públicas foram<br />

saquea<strong>da</strong>s ilegal e ilegitimamente pela grilagem especializa<strong>da</strong>, passado a se constituírem nas “grandes proprie<strong>da</strong>des”<br />

hoje conheci<strong>da</strong>s.<br />

252 CPI dos Incentivos Fiscais <strong>da</strong> Amazônia (op. cit. pp. 3 - 4. Grifos e sublinhados nossos).<br />

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