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Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

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Por um lado, a adequação 227 entre as legislações dos Estados e a Federal,<br />

pressuposta na Constituição Federal, como se observou, era frágil e, por outro lado,<br />

gozando os Estados de autonomia sobre seus territórios, dificilmente a União poderia<br />

impor, mesmo que o desejasse, exigências legais no campo <strong>da</strong> política fundiária.<br />

Efetivamente, portanto, a União procurará ater-se, em última análise, às terras de seu<br />

domínio e, apenas em situações especiais, entrará em disputas e contenciosos com os<br />

Estados, sobretudo quando as questões sobre terras envolverem retornos tributários<br />

relevantes para o orçamento <strong>da</strong> União. Nunca os contenciosos têm por referência a<br />

defesa de direitos sobre as posses, sobretudo quando se tratam de pequenos ocupantes,<br />

como no caso do Oeste do Paraná, do Mato Grosso e, mais recentemente, do Pará 228 .<br />

Após o Decreto 451-B, já analisado, outra tentativa de regulamentação federal<br />

sobre as terras devolutas vai aparecer, indiretamente, no Decreto 2.453-A de 5 de<br />

janeiro de 1912. Diz-se indiretamente posto que este Decreto reportava-se de forma<br />

particular ao incentivo <strong>da</strong> produção do látex, na conjuntura de crise que se apresentava<br />

para a produção e exportação nacional <strong>da</strong> borracha sob o impacto <strong>da</strong> concorrência<br />

britânica; e para uma específica política de colonização e integração <strong>da</strong> Amazônia à<br />

economia nacional. Como observa Edilson Martins 229 ,<br />

“De 1870 a 1912 o Brasil torna-se o maior exportador mundial de<br />

borracha, chegando a contribuir com 100% de to<strong>da</strong> a produção do<br />

mercado internacional. Os ingleses, cuja tradição colonialista<br />

nunca foi posta em dúvi<strong>da</strong>, contrabandearam no final do século<br />

XIX 70 mil mu<strong>da</strong>s de seringa de nosso país, e racionalizaram o<br />

cultivo em suas colônias asiáticas(...).”<br />

O Decreto 2.453-A, de 5 de janeiro de 1912, como será visto, destina-se<br />

especificamente ao incentivo à produção do látex, e, mais que isto, a uma determina<strong>da</strong><br />

política de colonização e ocupação <strong>da</strong> Amazônia, indicando medi<strong>da</strong>s objetivas para a<br />

implantação de um amplo programa de desenvolvimento, que envolvia a construção de<br />

infra-estrutura ferroviária e outras ações específicas, na área <strong>da</strong> de colonização, <strong>da</strong><br />

concessão de terras para a instalação de colônias agrícolas e de grandes empresas<br />

agropecuárias e de pesqueiras, envolvendo inclusive, a instalação de estruturas para<br />

227 É pressuposto do ordenamento jurídico federativo que as legislações ordinárias, inclusive as Constituições<br />

estaduais, não podem ferir preceitos estabelecidos na Constituição Federal. Nesse sentido, to<strong>da</strong>s as Leis de Terras dos<br />

Estados, por definição não poderão ferir os preceitos constitucionais. Como se verá, será exatamente através <strong>da</strong><br />

argüição destes preceitos constitucionais que a União procurará redefinir a sua autonomia sobre boa parte <strong>da</strong>s terras<br />

devolutas estaduais, ampliando a abrangência dos seus bens. Por outro lado, como é igualmente preceito<br />

constitucional o respeito “aos direitos adquiridos, o ato jurídico, à coisa julga<strong>da</strong>”, assegurados em to<strong>da</strong>s as<br />

Constituições brasileiras. Assim, as situações anteriormente consoli<strong>da</strong><strong>da</strong>s - mais uma vez o “fato consumado”,<br />

dificilmente podem ser reverti<strong>da</strong>s. Isso faz com que os contenciosos sobre as terras devolutas prolonguem-se<br />

indefini<strong>da</strong>mente, acabando por assegurar privilégios e, sobretudo atos ilegítimos, como se verá neste trabalho.<br />

Apenas a Constituição de 1967 (após a Emen<strong>da</strong> Constitucional n o 1, de 1969. BRASIL. Presidência <strong>da</strong> República.<br />

Brasília: 1969) embora assegurando aqueles princípios (art. 153), e provavelmente em face do “estado de<br />

exceção” em que vigorava, interferiu efetivamente nessa questão como será visto em lugar próprio deste estudo.<br />

228 Há uma vasta literatura a respeito dessas questões. Ver em especial FOWERAKER (op. cit.); MEDEIROS,<br />

(1989) e FACÓ (op. cit.).<br />

229 MARTINS, E . 1982., p. 24.<br />

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