19.03.2015 Views

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

Alberto da Silva Jones O MITO DA LEGALIDADE DO LATIFÚNDIO ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

seria posta em prática pela Lei de Terras de 1850, sendo regulamenta<strong>da</strong>, somente em<br />

1854. Entretanto, o seu instrumento operativo mais importante, que seria a demarcação<br />

e o registro <strong>da</strong>s terras possuí<strong>da</strong>s e a discriminação e arreca<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s terras devolutas,<br />

que deveriam ficar sob o controle do Estado, fracassou de forma contundente.<br />

Este fracasso <strong>da</strong> Política Fundiária do Império, tenta<strong>da</strong> após a consoli<strong>da</strong>ção do<br />

Estado independente, na déca<strong>da</strong> de 1840, e formaliza<strong>da</strong> juridicamente pela Lei 601 de<br />

1850, foi apenas o primeiro.<br />

O controle efetivo <strong>da</strong>s terras devolutas brasileiras, que formalmente permanecia<br />

nas mãos do Estado, desde o “império <strong>da</strong>s posses” e, sobretudo, no período regencial,<br />

tinha passado, de fato, às mãos do latifúndio, <strong>da</strong>s oligarquias locais e dos especuladores<br />

imobiliários que, já na segun<strong>da</strong> metade do século XIX, com a valorização <strong>da</strong>s terras,<br />

sobretudo pela expansão <strong>da</strong> cafeicultura, começaram a se organizar em empresas de<br />

imigração e colonização.<br />

Pode-se dizer que o controle sobre as terras era exercido por duas vias: 1. “De<br />

fato”, isto é, à margem <strong>da</strong>s normas juridicamente instituí<strong>da</strong>s - direta e imediatamente, ao<br />

nível local, pela força e autori<strong>da</strong>de priva<strong>da</strong>s dos latifundiários: sobretudo quando os<br />

conflitos não se publicizavam e quando as disputas pela terra, se estabeleciam contra<br />

pequenos posseiros e indígenas. 2. “De direito”, isto é, fun<strong>da</strong>do, pelo menos<br />

formalmente, nas normas juridicamente sanciona<strong>da</strong>s. Neste caso, o controle era<br />

exercido de forma mediata e institucional, pela via administrativa ou judicial. Sofria este<br />

processo, geralmente, a influência, ou mediação, dos representantes dos interesses<br />

latifundiários, quer fosse no Parlamento e no Executivo, quer fosse, em última instância,<br />

no próprio Judiciário que, localmente, sempre sofreu a forte influência, quando não a<br />

pressão direta, e nem sempre discreta 178 , <strong>da</strong>s oligarquias, geralmente incrusta<strong>da</strong>s nas<br />

burocracias <strong>da</strong> Administração Pública, sobremaneira poderosas ao nível local. Isso não<br />

quer significar, linearmente, que as oligarquias dispusessem <strong>da</strong> plena direção e controle<br />

do aparelho administrativo do Estado, mas que, as medi<strong>da</strong>s adota<strong>da</strong>s, política,<br />

administrativa e judicialmente, raramente feriam os seus interesses, muito<br />

particularmente quando se tratavam de temas referentes a apropriação de terras<br />

antes do século XIX.” Nessa conjuntura, segundo Passos Guimarães, e neste sentido concor<strong>da</strong>-se aqui com a sua<br />

argumentação, “a aristocracia rural portuguesa, no Brasil colonial, e a ‘nobreza’ rural brasileira, logo depois<br />

<strong>da</strong> independência, não precisavam recorrer a esses artifícios do sistema mercantil, porque no seu tempo<br />

a terra era ain<strong>da</strong> um privilégio (...) e não uma mercadoria. Bastava impedir, por meios jurídicos, as<br />

doações e, por meios violentos, as ocupações, àqueles que, ao arbítrio dos grandes senhores<br />

dominantes na Metrópole ou no Estado nacional nascente, não possuíssem dotes de nobreza ou<br />

fartura de dinheiro para merecer sesmarias.” (Id. Ibidem, p. 111).<br />

178 A influência <strong>da</strong>s oligarquias, sobretudo ao nível local, é expressa nos seguintes termos por Raymundo Faoro: “O<br />

coronel tem capangas, elementos sem vontade própria, como os têm os subcoronéis (...). Em regra o<br />

compadrio une os aderentes ao chefe, enquanto goza <strong>da</strong> confiança do grupo dirigente estadual e<br />

enquanto presta favores, com o domínio do mecanismo policial, muitas vezes do promotor público, não<br />

raro expresso na boa vontade do juiz de direito. As autori<strong>da</strong>des estaduais - inclusive o promotor<br />

público e o juiz de direito - são removi<strong>da</strong>s, se em conflito com o coronel. Até a supressão <strong>da</strong><br />

comarca, seu desmembramento, elevação <strong>da</strong> entrância são expedientes hábeis para arre<strong>da</strong>r a<br />

autori<strong>da</strong>de incômo<strong>da</strong>.” (FAORO, op. cit. p. 632. Negritos nossos).<br />

103

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!