A diversidade sexual na escola: produção de subjetividade e ...

A diversidade sexual na escola: produção de subjetividade e ... A diversidade sexual na escola: produção de subjetividade e ...

20.02.2015 Views

65 5 A INSERÇÃO NO CAMPO O interesse em problematizar 5 as normas de gênero e sexualidade me levou 6 a participar como bolsista de iniciação científica, em 2006, e como mestranda, a partir de 2007 da pesquisa: O/A educador/a e a Diversidade Sexual, coordenada pelo professor Henrique Caetano Nardi. Esta pesquisa, que se encontra em sua fase final, se associou ao projeto Educando para a Diversidade coordenado pela ong Nuances em parceria com as Secretaria Municipal da Educação de Porto Alegre, a Secretaria da Educação do estado do Rio Grande do Sul e conta com a colaboração do programa de Pós Graduação em Psicologia Social. Este projeto, financiado pelo governo federal dentro das políticas implementadas pelo Programa Brasil Sem Homofobia, propõe a formação continuada para professores/as da rede pública visando à qualificação para o trabalho com a diversidade sexual na escola. Em Porto Alegre, como relatamos no capítulo anterior, dois projetos tiveram suas propostas de intervenção aprovadas nos editais do PBSH, o Educando para a diversidade, da ong nuances e o projeto da ong Somos: “Desconstruindo preconceitos, construindo identidades”, que iniciaram em 2006. Participei como aluna da primeira edição do Educando para a Diversidade em 2006 e na sua segunda edição (neste mesmo ano) minha participação foi como observadora dentro de minha participação na pesquisa, após, já como estudante de mestrado, acompanhei as duas outras edições de 2007 e 2008. 5 Para Robert Castel, problematizar é colocar em evidência “a existência de um feixe unificado de questões (cujas características comuns devem ser definidas) e que emergem em um determinado momento (que é preciso datar), que se reformularam várias vezes através de crises, integrando dados novos (é necessário periodizar essas transformações) e que ainda hoje estão vivas.” (Castel, 1998, p. 29). Para Michel Foucault (1994), problematizar é refletir sobre o conjunto de práticas discursivas que fazem algo entrar no jogo do verdadeiro e do falso e que o constitui em objeto para o pensamento (que seja sob a forma de uma reflexão moral, do conhecimento científico, de análise política, etc.). 6 Nesta escrita vou utilizar dois modos de apresentação, até então foi utilizada a primeira pessoa do plural: nós, trazendo toda a carga da experiência compartilhada com os/as teóricos, orientador e professores/as. Na apresentação do campo assumo a primeira pessoa como a melhor forma de relatar esta experiência que é atravessada por minhas marcas escolares, de gênero, de geração, etc.

66 O contato com a proposta da ong Somos, por sua vez, aconteceu acompanhando um módulo da capacitação realizado em 2007. Os coordenadores da formação proposta pela ong Somos, cientes da minha intenção de pesquisa permitiram que eu acompanhasse o último módulo da formação onde, segundo a dinâmica utilizada, os pequenos grupos que vinham trabalhando separadamente se reuniam para trabalhar conjuntamente os últimos conteúdos, consistindo de um módulo mais teórico se diferenciando da dinâmica dos anteriores que funcionaram nos moldes de oficinas. Eles também me colocaram em contato com a supervisora pedagógica Nádia 7 , pois na sua escola estava acontecendo um projeto de intervenção abordando a homofobia. A equipe diretiva desta escola havia convidado os coordenadores da capacitação para fazerem um trabalho com os/as alunos/as de oitava série. A participação na formação do Educando e do Desconstruindo propiciou um contato com as experiências do cotidiano das/as educadores/as, seus relatos, suas dificuldades. Nas conversas informais nos intervalos, nos comentários foi se descortinando para mim uma vivência que eu sentia muito complexa. A educação como prática e campo de estudo se revelava um universo permeado de teorias e disputas que por vezes pareciam incompreensíveis, me vi afogada em siglas: NASCA, GGM, B30, T20, FICAI, etc. Os/as profissionais da educação me pareciam muito queixosos, sempre surgiam colocações de estarem sobrecarregados: “sobrou tudo para a escola”. E afirmações que faltava estrutura para as escolas, tinham muitas turmas para atender, a qualidade do serviço estava comprometida por falta de investimentos públicos. A primeira impressão foi a de que imperava certo descrédito em mudanças, se reapresentavam afirmações como: “é um trabalho de formiguinha”, “se luta contra a corrente”. Ao mesmo tempo percebi a grande importância dada para as qualificações e a formação continuada, o/a professor/a é um profissional sempre “se atualizando”. A escola tem investido em especialistas e propostas de formação destes/as profissionais se reapresentam, um argumento sempre presente é a necessidade de qualificação na área da sexualidade: “É preciso se informar, saber do que se fala, para não falar 7 Com a finalidade de preservar o sigilo, o nome das pessoas envolvidas na pesquisa, aqui mencionados, foram substituídos por nomes fictícios.

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O contato com a proposta da ong Somos, por sua vez, aconteceu<br />

acompanhando um módulo da capacitação realizado em 2007. Os coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dores da<br />

formação proposta pela ong Somos, cientes da minha intenção <strong>de</strong> pesquisa permitiram<br />

que eu acompanhasse o último módulo da formação on<strong>de</strong>, segundo a dinâmica<br />

utilizada, os pequenos grupos que vinham trabalhando separadamente se reuniam para<br />

trabalhar conjuntamente os últimos conteúdos, consistindo <strong>de</strong> um módulo mais teórico<br />

se diferenciando da dinâmica dos anteriores que funcio<strong>na</strong>ram nos mol<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ofici<strong>na</strong>s.<br />

Eles também me colocaram em contato com a supervisora pedagógica Nádia 7 , pois <strong>na</strong><br />

sua <strong>escola</strong> estava acontecendo um projeto <strong>de</strong> intervenção abordando a homofobia. A<br />

equipe diretiva <strong>de</strong>sta <strong>escola</strong> havia convidado os coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dores da capacitação para<br />

fazerem um trabalho com os/as alunos/as <strong>de</strong> oitava série.<br />

A participação <strong>na</strong> formação do Educando e do Desconstruindo propiciou um<br />

contato com as experiências do cotidiano das/as educadores/as, seus relatos, suas<br />

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<strong>de</strong>scorti<strong>na</strong>ndo para mim uma vivência que eu sentia muito complexa. A educação como<br />

prática e campo <strong>de</strong> estudo se revelava um universo permeado <strong>de</strong> teorias e disputas<br />

que por vezes pareciam incompreensíveis, me vi afogada em siglas: NASCA, GGM,<br />

B30, T20, FICAI, etc.<br />

Os/as profissio<strong>na</strong>is da educação me pareciam muito queixosos, sempre surgiam<br />

colocações <strong>de</strong> estarem sobrecarregados: “sobrou tudo para a <strong>escola</strong>”. E afirmações<br />

que faltava estrutura para as <strong>escola</strong>s, tinham muitas turmas para aten<strong>de</strong>r, a qualida<strong>de</strong><br />

do serviço estava comprometida por falta <strong>de</strong> investimentos públicos. A primeira<br />

impressão foi a <strong>de</strong> que imperava certo <strong>de</strong>scrédito em mudanças, se reapresentavam<br />

afirmações como: “é um trabalho <strong>de</strong> formiguinha”, “se luta contra a corrente”. Ao<br />

mesmo tempo percebi a gran<strong>de</strong> importância dada para as qualificações e a formação<br />

continuada, o/a professor/a é um profissio<strong>na</strong>l sempre “se atualizando”. A <strong>escola</strong> tem<br />

investido em especialistas e propostas <strong>de</strong> formação <strong>de</strong>stes/as profissio<strong>na</strong>is se<br />

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