A diversidade sexual na escola: produção de subjetividade e ...
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117 Neste aparecem com freqüência posicionamentos que colocam uma concepção negativa ao que é associado a uma cultura popular. Essas interpretações baseadas em esquemas dualistas, apresentam-se ordenadas no que se refere a nós, à nossa cultura, e outra que se refere a eles, à cultura deles. Esta relação, na educação, tem sido constituída através dos modelos higienista e das idéias eugenistas que colocam as perversões relacionadas a degenerescência das camadas pobres e não-brancas da população. A psiquiatria, mais a jurisprudência, a medicina legal, as instâncias do controle social, a vigilância das crianças perigosas, ou em perigo, funcionaram durante muito tempo ‘pela degenerescência’, pelo sistema de hereditariedade-perversão. Toda uma prática social, cuja forma ao mesmo tempo exagerada e coerente foi o racismo de Estado, deu a essa tecnologia do sexo um poder terrível e longínquos efeitos. (FOUCAULT, 1997, p. 112) A teoria da degenerescência 25 das raças, segundo Foucault, relaciona-se com uma sexualidade devassa, pervertida, “que tem efeitos sobre o plano da população, uma vez que se supõe que aquele que foi devasso sexualmente tem uma hereditariedade, uma descendência que, ela também, vai ser perturbada, e isso durante gerações e gerações...” (2002, p. 301). Tal teoria influenciou sobremaneira as práticas higiênicas e eugênicas resultando em uma série de livros e estudos científicos publicados na década de 1920, inclusive no Brasil. Na época eram muito presentes os enunciados que estabeleciam relações entre eugenia/saneamento, higiene/educação. Uma mudança no discurso racista, aliviando o tom autoritário e passando a utilizar a argumentação do pensamento eugenista/higienista. Neste sentido a educação estava ligada ao projeto civilizatório ocidental, pois para os médicos eugenistas/higienistas era necessário formar o homem, dominando a natureza na qual se encontrava inscrito e domando a sua própria natureza. A idéia de regeneração do povo brasileiro através da educação em uma escola higiênica diz respeito à influência das "teorias" raciais no pensamento médico a partir de 1870. Essas "teorias" (darwinismo social e evolucionismo) procuravam explicar as desigualdades sociais como desigualdades 25 Foucault, no curso Em Defesa da Sociedade se refere à teoria da degenerescência, surgida na França, em meados do século XIX, formulada por Morel e outros, que se constituiu como um núcleo do saber médico sobre a loucura e a anormalidade e teve muitos efeitos sobre as doutrinas e as práticas eugênicas e influenciou toda uma literatura, toda uma criminologia e toda uma antropologia. (1999, p. 301)
118 naturais, decorrentes de diferenças biológicas entre as raças, estas idéias se instalarem no Brasil com características próprias. Foucault menciona o racismo quando se refere ao poder com domínio sobre a vida, fazendo a escolha entre quem deve viver e quem deve morrer. A qualificação de certas raças como boas e de outras ao contrário, como inferiores, é uma maneira de diminuir alguns grupos perante outros em uma população, atribuindo a um determinado “tipo biológico” o domínio sobre os demais. Tal pensamento permite ao poder tratar uma população como uma mistura de raças, ou ainda, subdividir a espécie. Foucault diz que essa é uma das funções do racismo, ou seja, “fragmentar, fazer cesuras no interior desse contínuo biológico a que se dirige o biopoder.” (1999, p. 304)) A intervenção dos médicos, enquanto especialistas desempenhando uma função de controladores das famílias e de todo corpo social, é explicado pelo conceito de biopoder que já apresentamos, mas que cabe retomar aqui. Foucault o define como o exercício de poder sobre a vida dos indivíduos e da população, regulando-a, gerindo-a e controlando-a individualmente ou em conjunto. (...) técnicas de poder presentes em todos os níveis do corpo social e utilizadas por instituições bem diversas (a família, o exército, a escola, a polícia, a medicina individual ou a administração das coletividades) agiram no nível dos processos econômicos, do seu desenrolar, das forças que estão em ação em tais processos que os sustentam; operaram, também, como fatores de segregação e de hierarquização social, agindo sobre as forças respectivas tanto de uns quanto de outros, garantindo relações de dominação e efeitos de hegemonia. (FOUCAULT, 1997, p. 132) Esta divisão social se ancora em uma “patologização” da pobreza, uma forma medicalizada e psicologizada de compreensão da sexualidade que se constrói a partir de um binômio de um pólo pobre e promíscuo e outro educado e normal. Como coloca Henrique Nardi: Os efeitos da patologização da pobreza podem ser compreendidos a partir da individualização da questão da sexualidade no contexto da escola; ou seja, existe um paralelismo entre pobreza e patologia e, como a “doença” se materializa no indivíduo (mesmo que a pobreza seja entendida como da ordem do social), a ação das escolas se resume a entender os “casos” problemáticos de alunos e alunas marcados por uma suposta “hipersexualização do comportamento. (Henrique Nardi, 2008, p. 6) Ou seja, trata-se da constituição/permanência de um discurso medicalizado/psicologizado sobre a educação que vai ser aprofundado e concretizado em teorias e ações ao longo do século XX. Os dispositivos de produção de sujeitos
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<strong>na</strong>turais, <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> diferenças biológicas entre as raças, estas idéias se instalarem<br />
no Brasil com características próprias.<br />
Foucault mencio<strong>na</strong> o racismo quando se refere ao po<strong>de</strong>r com domínio sobre a<br />
vida, fazendo a escolha entre quem <strong>de</strong>ve viver e quem <strong>de</strong>ve morrer. A qualificação <strong>de</strong><br />
certas raças como boas e <strong>de</strong> outras ao contrário, como inferiores, é uma maneira <strong>de</strong><br />
diminuir alguns grupos perante outros em uma população, atribuindo a um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do<br />
“tipo biológico” o domínio sobre os <strong>de</strong>mais. Tal pensamento permite ao po<strong>de</strong>r tratar uma<br />
população como uma mistura <strong>de</strong> raças, ou ainda, subdividir a espécie. Foucault diz que<br />
essa é uma das funções do racismo, ou seja, “fragmentar, fazer cesuras no interior<br />
<strong>de</strong>sse contínuo biológico a que se dirige o biopo<strong>de</strong>r.” (1999, p. 304))<br />
A intervenção dos médicos, enquanto especialistas <strong>de</strong>sempenhando uma função<br />
<strong>de</strong> controladores das famílias e <strong>de</strong> todo corpo social, é explicado pelo conceito <strong>de</strong><br />
biopo<strong>de</strong>r que já apresentamos, mas que cabe retomar aqui. Foucault o <strong>de</strong>fine como o<br />
exercício <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r sobre a vida dos indivíduos e da população, regulando-a, gerindo-a<br />
e controlando-a individualmente ou em conjunto.<br />
(...) técnicas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r presentes em todos os níveis do corpo social e utilizadas por<br />
instituições bem diversas (a família, o exército, a <strong>escola</strong>, a polícia, a medici<strong>na</strong> individual ou a<br />
administração das coletivida<strong>de</strong>s) agiram no nível dos processos econômicos, do seu<br />
<strong>de</strong>senrolar, das forças que estão em ação em tais processos que os sustentam; operaram,<br />
também, como fatores <strong>de</strong> segregação e <strong>de</strong> hierarquização social, agindo sobre as forças<br />
respectivas tanto <strong>de</strong> uns quanto <strong>de</strong> outros, garantindo relações <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>ção e efeitos <strong>de</strong><br />
hegemonia. (FOUCAULT, 1997, p. 132)<br />
Esta divisão social se ancora em uma “patologização” da pobreza, uma forma<br />
medicalizada e psicologizada <strong>de</strong> compreensão da <strong>sexual</strong>ida<strong>de</strong> que se constrói a partir<br />
<strong>de</strong> um binômio <strong>de</strong> um pólo pobre e promíscuo e outro educado e normal. Como coloca<br />
Henrique Nardi:<br />
Os efeitos da patologização da pobreza po<strong>de</strong>m ser compreendidos a partir da<br />
individualização da questão da <strong>sexual</strong>ida<strong>de</strong> no contexto da <strong>escola</strong>; ou seja, existe um<br />
paralelismo entre pobreza e patologia e, como a “doença” se materializa no indivíduo<br />
(mesmo que a pobreza seja entendida como da or<strong>de</strong>m do social), a ação das <strong>escola</strong>s se<br />
resume a enten<strong>de</strong>r os “casos” problemáticos <strong>de</strong> alunos e alu<strong>na</strong>s marcados por uma suposta<br />
“hiper<strong>sexual</strong>ização do comportamento. (Henrique Nardi, 2008, p. 6)<br />
Ou seja, trata-se da constituição/permanência <strong>de</strong> um discurso<br />
medicalizado/psicologizado sobre a educação que vai ser aprofundado e concretizado<br />
em teorias e ações ao longo do século XX. Os dispositivos <strong>de</strong> <strong>produção</strong> <strong>de</strong> sujeitos