A diversidade sexual na escola: produção de subjetividade e ...
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115 comunidade já falaram que as professoras tem que apanhar na cara.” “Mas gente, não se preocupem, isso sempre se diz, mãe entra aqui dizendo que vai bater, fazer e acontecer e nunca acontece nada. Só gritam...” O tom com que se fala das mães geralmente é de conflito, não percebi sinais de parceria. “Qualquer coisa a gente leva para o DECA, que lá elas entram de rabo entre as pernas, aqui na escola as mães entram gritando que vão dar nas professoras e lá ficam quietinhas.” 7.7 - A patologização da pobreza Podemos perceber na escola a emergência de enunciados que naturalizam a diminuição do valor da vida com a pobreza, emerge aí uma hierarquia das vidas quanto ao investimento na construção de si. A vida do outro é percebida como menos importante. “Eu acho que nesse meio aqui, de camada mais popular, acho que eles lidam de uma maneira muito melhor com a sexualidade do que classe média, classe média alta, e outros níveis de escola. Eu acho que até assim ó, acho que até eles até banalizam mais Por que eles não tem aquele desespero que a gente teria no caso de uma gravidez de uma adolescente, eles lidam muito bem com a gravidez na adolescência, isso é o que me parece, estou falando pelo meu conhecimento, eles lidam muito bem, eu não vejo nenhuma mãe desesperada porque sua filha adolescente engravidou, eu não vejo ninguém desesperado porque tá com aids, entende, e a gente atende uma demanda grande aqui de pessoas com aids, mas eu não vejo ninguém em desespero: tô com aids o que será de mim? Eu não vejo ninguém desesperado porque seu filho é homossexual e fez uma escolha assim, eu vou dizer que não...eles têm uma forma diferenciada, talvez até pela cultura, pelo meio, eles têm uma forma diferenciada de tratar com as questões da sexualidade, pelo menos da nossa que é uma vida levada de uma maneira muito forte, para essas coisas. Eles lidam de forma leve com essas questões, isso não bate forte, como bate para nós, não bate, eles não trabalham com a mesma lógica que nós em relação a isso, sentimento não tem a mesma batida que teria para nós. Não sei se isso tem a ver com as questões culturais, eu acredito que sim, se isso também tem muito a ver com o meio, porque eu não te diria que o meio é promíscuo, mas é um meio que proporciona uma maior liberdade nessas questões sexuais. Que o meio... assim, é visto com muita normalidade uma aluna nossa começar a transar aos 10, 11 anos de idade. O abuso sexual não é visto com a gravidade que pra nós é visto e trabalhado e... sabe. Fica tudo no âmbito, me parece de uma coisa muito, tudo muito banalizado. Acho que na hora eles até sofrem um certo impacto com estas questões, mas isso logo se resolve, logo se acomoda, eu te diria, e isso não é um pai nem dois, é usual na vila isso é sentimento, a gente percebe esse sentimento.” ( Sonia - orientadora educacional)
116 Pode-se pensar que a condição de classe pode ser um diferenciador na percepção dos indivíduos em termos das suas experiências em torno de gênero, raça, sexualidade, como parte na constituição de sua subjetividade, porém, estas diferenças têm sido tratadas, no cotidiano escolar, de modo a estabelecer uma escala de valores, onde a lógica que se mantém naturalizada é de um discurso polarizado e moralizado. O discurso das/os professoras/es, com freqüência, responsabiliza "o meio" onde as crianças vivem por seus comportamentos "desviantes": agressivos, desinteressados, "sem-educação", sem objetivos, “vileiras”, etc. Os/as educadores/as reproduzem determinados enunciados que afirmam e estabelecem relações de poder enquanto rejeitam outros produzindo processos de naturalização da diferença. Enunciados homofóbicos ou sexistas estão profundamente articulados com aqueles de discriminação de classe, assim, diferentes desigualdades se sobrepõem e se reforçam. Em torno deste referencial constrói-se um universo de diferenças e lugares desvalorizados, de sub-cidadãos. “A gente tem, não sei, eu agora falo por mim tenho muito nítido que nós temos dentro da escola dois mundos, que é o mundo dos nossos, da nossa formação cultural, moral, de princípios e tal, e que eles vivem num mundo num universo diferente da gente né, que eles tem outros princípios de valor, outras coisas que para eles são fundamentais, pesa muito mais para eles, eles choram muito mais aqui conosco por questões de alimentação do que por um filho que engravidou na adolescência, então para eles é muito mais importante as estruturas básicas da vida cotidiana, que tu crie tuas questões fundamentais da tua vida cotidiana lá, de alimentação, de moradia, de teto de... sabe, isso é um valor muito maior para eles. O alimento é fundamental, a questão da locomoção...”(Sonia - orientadora educacional) No campo da educação uma diferença, vista como resistente, das classes populares tem sido percebida como uma dificuldade para o processo educativo. Uma grande interpretação moderna centrou-se na ignorância daqueles que não tinham condições de compreender o sentido dos novos valores da modernidade e supôs, dentro da visão de mundo evolucionista, que haveria uma mudança gradual, uma incorporação das verdades do progresso. Os enunciados atuais na educação não deixam de lado totalmente esse modelo e convivem com aqueles que afirmam o interesse e valorização da diferença, porém estas explicações de mundo não desapareceram e convivem às vezes sem contradições aparentes no cotidiano escolar.
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comunida<strong>de</strong> já falaram que as professoras tem que apanhar <strong>na</strong> cara.” “Mas gente, não<br />
se preocupem, isso sempre se diz, mãe entra aqui dizendo que vai bater, fazer e<br />
acontecer e nunca acontece <strong>na</strong>da. Só gritam...” O tom com que se fala das mães<br />
geralmente é <strong>de</strong> conflito, não percebi si<strong>na</strong>is <strong>de</strong> parceria. “Qualquer coisa a gente leva<br />
para o DECA, que lá elas entram <strong>de</strong> rabo entre as per<strong>na</strong>s, aqui <strong>na</strong> <strong>escola</strong> as mães<br />
entram gritando que vão dar <strong>na</strong>s professoras e lá ficam quietinhas.”<br />
7.7 - A patologização da pobreza<br />
Po<strong>de</strong>mos perceber <strong>na</strong> <strong>escola</strong> a emergência <strong>de</strong> enunciados que <strong>na</strong>turalizam a<br />
diminuição do valor da vida com a pobreza, emerge aí uma hierarquia das vidas quanto<br />
ao investimento <strong>na</strong> construção <strong>de</strong> si. A vida do outro é percebida como menos<br />
importante.<br />
“Eu acho que nesse meio aqui, <strong>de</strong> camada mais popular, acho que eles lidam <strong>de</strong> uma<br />
maneira muito melhor com a <strong>sexual</strong>ida<strong>de</strong> do que classe média, classe média alta, e<br />
outros níveis <strong>de</strong> <strong>escola</strong>. Eu acho que até assim ó, acho que até eles até ba<strong>na</strong>lizam mais<br />
Por que eles não tem aquele <strong>de</strong>sespero que a gente teria no caso <strong>de</strong> uma gravi<strong>de</strong>z <strong>de</strong><br />
uma adolescente, eles lidam muito bem com a gravi<strong>de</strong>z <strong>na</strong> adolescência, isso é o que<br />
me parece, estou falando pelo meu conhecimento, eles lidam muito bem, eu não vejo<br />
nenhuma mãe <strong>de</strong>sesperada porque sua filha adolescente engravidou, eu não vejo<br />
ninguém <strong>de</strong>sesperado porque tá com aids, enten<strong>de</strong>, e a gente aten<strong>de</strong> uma <strong>de</strong>manda<br />
gran<strong>de</strong> aqui <strong>de</strong> pessoas com aids, mas eu não vejo ninguém em <strong>de</strong>sespero: tô com<br />
aids o que será <strong>de</strong> mim? Eu não vejo ninguém <strong>de</strong>sesperado porque seu filho é<br />
homos<strong>sexual</strong> e fez uma escolha assim, eu vou dizer que não...eles têm uma forma<br />
diferenciada, talvez até pela cultura, pelo meio, eles têm uma forma diferenciada <strong>de</strong><br />
tratar com as questões da <strong>sexual</strong>ida<strong>de</strong>, pelo menos da nossa que é uma vida levada <strong>de</strong><br />
uma maneira muito forte, para essas coisas.<br />
Eles lidam <strong>de</strong> forma leve com essas questões, isso não bate forte, como bate para nós,<br />
não bate, eles não trabalham com a mesma lógica que nós em relação a isso,<br />
sentimento não tem a mesma batida que teria para nós. Não sei se isso tem a ver com<br />
as questões culturais, eu acredito que sim, se isso também tem muito a ver com o meio,<br />
porque eu não te diria que o meio é promíscuo, mas é um meio que proporcio<strong>na</strong> uma<br />
maior liberda<strong>de</strong> nessas questões sexuais. Que o meio... assim, é visto com muita<br />
normalida<strong>de</strong> uma alu<strong>na</strong> nossa começar a transar aos 10, 11 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. O abuso<br />
<strong>sexual</strong> não é visto com a gravida<strong>de</strong> que pra nós é visto e trabalhado e... sabe. Fica tudo<br />
no âmbito, me parece <strong>de</strong> uma coisa muito, tudo muito ba<strong>na</strong>lizado. Acho que <strong>na</strong> hora<br />
eles até sofrem um certo impacto com estas questões, mas isso logo se resolve, logo<br />
se acomoda, eu te diria, e isso não é um pai nem dois, é usual <strong>na</strong> vila isso é<br />
sentimento, a gente percebe esse sentimento.” ( Sonia - orientadora educacio<strong>na</strong>l)