Manifestação severa da esclerodermia - ABCCMF
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Manifestação <strong>severa</strong> <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong><br />
RELATO DE CASO<br />
Manifestação <strong>severa</strong> <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong><br />
Severe demonstration of the scleroderma<br />
Cleydson Lucena de Andra<strong>da</strong> Oliveira 1 , Lívia Nolêto de Rezende Oliveira 2 , Ricardo Lopes <strong>da</strong> Cruz 3 ,<br />
André <strong>da</strong> Silveira Braune 4 , Elise Tonomura 5<br />
RESUMO<br />
A esclerose sistêmica é uma doença multissistêmica crônica<br />
de etiologia desconheci<strong>da</strong>, caracteriza<strong>da</strong> clinicamente<br />
por espessamento <strong>da</strong> pele em decorrência do acúmulo de<br />
tecido conjuntivo e por comprometimento dos órgãos viscerais,<br />
incluindo o trato gastrointestinal, os pulmões, o coração<br />
e os rins. As anormali<strong>da</strong>des vasculares, especialmente <strong>da</strong><br />
microvasculatura, constituem um aspecto proeminente <strong>da</strong><br />
<strong>esclerodermia</strong>. O grau e a taxa de comprometimento <strong>da</strong><br />
pele e dos órgãos internos variam entre os pacientes. O<br />
acometimento <strong>da</strong> face inclui uma fronte lisa e sem rugas,<br />
pele retesa<strong>da</strong> sobre o nariz, encolhimento do tecido em<br />
volta <strong>da</strong> boca e sulcos radiais periorais, adelgaçamento dos<br />
lábios e microstomia. O nariz assume um aspecto pinçado<br />
ou semelhante a um bico. A pele acometi<strong>da</strong> fica endureci<strong>da</strong>,<br />
lisa e aderi<strong>da</strong> às estruturas subjacentes, muitas vezes com<br />
hiper e hipopigmentação, sem pêlos, seca e grossa. Embora<br />
a esclerose sistêmica não possa ser cura<strong>da</strong>, o tratamento<br />
dos sistemas orgânicos acometidos pode aliviar os sintomas<br />
e melhorar a função.<br />
SUMMARY<br />
The sclerosis systemic is a disease multisystemic chronic of<br />
unknown etiology, characterized clinically for enlargement of<br />
the skin as a result of the accumulation of subjunctive cloth<br />
and for compromising of the visceral organs, including the<br />
gastrointestinal system, the lungs, heart and the kidneys. The<br />
vascular abnormalities, especially of the microvascularization,<br />
constitute a prominent aspect of the scleroderma. The<br />
degree and the tax of compromising from the skin and from<br />
the internal organs vary among the patients. The attack of<br />
the face includes a smooth forehead and without wrinkles,<br />
skin flexed on the nose, shrinking of the cloth around the<br />
mouth and radial furrows periorals, streightening of the lips<br />
and micromouth. The nose assumes a picked up or similar<br />
aspect to a beak. The attacked skin is hardened, smooth and<br />
joined to the underlying structures, very often with very much<br />
or little pigmentation without hairs, dry and thick. Though<br />
the sclerosis systemic could not be cured, the treatment of<br />
the organic attacked systems can relieve the symptoms and<br />
improve the function.<br />
Descritores: Face/anormali<strong>da</strong>des. Escleroderma<br />
sistêmico. Doenças do tecido conjuntivo.<br />
Descriptors: Face/abnormalities. Scleroderma,<br />
systemic. Connective tissue diseases.<br />
1. Otorrinolaringologista. Fellow de Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial do<br />
Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO).<br />
2. Médica Residente de Otorrinolaringologia do Hospital<br />
Universitário Antônio Pedro HUAP/UFF.<br />
3. Ex-Presidente <strong>da</strong> Associação Brasileira de Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial<br />
(<strong>ABCCMF</strong>); Membro Titular <strong>da</strong> Socie<strong>da</strong>de Brasileira de Cirurgia Plástica<br />
(SBCP) e <strong>da</strong> <strong>ABCCMF</strong>; Chefe do Serviço de Cirurgia Crânio-Maxilo-<br />
Facial do INTO.<br />
4. Médico Preceptor do Serviço de Cirurgia Crânio-Maxilo-Facial do INTO;<br />
Membro Titular <strong>da</strong> SBCP e <strong>da</strong> <strong>ABCCMF</strong>.<br />
5. Médica radiologista do INTO e Profa. Assistente de Radiologia <strong>da</strong><br />
Facul<strong>da</strong>de de Medicina <strong>da</strong> UFRJ.<br />
Correspondência: Cleydson Lucena de Andra<strong>da</strong> Oliveira<br />
Praia de Icaraí, 69, apto.1202, Bloco B – Icaraí – Niterói, RJ, Brasil<br />
CEP 24230-000<br />
E-mail: cleysinho@bol.com.br<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2010; 13(3): 183-6<br />
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Oliveira CLA et al.<br />
INTRODUÇÃO<br />
A esclerose sistêmica é uma doença multissistêmica<br />
crônica de etiologia desconheci<strong>da</strong>, caracteriza<strong>da</strong> clinicamente<br />
por espessamento <strong>da</strong> pele em decorrência do acúmulo<br />
de tecido conjuntivo e por comprometimento dos órgãos<br />
viscerais, incluindo o trato gastrointestinal, os pulmões, o<br />
coração e os rins 1-7 .<br />
As anormali<strong>da</strong>des vasculares, especialmente <strong>da</strong> microvasculatura,<br />
constituem um aspecto proeminente <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong>.<br />
O grau e a taxa de comprometimento <strong>da</strong> pele e<br />
dos órgãos internos variam entre os pacientes.<br />
Dois subgrupos podem ser identificados, apesar <strong>da</strong><br />
existência de alguma superposição. O primeiro desses é<br />
designado como <strong>esclerodermia</strong> cutânea difusa e caracterizase<br />
pelo rápido desenvolvimento de espessamento cutâneo<br />
simétrico <strong>da</strong>s partes proximais e distais dos membros, <strong>da</strong><br />
face e do tronco. Esses pacientes correm mais riscos de<br />
desenvolver doença renal e outra doença visceral no início<br />
<strong>da</strong> evolução. O outro subgrupo, <strong>esclerodermia</strong> cutânea limita<strong>da</strong>,<br />
é definido por espessamento simétrico <strong>da</strong> pele limitado<br />
às partes distais dos membros e <strong>da</strong> face. Com frequência,<br />
esse subgrupo exibe manifestações <strong>da</strong> síndrome CREST,<br />
um acrônimo de calcinose cutânea, fenômeno de Raynaud<br />
(palidez, cianose e hiperemia reativa induzi<strong>da</strong>s pelo frio),<br />
dismotili<strong>da</strong>de do esôfago, esclero<strong>da</strong>ctilia e telangiectasia.<br />
O prognóstico <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong> cutânea limita<strong>da</strong> é<br />
melhor. A <strong>esclerodermia</strong> também pode ocorrer numa forma<br />
localiza<strong>da</strong> limita<strong>da</strong> à pele, ao tecido subcutâneo e ao<br />
músculo, sem comprometimento sistêmico. Também pode<br />
ocorrer comprometimento de órgãos viscerais na ausência<br />
de acometimento cutâneo, sendo conhecido como esclerose<br />
sistêmica sem <strong>esclerodermia</strong>. A <strong>esclerodermia</strong> localiza<strong>da</strong><br />
costuma acometer crianças e adultos jovens.<br />
A esclerose sistêmica possui distribuição mundial,<br />
afeta to<strong>da</strong>s as raças, sua incidência aumenta com a i<strong>da</strong>de,<br />
tornando-se máxima <strong>da</strong> terceira à quinta déca<strong>da</strong>s de vi<strong>da</strong>, o<br />
sexo feminino é três vezes mais acometido que o masculino,<br />
sendo mais frequente e grave em mulheres negras jovens.<br />
As alterações cutâneas <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong> geralmente<br />
surgem nas mãos, pés e face, com episódios de edema sem<br />
cacifo recorrente. A esclerose <strong>da</strong> pele começa na parte<br />
distal dos dedos (esclero<strong>da</strong>ctilia) e se propaga em direção<br />
proximal, geralmente acompanha<strong>da</strong> por reabsorção óssea<br />
<strong>da</strong>s pontas dos dedos, que podem apresentar úlceras em<br />
saca-bocado, cicatrizes estrela<strong>da</strong>s ou áreas de hemorragia.<br />
Os dedos podem realmente encolher e adquirir forma de<br />
salsicha, e como as unhas não são acometi<strong>da</strong>s, podem se<br />
curvar sobre a extremi<strong>da</strong>de dos dedos. Geralmente há telangiectasia<br />
periungueal, mas o eritema periungueal é raro.<br />
Nos casos avançados, os membros mostram contraturas e<br />
calcinose cutânea.<br />
O acometimento <strong>da</strong> face inclui uma fronte lisa e sem<br />
rugas, pele retesa<strong>da</strong> sobre o nariz, encolhimento do tecido em<br />
volta <strong>da</strong> boca e sulcos radiais periorais, adelgaçamento dos<br />
lábios e microstomia. O nariz assume um aspecto pinçado<br />
ou semelhante a um bico. A pele acometi<strong>da</strong> fica endureci<strong>da</strong>,<br />
lisa e aderi<strong>da</strong> às estruturas subjacentes, muitas vezes com<br />
hiper e hipopigmentação, sem pêlos, seca e grossa. O fenômeno<br />
de Raynaud está presente em quase todos os pacientes<br />
e pode preceder em muitos anos o desenvolvimento <strong>da</strong><br />
<strong>esclerodermia</strong>.<br />
A biopsia cutânea revela espessamento <strong>da</strong> derme e homogeneização<br />
dos feixes de colágeno. O diagnóstico é clínico<br />
e baseado na biopsia.<br />
A evolução <strong>da</strong> esclerose sistêmica é variável. Nos pacientes<br />
com doença cutânea difusa, a taxa de sobrevi<strong>da</strong> cumulativa após<br />
5 anos é de cerca de 70%, e a de 10 anos, aproxima<strong>da</strong>mente<br />
55%. Na doença cutânea limita<strong>da</strong>, a taxa de sobrevi<strong>da</strong> após<br />
5 anos é de 90% e após 10 anos, em torno de 75%. Embora<br />
a esclerose sistêmica não possa ser cura<strong>da</strong>, o tratamento dos<br />
sistemas orgânicos acometidos pode aliviar os sintomas e<br />
melhorar a função. A relação médico-paciente é de suma importância<br />
na assistência aos pacientes com essa doença debilitante<br />
crônica, devendo ser instruídos a respeito <strong>da</strong> doença.<br />
De acordo com a gravi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> afecção, o paciente necessitará<br />
de monitoração <strong>da</strong> pressão arterial, hemogramas, exames<br />
de urina e avaliação <strong>da</strong> função renal e pulmonar em intervalos<br />
regulares. Muitos fármacos foram utilizados no tratamento <strong>da</strong><br />
esclerose sistêmica, sem qualquer benefício consistente ou<br />
prolongado. O tratamento envolve desde medi<strong>da</strong>s gerais (usar<br />
luvas, meias e roupas adequa<strong>da</strong>s ao frio, não fumar) ao uso<br />
de vários medicamentos para diversos fins (D-penicilamina,<br />
azatioprina, metotrexato, ciclofosfami<strong>da</strong>, AAS, dipiri<strong>da</strong>mol,<br />
prednisona, colchicina, vitamina E, colírios, drogas antirefluxo<br />
gastroesofágico, AINEs, antibióticos, nifedipina).<br />
O objetivo deste trabalho é apresentar, para fins acadêmicos,<br />
um caso de manifestação grave <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong> em que ocorreram<br />
alterações craniofaciais, com indicação de tratamento<br />
cirúrgico reparador.<br />
RELATO DO CASO<br />
AMS, 24 anos, sexo feminino, estu<strong>da</strong>nte universitária de<br />
Enfermagem, natural e procedente de São Gonçalo – RJ, foi<br />
encaminha<strong>da</strong> ao nosso ambulatório pelo serviço de Bucomaxilofacial<br />
<strong>da</strong> UERJ/HUPE, onde vem sendo acompanha<strong>da</strong><br />
regularmente há vários anos, para avaliação <strong>da</strong>s alterações<br />
craniofaciais e <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de de procedimentos ortocirúrgicos.<br />
A paciente relata o início dos sintomas aos 7 anos de i<strong>da</strong>de,<br />
quando apresentou per<strong>da</strong> progressiva <strong>da</strong> espessura de ambos<br />
os lábios e sangramento gengival. Aos 10 anos, a equipe de<br />
Dermatologia, juntamente com a Patologia, Reumatologia<br />
e Genética Médica <strong>da</strong>quele hospital de origem, firmou o<br />
diagnóstico de <strong>esclerodermia</strong>. Aos 11 anos, a paciente foi<br />
submeti<strong>da</strong> a exodontia seria<strong>da</strong> de todos os dentes permanentes,<br />
com periodontite grave. Evoluiu com formação de abscessos<br />
apicais. Aos 14 anos, constatou-se o fim <strong>da</strong> progressão <strong>da</strong><br />
doença pela Reumatologia. Aos 19 anos, foi indica<strong>da</strong> correção<br />
cirúrgica <strong>da</strong>s alterações, porém desistiu dos procedimentos<br />
naquele momento e atualmente deseja a reparação, sendo-nos<br />
encaminha<strong>da</strong> para tal.<br />
Ao exame físico, a paciente apresentava microstomia grave,<br />
atrofia completa <strong>da</strong> maxila e <strong>da</strong> mandíbula, com presença dos dentes<br />
38 e 48 semi-inclusos. Aparência envelheci<strong>da</strong> (Figuras 1 e 2).<br />
A tomografia computadoriza<strong>da</strong> revelou reabsorção completa<br />
do rebordo alveolar maxilar e afilamento importante do palato<br />
e assoalho dos seios maxilares, mais evidente à direita. Mandíbula<br />
com estrutura óssea preserva<strong>da</strong>, com per<strong>da</strong> dos elementos<br />
dentários anteriores, permanecendo apenas os dentes molares<br />
bilateralmente (Figuras 3 a 10).<br />
Foram indica<strong>da</strong>s distração osteogênica monovetorial bilateral<br />
<strong>da</strong> mandíbula e reconstrução microcirúrgica dos lábios.<br />
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Manifestação <strong>severa</strong> <strong>da</strong> <strong>esclerodermia</strong><br />
Figura 1 – Fofografia frontal com a paciente de<br />
boca fecha<strong>da</strong>.<br />
Figura 4 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face com<br />
reconstrução 3D (lateral esquer<strong>da</strong>).<br />
Figura 2 – Fofografia frontal com a paciente de<br />
boca aberta.<br />
Figura 5 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face com<br />
reconstrução 3D (lateral direita).<br />
Figura 3 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face com<br />
reconstrução 3D (frontal).<br />
Figura 6 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face com<br />
reconstrução 3D (lateral esquer<strong>da</strong>).<br />
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Oliveira CLA et al.<br />
Figura 7 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face, corte axial<br />
demonstrando reabsorção <strong>da</strong> maxila.<br />
Figura 9 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face, corte<br />
sagital demonstrando afilamento importante do palato.<br />
Figura 8 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face, corte<br />
coronal demonstrando reabsorção completa do rebordo<br />
alveolar maxilar e afilamento importante do palato e<br />
assoalho dos seios maxilares.<br />
Figura 10 – Tomografia computadoriza<strong>da</strong> de face com<br />
reconstrução 3D (frontal).<br />
CONCLUSÃO<br />
Demonstramos, assim, um caso diferente e incomum, que<br />
exige atenção e cui<strong>da</strong>dos especiais de todos os profissionais<br />
envolvidos.<br />
REFERÊNCIAS<br />
1. Arnett FC. HLA and autoimmunity in scleroderma (systemic sclerosis).<br />
Int Rev Immunol. 1995;12(2-4):107-28.<br />
2. Bennett RM. Mixed connective tissue disease and other overlap<br />
syndromes. In: Kelley WN, ed. Textbook of rheumatology. 5 th ed.<br />
Philadelphia:Saunders;1997. p.1065.<br />
3. Black CM. Systemic sclerosis: management. In: Klippel JH, Dieppe<br />
PA, eds. Rheumatology. 2 nd ed. London:Mosby International;1998.<br />
4. Bolster MB, Silver RM. Assessment and management of scleroderma<br />
lung disease. Curr Opin Rheumatol. 1999;11(6):508-13.<br />
5. Vázquez-Abad D, Rothfield NF. Autoantibodies in systemic sclerosis.<br />
Int Rev Immunol. 1995;12(2-4):145-57.<br />
6. Postlethwaite AE. Role of T cells and cytokines in effecting fibrosis.<br />
Int Rev Immunol. 1995;12(2-4):247-58.<br />
7. Braunwald E, Kasper DL, Fauci AS, Longo DL, Hawser SL, Jameson<br />
JL. Harrison Medicina Interna. 15ª ed. vol 2. Rio de Janeiro:McGraw-<br />
Hill;2002. p.2054-64.<br />
Trabalho realizado no Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (INTO), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.<br />
Artigo recebido: 13/11/2009<br />
Artigo aceito: 8/1/2010<br />
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