Epignatus ou fissura 0-14 de Tessier: interrelação entre ... - ABCCMF
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da Silva Freitas et al.<br />
RELATO DE CASO<br />
<strong>Epignatus</strong> <strong>ou</strong> <strong>fissura</strong> 0-<strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>Tessier</strong>: interrelação <strong>entre</strong><br />
<strong>de</strong>formida<strong>de</strong>s da linha média<br />
Epignathus or <strong>Tessier</strong> number 0-<strong>14</strong> cleft: interrelation among medial<br />
line <strong>de</strong>formities<br />
Renato da Silva Freitas 1 , Nivaldo Alonso 2 , Thais <strong>de</strong> Freitas Azzolinni 3 , Giovana Gianini Romano 4 , Luciano Busato 5 ,<br />
César Vinicius Gran<strong>de</strong> 6 , Gilvani Azor <strong>de</strong> Oliveira e Cruz 7<br />
RESUMO<br />
Introdução: <strong>Epignatus</strong> é um teratoma raro que contém<br />
histologicamente o tecido <strong>de</strong> todas as camadas germinativas.<br />
Os pacientes apresentam uma massa recoberta por pele e<br />
mucosa originada na base do crânio e que protrui através<br />
da boca, obstruindo a via aérea. Esta massa parece ser<br />
originada <strong>de</strong> células-tronco pluripotenciais vindas da região<br />
da bolsa <strong>de</strong> Ratske. Ao nascimento, seu tratamento consiste<br />
em assegurar imediatamente a permeabilida<strong>de</strong> da via aérea<br />
por meio <strong>de</strong> intubação orotraqueal <strong>ou</strong>, se necessário,<br />
traqueostomia. A ressonância magnética e a tomografia<br />
computadorizada <strong>de</strong>vem ser solicitadas anteriormente à<br />
intervenção, para afastar encefalocele <strong>ou</strong> extensão intracraniana<br />
da lesão. Uma vez que a dimensão da massa é<br />
i<strong>de</strong>ntificada, o tumor po<strong>de</strong> ser excisado através da cavida<strong>de</strong><br />
oral. O propósito <strong>de</strong>ste estudo é apresentar dois casos <strong>de</strong><br />
teratomas originados na base do crânio e associados à<br />
<strong>fissura</strong> palatina. Relato dos casos: Ambos os casos apresentavam<br />
características <strong>de</strong> <strong>fissura</strong>s 0-<strong>14</strong>, como nariz bífido,<br />
duplo septo e <strong>fissura</strong> alveolar mediana. Nós sugerimos que<br />
o epignatus po<strong>de</strong> ser uma forma diferente <strong>de</strong> apresentação<br />
da <strong>fissura</strong> 0-<strong>14</strong>.<br />
Descritores: Fissura palatina. Anormalida<strong>de</strong>s craniofaciais/cirurgia.<br />
Face/anormalida<strong>de</strong>s. Neoplasias nasofaríngeas.<br />
Teratoma.<br />
SUMMARY<br />
Introduction: Epignathus is a rare teratoma which<br />
histologically contains tissue of all three germ layers. Patients<br />
usually present at birth with a mass covered with skin<br />
and mucosa that protru<strong>de</strong>s thr<strong>ou</strong>gh the m<strong>ou</strong>th, arising from<br />
the cranial bases and compromises the airway by fills the<br />
oral cavity. This mass is th<strong>ou</strong>ght to arise from pluripotential<br />
stem cells from the Rathke´s p<strong>ou</strong>ch region. Management<br />
involves emergently securing an airway by intubation or<br />
formal tracheostomy, when it is necessary. An MRI or CT<br />
scan is required prior to surgical intervention to rule <strong>ou</strong>t an<br />
encephalocele or intracranial extension of the lesion. Once<br />
the extent of the mass is a<strong>de</strong>quately <strong>de</strong>termined, the tumor<br />
can be excised thr<strong>ou</strong>gh the oral cavity. The aim of this study<br />
is to present two cases treated last year, who had a mass<br />
arising from the cranial basis associated a cleft palate. Case<br />
reports: Both of them had characteristics of cleft n° 0-<strong>14</strong>,<br />
as bifid nose, d<strong>ou</strong>ble septum and median alveolar cleft. We<br />
have suggested that epignathus c<strong>ou</strong>ld be a different form of<br />
presentation of cleft n° 0-<strong>14</strong>.<br />
Descriptors: Cleft palate. Craniofacial abnormalities/<br />
surgery. Face/abnormalities. Nasopharyngeal neoplasms.<br />
Teratoma.<br />
1. Professor Adjunto III da Disciplina <strong>de</strong> Cirurgia Plástica e Reconstrutora do<br />
Hospital <strong>de</strong> Clínicas da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Paraná (UFPr). Cirurgião Crânio-facial<br />
do Centro <strong>de</strong> Atendimento Integral ao Fissurado Labiopalatal (CAIF).<br />
2. Professor livre-docente, Chefe do Serviço <strong>de</strong> Cirurgia Craniomaxilofacial<br />
da Divisão <strong>de</strong> Cirurgia Plástica e Queimaduras do Hospital das Clínicas<br />
da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo (HC-FMUSP).<br />
3. Acadêmica <strong>de</strong> Medicina da Faculda<strong>de</strong> Evangélica do Paraná.<br />
4. Médica Resi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> Cirurgia Plástica e Reconstrutiva da UFPr.<br />
5. Cirurgião Plástico do CAIF.<br />
6. Neurocirurgião do CAIF.<br />
7. Professor Associado e Coor<strong>de</strong>nador da Disciplina <strong>de</strong> Cirurgia Plástica<br />
e Reconstrutora do Hospital <strong>de</strong> Clínicas e do Hospital do Trabalhador da<br />
UFPr. Chefe do Setor <strong>de</strong> Cirurgia Crânio-maxilo-facial do Hospital Universitário<br />
Cajuru da PUC-Pr. Responsável pela Cirurgia Crânio-maxilo-facial<br />
do Hospital Pequeno Príncipe.<br />
Correspondência: Renato da Silva Freitas<br />
Hospital <strong>de</strong> Clínicas da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Paraná (UFPR)<br />
Rua General Carneiro, 181 – 9° andar – Cirurgia Plástica e Reparadora<br />
– Curitiba, PR, Brasil – CEP 80060-900.<br />
E-mail: dr.renato.freitas@gmail.com<br />
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<strong>Epignatus</strong> <strong>ou</strong> <strong>fissura</strong> 0-<strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>Tessier</strong>: interrelação <strong>entre</strong> <strong>de</strong>formida<strong>de</strong>s da linha média<br />
INTRODUÇÃO<br />
<strong>Epignatus</strong> é um tipo raro <strong>de</strong> teratoma nasofaríngeo congênito<br />
<strong>de</strong>rivado das três camadas germinativas e que usualmente<br />
contém órgãos i<strong>de</strong>ntificáveis 1,2 . O termo “epignatus” é puramente<br />
topográfico, referindo-se a todos os tipos <strong>de</strong> tumor originários<br />
da maxila, palato <strong>ou</strong> osso esfenói<strong>de</strong> – região da Bolsa<br />
<strong>de</strong> Ratske 3 . Lesões relacionadas a este tumor não dispõem <strong>de</strong><br />
qualquer apresentação histopatológica específica e são frequentemente<br />
difíceis <strong>de</strong> distinguir <strong>de</strong> gêmeos incompletos, reduplicação<br />
e teratoma 4 . Existem diversas teorias sobre a etiologia:<br />
implantação traumática <strong>de</strong> tecidos, falha na fusão <strong>de</strong> região<br />
somática durante a embriogênese <strong>ou</strong> implantação <strong>de</strong> células<br />
pluripotenciais que <strong>de</strong>sorganizam o crescimento no tecido 5 .<br />
O tumor protrui pela boca e po<strong>de</strong> levar à morte do recémnato<br />
em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> obstrução significativa da via aérea.<br />
Dessa forma, o cuidadoso planejamento antes e após o nascimento<br />
é necessário para assegurar a permeabilida<strong>de</strong> da via<br />
aérea 1 . Po<strong>de</strong> estar associado a <strong>ou</strong>tras anomalias do palato,<br />
maxila e mandíbula, sequência <strong>de</strong> Pierre Robin, cistos branquial<br />
e doenças cardíacas congênitas 1,4,6 .<br />
Apenas 10% dos teratomas ocorrem na região da cabeça<br />
e pescoço, predominantemente nas regiões cervical e nasofaringeas,<br />
fazendo dos teratomas nasofaríngeos entida<strong>de</strong>s<br />
extremamente raras 2 . Teratomas ocorrem em média um caso a<br />
cada 35.000 a 200.000 nascidos-vivos, <strong>de</strong>monstrando prepon<strong>de</strong>rância<br />
em mulheres 7,8 . Não há casos relatados <strong>de</strong> anomalias<br />
genéticas <strong>ou</strong> incidência familiar 3,6 . O propósito <strong>de</strong>ste estudo é<br />
apresentar dois casos <strong>de</strong> teratomas tratados, com massa saindo<br />
a partir da base do crânio associada à <strong>fissura</strong> palatina.<br />
Durante dois anos, a criança teve cinco episódios <strong>de</strong> pneumonia.<br />
Quando retorn<strong>ou</strong> aos nossos cuidados, o hipertelorismo<br />
estava mais evi<strong>de</strong>nciado, com presença <strong>de</strong> seis <strong>de</strong>ntes incisivos<br />
superiores, seis <strong>de</strong>ntes incisivos inferiores, duplo frênulo<br />
labial e nariz bífido (Figuras 2 e 3). Os exames <strong>de</strong> tomografia<br />
computadorizada e ressonância magnética <strong>de</strong>monstraram uma<br />
massa originada na face rostral do esfenói<strong>de</strong>, protruindo sobre<br />
a cavida<strong>de</strong> nasal e oral, estando inclusa no seu pedículo uma<br />
estrutura óssea, a qual se assemelhava a um septo bífido.<br />
Havia uma pequena comunicação com a base do crânio na<br />
região esfenoidal (Figuras 4 a 6). Aos 24 meses <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, a massa<br />
palatal foi excisada com o tecido normal adjacente, sob anestesia<br />
geral. A língua bífida não foi tratada, assim como a <strong>fissura</strong> palatina.<br />
Histologicamente, a massa palatina era recoberta <strong>de</strong> pele<br />
queratinizada, folículos pilosos e estruturas epi<strong>de</strong>rmói<strong>de</strong>s<br />
(Figura 7), associados a tecido gorduroso maduro e brotos<br />
<strong>de</strong>ntários, posteriormente diagnosticada como epignatus. A<br />
criança foi mantida por cinco dias sob cuidados em unida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> terapia intensiva e recebeu alta hospitalar no décimo dia<br />
pós-operatório. A palatoplastia foi realizada um mês após a<br />
primeira cirurgia e associada à ressecção do tecido na linha<br />
média da língua, que <strong>de</strong>monstr<strong>ou</strong> ser um hamartoma.<br />
Figura 1 – Paciente 1: dois dias <strong>de</strong> vida, com massa<br />
protuindo através da boca.<br />
RELATO DOS CASOS<br />
Os achados clínicos, radiológicos e laboratoriais <strong>de</strong> dois<br />
pacientes tratados no Centro <strong>de</strong> Atendimento Integral ao Fissurado<br />
Lábio Palatal, portadores <strong>de</strong> epignatus foram revisados. Realiz<strong>ou</strong>se<br />
revisão extensa da literatura sobre o tema, e se discutiu a etiopatogenia<br />
e tratamento <strong>de</strong>ssa malformação. Propõe-se que epignatus<br />
po<strong>de</strong> ser uma forma <strong>de</strong> apresentação da <strong>fissura</strong> craniofacial 0-<strong>14</strong>.<br />
Caso 1<br />
Criança do sexo feminino, nasceu após 38 semanas <strong>de</strong><br />
gestação, pesando 2,880 gramas, com Apgar <strong>de</strong> 9 ao primeiro<br />
minuto e 10 aos cinco minutos, sem dificulda<strong>de</strong>s respiratórias.<br />
Foi encaminhada ao nosso serviço no seu segundo dia <strong>de</strong> vida<br />
para investigação clínica, por apresentar massa <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s<br />
dimensões no palato e malformação da língua (Figura 1). Não<br />
havia intercorrências em sua história pré-natal, e a história<br />
familiar também foi negativa.<br />
Ao exame clínico, uma lesão <strong>de</strong> dimensões aproximadas<br />
às da língua era visível no palato duro, o qual se apresentava<br />
<strong>fissura</strong>do. A massa era recoberta por pele e pêlos finos, evi<strong>de</strong>nciando<br />
hipertelorismo. A língua era larga, bífida e com uma<br />
pequena proeminência sobre a superfície do dorso. Não foram<br />
encontradas <strong>ou</strong>tras anomalias no exame físico. O diagnóstico<br />
clínico foi <strong>de</strong> epignatus combinado com <strong>fissura</strong> palatina e língua<br />
lobulada com tumor lingual. A paciente teve um episódio <strong>de</strong><br />
pneumonia, sendo internada em <strong>ou</strong>tro hospital e submetida a<br />
traqueostomia e biópsia, com diagnóstico <strong>de</strong> teratoma.<br />
Figura 2 – Paciente 1: dois anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, préoperatório<br />
com traqueostomia.<br />
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Figura 3 – Visão oclusal, <strong>de</strong>monstrando seis <strong>de</strong>ntes<br />
superiores e seis <strong>de</strong>ntes inferiores.<br />
Figura 6 – Tomografia tridimensional <strong>de</strong>monstrando o<br />
tumor intra-oral, com pedículo ósseo.<br />
Figura 4 – Visão lateral <strong>de</strong> teratoma na ressonância<br />
nuclear magnética, com pequeno orifício no esfenói<strong>de</strong>.<br />
Figura 7 - Análise microscópica com tecidos<br />
epidérmicos.<br />
Figura 5 – Teratoma.<br />
Caso 2<br />
Paciente do sexo masculino, nasceu <strong>de</strong> parto cesariana,<br />
após 39 semanas <strong>de</strong> gestação, pesando 3490 gramas (Figura 8).<br />
O escore <strong>de</strong> Apgar foi <strong>de</strong> 9 ao primeiro minuto e 9 aos cinco<br />
minutos. Seus pais eram saudáveis e não apresentavam relação<br />
<strong>de</strong> consaguinida<strong>de</strong>. Sua mãe era primigesta e primípara. O<br />
recém-nascido teve dificulda<strong>de</strong>s respiratórias e alimentares nos<br />
primeiros dias, sem necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> intubação, traqueostomia<br />
<strong>ou</strong> suporte ventilatório. O exame da cavida<strong>de</strong> oral revel<strong>ou</strong> um<br />
tumor <strong>de</strong> 4 cm na sua maior dimensão, com cobertura cutânea e<br />
finos pêlos saindo através <strong>de</strong> uma ampla <strong>fissura</strong> palatina (Figura<br />
9). Hipertelorismo estava presente e a língua apresentava suas<br />
dimensões e posição normais. A criança foi alimentada com<br />
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<strong>Epignatus</strong> <strong>ou</strong> <strong>fissura</strong> 0-<strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>Tessier</strong>: interrelação <strong>entre</strong> <strong>de</strong>formida<strong>de</strong>s da linha média<br />
auxílio <strong>de</strong> sonda nasoenteral até o dia da cirurgia. O exame <strong>de</strong><br />
tomografia computadorizada revel<strong>ou</strong> um tumor intranasal e<br />
intra-oral associado à duplicação do septo, sendo que o pedículo<br />
estava localizado na face anterior dos ossos esfenói<strong>de</strong><br />
e etmói<strong>de</strong> (Figuras 10 e 11). Não foi evi<strong>de</strong>nciada extensão<br />
intracraniana do tumor.<br />
A cirurgia foi realizada sob anestesia geral, quando o<br />
paciente estava com 29 dias <strong>de</strong> vida e pesando 4300 gramas.<br />
Durante a cirurgia, foi observada protrusão do tumor na cavida<strong>de</strong><br />
bucal através <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong> <strong>fissura</strong> no palato. Estava<br />
localizado na pare<strong>de</strong> anterior do corpo dos ossos esfenói<strong>de</strong> e<br />
etmói<strong>de</strong>. O teratoma foi dissecado <strong>de</strong> suas a<strong>de</strong>sões e facilmente<br />
ressecado com eletrocautério. A peça cirúrgica tinha as dimensões<br />
<strong>de</strong> 4,5 cm <strong>de</strong> comprimento, 3 cm <strong>de</strong> largura e 1,2 cm <strong>de</strong><br />
espessura; possuía aparência externa homogênea e cobertura<br />
cutânea com pêlos finos, sendo preenchida por tecido mucoso.<br />
Também foi observada presença <strong>de</strong> germes <strong>de</strong>ntários no<br />
conteúdo do tumor (Figura 12). A análise microscópica revel<strong>ou</strong><br />
a presença <strong>de</strong> epi<strong>de</strong>rme e tecido conectivo maduros, associados<br />
à hiperplasia mucosa sem atipias (Figura 13).<br />
O período após a cirurgia transcorreu bem e a criança<br />
recebeu alta no terceiro dia pós-operatório, recebendo alimentação<br />
via oral. A reparação da <strong>fissura</strong> palatina foi realizada sem<br />
intercorrências aos 12 meses <strong>de</strong> vida (Figura <strong>14</strong>).<br />
Figura 8 – Paciente 2: menino com 20 dias <strong>de</strong> vida, com<br />
teratoma e mordida aberta anterior.<br />
Figura 10 – Tomografia axial <strong>de</strong>monstrando<br />
duplicação septal.<br />
Figura 9 – Visão intra-operatória, <strong>de</strong>monstrando a base<br />
tumoral na região esfeno-etmoidal.<br />
Figura 11 – Visão coronal, septo duplo.<br />
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Figura 12 – Peça tumoral, presença <strong>de</strong> germes <strong>de</strong>ntários<br />
<strong>de</strong>ntro do tumor.<br />
Figura <strong>14</strong> – Dois meses <strong>de</strong> pós-operatório.<br />
Figura 13 – À microscopia, tecido epidérmico e gordura<br />
maduros.<br />
DISCUSSÃO<br />
Teratomas da cavida<strong>de</strong> oral e nasofaringe em recém-nascido<br />
são raros. Embora esses tumores possam variar em estrutura e<br />
grau <strong>de</strong> diferenciação, três camadas são evi<strong>de</strong>nciadas (ectodérmica,<br />
mesodérmica e endodérmica) 7 . O termo epignatus referese<br />
ao tumor que sai do palato e nasofaringe, protruindo através<br />
da boca. Yoshimura et al. 9 advogaram a seguinte classificação<br />
patológica: tipo I - pele e tecido gorduroso <strong>de</strong>rivado <strong>de</strong> duas<br />
camadas germinativas; tipo II - teratoma tecido representando<br />
todas as três camadas germinativas, com osso, <strong>de</strong>ntes, sistema<br />
nervoso e trato gastrointestinal; e tipo III - gêmeo parasita com<br />
órgãos diferenciados e extremida<strong>de</strong>s. Os dois casos analisados<br />
foram classificados como tipo II.<br />
O epignatus po<strong>de</strong> causar asfixia logo após o nascimento,<br />
<strong>de</strong>vido à presença <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> tumor, o que resulta em necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> suporte <strong>de</strong> vida em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> obstrução da via<br />
aérea. Também tem sido associado à sequência <strong>de</strong> Pierre Robin.<br />
Foi observado que a asfixia secundária à obstrução <strong>de</strong> via<br />
aérea po<strong>de</strong> levar a alto índice <strong>de</strong> mortalida<strong>de</strong> nesses pacientes<br />
no momento <strong>de</strong> seu nascimento <strong>ou</strong> no período perinatal. O<br />
primeiro recém-nato sobrevivente com epignatus foi relatado<br />
por Ochsner e Ayers 10 , em 1951. Até 1984 apenas oito pacientes<br />
haviam sobrevivido após abordagem cirúrgica 3,11,12 . Os recémnatos<br />
analisados nos nossos dois casos não sofreram qualquer<br />
distúrbio <strong>de</strong> oxigenação.<br />
Os diagnósticos diferenciais <strong>de</strong>sse tumor incluem retinoblastoma,<br />
encefalocele etmoidal, rabdomiosarcoma congênito,<br />
linfangioma, glioma nasal, tireói<strong>de</strong> heterotópica e epulis gigante 6 .<br />
A patogênese do epignatus é incerta; embora haja uma série<br />
<strong>de</strong> teorias sobre sua etiologia, como: implantação traumática no<br />
tecido, falha <strong>de</strong> regiões somáticas ao fundir durante a embriogênese,<br />
<strong>ou</strong> implantação <strong>de</strong> células pluripotenciais com crescimento<br />
<strong>de</strong>sorganizado do tecido 5 . Alguns autores acreditam<br />
que a falha na fusão das estruturas na linha média durante a<br />
embriogênese leva ao teratoma nasofaríngeo <strong>de</strong> linha média e<br />
<strong>fissura</strong> palatina. Por <strong>ou</strong>tro lado, <strong>ou</strong>tros autores acreditam que<br />
as células pluripotenciais primordiais são implantadas ectopicamente<br />
e crescem sem a influência da organização <strong>de</strong> células<br />
e fatores ao redor.<br />
A <strong>fissura</strong> palatina é frequentemente relatada em associação<br />
com epignatus, e é causada pela formação do tumor num estágio<br />
muito precoce da vida fetal, <strong>entre</strong> 8 e 12 semanas, antes da união<br />
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<strong>Epignatus</strong> <strong>ou</strong> <strong>fissura</strong> 0-<strong>14</strong> <strong>de</strong> <strong>Tessier</strong>: interrelação <strong>entre</strong> <strong>de</strong>formida<strong>de</strong>s da linha média<br />
normal das lâminas palatais bilaterais 4 . De qualquer forma,<br />
quando nós reavaliamos nossos pacientes, especificamente com<br />
tomografia computadorizada, foi possível sugerir que esses<br />
pacientes fossem portadores <strong>de</strong> <strong>fissura</strong> nasal 0-<strong>14</strong>.<br />
No caso 1, havia septo duplo, com hipertelorismo, nariz<br />
bífido, palato largo com 6 <strong>de</strong>ntes incisivos superiores e inferiores<br />
e duplo frênulo labial. No caso 2, havia duplo septo, e<br />
também foi evi<strong>de</strong>nciado hipertelorismo. O tumor po<strong>de</strong>ria ser<br />
um excesso <strong>de</strong> tecido embriológico que migr<strong>ou</strong> da base do<br />
crânio pela <strong>fissura</strong> craniofacial.<br />
O tratamento do epignatus <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da extensão e localização<br />
da lesão. Alguns investigadores advogam que o<br />
cordão umbilical e a circulação fetoplacentária <strong>de</strong>vem ser<br />
mantidos por algum tempo após o nascimento para maximizar<br />
a oxigenação do feto, permitindo o rápido exame,<br />
e traqueostomia, se necessária 7 . Dohlman e Sjovall 11<br />
advogaram tratamento em vários estágios, com imediata<br />
ressecção do tumor, reavaliação do tumor residual durante<br />
as primeiras semanas <strong>de</strong> vida e reparo da <strong>fissura</strong> palatina<br />
com <strong>14</strong> meses <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. Outros autores realizaram o reparo<br />
do palato <strong>entre</strong> 2 e 5 meses após a ressecção tumoral 5 . Nós<br />
<strong>de</strong>cidimos reparar o palato mais tar<strong>de</strong>, por volta <strong>de</strong> 1 ano<br />
<strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, e neste tempo também tratar a língua bífida, <strong>de</strong><br />
forma a proporcionar melhor relação <strong>entre</strong> a cavida<strong>de</strong> oral<br />
e a língua após a palatoplastia.<br />
Entre as malformações associadas ao tumor epignatus estão<br />
as línguas bífidas. O espaço mediano <strong>entre</strong> as duas meta<strong>de</strong>s<br />
da língua representa a não-fusão das três lâminas embriológicas<br />
que formam a língua. Bifidismo e glossoptose indicam<br />
um precoce <strong>de</strong>senvolvimento do tumor, que impe<strong>de</strong> a fusão<br />
dos brotos primitivos da língua e leva a um posicionamento<br />
anteriorizado <strong>de</strong>sta. Provavelmente esta é a razão pela qual o<br />
epignatus e os distúrbios <strong>de</strong> fusão da língua estão relacionados 8 .<br />
Nós encontramos apenas 3 casos <strong>de</strong> epignatus associados à<br />
língua lobulada reportados na literatura. O caso 1 possuía língua<br />
larga, com algumas proeminências no dorso, e <strong>de</strong>cidimos tratar<br />
este aspecto num segundo tempo, por ocasião <strong>de</strong> melhores<br />
condições clínicas do paciente.<br />
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Trabalho realizado no Centro <strong>de</strong> Atendimento Integral ao Fissurado Lábio-Palatal (CAIF), Disciplina <strong>de</strong> Cirurgia Plástica da Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do<br />
Paraná e Serviço <strong>de</strong> Cirurgia Craniofacial da Disciplina <strong>de</strong> Cirurgia Plástica da Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.<br />
Artigo recebido: 18/3/2009<br />
Artigo aceito: 12/11/2009<br />
Rev Bras Cir Craniomaxilofac 2009; 12(4): 178-83<br />
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