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Pompeia pelo Vesúvio, o do terremoto de Lisboa, e muitas anedotas surpreendentes<br />
como esta, que se passa em Nova Orleans, no tempo da Lei Seca:<br />
Dois rapazes negros andam pelo corredor de um trem que acaba de parar, escondendo sob a<br />
roupa frascos de diferentes formatos, onde se lê em letras graúdas: “chá gelado”. Um viajante<br />
faz sinal a um dos vendedores e compra um dos frascos, pelo preço de um terno, escondendoo<br />
em seguida. Outro faz a mesma coisa, depois mais dez, vinte ou cinquenta. “Senhoras e<br />
senhores”, imploram os rapazes, “esperem que o trem volte a andar antes de beberem seu<br />
chá”. Todos piscam o olho em cumplicidade... O apito soa, o trem parte, e os passageiros<br />
levam os frascos aos lábios. Mas o desapontamento logo nubla seus rostos, pois o que estão<br />
bebendo é mesmo chá gelado 2 .<br />
Nem a TV nem a internet acabaram com o rádio, que se acomodou à primeira e<br />
se acoplou à segunda, passando hoje muito bem, obrigado. No Brasil inteiro existem<br />
hoje rádios nas escolas e comunidades, rádios de curto e longo alcance, rádios feitas<br />
por crianças, por jovens, por velhos, rádios que falam todas as línguas que se fala no<br />
Brasil, muito além do português. Tanto existem emissoras interativas on-line, quanto<br />
emissoras captadas pela antena do radinho de pilha que o pedreiro escuta na obra, a<br />
professora enquanto corrige provas em casa, e o motorista, no táxi.<br />
Nem só de música, esporte e notícias se faz a programação dessas rádios. Em<br />
muitos projetos, nas grandes cidades e vilarejos do interior, as vozes no rádio contam<br />
histórias de vida, contos, poemas, fazem teatro com a textura da voz, experimentam<br />
linguagens e temas contemporâneos. As histórias que o rádio conta abastecem de<br />
emoções, arte e companhia os dias e noites das mulheres e dos homens em seus<br />
momentos de intimidade ou solidão, falam aos românticos, aos visionários, e a todos<br />
os que simplesmente buscam sintonizar seus semelhantes. O coração quente do rádio,<br />
nos cantos das casas brasileiras, aquece o cotidiano de milhões, e é um dos nossos<br />
grandes e nem sempre reconhecidos parceiros na aventura de povoar o cotidiano com<br />
histórias contadas, e portanto com mais sentido na vida.<br />
Gilka Girardello<br />
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2 Em MEHLMAN, Jeffrey: Walter Benjamin for children: an essay on his radio years. Chicago: University of Chicago<br />
Press, 1984, p. 8.