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Independente das histórias e seus narradores, o mar sempre existiu e por volta dos<br />

16 anos de idade me vi dono de um barco que se chamava Tucum. Seu cavername,<br />

espécie de esqueleto dos saveiros, foi trazido a reboque de Belém do Pará para São<br />

Luís do Maranhão pelo meu professor e sócio, Clemens Hilbert, um músico alemão<br />

aventureiro, que navegou por aqueles mares nos anos 1970 e 1980.<br />

A reconstrução do Tucum, num tosco estaleiro da Gamboa, bairro de São Luís,<br />

foi um acontecimento que não poderia esquecer. Dois mestres artesãos, irmãos,<br />

foram recolocando a madeira do barco, meses a fio, num processo complicadíssimo<br />

de construção e reconstrução, até que ressurgiu grandioso e belo como um enorme<br />

animal ressuscitado.<br />

Clemens parecia um menino de tão feliz. Era bonito navegar na lua cheia do delta<br />

do Parnaíba com um coração ávido por descobrir o mundo.<br />

Mais de trinta anos depois, uma outra história de barco me esperava.<br />

Foi no Etnodoc – Edital de apoio a documentários etnográficos sobre patrimônio<br />

cultural imaterial. Participei da gestão do projeto. Um dos filmes selecionados, O barco<br />

do mestre, do antropólogo e cineasta Gavin Andrews, documenta o ofício de fazer<br />

barcos na Região Norte e sua eminente extinção. Espero que isso nunca se confirme.<br />

Comecei a ler a obra de Guimarães Rosa mais ou menos na época que Tucum<br />

renascia das cinzas, ou melhor, das águas. Rosa disse certa vez ao crítico de literatura<br />

Günther Lorenz, que são as “estórias” que nos escrevem. No “Entremeio com o<br />

vaqueiro Mariano”, que considerava o maior vaqueiro do mundo porque conhecia a<br />

alma dos bois, escreveu que narrar é resistir.<br />

Encerro este artigo lembrando de amigos e colegas que estarão nessa hora contando<br />

histórias, no ofício mágico de viver contando histórias. Penso nesse tecido fino<br />

que vem de nossas almas. Penso nas histórias que nos fabricam o Ser e que nos fazem<br />

rir, chorar, encantar, refletir, educar e sonhar.<br />

Cristiano Mota Mendes<br />

205<br />

A Benzinho e Raimundo

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