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[AnaLu Palma]<br />
Entrei na sala e encontrei uma plateia barulhenta, sentada de forma muito<br />
desorganizada. Uma plateia que não se dispunha frontalmente ao palco, como é<br />
de hábito em apresentações. O espaço físico era preenchido por aqueles corpos numa<br />
composição incomum aos meus olhos necessitados de harmonia formal. Desejei criar<br />
frases em relevo no chão e em cada letra, dispor uma cadeira, alinhando palavras e<br />
corpos. Palavras táteis que organizassem, conduzissem e distribuíssem aquelas pessoas<br />
no espaço. Mas isso foi só um lampejo, habituada que estou a me valer das palavras<br />
para dar conta do inusitado.<br />
Tenho por costume sorrir para cumprimentar e para chamar a atenção. É uma<br />
espécie de cartão de visitas que captura o olhar do outro e me coloca na zona privilegiada<br />
do foco. Sorrio com o corpo todo e sei o que meu sorriso provoca. Contudo,<br />
não adiantaria nada este recurso. A menos que eu esculpisse pelas paredes meu rosto<br />
e convocasse todos ao toque. Imaginei diversas bocas escancaradas em alegria tátil,<br />
cumprindo sua função costumeira de simpatia. Isso era mais um raio de imaginação,<br />
buscando adaptar meios para resolver a realidade nova que se me apresentava.<br />
Inspirei fundo e escolhi a dedo as palavras que trariam para mim a atenção de<br />
todos. Pressenti que escolher a forma de dizer seria mais contundente do que as<br />
palavras em si. E como nos exercícios de leitura, imaginei uma mesma frase sendo<br />
dita com ternura, com veemência, com desleixo, com piedade, em tom de súplica.<br />
Ensaiei baixinho, só na minha cabeça. Quantas entradas diferentes eu poderia ter<br />
nesta mesma sala, quantas impressões diferentes poderia causar apenas pela maneira<br />
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