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Os nossos antepassados, de Italo Calvino, como alegoria do sujeito ...

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Revista <strong>de</strong> Estu<strong>do</strong>s Interdisciplinares <strong>de</strong> Italiano | Número 04 | março/2012<br />

mais boa vonta<strong>de</strong>’ Mas não obten<strong>do</strong> respostas para tais questões, tratava <strong>de</strong><br />

expulsá-las da mente, esforçan<strong>do</strong>-se em fazer as instalações mais bonitas e<br />

engenhosas que podia. – Tem <strong>de</strong> esquecer o fim para o qual servirão. Olhe-os só<br />

<strong>como</strong> mecanismos. Vê <strong>como</strong> são bonitos” (CALVINO, 2001, p. 48-49).<br />

É assim que a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> encara suas construções, <strong>como</strong> mecanismos que<br />

funcionam, é este o aspecto formal da razão que <strong>do</strong>mina. Não se põe em questão os<br />

fins – o que seria tarefa para uma razão sensível e crítica.<br />

O barão nas árvores<br />

Seguin<strong>do</strong> a trilogia, temos O barão nas árvores. Diferentemente da primeira<br />

história, aqui <strong>Calvino</strong> não <strong>de</strong>staca a mutilação ou a incompletu<strong>de</strong> <strong>do</strong> ser. Segun<strong>do</strong> ele, a<br />

sua teia narrativa seria sobre: “[...] uma pessoa [que] se impõe voluntariamente uma<br />

regra difícil e a segue até as últimas consequências, pois sem esta não seria ela mesma<br />

nem para si nem para os outros” (CALVINO, 2001, p. 13). Obviamente, o autor <strong>de</strong>lineia<br />

<strong>como</strong> será a narrativa e, a partir disso, constrói um objetivo, ou um <strong>de</strong>sejo, a ser<br />

alcança<strong>do</strong>. Mas isso não significa dizer que, durante o processo <strong>de</strong> criação e escrita, a<br />

história não possa extrapolar os objetivos <strong>de</strong>fini<strong>do</strong>s e apresentar outros temas ou i<strong>de</strong>ias<br />

que apontem para outros caminhos da reflexão e da crítica. Segun<strong>do</strong> <strong>Calvino</strong>, a história<br />

tem <strong>como</strong> objetivo principal mostrar a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong> alguém em seguir um projeto<br />

até as últimas consequências para manter a sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Mas, <strong>como</strong> ele mesmo<br />

afirmou, os leitores <strong>de</strong> suas histórias estão livres para interpretar além <strong>do</strong> explicita<strong>do</strong><br />

por ele em suas análises ou comentários sobre as suas próprias histórias: “Assim <strong>como</strong><br />

estão livres para interpretar <strong>como</strong> quiserem estas três histórias, e nem precisam sentirse<br />

vincula<strong>do</strong>s ao testemunho que agora lhes ofereci sobre sua gênese” (CALVINO, 2001,<br />

p. 19).<br />

Deste mo<strong>do</strong>, po<strong>de</strong>mos adicionar algumas outras interpretações sobre o<br />

personagem principal Cosme Chuvasco <strong>de</strong> Rondó. Ao <strong>de</strong>cidir viver em cima das árvores,<br />

<strong>de</strong>ixa-se claro, através <strong>do</strong> narra<strong>do</strong>r – seu irmão – que Cosme não aceita as relações<br />

familiares que se dão em sua casa, nem o man<strong>do</strong> autoritário <strong>do</strong> pai, muito menos a<br />

i<strong>de</strong>ia que o pai representa <strong>de</strong> ascensão à riqueza e po<strong>de</strong>r trazi<strong>do</strong>s pela nomeação a<br />

algum cargo importante. Mas se po<strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r, também, que Cosme não<br />

conseguia relacionar-se diretamente com as pessoas, pois fugia <strong>de</strong>las quan<strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>termina<strong>do</strong> comportamento ou pessoa o <strong>de</strong>sagradava. No caso <strong>de</strong> Cosme, ele vivia<br />

momentos <strong>de</strong> selvageria: “[...] ele era igualmente avesso a to<strong>do</strong> tipo <strong>de</strong> convivência<br />

humana vigente em sua época, e por isso fugia <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s, e se obstinava em<br />

experimentar novos; mas nenhum <strong>de</strong>les lhe parecia suficientemente justo e diferente<br />

<strong>do</strong>s outros: daí seus contínuos intervalos <strong>de</strong> selvageria” (CALVINO, 2001, p. 332). Em<br />

contrapartida, quan<strong>do</strong> em contato com as pessoas, mantinha postura otimista, fruto <strong>de</strong><br />

sua proximida<strong>de</strong> aos i<strong>de</strong>ais da Revolução Francesa. A sua recusa, no fim das contas, é<br />

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