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9. Investigação qualitativa e quantitativa - Universidade da Madeira

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INVESTIGAÇÃO QUANTITATIVA E QUALITATIVA: DICOTOMIA OU<br />

COMPLEMENTARIDADE<br />

António V. Bento<br />

Centro de Investigação em Educação<br />

<strong>Universi<strong>da</strong>de</strong> <strong>da</strong> <strong>Madeira</strong><br />

Na primeira aula <strong>da</strong> uni<strong>da</strong>de curricular de “Investigação em Educação” começamos por<br />

definir o conceito de investigação científica como um “processo que permite resolver<br />

problemas ligados ao conhecimento de fenómenos do mundo real no qual vivemos”<br />

(Fortin, 2003) e exploramos a sua importância decisiva para o desenvolvimento <strong>da</strong>s<br />

pessoas, <strong>da</strong>s organizações e <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong>des.<br />

O termo “investigação” deriva do latim “investigatio” (in+vestigium), “in” significando<br />

uma acção de entrar e “vestigium” correspondendo a vestígio, marca, sinal” (Sousa,<br />

2005, p. 11). Ain<strong>da</strong> segundo este autor (Sousa, 2005), “investigar” refere-se, em termos<br />

etimológicos, em entrar nos vestígios, em procurar nos sinais o conhecimento <strong>da</strong>quilo<br />

que os provocou.<br />

Pergunta-se frequentemente porque se deve fazer investigação em educação. A resposta<br />

é que a investigação educacional desenvolve novos conhecimentos acerca do ensino, <strong>da</strong><br />

aprendizagem e <strong>da</strong> administração educacional.<br />

A investigação educacional tem sido descrita como <strong>quantitativa</strong> ou <strong>qualitativa</strong>. Estes<br />

termos referem as duas tradições diferentes de investigação, ca<strong>da</strong> uma com a sua<br />

terminologia, métodos e técnicas. Por muitas déca<strong>da</strong>s, a maioria <strong>da</strong> investigação<br />

educacional era basea<strong>da</strong> na tradição <strong>quantitativa</strong>, que é, o que é conhecido como a<br />

filosofia positivista de como geramos o conhecimento. Como reflectido nas ciências<br />

exactas e na psicologia, o positivista acredita que há factos com reali<strong>da</strong>de objectiva que<br />

podem ser expressos numericamente. Consequentemente, há uma pesa<strong>da</strong> dependência<br />

em números, medi<strong>da</strong>s, experiências, relações e descrições numéricas. Até aos anos 70<br />

do século passado, a vasta maioria dos estudos em educação eram de natureza<br />

<strong>quantitativa</strong>. Nos dias de hoje, é muito comum lermos estudos que são qualitativos, que<br />

têm algumas características <strong>qualitativa</strong>s ou que usam ambas as abor<strong>da</strong>gens.<br />

A investigação <strong>qualitativa</strong> foca um modelo fenomenológico no qual a reali<strong>da</strong>de é<br />

enraiza<strong>da</strong> nas percepções dos sujeitos; o objectivo é compreender e encontrar<br />

significados através de narrativas verbais e de observações em vez de através de<br />

números. A investigação <strong>qualitativa</strong> normalmente ocorre em situações naturais em<br />

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contraste com a investigação <strong>quantitativa</strong> que exige controlo e manipulação de<br />

comportamentos e lugares.<br />

Actualmente há um consenso muito alargado acerca do que é a investigação <strong>qualitativa</strong>.<br />

Segundo vários autores (ex. Bog<strong>da</strong>n & Biklen, 1994), as características <strong>da</strong> investigação<br />

<strong>qualitativa</strong> são múltiplas: a) Acontece em ambientes naturais; frequentemente o<br />

investigador vai ao local dos participantes para recolher os <strong>da</strong>dos com grande detalhe;<br />

b) Usa múltiplos métodos de recolha de <strong>da</strong>dos e que são interactivos e humanistas; há<br />

uma participação activa do investigador e uma sensibili<strong>da</strong>de para com os participantes<br />

no estudo; c) Emerge do processo de investigação em vez de ser pré-estabeleci<strong>da</strong>; em<br />

consequência, as questões de investigação podem mu<strong>da</strong>r e ser redefini<strong>da</strong>s durante o<br />

processo; d) É profun<strong>da</strong>mente interpretativa e descritiva; o investigador faz uma<br />

interpretação dos <strong>da</strong>dos, descreve os participantes e os locais, analisa os <strong>da</strong>dos para<br />

configurar temas ou categorias e retira conclusões; d) É indutiva; o investigador analisa<br />

os <strong>da</strong>dos indutivamente; não há a preocupação em arranjar <strong>da</strong>dos ou evidência para<br />

provar ou rejeitar hipóteses; e) É significativa; é uma preocupação essencial na<br />

abor<strong>da</strong>gem <strong>qualitativa</strong>. O investigador está preocupado em saber como diferentes<br />

pessoas fazem sentido ou dão significado às suas vi<strong>da</strong>s e quais são as perspectivas<br />

pessoais dos participantes. f) O investigador qualitativo vê os fenómenos sociais<br />

holisticamente; este facto explica por que os estudos qualitativos parecem gerais e<br />

visões panorâmicas em vez de micro análises; g) O investigador qualitativo reflecte<br />

sobre o seu papel na investigação; reconhece possíveis enviesamentos, valores e<br />

interesses pessoais. O “eu” pessoal é inseparável do “eu” investigador. Assume-se,<br />

portanto, que to<strong>da</strong> a investigação está eiva<strong>da</strong> de valores. h) O investigador qualitativo<br />

usa, em simultâneo, a recolha de <strong>da</strong>dos, a análise e o processo de escrita; privilegiam-se<br />

os significados e como os participantes dão sentido às suas vi<strong>da</strong>s, o que experienciam, o<br />

modo como interpretam as suas experiências e como estruturam o mundo social em que<br />

vivem; i) O investigador qualitativo é o principal instrumento de recolha de <strong>da</strong>dos; o<br />

investigador passa imenso tempo no local de estudo a compreender os contextos; j) O<br />

investigador qualitativo preocupa-se mais com o processo do que simplesmente com os<br />

resultados.<br />

Segundo Bell (2004, pp. 19-20), os “investigadores quantitativos recolhem os factos e<br />

estu<strong>da</strong>m a relação entre eles” enquanto que os investigadores qualitativos “estão mais<br />

interessados em compreender as percepções individuais do mundo. Procuram<br />

compreensão, em vez de análise estatística. (…). Contudo, há momentos em que os<br />

investigadores qualitativos recorrem a técnicas <strong>quantitativa</strong>s, e vice-versa.”<br />

Frequentemente, os alunos perguntam qual <strong>da</strong>s abor<strong>da</strong>gens é a melhor, a <strong>quantitativa</strong> ou<br />

a <strong>qualitativa</strong>. A resposta é que ambas são importantes; o uso de ca<strong>da</strong> uma depende do<br />

que queremos estu<strong>da</strong>r e a que perguntas pretendemos responder. Finalmente, as<br />

abor<strong>da</strong>gens <strong>qualitativa</strong>s e <strong>quantitativa</strong>s têm sido usa<strong>da</strong>s, com muito sucesso,<br />

conjuntamente. Os <strong>da</strong>dos qualitativos podem também ser usados para suplementar,<br />

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vali<strong>da</strong>r, explicar, iluminar ou reinterpretar <strong>da</strong>dos quantitativos obtidos dos mesmos<br />

sujeitos. De facto, as abor<strong>da</strong>gens de investigação, <strong>quantitativa</strong> e <strong>qualitativa</strong>, devem ser<br />

vistas como técnicas complementares, ca<strong>da</strong> uma delas <strong>da</strong>ndo as suas próprias visões a<br />

um determinado problema; assim, podem, então, ser mais complementares que<br />

dicotómicas.<br />

Referências<br />

Bell, J. (2004). Como realizar um projecto de investigação (3ª edição). Lisboa: Gradiva.<br />

Bog<strong>da</strong>n, R. & Biklen, S. (1994). Investigação <strong>qualitativa</strong> em educação. Porto: Porto<br />

Editora.<br />

Fortin, M. (2003). O processo de investigação: Da concepção à realização (3ª edição).<br />

Loures: Lusociência.<br />

Sousa, A. (2005). Investigação em educação. Lisboa: Livros Horizonte.<br />

Como fazer referência deste artigo:<br />

Bento, A. (2012, Abril). Investigação <strong>quantitativa</strong> e <strong>qualitativa</strong>: Dicotomia ou<br />

complementari<strong>da</strong>de. Revista JA (Associação Académica <strong>da</strong> <strong>Universi<strong>da</strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

<strong>Madeira</strong>), nº 64, ano VII (pp. 40-43). ISSN: 1647-8975.<br />

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