PERTENÃAS FECHADAS EM ESPAÃOS ABERTOS - Acidi
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PERTENÇAS <strong>FECHADAS</strong> <strong>EM</strong> ESPAÇOS <strong>ABERTOS</strong> – Estratégias de (re)Construção Identitária de Mulheres Muçulmanas em Portugal<br />
reforça o sistema patrilinear, dado que a descendência deste casal<br />
seguirá a mesma linha (Weibel, 2000). Sendo os homens detentores do<br />
monopólio dos instrumentos de produção e de reprodução do capital<br />
simbólico, eles procuram assegurar a conservação ou o aumento desse<br />
material através destas estratégias matrimoniais (Bourdieu, 1999). É o<br />
caso de Nafanta, destinada ao seu primo direito desde a nascença, do<br />
primeiro casamento de Fulé, e de Mariatu, também casada com um<br />
primo, embora mais afastado:<br />
“Foi família, a minha tia é que decidiu o casamento. Quer dizer,<br />
somos primos, um bocadinho afastados. Fomos criados pela<br />
mesma pessoa. Quando a mãe dele morreu ele era bebé, então a<br />
minha tia criou, e eu, depois, também fui criada com a minha tia,<br />
que é irmã do meu pai, porque também o meu pai morreu logo<br />
e a minha mãe, para não ficar sobrecarregada de tantos, fiquei<br />
eu com a minha tia. Ele é mais velho que eu 10 anos”. (Mariatu,<br />
44 anos, origem guineense)<br />
A jovem Latifah, de origem indiana, embora seja também casada com um<br />
primo em primeiro grau, refere não ter sido uma situação imposta pelos<br />
familiares, mas sim uma escolha da própria, sentimental e não instrumental,<br />
tendo até o namoro sido escondido do pai, como já foi referido.<br />
Outra das principais diferenças entre as estruturas familiares das<br />
populações destas duas origens é a poligamia, inexistente entre as<br />
entrevistadas indianas, mas bastante comum entre as guineenses, quer<br />
entre as próprias entrevistadas, quer nas suas famílias. Neste sentido, são<br />
também as guineenses que, ao contrário das indianas, admitem que a<br />
decisão do cônjuge em casar-se com outras mulheres possa vir a acontecer.<br />
“Até agora ele não… Poderá vir, não sei. Claro que ninguém gosta,<br />
mas eu não posso obrigar, né Eu posso dizer que não, mas nem<br />
isso lhe impede de fazer, se ele decidir mesmo fazer. Os<br />
muçulmanos são assim”. (Mariatu, 44 anos, origem guineense)<br />
Entre elas, apenas Fulé, filha de mãe caboverdiana, diz nunca vir a aceitar<br />
uma situação de poligamia do marido. Sendo uma situação aceite pela<br />
religião muçulmana em circunstâncias específicas 17 , foi, contudo,<br />
geralmente demonstrada uma manifestação de desagrado face à mesma:<br />
“Eu sabia que a família dele o queria dar a outra família outra vez,<br />
mas eu sempre ficava em cima disso. Nunca deixei, nunca. Nunca<br />
17. A religião admite até três mulheres para além da primeira, que mantém o estatuto<br />
de principal, desde que as condições económicas do homem permitam proporcionar<br />
a todas um nível de vida semelhante.<br />
Maria Abranches<br />
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