09.01.2015 Views

José Eustáquio Diniz Alves - Instituto de Economia da UFRJ

José Eustáquio Diniz Alves - Instituto de Economia da UFRJ

José Eustáquio Diniz Alves - Instituto de Economia da UFRJ

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

A relação inversa entre fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> e ren<strong>da</strong><br />

José Eustáquio <strong>Diniz</strong> <strong>Alves</strong> i<br />

O número <strong>de</strong> filhos diminui quando a ren<strong>da</strong> aumenta. Esta relação inversa vale tanto para o nível<br />

macroeconômico, quanto para o nível microeconômico. Famílias com maiores níveis <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> têm, em média,<br />

menos filhos do que as famílias pobres. Países com altos níveis <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> per capita possuem taxas médias <strong>de</strong><br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> menores do que os países <strong>de</strong> baixa ren<strong>da</strong> per capita. Esta é uma correlação observa<strong>da</strong> nas<br />

evidências empíricas.<br />

Porém, dizer que a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> está relaciona<strong>da</strong> com o aumento <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> não significa estabelecer<br />

um sentido <strong>de</strong> causali<strong>da</strong><strong>de</strong>, pois tanto a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> po<strong>de</strong> levar ao aumento <strong>da</strong> ren<strong>da</strong>, quanto o<br />

contrário, ou seja, o aumento <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> po<strong>de</strong> levar à que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong>. Buscar enten<strong>de</strong>r o sentido <strong>da</strong><br />

causali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> relação entre fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> e ren<strong>da</strong> não é uma tarefa puramente acadêmica, pois <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />

Conferência Mundial sobre População, <strong>de</strong> Bucareste, realiza<strong>da</strong> em 1974, os formuladores <strong>de</strong> políticas públicas se<br />

<strong>de</strong>batem sobre as duas alternativas seguintes: priorizar os investimentos no <strong>de</strong>senvolvimento econômico<br />

(provocando a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong>) ou priorizar os investimentos em “planejamento familiar” e na que<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> (o que reduziria o ônus <strong>da</strong> alta razão <strong>de</strong> <strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> crianças e jovens) para possibilitar o take<br />

off do <strong>de</strong>senvolvimento econômico.<br />

Na prática, a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> e o <strong>de</strong>senvolvimento econômico são fenômenos sincrônicos que se<br />

reforçam mutuamente, embora, entre os diversos países do mundo, o limiar entre fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

<strong>de</strong>senvolvimento tenha níveis um tanto quanto diferentes. O gráfico 1 mostra a relação entre as taxas <strong>de</strong><br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> e a ren<strong>da</strong> per capita em 175 países do mundo (que tinham <strong>da</strong>dos disponíveis para o período<br />

compreendido entre 2005-2010).<br />

Gráfico 1: Taxa <strong>de</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> total (2005-10) e ren<strong>da</strong> per capita em po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> pari<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> compra - ppp (2008)<br />

– 175 paises<br />

Ren<strong>da</strong> per capita ppp (mil dólares)<br />

70<br />

60<br />

50<br />

40<br />

30<br />

20<br />

10<br />

0<br />

y = 49,179x -2,121<br />

R² = 0,6665<br />

0 1 2 3 4 5 6 7 8<br />

Taxa <strong>de</strong> Fecuni<strong>da</strong><strong>de</strong> Total (TFT)<br />

Fonte: Population Reference Bureau (PRB), 2010 World Population Data Sheet<br />

1


Entre os países com ren<strong>da</strong> per capita acima <strong>de</strong> US$ 50 mil (e acima <strong>da</strong> curva <strong>de</strong> tendêncial), apenas o Kwait –<br />

exportador <strong>de</strong> petróleo – apresentava TFT acima <strong>de</strong> 2 filhos. Da mesma forma, a Arábia Saudita foi único país<br />

com ren<strong>da</strong> per capita maior <strong>de</strong> US$ 20 mil e fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> acima <strong>de</strong> 3 filhos por mulher. De modo geral, os países<br />

exportadores <strong>de</strong> petróleo apresentam fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> um pouco maior do que os outros países com o mesmo nível<br />

<strong>de</strong> ren<strong>da</strong>. Isto porque a riqueza gera<strong>da</strong> pelo petróleo não implica, necessariamente, em oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

empregos <strong>de</strong>centes para todos os ci<strong>da</strong>dãos e, especialmente, para as mulheres.<br />

Já entre os países com baixa ren<strong>da</strong> (abaixo <strong>de</strong> US$ 10 mil) e baixa fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> (abaixo do nível <strong>de</strong> reposição)<br />

estão principalmente países do leste europeu (Albânia, Armênia, Georgia, Moldova, Ucrânica, etc.), do su<strong>de</strong>ste<br />

asiático (Tailândia e Vietnam) e do Caribe (Santa Lúcia e Dominica).<br />

O gráfico 1 mostra que, em um extremo, todos os países com ren<strong>da</strong> per capita acima <strong>de</strong> US$ 30 mil possuem<br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> abaixo <strong>de</strong> 2,3 filhos por mulher. No outro extremo, todos os países com fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> acima <strong>de</strong> 4<br />

filhos por mulher tinham ren<strong>da</strong> per capita menor do que US$ 6 mil. Nenhum país <strong>de</strong> alta ren<strong>da</strong> possuia<br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> eleva<strong>da</strong>. Contudo, existiam vários países com fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> abaixo do nível <strong>de</strong> reposição e baixa<br />

ren<strong>da</strong> (países pobres). Isto parece sugerir que o alto nível <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> leva necessariamente à redução do tamanho<br />

<strong>da</strong> família, mas famílias pequenas não são, necessariamente, passaporte para elevados níveis <strong>de</strong> ren<strong>da</strong>.<br />

Uma breve visão longitudinal mostra as diferenças entre 3 países. A Arábia Saudita passou a ter altos níveis <strong>de</strong><br />

ren<strong>da</strong> na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1970 quando houve um gran<strong>de</strong> aumento do preço do petróleo. Naquela época a TFT na<br />

Arábia Saudita estava em torno <strong>de</strong> 7 filhos por mulher. Ou seja, só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter alta ren<strong>da</strong> per capita a<br />

fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> saudita começou a cair. O país enriqueceu e <strong>de</strong>pois houve a transição <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Na China aconteceu o contrário, pois a TFT estava em torno <strong>de</strong> 6 filhos por mulher, em 1965-70 e caiu para 3<br />

filhos, em 1975-80, numa época que a ren<strong>da</strong> per capita era muito baixa e o país contava com baixo nível <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico e baixa urbanização. Portanto, na China, a fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> caiu primeiro e o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico veio <strong>de</strong>pois (anos 1980 em diante).<br />

Já no caso brasileiro a ren<strong>da</strong> per capita vinha crescendo ao longo do século XX e provocando a que<strong>da</strong> <strong>da</strong>s taxas<br />

<strong>de</strong> mortali<strong>da</strong><strong>de</strong>. A partir <strong>de</strong> um certo limiar <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento (aumento <strong>da</strong> urbanização, do assalariamento,<br />

<strong>da</strong> educação, etc.) a fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> começou a cair e manteve um ritmo <strong>de</strong> que<strong>da</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do ciclo<br />

econômico. Na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1970 a economia cresceu muito e a fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> caiu. Na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1980, houve crise<br />

econômica e redução <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> per capita, mas a fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> continuou caindo. Na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990 e na<br />

primeira déca<strong>da</strong> do século XXI a economia cresceu enquanto a fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> continuava caindo. Especialmente,<br />

na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 2000-10 a mu<strong>da</strong>nça <strong>da</strong> estrutura etária (provoca<strong>da</strong> pela que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong>) ajudou a acelerar<br />

o crescimento econômico e a diminuir os níveis <strong>de</strong> pobreza.<br />

Desta forma, po<strong>de</strong>-se observar que, mesmo por caminhos diferentes, é váli<strong>da</strong> a relação entre o aumento <strong>da</strong><br />

ren<strong>da</strong> per capita do país, a redução <strong>da</strong> pobreza e a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong>, embora a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> fecundi<strong>da</strong><strong>de</strong> seja<br />

uma condição necessária, mas não suficiente para o aumento <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> per capita.<br />

i Professor titular <strong>da</strong> Escola Nacional <strong>de</strong> Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE. Apresenta seus pontos <strong>de</strong> vista em caráter<br />

pessoal. Tel: (21) 2142 4689. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br Publicado em APARTE (http://www.ie.ufrj.br/aparte/) –<br />

16/07/2011).<br />

2

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!