GT 2011 - Semana de Letras - UFSC

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Meninice
Meu pai não tinha carro
Muito menos sabia dirigir
Minha mãe trabalhava muito, dava aula, era professora.
Em casa, minha irmã e suas amigas, brincavam...
E eu, sozinho entre os quadrinhos.
No mundo grande de meu pequeno quarto
Lia histórias de super-heróis
Era gibi que não acabava mais.
O maior deles de manhã cedo me chamava
Tom grave, no diminutivo.
Com um sotaque igual ao dos meus tios e avós:
- Charlinho...
O som dessa voz ainda ecoa abafado
Pelo volume alto de um velho rádio.
Até posso vê-lo preparando um café gostoso
Sim, pois me lembro de que ele fazia um bom café.
No quintal harmonioso que cultivava
Com apenas vassoura, pá e ancinho,
Eu lá brincava ao sol com uma bola velha e suja
Carimbando suas formas na parede azul.
Repentinamente parei para ver a beleza
De um bico de lacre que veio a pousar
Em seu ninho no pé de limão
E eu ali a suspirar... Bem fundo!
Contudo, veio a chuva forte.
E a tempestade fez o pássaro voar
E o tempo levar meu pai
E a beleza do quintal então se desmanchou
Dentro de casa com os dedos em forma de limpador de para-brisa
Através do vidro embaçado ainda tento ver meus amigos lá fora.
Encharcados a jogar futebol no aguaceiro
Enfim, lá no fundo da rua vislumbro o arco-íris sorrindo.
Jamais poderia imaginar, leitor.
Que igual àquele velhinho simpático
Na capa de um dos livros da minha mãe
Também teria eu um dia história bonita para lhe contar.
Charles de Miranda Júnior
Sábado, 21 de Maio de 2011.